ESOPIANA E MAIS

ESOPIANA E MAIS – 17-25 AGO 15

Novas séries de William Lagos

ESOPIANA I – 17 AGO 2015

Aesopos, nosso Esopo, em português,

é o autor de apólogos sem conta,

alguns famosos, outros tendo menor monta;

aqui decido referir-me a três...

Sobre o Lobo e o Cordeiro, sempre lês,

que em variadas opiniões o povo aponta

e contra nossos políticos reponta,

por mais diversa de sua bandeira a tês!...

Outro que todos referem é o da formiga

trabalhadora e com rancor da farra

estridente da colega que cantava;

todos a ouviram e são cativos dessa intriga,

em que alimento negou à tal cigarra,

morta de fome enquanto ainda dançava!

ESOPIANA II

Claro que apólogos são só moralidades,

na natureza sem achar correspondência,

mas noutros casos em real tendência,

assim descrita pelo autor como verdades!

Um enxame de abelhas exerce atividades

bastante úteis, embora essa potência

não seja a real intenção de sua cadência:

néctar buscam para o mel de suas cidades

e se com isso muitas flores polinizam,

do mesmo modo que as árvores frutíferas,

esse é um efeito tão só colateral,

que a cera é para os favos que cultivam

e não se pode afirmar que tais melíferas

mel nos fabriquem por bondade natural!...

ESOPIANA III

Assim um homem que possuía uma parreira

achava, às vezes, uma feroz competição:

sugar suas uvas tais abelhas vão

e sua picada é dolorosa e bem certeira!

Pois conta Esopo que sob sua videira

esse homem instalou, por proteção

algumas jarras em que mel e água estão

como recurso contra a praga zumbideira...

E atraídas pelo odor do próprio mel,

as abelhas se enfiaram nas vasilhas,

sem conseguir sair, em quantidade!...

E assim o homem das uvas seu farnel

encheu depressa, com alguidar e bilhas,

sem se importar com tão grande mortandade!

ESOPIANA IV

E havia um lobo a encurralar um cabritinho,

correndo empós, para o bichinho devorar;

mas quando estava já prestes a alcançar,

parou a certa distância o animalzinho!...

“Por favor, Senhor Lobo,” – suplicou, baixinho

“Notei que é mais veloz e vai logo me pegar,

mas eu queria que deixasse-me dançar

antes que eu morra – eu vou ficar pertinho!”

“Mas toque para mim em sua linda lira,

que melhor ritmo com melodia irei mostrar!”

E o lobo concordou, em sua vaidade...

Destarte, contra ele a sorte vira:

os cães ouviram e vieram-no atacar,

para o matarem com grã voracidade!...

ESOPIANA V

Mas enquanto a matilha o perseguia

e já sua hora derradeira avista,

pensou o lobo: Por que quis ser musicista?

Fosse açougueiro, bem melhor eu comeria!

Ou se o cabrito matasse, assim que o via,

não estariam estes malvados na minha pista!

Na correria em que, por mais que insista,

sei que no fim minha pobre vida perderia!

E de fato, no mesmo dia, pereceu,

sem lhe sobrarem os ossos nem o pelo;

mais do que o lobo, o cão é bem feroz!

Fez grande troça o cabritinho, mas perdeu,

pois veio a cozinheira e no seu zelo

fez dele assado, também destino atroz!...

ESOPIANA VI

Esopo, para mim, foi velho austero,

querendo aos moços ensinar a trabalhar,

sem dança ou música, só o néctar a buscar,

artes zurzia com seu ânimo severo!

E esta poesia que diariamente gero,

mui certamente ele iria condenar!...

Eu deveria ir meu pátio capinar,

me afirmaria, com um tom de voz sincero!

Mas a cigarra, ao morrer, já pôs seus ovos

e as mãos do lobo não permitem tocar lira;

cumprem abelhas tão somente a sua função...

E quanto a mim, estes versos sempre novos

quero espalhar enquanto o mundo gira,

sem pretender qualquer apólogo ou lição!...

BERENICE E A ARANHA I – 18 AGO 15

Foi minha irmã cuidar de meu sobrinho,

Na casa antiga que então este alugava

E enquanto em tal morada se encontrava

Foi lavar a sua roupa com carinho...

