Desilusão
Por ordem divina chueguei certo dia,
Incauto e sem guia,
No mundo a sorrir.
Seguindo o meu sonho de ingênua criança,
Eu tive a esperança
De um belo porvir.
A brisa amorosa beijou-me na fronte,
Um lindo horizonte
Ao longe avistei.
Se tudo falava de amor e poesia,
Um tom de harmonia
Em tudo eu notei.
De peito ancioso, corri à procura
De gozo, ventura,
Mistério e condão.
Vaguei pela terra, de abrigo em abrigo,
Qual pobre mendigo
Em busca do pão.
E sempre encontrando em meus tristes caminhos
Os duros espinhos
Que a mágoa contém.
E a voz da ilusão a dizer-me, de lado:
O teu eldorado
Está mais além.
Além eu passava, à procura do norte,
Porém sempre a sorte
Fatal contra mim.
Enquanto os martírios eu ia carpindo
Mas via surgindo
Tormentos sem fim.
Na longa viagem, vi monstro homicida,
Vi luta renhida
De irmão contra irmão.
E vi entre os homens a falta de siso,
Nos lábios, um riso,
No peito, um dragão.
Nas noites escuras, ouvi o bulício
Dos filhos do vicio
No doido tropel.
E vi a loucura da mais linda dama
Socada na lama
Do negro bordel.
Vi tudo envolvido na baixa matéria,
Um caos de miséria,
Voltei desolado, de peito vazio,
Nem honra nem brio
Na terra encontrei.
De tanta tristeza, pezar e desgosto,
Senti pelo rosto
Correr-me o suor.
Se neste universo só reina tortura,
Devo ir à procura
De um mundo melhor.
A morte vem perto, conheço que morro,
Não peço socorro,
Preciso morrer.
Aquele que pensa, não morre gemendo,
Pois ele está vendo
Que cumpre o dever.
Não levo saudade guardada na mente,
Da vida presente
Eu nada fruí.
Em vez de conforto, sossego e delícias,
Somente malícias
E dores eu vi.