BIGAMIA

Quando tua beleza, um dia, evaporar

Na neblina do tempo inexorável, rude,

E o teu grito de amor, já trêmulo ficar

Nas furnas da velhice, à beira do ataúde...

Arrependida e triste hás de rememorar

Que hoje caio a teus pés e assim, nessa atitude

Beijo os teus rastros - como a praia beija o mar, -

Sem que o meu gesto tua indiferença mude.

Hás de lembrar, já velha, o quanto foste bela,

E sofrerás pior que a esquálida cadela

A esganiçar no sofrimento da invernia!

Enquanto é tempo, dá-me o teu amor formoso!

Faz o meu mundo tétrico, maravilhoso

E, promulga entre nós a lei da bigamia!

Salé, 2002