TERRA-MARTE ANO 2500, RESENHA

TERRA-MARTE ANO 2500, RESENHA

Miguel Carqueija

 

Resenha da novela de ficção científica “Terra-Marte: ano 2500”, por James Elton. Coleção Fantastic nº 15 (antiga Série Futurâmica nº 16). Tradução de Iolanda Guaspari. Título original: “The quest of the seeker” (O problema do pesquisador), copyright John Spencer & Co.; edição brasileira : Editora Tecnoprint Gráfica, Rio de Janeiro-RJ, 1975 (Edições de Ouro, Categoria Copa, 566). Primeira edição brasileira: Tecnoprint, 1958.

 

Uma típica “ópera do espaço” como as histórias de B.R. Bruss, Jimmy Guieu, Maurice Limat, Roy Sheldon ou F.Richard-Bessière. Essas obras são, de um modo geral, legíveis e interessantes, ainda que ridículas e medíocres. É que possuem uma linha de ação bem definida que geralmente consegue manter o interesse para leitores disponíveis, mas não causam grande impressão.

Nesse livro acompanhamos as proezas de Shan Karkoran, o Pesquisador — um P maiúsculo, mesmo — que vive num reduto do Pólo Sul, junto com os outros de sua estirpe. Apesar de toda a sabedoria e dos poderes da classe à qual pertence, Shan está inquieto: ele quer saber o que ocorre no resto do mundo (o que inclui outros planetas). Constata rapidamente que, fora de seu refúgio no gelo da Antártica, o mundo se encontra de pernas para o ar: prostituição, pirataria, violência, miséria e corrupção. Isso já na Terra, sem precisar ir ao resto do sistema. E aí notamos um detalhe curioso, que aliás me foi comentado pelo Gerson Lodi: com a Terra arruinada, ele vai se preocupar com o que acontece em Marte — onde até se envolve na luta para derrubar o tirano Marvan.

Shan acaba sendo um desses heróis inverossímeis que sempre escapa da morte por pior situação em que esteja. No começo isso ainda é explicado com o seu poder de fulminar as pessoas com o olhar (deve ser aquele olhar de “professora do Calvin”), que utiliza no seu primeiro confronto com Tushar, o grande vilão da história. Mas depois acontecem lances bastante improváveis, tipo o sujeito ser salvo por uma bola de peles telepata ou pela chegada de toda uma frota interplanetária atacante quando ele estava prestes a ser jogado no abismo. Quanto ao poder do Pesquisador, não sei porque ele não o utiliza em todas as encrencas.

Uma das sequências mais curiosas é aquela em que o Decano dos Pesquisadores mostra a Shan — que retornara de Marte na esperança de obter ajuda para a sua campanha pessoal de restauração da justiça — uma espécie de filme do espaço e do tempo, numa sala especialmente projetada:

“Não podemos atravessar o tempo, Shan, mas fazemos o possível para que o tempo nos seja trazido aqui neste quarto...”

E assim o sacripantas do Decano mostra a Shan que, ao contrário do que este julga, os Conselheiros (pesquisadores hierarquicamente superiores) não ignoram as misérias e os crimes que golpeiam o Sistema Solar. Sabem tudo, só que não pretendem intervir tão cedo. Ou talvez nunca:

“Não interviremos, Shan. Talvez, em época oportuna, faremos o que nos compete... Mas esse tempo ainda não chegou. Recolha-se à sua cela, Shan, e prepare-se para escrever.”

Shan se rebela contra essa mentalidade e retorna sozinho, disposto a derrubar um imperador. O contexto geral do enredo é bastante maniqueísta, inclusive excluindo praticamente as mulheres da trama e vínculos familiares dos personagens principais. Apenas o Imperador Marvan tem um irmão, Kavario, seu arqui-inimigo. Assim, Marvan e Tushar são vilões tão convincentes quanto os que aparecem nos desenhos de super-heróis. E Shan, por falar nisso, como herói é tão convincente quanto os Super-Amigos...

Embora tirano de Marte, Marvan não é o principal vilão. É covarde, e disto se aproveita Shan para ameaçá-lo de forma mirabolante:

“Torture-me, se quiser, Marvan. Creio, porém, que não se atreverá. Sou um Pesquisador! Ainda que me pusesse ferro em brasas no corpo, eu o mataria com o meu olhar. Posso amaldiçoá-lo para toda a eternidade. O seu fantasma irá vaguear, eternamente, nos vácuos negros do espaço...”

A reação de Marvan a essas palavras é histérica.

Na metade do livro a trama acaba ficando cansativa pois o autor encompridou muito um argumento fraco.

Resta observar que a ação se passa muito além do ano 2500, de modo que o título colocado em português é incoerente.

O autor escreveu também “A equação humana: quatro novelas de FC”, que saiu no Brasil pela Editora Mundo Musical, Rio de Janeiro, 1976.

 

Rio de Janeiro, 2 a 8 de setembro de 1991.

Texto originalmente publicado no fanzine "Megalon" (São Paulo) editado pelo jornalista Marcello Simão Branco, onde eu assinei a coluna "Galeria do Tempo" com resenhas de obras de ficção científica.

Com o advento da internet os fanzines de papel foram desaparecendo.