O Diabo, Deus, João e o Tinoco.
De chifre em pé, o Diabo, que chegado da casa é,
Num salto ligeiro sobe ao alicerce de Deus:
“Levam minhas orelhas ao carbo! Diga, o que é?”
João anuncia com o dedo a fala, mas Deus trovoa:
“É meu assunto! Desça e cuide do teu!”
“Assunto é que não tenho, Tinoco é bobo à toa”
Nisso riu o pobre mortal. Riso inocente, natural.
Ao santíssimo fervia os olhos – o capeta casquinava.
“Imundos!” retumbou o criador e disparou o vendaval.
Voava tudo que voava lá em cima. Deus-nos-acuda
Não acudia. O encapetado do diabo não se cabia
De tanto riso e alegria, de ver o amigo à carrancuda.
João, muito ligeiro, aproveitou a confusão e foi-se pelo bueiro.
Desceu rápido, mas inda viu o mundão de agorinha vivido.
Mas logo a cara esquentava e olho enxergava nevoeiro.
Sentado rápido foi tão forte na escadaria que gemer só sabia.
Na pedra dura, no sinal da pancada: uma bunda quebrada!
João tremia. Não sabia se doía a pancada ou a queimada que ardia.
Tempo ao entendimento foi escasso, ouviu logo lá de baixo:
“Esse abundado de osso quebrado só pode ser João, coitado!”
E, de repente, ria. Pela piada ou alegria? Não sossegou o faixo.
Desceu os degraus
da portaria: Ploc ploc ploc,
Ploc, ploc, ploc – Quentume de fornaria!
Ao portão chaveado esbarrava o João sorrido,
Cheio de alegria ao ver Tinoco enjaulado (coitado),
Lagrimou os olhos aos olhos do amigo sofrido.
“Diz-me, João, é verão! Veio gozar comigo?”
“Cala-te, Tinoco, logo vem o Capeta imundo!”
“Ora! E não é na imundice dum bar que se faz amigo?!”