O limiar de Lyman

Te quero num chão de estrelas
Nua como a lua
E tão fugaz quanto um cometa...
Te quero numa explosão de gametas
Fundindo na supernova
Que a relatividade prova na sua ciencia imperfeita.

Coberta de éter
E da matéria impura
Vertendo o desejo imaturo;
Seminal como um buraco negro...
 
Dudu Oliveira

 
 
O limiar de Lyman: Dudu Oliveira
 
O EU LÍRICO
 
 
O poeta está diante de duas matrizes e, através de considerações sobre elas, o eu lírico atinge desdobramentos de atração e distanciamento.
 
Ele se dirige à mulher desejada, idealizada como algo que lembre o céu e a terra; o mais alto grau de pureza elimina a ameaça da entrega no nível da maior carnalidade? O que eu perco se me entregar totalmente a ela? Essa é uma das razões pelas quais ele pode deter-se no limiar.
 
Suas considerações também recaem sobre a matriz cósmica. Ela é geradora de vida. Afinal, não estamos nós aqui? Os conceitos são os conceitos da Física Quântica; da questão da conservação da energia. Para que o novo tenha existência, um tipo de energia transforma-se em outro. Algo é sacrificado. Há uma ameaça, uma incógnita. O que virá depois de um buraco negro?
 
Existe ainda o plano do arquétipo feminino. De idêntica forma ao que ocorre no nível cósmico, o feminino, potencialmente gerador de vida, absorve a energia masculina para engendrar um novo ser. O eu lírico questiona sobre o que pode acontecer  no nível psiquico, ao masculino que entrega a sua energia.
 
Também há a musa, a Ânima, através das quais o eu lírico se vê diante da criação hermafrodita. Ele é o gestante completo de sua criação; pai e mãe. Que perigo isso representa para o Ânimus?
 
O texto é muito denso e seria bem simbolizado pela imagem da anã branca que fica “cortejando” seu par, trocando energia com ele, fazendo revoluções ao redor dele.
 
O que o eu lírico nos traz em uma de suas atuações, dentro do enfoque de releitura escolhido, é um questionamento sobre o desejo e sobre a entrega.
 
Limiar, por definição começo, é o [b]quero-te[/b].  Transpor o limiar representa deparar-se com um novo sentido; deixar um modo de sentir para que um novo sentimento comece; abandonar um conceito, para que um outro possa tomar seu lugar.

O eu lírico diz que o desejo existe, mas reflete sobre o que representa transpor o limiar do desejo. E sugere: A maturidade está para o desejo, assim como a perfeição está para a ciência...

Buscando ainda maior abrangência interpretativa, podemos considerar O limiar de Lyman como um símbolo do processo alquímico (a transmutação atravessa quatro fases destilação, combustão aquecimento e evaporação), que se realiza no interior  do próprio poeta. Os elementos que a sua objetividade coleta (o princípio ativo, fixo, masculino) e os aspectos que sua sensibilidade destila (o princípio volátil, passivo, feminino),  entram em ebulição sob a ação das forças criativas dos princípios, que internamente se “casam”. Desse processo, o eu lírico representa uma fase, a da evaporação.  Através do eu lírico, o poeta realiza a Grande Obra. Da conjugação da matéria bruta da realidade factual e dos recursos que a linguagem lhe oferece, amalgamados no cadinho, sob o aquecimento do caldeirão fervente das emoções, maturando até alcançar a depuração, evaporam-se e resultam em Poesia, a sua Obra de Arte.



Nilza A. Hoehne Rigo