LICANTROPO

CAPÍTULO I – NO COMEÇO SÓ FILHAS

Com muito esforço, fez-me um homem feliz o destino.

Criar uma família numerosa, só com Deus no comando.

Criamos oito belos filhos: sete meninas e um menino.

Sem minha esposa, o júbilo não estaria me apossando.

Minha mulher é muito linda, compreensiva e guerreira.

O meu sonho mesmo era ser pai de um belo hominho.

Todavia foi uma menina que nasceu, a criança primeira.

Eu fiquei apenas alegre em ser pai daquele ser novinho.

Na segunda gestação, eu e minha esposa sonhamos igual.

Desejamos com bastante ardor ser pais de um garoto.

Assim fecharíamos a fábrica, já que teríamos um casal.

A filha lá na frente seria da mãe a melhor companhia.

O filho, meu melhor comparsa. O sonho foi pro esgoto.

Novamente uma outra bonita filhinha a vida me daria.

CAPÍTULO II – UMA LUZ DE ESPERANÇA

Na sétima gravidez, eu e minha esposa jogamos a toalha.

Independente do sexo, esse será o nosso último bebê.

Com seis filhas, se vier outra, será bem-vinda, detalha.

Contudo, se nascer um homenzinho, vai ser aquele auê.

Uma amiga me falou de uma simpatia como conselho.

Vindo outra menina, por nela o nome de Nossa Senhora.

É batata! A próxima criança que nascer será um fedelho.

Tal crendice me encheu de esperança que se não for agora...

A minha sétima filha nasceu. Nenhuma dúvida me restou.

Coloquei o nome da mãe de Deus, consoante a superstição.

Disse o porquê à minha esposa que com descrença me olhou.

Sabendo que eu sou cabeça-dura um pensamento lhe vem:

Mesmo falando que seria a última cria, o pacto fora em vão.

O marido suplicará, cederei, e no ano seguinte mais um neném.

CAPÍTULO III – A SIMPATIA DEU CERTO

Que alegria imensa! Meu filho tão sonhado, nasceu.

A minha esposa agora não precisará mais dar à luz.

Definitivamente podemos fechar a fábrica, já deu.

Veio saudável e receberá o meu nome, como supus.

Todos que foram visitá-lo disseram ser a minha cara.

Ao ouvir isso, eu não me caibo de contentamento.

Um irmãozinho... em cada rosto das irmãs escancara

Um certo ar de surpresa e um olhar amoroso e atento.

Pai, vamos ajudar a mamãe criar nosso irmãozinho.

Pode trabalhar sossegado. A ele agente compartilha

Tudo o que o senhor nos dá: amor, proteção e carinho.

Que o Nosso Deus me dê muita força, saúde e trabalho

Para que possa cuidar com dignidade da minha família

sem faltar nada à minha esposa, as filhas e meu pirralho.

CAPÍTULO IV – PÚBERE COM PROBLEMA DE SAÚDE

Meu filho começou a apresentar problemas de saúde.

Foi entrar na adolescência que isso passou acontecer.

Na fase infantil era saudável pelo que observar pude.

Ia ao pediatra só pra consultas de rotina sem nada ter.

Hoje, ele anda com os olhos bastante avermelhados,

Parecendo estar com uma conjuntivite constante.

Fora uma anemia crônica que nos deixa preocupados

Porque a medicina não tem resposta neste instante.

Exames e mais exames foram pedidos e não dá nada.

Os olhos dele continuam vermelhos e a anemia, credo,

Tomou conta daquele corpo numa possessão danada!

Um poema do romantismo nos diz que viver é lutar.

O autor desse poema é Gonçalves Dias já antecedo.

Com muita fé e resiliência vamos esse mal enfrentar.

CAPÍTULO V – ANIVERSÁRIO DO MEU FILHO

Hoje é aniversário do meu filho muito amado.

Ele faz treze anos de idade. Virou um rapazinho.

Ele terá uma bela festa preparada com cuidado

Pelas irmãs, chancelada por um recíproco carinho.

Os convidados são pessoas íntimas e/ou da família.

Como podem ver foi um grupo para lá de seleto.

Apesar disso há gente que conosco compartilha

Comentário sobre meu filho, digamos, nada discreto.