Foi então que viu a teia, espalhada num cantinho

Dessa peça em que a máquina se achava...

E se aranha fosse uma dessas que picava,

Durante a noite, quem dormia bem quietinho?

Aproximou-se do aracnídeo, devagar,

E desferiu-lhe tremenda vassourada!

A teia desmanchou-se e ela sumiu,

Mas seu cadáver não conseguiu achar...

Acreditava acertar bem acertada

A pobre aranha, no instante em que a atingiu!

BERENICE E A ARANHA II

Sentiu um certo remorso pela aranha:

Moscas devora e também outros insetos,

Mas que fazer? Instintos bem concretos

Nos levam a temer a sua artimanha

E a matar qualquer visita estranha

Que nos invada os ambientes mais diletos;

Não se compartilha de bom grado os tetos,

Perante o medo ancestral a mente acanha...

Não cabe Ahimsa no pensar ocidental, (*)

Mas era a aranha criatura prodigiosa:

Em poucos dias restaurada fora a teia!

(*) Preservação de qualquer vida, matar nunca.

Berenice se achegou, é natural:

Faltavam patas nessa aranha vigorosa,

Mas de seda o canto inteiro se permeia!...

BERENICE E A ARANHA III

Chegou à tona o instinto maternal

De minha irmã, que de culpa foi ferida:

Mil emoções a tomaram de vencida,

Superara a adversidade o animal!...

Ela venceu a repugnância natural,

Chegou bem perto de sua vítima sofrida

E lhe falou, com voz bem comovida:

“Aranha, eu juro nunca mais te fazer mal!”

“Se prometeres não tomar qualquer vingança

Contra meu filho, durante a madrugada...

Em represália até talvez tenhas direito,

Mas me recordas do luto e da esperança;

Remorsos sinto por te deixar aleijada,

Fininha a culpa, mas a sinto no meu peito!”

BERENICE E A ARANHA IV

E assim vários dias se passaram...

Em nova tarde, viu que tinha companhia:

Uma outra aranha com a “sua” ali vivia

Com certo medo, inquietações surgiram...

Noites depois, seus problemas a ocuparam:

Foi tomar banho, a cabeça já vazia

E lá no box, viu a “outra” que a acolhia!

O que fazer? Os seus instintos dominaram!

Mais que depressa, golpeou-a com o chinelo

E centenas de aranhinhas se espalharam!

Abriu a térmica e as cobriu de água fervente!

Feito o holocausto, foi limpar o seu castelo:

Num saco plástico cem cadáveres ficaram

E só depois seu juramento veio à mente!...

BERENICE E A ARANHA V

A aleijada nessa manhã não apareceu,

Nem no outro dia, parecendo estar com medo:

Dos juramentos humanos via o segredo:

Que já não valem se o interesse se perdeu!

Três dias depois, contudo, sob o véu

De teia ainda maior, de seu degredo

Ela havia retornado, desde cedo,

Perneta embora, mas ao vê-la, se encolheu!

De certo modo, parecia um desafio,

Fiara a teia muito maior que dantes

E estava bem em baixo a tecelã,

Sua armadilha aumentando em grande brio,

Talvez pensando conseguir novas amantes,

Forjando um ninho com sua cinérea lã...

BERENICE E A ARANHA VI

Berenice chegou perto, lentamente:

“Aranha velha, não quebrei meu juramento:

Não te ataquei de novo um só momento;

Matei a outra, mas defensivamente...”

Não respondeu a aranha, infelizmente,

Sem se dispor a novo pacto dar assento:

Por que confiar no agressor do antigo evento?

Mas não ampliou mais a sua teia, realmente,

Pois Berenice só a via de relance:

Quando a outra a pressentia, se escondia,

Havia uma fresta bem no canto da parede.

Depois, mudou-se e saiu de seu alcance,

Hoje ainda pensa nessa aranha que sofria,

Mas que perante a adversidade nunca cede!...

AFECÇÕES I – 19 ago 2015

Certas pessoas apresentam acatisia

e não conseguem parar em um só lugar.

Vem do grego, kathizien, ou “sentar”,

quase impossível para quem disso sofria.

Inquietação constante que se cria,

certa ansiedade, movimento sem cessar,

que certas vezes tratamento vem causar

de antipsicóticos em que o clínico confia....

