Breves relatos sobre as finalidades da pena

Antes de se iniciar esse breve relato sobre as finalidades da pena, mister se faz a conceituação do que vem a ser essa temível palavra.

Nos dizeres de Damásio “pena é a sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim é evitar novos delitos”.*

Já Fernando Capez, amplia esse conceito esclarecendo a pena como sendo uma “sanção penal de caráter aflitivo; imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consiste na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade”.**

Antigamente as penas eram muito mais severas, variando da amputação de membros até a morte, entretanto, com o evoluir das civilizações, a pena também progrediu com um senso mais humanitário, tendo como finalidade a recuperação do meliante.

A aplicação da pena é proporcional à gravidade objetiva do fato e a culpabilidade do autor.

Segundo o que dispõe o inciso XXXIX, do artigo 5º, da Constituição Federal, ninguém será punido se não houver uma lei anterior que defina tal ação como crime e as sanções legais no caso de seu descumprimento.

Desta forma, somente será punido aquele que agir fora dos parâmetros impostos pela sociedade e tutelados pela justiça.

A pena como principal conseqüência jurídica, que se deriva da prática da infração penal, apresenta determinados aspectos que estão indicados no artigo 59, in fine, tais como o de retribuição (como uma justa resposta ao ato praticado pelo agressor) e a prevenção, que atua no sentido de inibir que toda a sociedade comece a delinqüir, ou então, que o infrator volte para o mundo da criminalidade reincidindo seu ato falho.

É através da aplicação da pena que se busca uma resposta que tranqüilize a sociedade e, ao mesmo tempo em que assegure ao criminoso condições eficazes para a sua reinserção ao meio social, com a sua recolocação no âmbito familiar, no mercado de trabalho, sem o sentimento de inferioridade, que geralmente um ex-presidiário leva consigo.

No momento da aplicação da pena, o magistrado objetiva o cumprimento das finalidades das sanções, caso contrário, seria desnecessário e um total desperdício de todas as fases processuais e a correta averiguação da autoria e da materialidade do delito.

Atualmente, o que encontramos em nosso ordenamento jurídico criminal é a completa descaracterização das funções primordiais da pena.

No momento em que se admite que a pena é uma justa retribuição do Estado em relação ao mal cometido contra a sociedade, estamos encaminhando um criminoso para um sistema carcerário, em que, não se conhecendo o caráter do cidadão, o misturará com pessoas muito mais perigosas, experientes e habilitadas nas artes criminais. O que dependendo do condenado, acaba assumindo o perfil de um bandido; criminoso; que às vezes não passa perto de ser isso, e apenas está ali por um único e pequeno deslize.

Por outro lado, a pena também tem o caráter de prevenção, que se divide em geral e especial.

A prevenção geral é aquela que visa prevenir que a sociedade como um todo comece a delinqüir, instaurando-se, assim, um verdadeiro caos.

Por sua vez, a prevenção especial é voltada para a reeducação do criminoso, para que ele não volte para as latrinas fétidas da marginalidade.

Entretanto, a prisão desse criminoso não está levando à finalidade da pena, eis que apesar de se ver que a justiça está sendo feita nos casos que ultrapassam os limites da moral e da própria justiça; os índices de criminalidade continuam aumentando, o que denota que essa prevenção não serve de exemplo para que outros não caiam nos mesmos erros.

Ao contrário do que se pretende com a imposição da pena, em evitar a criminalidade, quanto maior o número de criminosos há um maior número de seguidores, que idolatram e protegem esses bandidos com a sua própria vida; por sustentarem o status de “seguidores de Fulano - o bom da boca”, o que acaba se transformando nessa corrente infindável de criminalidade.

Hoje em dia, a pena privativa de liberdade, que tanto já foi temida, agora não passa de mera mudança de endereço da sede da organização criminosa, em que os delinqüentes estão apenas longe fisicamente de seu mundo.

O que era para ser uma punição transformou-se em mera diversão para os grandes marginais, uma vez que de dentro das penitenciárias continuam controlando os seus cartéis, além de desfrutarem das mordomias e bajulações que os pequenos criminosos lhes proporcionam, seja por dívidas de entorpecentes, ou então, meramente para ser aceito pela organização.

