EDUCAÇÃO A SERVIÇO DA INCLUSÃO SOCIAL: UMA CONQUISTA DA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Resumo

Este trabalho traz um estudo da matéria educação em todas as Constituições brasileiras considerando o cenário social, econômico e político de cada período. A finalidade deste artigo é proporcionar um entendimento de como o assunto se desenvolveu até culminar na atual Constituição - cuja temática educacional é tratada como direito fundamental e incluída no rol de direitos sociais.

Palavras-chave: Educação; Constituição; Inclusão social; Direito social.

EDUCATION USEFUL TO SOCIAL INCLUSION: AN ACHIEVEMENT OF THE CONSTITUTION OF 1988

Abstract

This work has a study of the educational subject in all of the Brazilian Constitutions, taking into consideration the social, economic and political setting of each period. The scope of this paper is to provide an understanding of how this topic has developed until the current Constitution – whose educational theme is treated as a fundamental right and included in the list of social rights.

Key Words: Education; Constitution; Social Inclusion; Social Right.

INTRODUÇÃO

Apesar de previsto, de forma mais ou menos abrangente, por todas as Constituições brasileiras, e marcado por forte influência ideológica de cada época, somente agora, com o advento da atual Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), promulgada em 1988, o Brasil desperta e concede a relevância de que necessita o tema educação – atualmente, não mais enxergado em sentido estrito (aluno/professor), mas sendo tratado forma mais abarcante - lato sensu; empregado, inclusive, a serviço da inclusão social.

Direito fundamental, a matéria está incluída entre o rol de direitos sociais previstos no artigo 6º, da Constituição Federal de 1988 (CF/88). Encontra-se apregoada nos artigos 205 a 214 e vinculada ao princípio da dignidade da pessoa humana; sendo fundamento do Estado brasileiro, consoante o artigo 1º, inciso III, da Lei Maior.

Sob a égide da atual Constituição e paralela à atuação do governo - que objetiva a expansão de todos os níveis de ensino e implementa políticas de controle de qualidade - está a sociedade civil, que tem demonstrado grande interesse pelo tema da educação e participa, ativamente, do processo de melhora nos índices de escolaridade; entendendo , desse modo, que tal requisito é de fundamental importância para o real desenvolvimento do país.

Portanto, pode-se asseverar que de sua efetiva prestação emana a concretização dos objetivos essenciais do país. Objetivos esses que, inclusive, estão positivados no art. 3º da CF/88, que são:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela resolução nº. 217-A, da Assembléia das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, em seu art. 26, também ressalta a importância do tema:

I) Todo o homem tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico e profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito.

II) A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.

III) Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.

O TEMA EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

Constituição de 1824

Em 1808, houve a transferência da família Real portuguesa para o Brasil - devido à invasão de Portugal, por Napoleão Bonaparte.

Posteriormente à declaração da Independência do Brasil (em 7 de setembro de 1822) Dom Pedro I convoca uma Assembleia Geral Constituinte e Legislativa, com ideais marcadamente liberais. Todavia, esta vem a ser desfeita, arbitrariamente, pois divergia dos ideias autoritários do Imperador.

O monarca, em seu discurso inaugural, já tratou da temática da educação, afirmando que seria necessária uma legislação especial para disciplinar a matéria. Entretanto, o assunto sempre era desviado para temas de menor relevância, tornando impossível a fixação de diretrizes para o objeto em análise.

No período, a educação possuía um caráter elitista (o acesso era possibilitado, apenas, a membros da nobreza e da burguesia), reforçado pela preferência atribuída ao ensino superior e pela negligência ao ensino fundamental e secundário.

Assim, podemos dizer que durante o período de vigência da Constituição de 1824 não existiu, sob o aspecto constitucional, uma atribuição clara e precisa de competências entre as pessoas políticas para seu desenvolvimento. O que havia era a disciplina da matéria por meio da legislação ordinária, com a conseqüente descentralização, que não trouxe benefícios para o progresso da educação no País, pois privilegiou o ensino superior em detrimento da criação de políticas que cuidassem da implantação do ensino fundamental público e gratuito, essencial para a formação da maior parte da população. (TEIXEIRA, 2008, p. 151).

Constituição de 1891

A Constituição de 1891 foi a primeira Constituição da República do Brasil. Teve como relator o Senador Rui Barbosa. Consagrou o sistema presidencialista e a forma de Estado Federal. A forma de governo, Republicana, substituiu à Monarquia e houve a previsão, pela primeira vez, do habeas corpus.

O texto constitucional em tela distinguiu a competência legislativa da União e dos Estados na matéria educação. Caberia à União legislar sobre o ensino superior e aos Estados incumbia ordenar sobre ensino secundário e primário.

O direito à educação foi positivado nos artigos 35 e 72 da Constituição em epígrafe e também houve a separação entre Estado e Igreja no que tange à matéria.

Art. 35 - Incumbe, outrossim, ao Congresso, mas não privativamente:

1º) velar na guarda da Constituição e das leis e providenciar sobre as necessidades de caráter federal;

2º) animar no Pais o desenvolvimento das letras, artes e ciências, bem como a imigração, a agricultura, a indústria e comércio, sem privilégios que tolham a ação dos Governos locais;

3º) criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados;

4º) prover a instrução secundária no Distrito Federal.