Mas em geral, surge mais naturalmente:

não é questão de não ficar sentado,

mas como efeito de seu corpo atribulado

viajam sem parar, rapidamente;

e alguns deles são os exploradores

ou alpinistas, das vastidões senhores...

AFECÇÕES II

Pessoalmente, eu também sou afetado;

não que não possa parar em um só lugar,

mas não consigo jamais me conformar

com um só poema, por mais seja alongado;

e assim os vou amontoando, lado a lado,

sofrendo assim do Mal de Poetar,

com Nove Musas sempre a me puxar,

por Dionyso e Apollo disputado;

e nem consigo parar, pois já tentei:

da Acatisia Poética nas garras,

embora, no geral, só mova o braço!

Quis ser dos versos o senhor e rei,

mas eles me controlam em suas farras

e se paro de escrever, eu me desgraço!

AFECÇÕES III

Andei doente, bem recentemente:

ganhei remédios para o coração,

que me fizeram bem, mas na ocasião

a atividade me podaram, certamente...

Foi bradicinesia, é-me evidente,

meus movimentos lentos, sem paixão

e mesmo as coisas que perto de mim são

causavam-me cansaço, incontinenti...

Tomava banho devagar e caminhava

com certo esforço, só de ficar em pé

e nem sequer me queria alimentar,

pelo labor que erguer o garfo me cobrava,

a lentidão a consumir-me a fé

a um nível que mal quero recordar!

AFECÇOES IV

Contudo, mesmo em meus piores dias,

à poética acatisia me dobrava

e três ou quatro sonetos rascunhava,

já meio exausto por tais linhas fugidias...

Se por acaso em meu leito então me vias,

sem ler os livros que à cabeceira acumulava,

enquanto o maço de cartões mais ampliava,

que algo escrevesse direito nem crerias...

Mas versejava entre bradicinesia,

quando qualquer movimento me cansava

e até no chão caí, sem levantar!

E para tudo o mais, tinha abulia,

porém rascunhos afinal garatujava,

em lento instante, depois de me acordar...

AFECÇÕES V

Também existe a galactorreia,

só a umas poucas mulheres peculiar,

em que seu leite acaba por brotar,

sem um nenê que lhes sirva de plateia...

E até na adolescência surge a ideia

de tal “leite de bruxa” a se escapar

de meninos e meninas, pelo atuar

dos hormônios a provocar tal epopeia...

Sem tê-lo visto, encontrei fotografias

que mostravam tal leite coagulado

sob os mamilos de certos rapazinhos,

mas que passava por si, quais alergias,

sem deixar qualquer efeito demorado:

eram as bruxas que lhes vinham dar beijinhos!

AFECÇÕES VI

E cada vez que Zeus perdia a teta

de Amalteia, cabra que foi a sua nutriz,

o seu leite esguichava, por um triz,

formando estrelas, ou mesmo algum cometa!

Por isso a grande nuvem, que se afeta

de “Caminho do Leite” e ainda se diz

ser a Via Láctea, essa cósmica raiz

que a luz da Lua em vastidão completa! (*)

(*) Galactos é “leite” em grego, daí a Galáxia; mas de Lacteus, ou

“leitoso” em latim, deriva o nome da Via Láctea.

Galactorreia assim, igual eu tenho,

não nos mamilos, mas nas pontas de meus dedos

e o leite jorra em forma de sonetos!

E nesta confissão, agora eu venho

partilhar bisonhamente meus segredos,

que hoje me traem, por serem indiscretos!

GLADIADORES I – 27 abr 07

Conversa com ti mesma... Segue a alma

por seus meandros que não têm repouso.

Analisa os pensamentos que têm pouso

sobre a consciente aceitação da calma.

Pois tens desejos que nem sequer são teus.

Até parecem, por serem costumeiros:

noite após noite os escutas, derradeiros...

E, na alvorada, ao sol rasgar seus véus,

estão de volta. Mas são alheios predicados

que não pertencem à tua mente mais profunda

e se, para atingi-los, te esforçares,

algo te faltará. São resultados

de raciocínio estranho, que te inunda,

e se desfazem no momento em que os tocares.