Acharam que as orelhas dele estavam bem crescidas

E que o corpo, pela sua idade, estava muito peludo.

Ouvimos verdades, mas não queríamos tê-las ouvidas.

A medicina continuava ainda sem nenhuma resposta.

O que fazer? Olha que nós fizemos e tentamos de tudo.

Para curar meu filho aceito mesmo qualquer proposta!

CAPÍTULO VI – ABERRAÇÃO

O dia após ao aniversário do meu filho era uma sexta-feira.

No céu escuro estampado de estrelas reinava a lua cheia.

Por volta da meia-noite, a rotina lá de casa virou poeira.

Aconteceu algo tão assustador que até hoje nos chateia.

Não tivemos medo, já que o responsável é o nosso menino.

Do quarto do meu rapazinho se ouvia altos gritos e gemidos.

Quando abri a porta ele passou por mim em total desatino.

Seu aspecto não humano, deixou-nos plenamente aturdidos.

As mulheres lá de casa queriam gritar, mas o grito não saia.

Queriam rezar, mas o pavor, escondera-lhes todas as orações.

Amparar minha esposa e as filhas? O que você no lugar faria?

Optei por ir atrás do meu garoto. O que vi deixou-me boquiaberto.

Ele foi para uma encruzilhada e passou a uivar em altas vibrações.

Uivar para quem? Para lua cheia! Fugiu de vez ao me ver por perto.

CAPÍTULO VII – QUEM PODERÁ NOS SOCORRER?

Voltei para casa e encontro minhas guerreiras do jeito que saí.

Elas continuavam chorando por não compreender tudo aquilo.

Por que tal coisa foi acontecer com o nosso filho único? Diz-me aí!

Não me deixe sem resposta, Marido! O que será do nosso pupilo?

Não sabendo o que responder, ele abraça a esposa e chora junto.

O triste casal pegas as filhas menores. Colocam-nas no colo.

As já moças abraçam o casal e choram também em conjunto.

Engolindo choro e secando suas lágrimas, o homem sem rolo

Diz a esposa e as filhas que o chororô não resolverá o problema.

Se nós não temos as respostas conosco, vamos encontrá-las.

Nós não sabemos quem as têm, papai, aí é que está o dilema.

A você, minha filha mais velha, respondo sem nenhuma doidice

Lobisomem é um ser sobrenatural. As respostas, onde achá-las?

Quem entende de assunto místico, religioso e até crendice.

CAPÍTULO VIII – ELES PODEM NOS AJUDAR

Exato, minha filha! Achamos o ponto de partida. Logo, adianto:

Um bruxo ou um mago é quem nos responderá como esotérico.

No campo religioso será um padre, pastor, pai ou mãe de santo.

Em termo de crendice um folclorista ou um ancião quimérico.

Minhas filhas crianças vão passar o dia com a vovó materna.

Minhas filhas moças, mamãe e eu vamos atrás desses cidadãos.

Á noite, pego as meninas na vovó e nos achados a gente aderna

Em busca daquilo que for o mais coerente que tivermos em mãos.

Infelizmente, o irmão de vocês não retornará para cá tão cedo.

O amor que todos nós demos a ele, creio que mais alto falará.

Enquanto tiver como besta em nos machucar ele terá medo.

É quase madrugada. Vamos dormir ou pelo menos tentar.

Quem estiver sem sono, tome um chazinho de maracujá.

Amanhã o dia será puxado e não poderemos fraquejar.

CAPÍTULO IX – AS RESPOSTAS QUE ENCONTRAMOS

Pai, pelo que apuramos, nós encontramos diversas opiniões.

Desde possessão demoníaca ou de um forte espírito sem luz

Até uma crença popular, todas apresentam sofríveis soluções.

Pela crendice, meu irmão é um lobisomem pelo que eu supus.

Por ser o oitavo filho homem após a sequência de nascimento

De sete irmãs, o bebê macho ao fazer os treze anos de idade

Virará no horrível ser, nas noites de lua cheia no firmamento.

Não é nenhuma maldição ocasionada por qualquer divindade.

Filha, as soluções para o mal existente são medonhas, se ouvi bem.

O que mais de ruim tem que acontecer com meu filho, Senhor?!

