"Não te amo" - Almeida Garret

“Não te amo” é um poema romântico, e o próprio título realça a idéia de sentimentalismo, de tema amoroso. Aliás, a freqüente repetição de “não te amo” não é mais que uma artimanha para se afirmar o amor. A negação acaba por evidenciar um sentimentalismo repudiado: o amor.

O eu-lírico deixa a inspiração sobrepujar a razão e as tentativas de justificar levam-no a ceder-se a um amor sôfrego, mesmo “aterrorizante”:

E quero-te, e não te amo, que é forçado

De mau feitiço azado

Este indigno furor.

Mas oh! não te amo, não.

E infame sou, porque te quero, e tanto

Que de mim tenho espanto,

De ti medo e terror...

Mas amar!... não te amo, não.

A mulher evocada pelo eu-lírico é comparada a uma aziaga estrela, ou seja, conduz o mal-agouro e deslumbra, hipnotiza, ao mesmo tempo. Isto caracteriza os descompassos, as contradições do Romantismo.

O sentimento amoroso é encarado como algo carnal, transitório, que não chega ao coração, mas que machuca, que devora:

Não te amo, quero-te: o amor é vida

E a vida – nem sentida

A trago eu já comigo.

Ai, não te amo não!

Ai! não te amo, não; e só te quero

De um querer bruto e fero

Que o sangue me devora

Não chega ao coração.

Estruturalmente, verifica-se a liberdade de expressão do Romantismo em que a métrica é diferenciada; não se priorizam os versos de mesmo tamanho, há versos irregulares.

Não te amo, quero-te, o amar vem d’alma

E eu n’alma – tenho a calma.

A calma do jazido

Ai! não te amo não.

O “querer” em oposição ao “amar”, a calma do jazigo, conduz o eu-lírico à dor, à sofreguidão típica dos românticos.