GLADIADORES II – 20 AGO 15

Alguns afirmam ter vida o pensamento,

passeando por aí, com a intenção

de penetrar em tua mente e coração

e desse modo afetar teu julgamento.

Se é verdade, só com teu consentimento

dominar os teus pendores poderão;

vem pelos ares, ardilosos, em que estão

ou pelas telas de TV em tal momento.

São as “mimas”, da imitação as unidades

que ouves das amigas, quando a moda

se impõe, para forçar-te a mais despesas,

os costumes, nessa “feira de vaidades”

modificando, pois “a moda não incomoda”,

por mais te possa induzir a mil vilezas!

GLADIADORES III

Examina, portanto, os que são teus

e não aqueles que de fora te impuseram

ou que nas redes sociais te apareceram,

a noosfera dos modernos fariseus!

Também te envio pensamentos que são meus,

que por teus olhos, talvez, já penetraram,

quando meus versos em tua alma se encontraram,

mas não transmito tais ideias dos ateus!...

Abertamente eu transmito minhas mensagens

que a ti mesma poderão fortalecer,

nessa contemplação do que já és!...

Gladiadores, por certo, e das miragens

dentro da mente bem te podem defender

pela razão, contra essas falsas fés!...

GLADIADORES IV

Mas não te deixes por mim influenciar,

embora aqui te revele meu segredo:

talvez os tenha deflagrado por meu medo,

mas te pertencem os que sabes apreciar!

Minha intenção é só servir fino manjar

que fortaleça tuas defesas, não por credo,

mas por força da razão, escudo ledo:

gladiadores nessa arena a pelejar!

Contra as ideias com que buscam te “emprenhar

pelos ouvidos”, como diz velho ditado;

falsas amigas, não mais do que embusteiras,

que só buscam de algum modo te explorar

e com tua queda alimentar o seu pecado,

que então destrói mesmo as almas verdadeiras!

ESTRATÉGIAS SIBILINAS I – 28 abr 07

O vento que revolve teus cabelos

não é o vento que faz flutuar teus dedos,

que te sibila ao ouvido teus segredos,

sem serem teus, de fato, tais desvelos.

Porque esses sonhos que ora julgas tê-los,

são nada mais do que mimas, pelos ventos... (*)

E os cantos que te expressam sentimentos

melhor te fora soubesses esquecê-los...

Todavia, sempre existe a recompensa;

É como se, ao saberes expressá-los,

os teus fantasmas te abrissem os caminhos.

Para que possas, nessa trama densa,

continuar, de bom grado, a escutá-los,

sem te prenderes aos sonhos mais mesquinhos.

(*) Mimas são unidades de imitação, o que se vê ou escuta com

frequência e se acaba por repetir.

ESTRATÉGIAS SIBILINAS II – 21 AGO 15

Eram as Sibilas as adivinhas dos romanos,

mais herbanárias, de fato, e curandeiras

do que fossem realmente feiticeiras

ou profetizas desvendando cem arcanos.

Foi a Sibila de Cumas, sem enganos,

a mais famosa dessas enredadeiras

e com suas profecias embusteiras

mais que ajudá-los, só lhes causou danos!

Tais quais as Pitonisas dos helenos,

frases confusas somente murmuravam,

na dependência de sua interpretação,

que não traziam significados plenos,

dependendo de quais as estudavam,

frequentemente para final lamentação!

ESTRATÉGIAS SIBILINAS III

E com tão desfavoráveis resultados,

(que o Cristianismo logo as condenou)

“sibilino” em adjetivo se tornou,

motivos a mostrar desencontrados

e muitas vezes mal intencionados,

significado que já se coagulou,

estratégia que frequente transformou

o mundo inteiro por atos bem malvados.

Partes da mente te sussurram estratégias

com que podes os adversos enfrentar,

enquanto outras bem astutamente

a prometer-te recompensas régias...

Mas vêm de fora para te derrotar,

em fantasia de pureza, certamente...

ESTRATÉGIAS SIBILINAS IV

Por isso, cuida bem se isso que pensas

vem de teu próprio interesse, realmente,

ou vem do externo, malignamente,

a te assombrar com intenções bem tensas.

E mesmo ideias com as quais te incensas,

se não brotarem de tua própria mente,

buscam teu mal e conseguem-no, frequente:

peneira-as bem e vê o que dispensas!...