Mãe, calma! Não e só doloroso para você, mas para nós também.

Minha filha número um, continue com a sua sensata explanação.

Para o maninho voltar a ser gente, exigirá um esforço avassalador.

Este hercúleo feito não será, como direi, uma definitiva solução.

CAPÍTULO X - SUPLÍCIO

Para o bem de seus filhos, os pais se sujeitam a qualquer sacrifício.

Fale logo, minha filha, qual será o meu martírio de agora pra frente.

Há pessoas que afirmam ter um único paliativo para esse suplício.

Toda noite de lua cheia no céu de sexta-feira não será diferente.

A pessoa portadora da triste sina se irá para uma encruzilhada,

Uivará para lua e se transformará naquele terrível ser inumano.

Isso acontecendo, pegue o monstro e na mesma noite enluarada

Passe com ele em sete cemitérios distintos. Não findou o plano...

Depois das romarias, volte para encruzilhada onde tudo começou

Deixe a criatura nesse local até que ela retorne sua forma humana.

Assim mantemos sua integridade física e a terceiros o mau evitou.

Belo Horizonte tem seis cemitérios: da Paz, do Bonfim, da Saudade,

Bosque da Esperança, da Saudade e Parque da Colina. Que sacana!

Precisamos de sete cemitérios para assumir essa responsabilidade!

CAPÍTULO XI – A BALA DE PRATA

Sem de passar com o lobisomem nos cemitérios, tem outra saída?

Como lenitivo não. Há uma solução a esse estorvo em definitivo,

Mas ela é cruel. Sabem o Por quê? O lobisomem perderá a vida.

Alguém quer que meu irmão, que é esta criatura, não esteja vivo?

Todos presentes foram uníssonos em responder com um forte não.

O pai insiste na pergunta: um lobisomem, filha, como se mata?

Se um excelente atirador atingir certeiro o lobisomem no coração.

Não com bala comum. Mata-se o maldito com bala feita de prata.

Caramba! Então o algoz da fera tem que ser um atirador de elite.

Um atirador comum não terá sucesso, mesmo tendo sangue frio.

Também acredito nisso, papai, por mais que esse atirador exercite.

h! Bruxas e outros monstros idem. São mortos com essa munição.

Nós não somos assassinos, ainda mais de seres do mundo sombrio!

Filhas e marido! Esqueçamos tal escolha deferindo nossa votação.

CAPÍTULO XII – “BOA NOITE CINDERELA”

O lobisomem ao ser pai, serão lobisomens também os filhos dele?

Não sei, mãe. Ser lobisomem não é um problema genético, mas....

O problema do nosso filho em ser pai, querida, agora cancele.

Temos que pensar só em nosso filho e seu infortúnio contumaz.

A próxima semana será mais uma maldita sexta-feira de lua cheia.

Se o nosso filho estiver conosco, como farei a funesta peregrinação

Com ele já transformado em lobisomem à necrópole sem peleia?

Terei êxito se ele estiver desmaiado ou dormindo. Como então?

Querido, o nosso filho ao voltar, que isso em breve vai acontecer,

Sentaremos todos com ele e teremos uma conversa longa e franca.

Ele aceitará que, antes de virar bicho, um forte sonífero irá beber.

Na hora que a lua o chamar, o nosso filho irá para um cruzamento.

Lá a droga fará efeito e assim a vicissitude má o remédio tranca.

Com ele desmaiado, vamos aos cemitérios para seu livramento.

CAPÍTULO XIII – O FILHO VOLTOU

O filho volta para casa com baixa estima além de muita tristeza.

Mãe, ajuda-me! Alguma coisa ruim aconteceu com seu único filho.

Não sei e nem lembro o que é. Só sei que me causou estranheza

De estar nu em um cruzamento sendo advertido por um andarilho.

Estava com a boca sangrenta sem ter ferida ou quebrado dente.

Pude ver arranhões nas minhas pernas e surgiram assim do nada.

Entrei num terreno baldio, roubei a roupa de quem vi pela frente.

Voltei lote baldio. Lá fiquei até agora, com minha alma apavorada.

Ao ouvir a voz do jovem, pai e filhas vão até ele com alijamento.

Gota de alegria é derramada na família vítima do medo malsão

Filho, não fuja! Sua família o ajudará neste terrível acontecimento.

