Ave presa no ninho

I

Posso o mundo eu conquistar daqui,

Vendo estrelas d’um ninho seguro?

Há uma luz no céu a me iludir,

Faze-me crer na glória do futuro.

Mas cá estou, já velha, já vivi

Sem mesmo voar e sair do escuro.

Nada conquistei, nada conheci.

Segurança vã, mas no peito um furo.

Falta-me coragem pra subir ao céu.

Falta-me entrega pra provar do mel.

Talvez, provável, falta-me razão.

Pois não aceito o ninho que habito.

Quero sempre mais, mas sempre hesito.

Quero voar, mas sem sair do chão.

II

Pude o mundo eu conquistar daqui

Sem ir às estrelas, sem ver tal mundo.

A luz do céu é só pra iludir

Aquele sem brilho de si oriundo.

Estou velha, sim, mas revivi.

Passei eu por sofrimento profundo.

A dor conquistei, amadureci.

Eu me tornei solo de amor fecundo.

Faltou compaixão pra querer o céu.

Faltou-me altruísmo pra ansiar o mel.

Talvez, provável, faltou-me emoção.

Não reconheci o ninho que eu morava.

Eu quis mais, e com isso eu renegava

Quem me dava por total o coração.

Anne Negreiros
Enviado por Anne Negreiros em 15/02/2019
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