Análise do poema "Tradição", de Ascenso Ferreira

Tradição

Ascenso Ferreira

Terraço da Casa-Grande de manhãzinha,

fartura espetaculosa dos coronéis:

— Ó Zé-estribeiro! Ó Zé-estribeiro!

— Inhôôr!

— Quantos litros de leite deu a vaca Cumbuca?

— 25, seu Curuné!

— E a vaca malhada?

— 27, seu Curuné!

— E a vaca Pedrês?

— 35, seu Curuné!

— Sóó? Diabo! Os meninos hoje não têm o qui mamar!

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Análise do poema “Tradição” de Ascenso Ferreira

“Tradição” é um dos típicos poemas elaborados pelo pernambucano Ascenso Ferreira, cujo destaque é pelo forte apelo regional e por registrar, em sua arte influenciada pelas correntes do Modernismo, uma linguagem direta e simples, lembrando o jeito nordestino, com suas variações e costumes.

Não diferente do que foi dito, o poema em destaque já apresenta uma diferença enquanto estrutura, pois seus versos, em sua maioria, estão distribuídos em forma de diálogos (basta observar o uso dos travessões) e os iniciais, o “eu-lírico” situa o leitor em tempo e espaço (uma manhã no terraço da Casa-Grande). Então, a partir dessa realidade, o poema resgata parte do cotidiano de uma sociedade que vive com os pés na tradição.

Esse diálogo é representado por dois personagens, o empregado, “Zé-Estribeiro” e o patrão, “Curuné”. Essa hierarquia é exemplificada pelas falas, “Inhôôr!” e “seu Curuné!”, do empregado. Nessa conversa, o coronel apresenta-se preocupado com a quantidade de litros de leite que cada uma de suas vacas dá e a resposta final já registra parte da tradição dessa cultura que era o grande número de filhos existentes em uma família (neste caso, uma família rica, da Casa-Grande) e a solução para a alimentação das crianças, além da ama de leite, era o leite saído das vacas.

Trata-se, portanto, de um poema inovador (principalmente pelos versos livres e pela forma) que possui um vocabulário típico do cotidiano nordestino marcado pela valorização da cultura popular, bem registrada pelo poeta, além de passar o bom humor que se dá por uma tradição, tão destacada, desde o título, que entra em choque com as modernidades dos dias de hoje.

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FERREIRA, Ascenso. Poemas de Ascenso Ferreira: Catimbó – Cana Caiana – Xenhenhém. 5. ed. Recife: Nordestal, 1995, p. 57.

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Uma das coisas que aprendo a fazer, na faculdade e gostei muito. Análise de poemas.