É bem mais fácil aceitar passivamente

o que a sibila te sussurra em artifício,

que algumas vezes agradável te parece,

bem mais difícil o expulsar perpetuamente,

pela delícia contumaz de qualquer vício

a que te rendas, mas que apenas te enfraquece!

REGRAS DA VIDA XXXI

Acima de tudo, importa a dignidade

em tudo conservar. Não a honraria

que este mundo confira, mas a que pertencia,

desde o começo, à tua personalidade,

que geraste em ti mesmo. É em tal combate

que a tua autoestima sobrevive

e o respeito por ti mesmo em ti revive,

a cada passo que a solidez acate.

Pois se mostrares a ti mesmo tal respeito

logo perceberão. E a contragosto,

ou de bom grado – respeitarão também

a tua integridade. E não serás sujeito

a perder o controle por ti imposto,

no decoro e decência que em ti veem.

SORRINDO PARA MIM I –28 ABR 2007

Aquele que mais busca uma atenção

não é quem mais recebe. Existe alguém,

que somente por ser, ganha também

o respeito e a simpatia em cada ação

que material pratica, porque tem

plena consciência de sua projeção

e não se esforça em produzir clarão

mas ilumina ao seu redor, tal quem

possui no próprio olhar magnetismo,

confia em si e espera, no que faz,

sempre fazer melhor quanto possível.

E não se esforça por quebrar o ceticismo,

mas, simplesmente, o seu dever perfaz,

sem lamentar o que é inatingível.

SORRINDO PARA MIM II – 22 ago 15

Mas é bem raro que o mereça assim

quem é mais louvado pela sociedade;

há interesses ocultos, na verdade,

os quais se impõem como um toque de clarim.

E por serem reiterados, têm seu fim

aceito, nesse impulso da vaidade,

que procura alcançar, em saciedade,

igual respeito e aceitação, enfim!,,,

Sempre é melhor sorrisos se enxergar

que rostos a expressar má catadura:

poucos suportam tal reprovação,

falsos ídolos facilmente a aceitar,

seja no esporte ou na literatura,

buscando em seu rebanho a proteção!

SORRINDO PARA MIM III

Assim as mídia se aproveitam mais, (*)

de tantos meios à sua disposição,

a fim de impor pela repetição

um artista ou seus produtos materiais.

(*) Mídia é um anglicismo, plural do inglês medium,

ou meio de comunicação, tomado do latim, medium,

media e deve ser, portanto, também plural entre nós.

Na moda feminina os principais

dos estilistas embusteiros que aí estão,

criando modas através da negação

do estético em seus ridículos fatais...

No efetivar total do consumismo,

provocando, afinal, somente gasto

e de suas bolsas a locupletação,

mesmo costumes mudando em seu modismo:

e as ovelhas seguem, mastigando o pasto,

não que concordem, mas por pura imitação!...

SORRINDO PARA MIM IV

Quanto a mim, sempre fui indiferente

á derrota e ao triunfo, acompanhando

os conselhos que Kipling vem mostrando (*)

há mais de século, em seu soar contente.

(*) Veja o famoso poema de Rudyard Kipling, SE (If).

Mesmo que o desaponto, bem frequente,

se insinue, em seu furor nefando,

na minha própria mente, desgastando

as minhas defesas, com veneno tão potente!

Porém conservo minha autenticidade:

sou o que sou e o mundo que se dane,

se não quiser aceitar a minha mensagem,

que nem mensagem é, só minha verdade,

sem que insista com outrem que a proclame,

embora saiba vivenciá-la com coragem!

REDATOR – 29 ABR 07

Eu quis poder, da vida a meio e ao longo,

acreditar no que canto e no que prego.

E me disponho, feito um tolo cego

a redigir, no compassado gongo

que assinala minha vida, nesse bongo

tão ritmado, em que poemas lego,

o que me vem à mente e nisso entrego,

pedaços de meu ser, nesse regongo,

inútil estrugir de alheias mágoas,

que eu mesmo não as tenho. Indiferente

muitas vezes me percebo ante essas fráguas,

que até parecem de tão fundo me subir...

Mas tão somente escrevo, diligente,

o que em meus dedos se desfaz... a reluzir.

