O vendedor de passados - José Eduardo Agualusa

O vendedor de passados é um livro do escritor angolano contemporâneo José Eduardo Agualusa. O romance é inspirado nos conflitos em angola, nas influencias portuguesas e africanas e na cultura brasileira. Sua obra foi muito reconhecida no Brasil sendo um dos livros mais vendidos na Festa Literária Internacional que ocorreu em Paratti no Rio de Janeiro sendo o primeiro livro de conto do escritor publicado no Brasil.

O escritor tem ligações familiares no Brasil por parte de pai e de mãe. Agualusa é um termo da marinharia, dos marinheiros, para designar quando o mar está muito limpo, muito calmo, designação esta do signo agualusa que, também, é uma “ruptela do termo de água livre”, a maior parte da pequena família dos agualusas ainda vive em Cabo Frio, segundo o escritor.

Antecedendo a criação de O vendedor de passados o escritor escreveu obras com características mais voltadas a uma criação mais jornalística contendo relatos históricos e sócio-culturais.

O vendedor de passados é uma obra rica, porque além de reunir no romance as questões dos conflitos em angola e mencionar as influencias portuguesas, africanas e cultura brasileira, podemos observar o vasto conhecimento do autor sobre as diversas literaturas a partir de citações que ele faz de importantes escritores de obras literárias, entre elas de escritores brasileiros. Na obra de Agualusa percebemos em seu estilo as influencias vanguardista surrealista e concretista em sua obra.

O livro é composto por 32 capítulos curtos em que, a cada título, designa os acontecimentos do enredo referente o espaço físico ou psicológico dos personagens.

A leitura do livro é bem rápida e de grande eloqüência.

A narrativa é composta dos acontecimentos reais e dos sonhos dos personagens por isso, consideramos uma obra com influencias vanguardista do surrealismo.

O escritor domina muito bem às técnicas utilizadas para compor uma narrativa. Ora o texto é composto de um narrador onisciente (que tudo sabe) em terceira pessoa e, em outros fragmentos da obra é como se a história se narrasse sozinha sendo um narrador observador, mas, fazendo parte integrante implícito da narrativa. Nada espantosa esta observação se tratando de um escritor com a sua formação.

O enredo consiste na história de um homem que vende passados para os novos ilustres da Angola, essas pessoas têm prestígio e são considerados os novos ricos da sociedade, mas, lhes falta uma boa história, uma digna árvore genealógica. O vendedor de passados lhes proporciona uma realidade concreta em torno à história elaborada a cada cliente. O vendedor de passados materializa o seu produto comercial aos seus clientes, cria historia da majestosa genealogia de cada um lhes dando ancestrais ilustres, pergaminho. (...) “Resumindo: um nome que ressoe a nobreza e a cultura” (...) pg. 17

Felix, o vendedor, é um albino, considerasse um negro e vive em uma casa que: “Vive. Respira (...)” (pg 9), com a casa, os personagens (Osga e Felix) sentem uma relação de proteção semelhante à de se estar dentro de um útero.

A casa tem uma biblioteca e vários quadros de angolanos de renome espalhados por toda à parte. Na obra o escritor descreve a casa com detalhes: a clareza do lugar e a sensação de aconchego e segurança que traz aos personagens. Acreditamos que a escolha da descrição de Agulalusa sobre a casa e a relação dela com os personagens é porque: (...).”viver neste pais, é a vida em estado de embriaguez (...)”. A afirmação é porque as pessoas viviam em momentos difíceis na Angola, guerras civis, brigas pelo poder, massacres de inocentes, um povo que passou mutações tanto na política quanto nos valores e costumes da sociedade e os personagens acabam por se sentirem seguros em seu lar. Para retratar essa passagem de tempos difíceis o escritor vai destrinchando a história de Esperança, uma mulher que trabalha na casa de Felix Ventura, lava, passa, cozinha. Esperança viu sua família ser assassinada na sua frente escapando ela por sorte do acaso.

A personagem Osga que para nós brasileiros a tradução é lagartixa é uma metáfora criada pelo escritor que tem também uma relação forte com a casa e Felix Ventura o albino, através da Osga o leitor pode conhecer os sentimentos mais profundos de Felix por Ângela Lucia uma angolana cujo seu passado ao final da história vem à tona, tendo o seu passado uma relação direta com uns dos clientes de Felix.

A Osga também tem uma certa semelhança com Felix ventura em vários aspectos. Para explicarmos melhor essas relações é necessário saber que as lagartixas são um tipo de lagarto e os lagartos pertencem ao grupo dos répteis, junto com as cobras, as tartarugas e os jacarés. Acontece que só os lagartos – alguns deles – são capazes de perder, por vontade própria, um pedaço do rabo. O processo de soltar o rabo se chama autotomia (auto = voluntário, próprio; tomia = partir, cortar) e significa partir ou quebrar por vontade própria uma parte do corpo.

Na natureza, os animais possuem formas diferentes para se proteger e escapar dos seus predadores. Alguns possuem a cor parecida com a do ambiente, dificultando serem vistos; uns têm espinhos; outros têm veneno; há, ainda, aqueles que podem partir por vontade própria uma parte do corpo para escapar do perigo, como as lagartixas podendo assim regenerar a sua parte mutilada. No livro, a Osga está em busca de encontrar as memórias de suas outras vidas de forma a se regenerar. Na casa, ela está sempre na posição de observadora relatando ao leitor as suas impressões diante dos personagens e acontecimentos. Como a osga que pode partir por vontade própria uma parte do corpo para escapar do perigo e, assim, regenerar a sua parte mutilada, também como Felix que regenera o passado das pessoas e camufla a sua, assim como uma osga ao se sentir ameaçada.

No romance há várias peripécias, Felix ventura ao atender um estrangeiro que bate a sua porta, conhece o homem que o procura, este, o procura porque sabe que o albino constrói passado às pessoas, conversam e, lhe faz uma proposta ofertando-lhe uma boa quantia em dinheiro para que construa o seu passado.

A narrativa segue na seqüência em que os fatos vão acontecendo em torno da busca do estrangeiro por sua nova mãe, a partir do momento em que Felix o transforma em José Buchmann, natural da Chibia, 52 anos, fotografo profissional. Ele procura saber mais a respeito do seu passado construído por Felix Ventura a partir do nome da mãe, fotos e de pistas que Felix lhe dá em sua nova história, trilha um caminho em que o homem vai em busca de saber do paradeiro da mulher por quem procura. É evidente na narrativa da obra a busca da identidade do indivíduo a partir de suas raízes genealógicas em uma sociedade com características multiculturalista.

Esta é uma dica de leitura que vale a pena realizar. Encrementada de uma pitada de muito bom humor. Espero que todos gostem!!!!