Eu, seu pai, suas irmãs e sua mãe lhe contaremos toda a verdade.

Para atenuar esse mal em nossas vidas só com sua colaboração.

Talvez um dia acharemos uma cura a essa demoníaca enfermidade.

CAPÍTULO XIV – PRIMEIRO EMBATE

Sexta-feira de lua cheia da semana seguinte chegou. Vamos à luta.

Meu filho pouco antes de virar lobisomem toma o entorpecente.

A dose ingerida é cavalar. Se não for desse jeito, teríamos disputa.

Mal uivou à lua, já foi direto para o chão, minha cria adolescente.

Eu, a esposa e três filhas custamos colocar a besta em nosso carro.

Como pesa a odiosa criatura. Com a graça de Deus demos conta.

Beagá tem só seis cemitérios. O sétimo? Desse dilema desgarro,

Indo ao cemitério de cidade vizinha. Esse aperto não mais afronta.

Gastamos quase a madrugada toda para cumprir nossa missão.

Foi muito cansativo, porém nosso filho não fez nenhuma vítima.

Nem correu risco de morte. As razões citadas endossam essa ação.

Devolvendo meu filho à encruzilhada de origem, ele volta ao normal.

Mesmo sonolento nos agracia o apoio nessa causa é tão legítima.

Pomos o filho na cama. Agradecemos a Deus a vitória contra o mal.

CAPÍTULO XV – PESADELO VIVO

As sextas – feiras noturnas de lua cheia é esse pesadelo horrendo.

A avó materna dorme aqui em casa cuidando das netas menores.

Eu, a esposa e as filhas moças saímos às madrugadas protegendo

O único rapaz da casa. Não desejo isso aos nossos inimigos piores.

Os funcionários da noite dos cemitérios já até nos conhecem.

Solidarizam-se ao nosso dilema e ajudam em todas as frentes.

Pedimos segredo, porque se as coisas espantosas nos estarrecem

Só de ouvi-las, imagine sabendo que elas são reais e coexistentes?

O que será de minha família se todos souberem da triste verdade?

Meu filho aguentará viver assim? Sete filhas e nove meses esperei.

Eu não! Minha esposa! Pro menino ter a sina furtada pela maldade.

Temo que o lado de lá (do mal) tomem o meu filho em definitivo.

Até que pessoas matem meu guri por ele ser lobisomem, pensei!

Não é nada fácil viver com os temores com os quais hoje convivo.

CAPÍTULO XVI – BAFÃO

Padre, prepara os seus ouvidos. Tenho um bafão para lhe contar.

É coisa cabeluda, padre, que deixa qualquer um de cabelo em pé.

Secretária, não estamos aqui para o disse me disse e sim trabalhar.

Não é fofoca! Dizem que o diabo tá aqui, em nosso bairro! Ah, é?!

Como você sabe que não é boato ou imaginação das pessoas?

Padre, tem testemunha que gente viu o cão, o tinhoso, o satanás.

Aparentava ser um cachorro enorme. Depois virou gente. Á toas!

Bando de pecadores! Dão cartaz ao demo e deixam Cristo pra trás!

Aposto que você vai falar que o diabo surgiu naquela sexta-feira

De lua cheia em que apareceram animais mortos em quantidade

Enorme, onde a maioria foi dilacerada. Secretária, que besteira!

A polícia investiga o caso. Falar que foi lobisomem é uma furada.

O causador disso tudo é uma fera silvestre e de alta periculosidade,

Ou então é um ser humano com a mente bastante desequilibrada.

CAPÍTULO XVII - DECLARANTE

Secretária, lobisomem não existe. É puro folclore, ou melhor, lenda.

Tal como os deuses mitológicos daqueles povos de antigamente.

Você crê em Plutão? Em Odin? Em Baal? Em Hórus? Compreenda,

Pagão acreditar nessa bobagem, vá lá! Mas católico... é aviltante!

Padre, por favor, converse com o andarilho o mais rápido possível.

Ele ficará em nossa cidade por pouco tempo. Mais dois dias talvez.

O viajante tocou na criatura quando ela virou gente. Que incredível!

A besta, na forma humana, é um ser um adolescente de branca tez.