NO OLHO DO SOL I – 23 AGO 15

Tal qual o Semeador, saí a semear

as minhas palavras, igual que clara fonte,

brotando da nascente, pura ponte

entre o vasto subsolo e o paisagear;

as minhas palavras em sonetos a mostrar,

a sua vasta multidão neste reponte,

feitas em versos mil que mal se conte,

fluindo sempre, crescendo sem parar;

mas muitos passam sem ver o meu regato;

gotas somente a respingar na boa terra,

que frutificam nos mais meigos corações

ou se escondem das mentes, em recato,

desses que temem mostrar o que se encerra

no incessante turbilhar das emoções!

NO OLHO DO SOL II

Há muitos anos digito os meus poemas

e certamente alguns já tens contigo;

atravessaram da rede algum perigo,

mas corações assaltaram às centenas;

muitos mais houve, porém, em graves penas,

que nunca leram meu trabalho antigo

ou quando o leram, não lhe deram seu abrigo:

não eram para eles tais verbenas...

Igual que o Semeador, na boa terra,

caem apenas muito poucos grãos;

muitos secaram sob a luz do sol,

porque a palavra guarda em si o quanto encerra,

até ser fecundada, em compaixões,

por um olhar que a ilumine qual farol.

NO OLHO DO SOL III

Pois que já disse e vou somente repetir:

não são meus os poemas que te escrevo;

são um arcabouço frágil que te levo

e cabe a ti fazê-lo ressurgir...

A semente hás de tirar do seu dormir,

com tuas emoções, em vasto frevo;

só te darei as pistas que te devo,

mas o caminho tu mesmo irás abrir...

Toda mensagem em teu peito alastra

e lhe dás tua carne e sangue a revestir;

dás-lhe carinho, dás-lhe sentimento

e o que escrevi só te serve de pilastra

para esse templo que hás de construir,

fiel e sacerdote em um só momento.

NAVEGADOR I – 24 AGO 15

Sob a areia da praia, em seu reverso,

estão miríades de pequenas vidas;

perante os pés humanos são vencidas,

mas constituem seu próprio universo.

Sob as ondas do mar escorre o verso,

tantas loucuras sobre as vagas tidas,

mas barreiras se abrem, incontidas,

e escorre a frase em seu fragor disperso.

Nem tudo o que reluz na praia é areia:

há cacos de vidrilho, bolha e espuma,

olhos minúsculos sob a planta de teus pés;

recolhe a concha o raio que a incendeia

e reflete em madréporas, uma a uma,

centelhas tristes das mais antigas fés.

NAVEGADOR II

Para cada naufrágio, algum destroço

sobrenada e flutua na voragem;

talvez um mastro com resto de cordagem,

talvez um náufrago, desfeito em pele e osso;

talvez quase invisível no retoço

das vagas, em capelos de miragem,

algo que dance, garrafa de mensagem,

algo perdido nesse imenso poço;

porém um maremoto, um cataclisma

pode arrancar da vaza até um anel,

seu dedo há longos anos devorado

por seu cálcio e carbono, a longa cisma

das novas vidas, rejeitando o ouropel,

seu nutriente apenas apreciado...

NAVEGADOR III

Certamente esse anel não sobrenada,

mas pode ser engolido, simplesmente,

por crustáceo ou tubarão, que vorazmente

tudo devora em sua vida atribulada,

na qual não pode descansar por nada,

porém nadar precisa sempre à frente,

as suas brânquias acionadas totalmente

por movimentos, igual que alma penada...

E quando o elasmobrânquio se aproxima

das águas próximas de algum continente,

será alvo de pistola ou agudo arpão,

sua carne e ossos retirados nesse clima

e para dedo surpreendido se apresente

o pobre anel que deglutira sem razão!...

NAVEGADOR IV

Já o mais comum são apenas fragmentos

dessas velhas cidades detonados,

que não são pelas amêijoas devorados (*)

e entre teus dedos possam ter assentos;

(*) Pequenos moluscos bivalves comuns nas praias.

a maré os revolveu, em movimentos

pelas dunas, no final, localizados,

de sua matéria orgânica separados

por muitos seres, famintos como ventos...

