Dantas

Dantas era um ébrio inofensivo. Vivia da caridade pública, perambulando pelas ruas de Carolina Maranhão, dialogando com seus fantasmas. Usava uma única camisa de listas pretas e outras muito mais pretas ainda e se não fora um escudo com uma estrela, ninguém saberia que um dia aqueles trampos teriam sido uma camisa do Botafogo do Rio de Janeiro.

Um dia, aproximei-me dele com a desculpa de pedir uma informação e fiquei surpreso. O álcool não lhe corroera de todo o raciocínio. No seu desvario usava, ora por outra, palavras de pouco uso, o que demonstrava claramente sua familiaridade com a Língua. Depois fiquei sabendo que já fora um jornalista de grande credibilidade, que atuara nos principais periódicos de São Luís e Goiás. Certamente tivera família e vivia agora abandonado por todos.

Dantas

Ia tangido de esquina após esquina,

Por temporal singrar sem rota certa,

Exímio jornalista e até poeta,

Fizera então do álcool vitamina.

Possivelmente, amara a Messalina,

Que fora deusa ou musa predileta,

Levou-o a desviar da vida asceta,

Por outra que o bom senso recrimina.

Não sendo, embora, regras conhecidas,

Muitos de nós têm dores recolhidas,

Por algum desencontro do passado.

A sina nos levando pro sepulcro,

Com tudo o que rodou fora do fulcro

E ainda nos mantém angustiado.

Um Piauiense Armengador de Versos
Enviado por Um Piauiense Armengador de Versos em 27/12/2019
Reeditado em 25/01/2023
Código do texto: T6828298
Classificação de conteúdo: seguro