Com aspecto humano, o lobisomem foi prum terreno e escafedeu.

Meia hora depois surgiram os adoradores ou bruxos do ser do mal.

Pelo desencontro, os servos se entristecem com o que não ocorreu.

Os servos ou bruxos do maligno cinco: quatro mulheres e um varão

O viajante diz que três mulheres eram moças e a outra nada jovial.

O varão também não jovem era o líder. Dava ordem com precisão.

CAPÍTULO XVIII - NÃO É BOATO

Para tirar essa ideia absurda de sua cabeça, chame o viadante.

Vou agora mesmo, padre. Tomara que ele possa vir comigo.

Sem problema, caso o andarilho não puder vir neste instante.

Estarei aqui até ás dezoito horas. Ele virá, padre, eu predigo.

Sua bênção, padre! Vim atendê-lo o mais rápido que pude.

Deus o abençoe! Quero que confirme ou desminta o seguinte.

Há um convercê danado na comunidade rolando bem amiúde.

Se for mesmo verdade, para nós cristãos, será um tremendo acinte.

Chamei-o aqui porque a minha secretária insistiu com veemência.

Ela garante ser verdade os boatos que estão correndo soltos por aí.

E vai além. Ela diz que você é a testemunha cabal dessa existência.

Consoante o mexerico, Lucífer enviou-nos uma de suas criaturas.

A secretária e a população estão certas. Digo isso, pois não só vi,

mas também toquei nele. Temi depois ficar com sequelas impuras.

CAPÍTULO XIX – OPERAÇÃO SÃO TOMÉ

Mesmo você chancelando a fala da secretária, continuo cético.

Darei uma de São Tomé, ou seja, terei que ver para acreditar.

Viajante, leva-me ao local onde aparece o terrível ser maléfico.

Não querendo ir comigo, não o condeno, mas me diga o lugar.

Só fui lá uma vez. Depois do ocorrido, não voltei mais por medo.

Agora, tendo a companhia do senhor, posso voltar lá sim, padre.

Por volta de vinte duas horas para a casa paroquial me enveredo.

Pego o senhor e vamos. Quando ouvirmos que um cão ladre

E em seguida vários cachorros latindo é sinal de que ele está perto.

Os cães pararão de latir. Ouvir-se-á um uivo longo, fino e pungente.

O fim do uivo significa que o ser humano virou na fera, por certo.

Observou. Tudo acontecendo como lhe falei. Meia-noite em ponto.

Olhe lá o rapaz sem rumo aparecendo. Opa! Deu-se algo diferente!

Mal uivou para a lua cheia, bebeu um troço. Eis aí besta, pronto.

CAPÍTULO XX – EM FLAGRANTE

Oh! A criatura ruim tombou! Seus adoradores o estão recolhendo.

A última vez em que eu estive aqui, padre, nada disso acontecera.

Não posso ver ficar passivo diante de tudo isso que acontecendo.

Sou o representante de Cristo aqui na terra; o padre pondera.

Quer ir embora, pode ir. Já fez sua parte. Obrigado. Ore por mim.

Vocês aí! Parem! Peço em nome do Nosso Senhor Jesus Cristo!

Padre, não se aproxime! Rogo-lhe! Livra-se de ver algo tão ruim.

“As portas do inferno não prevalecerão. ” Jesus afirmou-nos isto!

Não somos seguidores do diabo. Imploramos-lhe: não aproxime!

Não praticamos o mal. Deixa-nos viver o nosso implacável martírio.

Se não pertencem ao mal, então, minha presença não a recrimine.

Padre, não nos amaldiçoe! Às sextas de lua cheia é o nosso inferno!

De frente para o grupo, vê o lobisomem. Meu Deus! Não é delírio!

A besta é meu filho, padre, o qual o senhor olhou sem o olhar terno.

CAPÍTULO XXI - SINOPSE

Eu e minha família temos uma peregrinação fúnebre para fazer.

Se não a fizermos, padre, o meu filho não voltará a ser humano.

Rodar sete cemitérios e voltar para cá. É assim que tem que ser.

Todas as sextas de lua cheia temos que salvar nosso filho inumano.

Antes de virar lobisomem ele toma um sonífero bastante forte.

Debilitado, colocamo-lo no carro para cumprirmos toda jornada.