E apesar de toda a sua presença

e dos corpos sobre a areia reclinados,

os vestígios humanos não perduram;

micro-organismos, em peleja tensa,

tuas células e emunctórios assimilados

durante a noite, enquanto a praia curam...

alfajores I – 25 ago 15

um dia a amei, desesperadamente.

a ponto de esquecer de tudo o mais,

sentia os dias como dons fatais,

a cada vez que dela estava ausente.

quanto fazia me era deprimente,

quando pensava que, talvez, jamais

voltasse a vê-la, antinaturais

as minhas relações com toda a gente.

assim, tudo deixei por amor dela,

sem sopesar a nódoa ou consequência:

queria apenas beijar-lhe o rosto amigo;

por mais que tola fosse, foi singela

a decisão que tomei; tinha inocência:

fiquei com ela a despeito do perigo!...

alfajores II

tudo na vida tem um preço, realmente;

assim a alimentação que é conseguida

e se destina a nos manter com vida,

foi da terra arrancada, em esforço ardente;

caso prefiras esse alimento deprimente

que causa a morte de vítima sofrida,

foi batizado por tal morte em acolhida:

preço de sangue cobrado ao pobre ente.

bem raramente podes de graça te manter

e é bem melhor pagar por refeição

do que ficares a alguém algo dever,

que cedo ou tarde, te saberá cobrar,

senão em prata, a preço de emoção,

muito mais caro do que um simples financiar!

alfajores III

e nada nesta vida tem mais preço

que um momento de amor só para dois,

que o pagamento há de chegar depois,

sempre encontrando de ti o endereço...

felicidade de amor só traz apreço

para quem a usufruir, que ao redor, pois,

sempre há aqueles que em tristeza róis,

seu próprio amor quebrado como gesso.

e cedo ou tarde, também tu te cobrarás

por tais momentos de tua felicidade;

nada na vida traz haver gratuito

e o pagarás com tristeza ou incompreensão,

que todo amor tem momentos de impiedade,

a te ferir com um aguilhão fortuito!

alfajores IV

e se tudo abandonei, por amor dela,

são alfajores os momentos de prazer:

mastigas, comes, para enfim nada mais ter

e da delícia só a lembrança se encastela...

sempre algum preço cobrará esta procela

que crismaste de amor no teu viver;

nada perdura, exceto o esquecer

e a esperança é, afinal, casta donzela!

passados tempos, os aljôfares da vida

deixaram de ser doces, mas azedos:

pequenas rixas, em ressaibo encaminhadas!

e a alternativa é a memória esvanecida

de outros amores lançados em degredos,

visões tardias não mais do que esboçadas!

VIRADA DO SÉCULO I – 26 AGO 15

O tempo humano é só convencional:

nós o medimos arbitrariamente;

há dia e noite, em caráter permanente,

mas a semana já é pouco natural

e mais ainda o mês, vago caudal,

que não atende ao Sol, nem finalmente

às fases da Lua obedecendo lealmente;

também varia dos dias seu total

e nessa convenção, períodos planos

nos atormentam somente no final;

não cabe aos astros governar o nosso ser;

por mais tempo a chorar seres humanos,

ao pôr do sol, melancolia fatal,

enquanto as flores choram de prazer.

VIRADA DO SÉCULO II

Nós dependemos do chamado Gregoriano

Calendário, que tantos dias podou

e ao curso do Sol mais se adequou,

substituindo o anterior, Juliano,

que antigamente, bem mais largo engano

havia enfrentado, pois dois meses se cortou;

na fundação de Roma se baseou,

calculada por escribas com afano.

Mas quando se adotou o Cristianismo,

um diferente calcular foi empregado:

partiu do ano em que Jesus havia nascido,

na rejeição feroz do paganismo,

secretamente por muitos conservado;

mas certo número de anos foi perdido!

VIRADA DO SÉCULO III

São quatro a seis a menos ou a mais!

Não admira que outros povos rejeitassem

e seus próprios preconceitos conservassem,

sem que, de fato, aceitassem-no jamais,

pois zomba o ano de nós, em naturais

oscilações do Sol, que assim passassem

e os movimentos da Galáxia imitassem,

sem se importar com histórias dos mortais

e quando surgem tais milenarismos

de fim de mundo ou as vãs festividades

da virada de um século em afoite,

do Ano Velho e do Novo nos modismos,

riem os anos de tais futilidades,

como se um século passasse numa noite!