GERTRUD

                                                      Hermann Hesse

 

 

            “Eu penso que, na vida, é possível estabelecer-se um limite preciso entre a juventude e a velhice. A juventude acaba quando acaba o egoísmo, a velhice começa quando se começa a viver para os outros...

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            A juventude quer divertir-se, a velhice, trabalhar. Ninguém se casa só para ter filhos, mas, uma vez que os têm, eles o modificam e, no fim, ele percebe que tudo, com efeito, acontecera somente em função deles. Isso prende-se ao fato de que a juventude, sem dúvida, gosta de falar da morte, mas nunca pensa nela. Os jovens julgam que vão viver eternamente; daí, poderem reportar a si mesmos todos os seus desejos e pensamentos. Ao contrário, os velhos já perceberam que, num ponto qualquer, existe um fim e que tudo o que alguém tem ou faz só para si mesmo, acaba por cair  no vazio e por ter acontecido em vão...” (pág. 97)

 

 

            “Considero a vida humana como uma noite profunda e triste, que não se suportaria, se, num ponto ou noutro, não rutilassem repentinos clarões, de uma luminosidade tão consoladora e maravilhosa, que seus segundos podem apagar e justificar anos de escuridão.” (pág. 111)

 

 

            “... existe bondade e razão em nós, dentro de nós, seres humanos com os quais brinca o destino; e podemos ser mais fortes do que a natureza e do que o destino, mesmo que somente por horas. E podemos sentir-nos próximos uns dos outros, quando é necessário, e olharmos uns nos olhos dos outros, com compreensão, e podemos amar-nos uns aos outros e viver para mútuo consolo...” (págs. 173,174)

 

 

           

            “... envelhecendo, nos sentimos mais contentes do que na juventude, que nem por isso pretendo menosprezar, pois, em todos os meus sonhos, continua a soar, de longe, aos meus ouvidos, como uma maravilhosa canção, mais pura e sonoramente afinada, hoje, do que quando ainda era realidade.” (pág. 175)


                         (in "Fragmentos" -  Cadernos de Leitura, 1968)