Adormecido, ele não atacará ninguém, tampouco semeará a morte.

Após as vagueações, devolvemo-lo ao local da mutação iniciada.

No adeus da madrugada vamos para casa exaustos, mas aliviados.

O rapazinho voltou a ser gente e o mal nele não ganhou amplitude.

Como São Paulo fizemos o bom combate e não fomos derrotados.

Até agora nós não sabemos se para esse infortúnio há alguma cura.

Meu filho não morará nas trevas. Nosso amor quer a ele beatitude.

Com fé em Deus chegaremos ao nosso intento com muita bravura.

CAPÍTULO XXII - LUCIDEZ

Deus nos livre disso, padre! Tem como evitar toda essa trabalheira

E conter o mal. É alguém acertar o monstro com uma bala de prata

Bem no seu coração. Sem errar. O tiro tem que ser preciso, certeiro.

Se não a situação inverte. Ao invés de matá-lo, é a fera que o mata.

Meu filho aceitou tomar o entorpecente antes de virar aberração.

Assim, protegia-nos de sua sevícia para que pudéssemos ajudá-lo.

Todos nós aqui, somos da mesma família. Eh! Apresenta-me então!

Em seguida consinta que eu vá com vocês. Serei mais um vassalo.

Pode vir sim, padre. Quem sabe Deus o enviou em nosso auxílio.

Como mãe e para o bem da minha família, eu lhe peço segredo.

Se ficarem sabendo de tudo, com certeza, virão matar meu filho.

Mãe, acho que o segredo que me pede, está deixando de sê-lo.

Por ora ninguém veio aqui por estar sobre o domínio do medo.

Logo para ajudar seu o filho, será necessário criar novo modelo.

CAPÍTULO XXIII – EM PRECE

Misericordioso Deus, eu estou vindo de um campo de batalha.

E o que é pior. O inimigo está querendo a alma de um inocente.

A luta é desigual, todavia a vítima nem sonha em jogar a tolha.

O novo cordeiro que o cão deseja não passa de um adolescente.

Quando me ordenei, por ouvir seu chamado, fizera-me o pedido

Que até hoje me disponho a cumpri-lo: as suas ovelhas apascentar.

Agora temos uma que nem desgarrada está e vem um anjo caído,

Infiltra-se no rebanho, para levar uma das nossas sem pestanejar.

Como nós, humanos, somos seres de cabeça dura, corra-se o risco

De mais uma vez deixarmos de cumprir o sexto mandamento

Temendo que o lobisomem lhes tire a vida em seu breu aprisco.

Dê-me uma luz pra livrar o jovem do mal e mantê-lo vivo também.

Tira Senhor através de mim o jovem e a família dele do sofrimento

Confirmando assim a presença do seu reino entre nós. Amém.

CAPÍTULO XXIV – LICANTROPIA

Como afirma o evangelho que acabamos de ouvir, segundo João;

Aquele que ama a Deus e odeia o seu irmão, esse é um mentiroso.

E outro versículo “O que amar a Deus, ame também o seu irmão. ”

Esses dois versículos, hoje, nos darão um conselho muito valioso.

São o vigésimo e o vigésimo primeiro. Eles alicerçarão a homilia.

Existe um boato correndo a boca miúda que deve ser esclarecido.

Temos em nosso bairro um adolescente que sofre de licantropia.

O que é isso? Uma doença psíquica onde o enfermo bem aturdido

Tem a ilusão de ter se transformado em animal, qualquer animal.

Muitos trazem em seu imaginário que virou um cruel lobisomem

Chamam de licantropo o adoentado portador desse psíquico mal.

Licantropia é uma palavra totalmente desconhecida por nós aqui.

Formada por dois radicais grego: Lykos/lobo e antropo/homem.

O nome vem de uma lenda que contarei conforme eu a ouvi.

CAPÍTULO XXV – O REI LICAÃO

Vou só fazer um adendo: a estória que contarei será bem resumida.

Na Grécia antiga, uma região chamada Arcádia, tinha um rei mau.

Mau não, cruel! Antes de ser assim a pessoa dele era bem querida.

Amava muito a Zeus, o deus-mor da mitologia de lá. Até aí, normal.

