A saga da Marquesa de Santos

 

A SAGA DA MARQUESA DE SANTOS

Miguel Carqueija

 

Resenha do romance histórico “A Marquesa de Santos”, de Paulo Setúbal. Companhia Editora Nacional, São Paulo-SP, 12ª edição, 1984. Apresentação: Lourenço Dantas Mota.

 

Um dos maiores romancistas brasileiros, Paulo Setúbal (1893-1937) marcou a minha infância. Meu pai começou a trazer livros pequenos e de capa dura, que um amigo estava lhe emprestando. Não sei se ele leu mas eu li todos, assinados pelo Paulo Setúbal, o primeiro foi “O romance da prata”. E entre eles estava “A Marquesa de Santos”.

É um livro aliciante, contando em forma de romance os bastidores escabrosos da corte de Dom Pedro I. Vemos aí as rivalidades entre os maçons que exerciam grande influência na política e a figura imponente de José Bonifácio de Andrada e Silva, Primeiro-Ministro do Império. A luta política entre ele e Gonçalves Ledo e outros rivais da Maçonaria, a existência de duas lojas rivais. O surgimento de Domitila de Castro, jovem lindíssima e sedutora da sociedade de São Paulo (cidade que nem de longe era a metrópole em que se tornou), separada do marido, que tentara matá-la (episódio mal explicado no livro); como ela se tornou a “favorita” do imperador, de quem gerou Isabel Maria, a quem Dom Pedro nomeou Duquesa de Goiás; o sofrimento da imperatriz e legítima esposa de D.Pedro, Leopoldina, e por trás de tudo, fofocando aqui, futricando ali, armando e desarmando, como o mexeriqueiro e alcoviteiro-mor da Corte, o sinistro Francisco Gomes da Silva, Secretário Privado de Sua Alteza, ou seja, o célebre Chalaça.

Em outro dos seus livros Setúbal lamenta que Dom Pedro I, apesar de seu lado humano, sempre teve o defeito de se ligar a gente canalha, os seus auxiliares próximos, aliás cúmplices de aventuras e sem-vergonhices.

A Marquesa de Santos representou na época um grande escândalo que enfraqueceu o reinado de Dom Pedro. Claro que o grande culpado foi ele, ao não respeitar os direitos da esposa legítima, por ele humilhada, pois o concubinato do imperador com Domitila era ostensivo.

O Chalaça obtinha praticamente tudo o que queria. Armava tramas, jogava uns contra os outros e parecia gozar de ilimitada confiança do monarca. Conseguiu a expulsão e desterro de José Bonifácio e por fim voltou-se contra a própria Domitila.

Dom Pedro era tão inconstante que teve caso até com a irmã da Marquesa de Santos.

O livro é delicioso, fascinante, detalhista e apresenta imensa riqueza vocabular; por isso é bom ter o dicionário por perto. Mostra inclusive como o clero da época era dependente do regalismo vigente. Mostra o gosto de nobreza pela ostentação bem como a maneira como se arranjavam os matrimônios reais, por encomenda, sem que os noivos se conhecessem.

Em suma, penetramos num mundo que se foi, com seu labirinto de intrigas.

 

Rio de Janeiro, 1º de março de 2023.