A Fidelidade em Tradução Poética
Acabo de ver mais uma das tantas traduções em língua portuguesa do poema Táctica y Estrategia do conterrâneo uruguaio Mário Benedetti.
Confesso que ainda não li nenhuma integralmente correta.
Refiro-me mais precisamente a um verso contido na quarta estrofe e que diz:
"..Y que no nos vendamos simulacros..."
Antes,porém,de tecer comentários acerca do tema,entendo como necessário dá-lo a conhecer àqueles que ainda não o tenham lido.
Ei-lo:
Mi táctica es
mirarte
aprender como sos
quererte como sos
mi táctica es
hablarte
y escucharte
construir con palabras
un puente indestructible
mi táctica es
quedarme en tu recuerdo
no sé cómo ni sé
con qué pretexto
pero quedarme en vos
mi táctica es
ser franco
y saber que sos franca
y que no nos vendamos
simulacros
para que entre los dos
no haya telón
ni abismos
mi estrategia es
en cambio
más profunda y más
simple
mi estrategia es
que un día cualquiera
no sé cómo ni sé
con qué pretexto
por fin me necesites
Pois,dentre outras esdrúxulas traduções da expressão 'vendamos simulacros' ,que tive a oportunidade de ler,hoje encontrei esta: 'vendemos simulados' !
Uma aberração!
Pra começo de conversa, 'vendamos' é forma do verbo 'vendar'(colocar venda,tapar,cobrir os olhos) também utilizado em língua portuguesa e que ,no poema ,aparece conjugado na primeira pessoa do plural-tempo presente.
O substantivo masculino-plural 'simulacros' ,a exemplo do Português,é sinônimo de 'simulações'(mentiras,enganos,falsificações),o que não se assemelha sequer de longe à tradução 'vendemos simulados'(ato de comercializar enganos...(?)).
'Vendamos simulacros',portanto, refere-se ao ato de encobrir ou mascarar uma (ou diversas) realidade(s).
Em minha modesta opinião,o verso em Português ficaria melhor,por fidedigno,transcrito desta forma:
"E que não mascaramos a verdade"
Assim,a meu pensar,se manteria a fidelidade lingüística e metafórica do verso em particular,bem como a integridade semântica do poema em questão.