Com o passar dos tempos, o amor dele começou a sair dos limites.

Licaão passou a ofertar seres humanos, ato que Zeus desaprovou.

Na sua burrice o soberano cria que suas oblações o deixava quites.

Ofertar estrangeiros mortos... A lei da hospitalidade, o rei violou.

A violação foi tanta que Zeus quis ver de perto pra fazer sua justiça.

Desceu a terra e se hospedou no palácio de Licaão como peregrino.

O rei queria matar o novo viajante, mas sua guarda não foi omissa.

Majestade, não mate, nem ofereça o andarilho de suplício a Zeus,

O novo forasteiro é a próprio disfarçado. Ah, é? Não me desatino.

O holocausto para ele, sem um gringo, será um dos servos meus.

CAPÍTULO XXVI – CASTIGO DE ZEUS

Ao receber a iguaria de carne humana, Zeus fica emputecido.

Testemunha in loco a crueldade. Ouve do povo atos reais sacanas

Licaão é penalizado perdendo sua forma humano sem alarido.

O soberano é transformado em lobo com qualidades humanas.

O novo ser que sofreu a zoomorfização é chamado de licantropo.

Não bastasse castigar o rei herege, Zeus destrói o palácio real.

Labaredas de fogo se apossam do castelo da base até o topo.

Nunca mais venha desrespeitar um deus, seu mero mortal!

Fim da estória fieis. Agora pergunto a vocês: o que devemos fazer?

Há um adolescente com transtorno mental chamado de licantropia.

Faremos igual Zeus, castigar e destruir o lar do rapaz? Ou proceder

Consoante o ensinamento de Cristo e deixarmos de ser mentiroso?

Amar a Deus sobre tudo e o próximo como a ti mesmo. Sem fatia!

Fazer a dicotomia e agir como Licaão e se tornar um pecaminoso.

CAPÍTULO XXVII – AGORA COM MEUS BOTÕES

A missa termina. Será que a minha homilia cumpriu meu objetivo

de manter a integridade física e material do rapazote lobisomem?

Como eu posso salvar a alma do púbere? Até agora nada positivo.

Entristeço-me porque as ausências de respostas me consomem.

Uma coisa é certa: o adolescente não tem nenhuma doença mental.

Sei bem o que vi, meus Deus! Ele é vítima de uma cruel maldição.

O que fazer para manter o rapazinho vivo e livre do sobrenatural?

Tomara que o Espírito Santo me ilumine para encontrar a solução.

Na noite de sexta-feira com a lua cheia, sabe qual é o meu medo?

Do jovem se cansar da luta e se render de corpo e alma ao tinhoso.

Não posso permitir isso! O maligno terá que ir para o seu degredo!

Oração, oração e mais oração. São as únicas opções que disponho.

No tempo de Deus e não no meu tudo resolverá. Sou esperançoso.

Creio que o bem será realizado. O pesadelo voltará a ser um sonho.

CAPÍTULO XXVIII - ASSASSINO

Outra vez é sexta-feira de lua cheia. O jovem volta a tétrica rotina.

Vai para a encruzilhada e no primeiro uivo toma o forte barbitúrico.

Os familiares, o padre aguardam a hora certa de agirem na surdina.

O agora lobisomem é derrotado pela droga e vai ao solo telúrico

Ao se aproximarem da fera desmaiada, o padre puxa um trezoitão.

Dispara um tiro. No mesmo instante ele recebe um soco no braço.

Fora dado pelo pai que solta outro, jogando o reverendo no chão.

a arma que caiu no primeiro soco ganha uma companhia. Eu faço

O quê agora, padre dos infernos! Assassino! Anticristo! Traidor!

Pega a arma e aponta pro padre. Vá com meu filho e fique por lá!

Não o mate, marido! Temos a justiça dos homens e a do Criador.

A esposa em prantos continua. Isso não trará nosso filho de volta.

Ele pega o padre pela gola da batina e uma coronhada lhe dá.

O padre desmaia. Há no ar um enorme sentimento de revolta.

CAPÍTULO XXIX – “COMPREENDER QUE SER COMPREENDIDO”

O padre volta do desmaio. Está com as mãos e os pés atados.

As mãos foram amarradas com a camisa do pai do ser bestial.