Com o precário sistema carcerário brasileiro, não se tem as mínimas condições de garantir uma permanência digna, com o apoio necessário para a sua ressocialização e futura reinserção no meio social, sem carregar o estigma de “bandido”; “criminoso” ou “ex-presidiário”, uma vez que já pagou pelo erro cometido.

O sistema de superlotação e a falta de condições mínimas de higiene, saúde e respeito pelo ser humano, impedem a reeducação do encarcerado, e o pior, propicia ao dito “ladrão de galinha”, todo um aprendizado para futuramente vir a assumir o topo da pirâmide na hierarquia da organização criminosa.

Infelizmente, o que falta para que o Brasil cumpra efetivamente os requisitos da pena é necessária uma mudança total no sistema carcerário, a fim de se acabar com a superlotação; propiciando a segregação dos criminosos em potencial, daqueles que por meros deslizes caíram na malha da criminalidade, conforme dispõe o artigo 5º, inciso XLVIII, da Constituição Federal e, no entanto, são boas pessoas, geralmente trabalhadores e pais de famílias; que merecem uma chance de pagarem pelo delito cometido e continuarem a sua vida com dignidade.

Se houvesse o mínimo de empenho no cumprimento do estabelecido na Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal); teríamos a tão idealizada prevenção dos crimes e a ressocialização do criminoso.

No entanto, as condições subumanas em que vivem os presos provisórios e/ou condenados, está longe de cumprir os requisitos assistenciais de direito dos condenados, dispostos no artigo 11, da Lei de Execução Penal.

É fácil notarmos que com esse sistema penitenciário a função ressocializadora da pena fica completamente prejudicada; eis que não se tem condições de propiciar cursos de reciclagem, palestras ou estudos que levem a reflexão das conseqüências da ilegalidade e o pior, não se propicia as mínimas condições de dignidade para que se retome a sua vida sem maiores conseqüências ou frustrações.

Se as funções das penas realmente estivessem sendo efetivadas não teríamos os altos índices de reincidência e a pronta substituição de um elemento que foi preso, por outro que assuma a sua função no mundo do crime, no mesmo instante.

Talvez conseguiríamos modificar essa situação se retomássemos à época em que vigorava o Código de Hamurabi, porque, assim, o delinqüente pensaria um pouco mais nas conseqüências que seus atos lhe causaria.

Não seria o caso de pensarmos na possibilidade de instauração da pena de morte, porque é mais que comprovado que isso não acaba com a violência e a marginalidade, tal como na China, em que tantos condenados são executados e nem assim os índices de marginalidade diminuem.

A única solução para que se cumpram efetivamente as funções da pena é uma completa revolução no sistema carcerário, no qual, garanta os direitos e, principalmente a dignidade dos condenados; respeitando sempre a separação entre os graus de periculosidade e de personalidade de cada delinqüente, de acordo com o inciso XLVIII, do artigo 5º, da Constituição Federal.

Notas:

*JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal. Parte Geral. v.1, 10 ed. São Paulo: Saraiva, 1985, p. 455.

**CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. v.1. 8 ed. Ver e atual. de acordo com as Leis n. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), 10.763/2003, 10.826/2003 e 10.886/2004. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 346.

BIBLIOGRAFIA

BOTELHO, Jeferson. Breves anotações sobre Teoria Geral da Pena. Disponível em: <http://www.jefersonbotelho.com.br/2007/08/14/breves-anotacoes-sobre-teoria-geral-da-pena%C2%A0/>. Acesso em: 20.maio.09.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. v.1. 8 ed. rev. e atual. de acordo com as Leis n.º 10.741/2003 (Estatuto do Idoso); 10.763/2003; 10.826/2003 e 10.886/2004. São Paulo: Saraiva, 2005.

GOMES, Luiz Flávio. Funções da Pena no Direito Penal Brasileiro. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8334>. Acesso em: 20.maio.09.

JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal. Parte geral. v.1. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 1985.