Para atar as pernas do padre foi usado o cinto. Estão inutilizados

Os tais membros para fuga. Voltou à vida, não é, pároco do mal!

Estou aguardando o cadáver do meu filho voltar à forma humana

Para chamar a polícia para que você apodreça numa fétida prisão.

Confiamos em você, desgraçado! Não sabíamos que era sacana.

Você se diz representante de Jesus aqui na terra. Eu afirmo que não.

Cristo não matou alguém. Nem o capeta que o atentou no deserto.

Quando nos conheceu, nós agradecemos a Deus por tê-lo enviado.

Ficamos muito esperançosos. A salvação do meu filho estaria perto.

Mal sabíamos que veio para tornar nossa esperança em pesadelo.

Em sua oração, pai, São Francisco prefere "amar do que ser amado,

Compreender que ser compreendido". Eis o meu preferido modelo.

CAPÍTULO XXX - EXORCIZADO

De repente a mãe solta a cabeça do lobisomem não chão e grita.

Mexeu! Eu vi! As filhas também confirmam sem nada entender.

A mãe retorna ao filho. Põe a mão no coração dele que palpita.

Meu filho não morreu, meu Deus! Eu sinto o coração dele bater.

Ele está respirando! A minha mão sente o ar sair de suas narinas.

Há um inchaço no seu peito. Passo a mão. O que vem me paralisa.

É a bala que o padre atirou! Não é feita de prata. As Minhas retinas

Me dizem: é bala comum! Por isso meu filho não morreu, analisa.

O pai está distraído com a bala. As filhas estão em pleno alvoroço.

Olhem meninas, o corpo do seu irmão está voltando a ser de gente.

A cara dele não é mais de lobo e sim do seu irmão, um lindo moço.

Os olhos do filho abrem. Mãe, por que não estou no meu quarto?

Que horas são? É noite ainda! Deixei de ser lobisomem de repente?

A única que sei respondo: são três da manhã. As demais descarto.

CAPÍTULO XXXI – COM A PALAVRA O PADRE

Gente! Alguém aí me desamarre! Não serei entregue à policia

Já que não sou assassino e não matei ninguém, pelo contrário.

O pai livra o padre das amarras. Ficar em liberdade, que delícia!

Como você está, meu jovem? Bem, padre. Não é extraordinário?

Nunca mais você se transformará naquela criatura horrenda.

O lobisomem que estava dentro de você para sempre morreu.

Como você, padre, pode nos garantir que resolveu a contenda?

Você usou artefato balístico comum e não a de prata, entendeu?!

Mãe, se eu usasse a bala de prata mataria a besta e o seu filho.

A bala que usei foi banhada por uma vela usada em três missas.

A vela denota o Cristo ressuscitado. Satã depara com seu caudilho.

O lobisomem representa o mal, enquanto que a vela, Jesus, o bem.

“Não tentarás o Senhor teu Deus”. Eis uma das divinas premissas.

Deus não é Deus de mortos e sim de vivos. Para Ele todos vivem”.

CAPÍTULO XXXII – A ORAÇÃO É MINHA FORTALEZA

Padre, como faço para você me perdoar do soco e da coronhada?

Perdoai nossas ofensas, como perdoamos quem nos tem ofendido.

A sábia oração que Jesus nos ensinou diz que não é pra fazer nada.

Por salvar uma ovelha do meu rebanho, tive o meu dever cumprido.

Mesmo assim, peço-lhe desculpas lá do fundo do meu coração.

Deixando bem claro: você está perdoado. Não há nenhum rancor.

Padre, quero lhe oferecer um maravilhoso almoço de retribuição

Por tudo que você fez por nós e ao meu filho. Diga sim, por favor!

Convite aceito, mãe. Irei sim com maior prazer e muito apetite.

Quer me passar o cardápio ou deixará o menu por minha conta?

Deixo para você essa missão, mãe. O que fizer, como. Acredite.

Antes de separar de vocês, eu quero lhes fazer um simples pedido:

Rezem sempre por mim, para que do meu sacerdócio eu dê conta.

Assim, em um novo confronto com o mal, estarei mais fortalecido.

O FILHO DA POETISA

Filho da Poetisa
Enviado por Filho da Poetisa em 30/07/2022
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