[...]

Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

§ 6º - Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos.

Constituição de 1934

O texto constitucional de 1934 sofreu forte influência da Constituição de Weimar – Alemanha – 1919, evidenciando Direitos humanos de 2ª geração e a perspectiva de um Estado Social de Direito. Recebeu, também, influência do fascismo. (LENZA, 2009, p. 61)

O assunto educação era disciplinado no artigo 5º, XIV, e 148 a 158, sendo, também caracterizada como direito subjetivo público pelo artigo 149.

Art 149 - A educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela família e pelos Poderes Públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no País, de modo que possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação, e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana.

Pela primeira vez foi fixada a aplicação de receitas dos entes federativos para educação. Os Estados e o Distrito Federal aplicariam 20%. Já os municípios e a União, pelo menos, 10% da arrecadação de impostos para a manutenção e desenvolvimento educacional. Outrossim, nos termos do artigo 157, foi prevista a criação de fundos educacionais, destinados à obras educativas e ao auxílio de alunos necessitados.

Verifica-se, portanto, que a Constituição de 1934 avançou, significativamente, no que diz respeito à melhoria da educação no país; destinando recursos do orçamento público para essa realização, bem como auxiliando aqueles que não tinham condições financeiras de frequentar o ensino.

Constituição de 1937

Getúlio Vargas foi eleito para governar de 1934 a 1938. Esse período foi marcado por grande rivalidade política - entre a direita fascista (Ação Integralista Brasileira – AIB), que defendia um Estado autoritário - e a esquerda, com ideais sociais, comunistas e sindicais (Aliança Nacional Libertadora – ANL).

Em 11 de julho de 1935, o governo fechou a ANL, por considerá-la ilegal, com base na Lei de Segurança Nacional.

Por causa da Intentona Comunista, o Governo decretou o estado de sítio e difundiu um forte movimento de repressão ao comunismo. Getúlio recebe apoio do Congresso Nacional que decretou estado de guerra.

Segundo Lenza (2009, p. 64):

[...] em 30 de setembro de 1937, os jornais noticiaram que o Estado- Maior do Exército havia descoberto um plano comunista para a tomada do Poder (‘Plano Cohen’). Este foi o ‘estopim’ para que o governo decretasse o golpe como suposta ‘salvação’ contra o comunismo que parecia ‘assolar’ o país [...] em 10 de novembro de 1937 Getúlio Vargas dá o golpe ditatorial, centralizando o Poder e fechando o Congresso Nacional.

A Carta de 1937 foi apelidada de Polaca, pois sofreu forte influência da Constituição polonesa fascista, de 1935.

A matéria educação foi disciplinada nos artigos 15, inciso IX, 16, inciso XXIV e 124 a 134.

Esclarece Pedagogia em Foco:

As conquistas do movimento renovador, influenciando a Constituição de 1934, foram enfraquecidas nesta nova Constituição de 1937. Marca uma distinção entre o trabalho intelectual, para as classes mais favorecidas, e o trabalho manual, enfatizando o ensino profissional para as classes mais desfavorecidas. Ainda assim é criada a União Nacional dos Estudantes - UNE e o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos - INEP. Em 1942, por iniciativa do Ministro Gustavo Capanema, são reformados alguns ramos do ensino. Estas Reformas receberam o nome de Leis Orgânicas do Ensino, e são compostas pelas seguintes Decretos-lei, durante o Estado Novo:

- O Decreto-lei 4.048, de 22 de janeiro, cria o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial - SENAI.

- O Decreto-lei 4.073, de 30 de janeiro, regulamenta o ensino industrial.

- O Decreto-lei 4.244, de 9 de abril, regulamenta o ensino secundário.

Constituição de 1946

A participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial, ao lado dos aliados, trouxe efeitos irreparáveis para o Estado. Isso porque, imaginava-se que, com essa atitude, o fascismo fosse “apagado” da realidade brasileira. Seria uma contradição manter uma Constituição baseada no modelo fascista e externamente lutar contra esse regime.

Assim, em decorrência dessa perda de legitimidade, o Estado Novo entra em crise e tem o seu fim em outubro 1945. Após a queda de Getúlio Vargas, ocorre um período de redemocratização que irá culminar na promulgação da Constituição de 1946.

No texto constitucional, o direito à educação foi asseverado nos artigos 5º, inciso XV, alínea “d” e artigos 166 a 175. Os recursos para a manutenção e recurso do ensino no país eram estabelecidos pelo artigo 169, in verbis:

Art. 169 - Anualmente, a União aplicará nunca menos de dez por cento, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nunca menos de vinte por cento da renda resultante dos impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino.

O Ministro Raul Leitão da Cunha regulariza o ensino primário e o ensino normal, além de criar o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC.

Presidida pelo educador Lourenço Filho, foi criada uma comissão, que era dividida em três subcomissões (uma para o ensino primário, uma para o ensino médio e outra para o superior) e tinha por objetivo elaborar um anteprojeto de reforma geral para a educação nacional. O anteprojeto foi encaminhado, em 1948, à Câmara Federal, iniciando um acirrado debate em torno das questões apresentadas.

Após 13 anos de intensos debates ocorreu o fato mais marcante para a educação no Brasil da época: foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional - Lei 4.024, de 20 de dezembro de 1961 - na qual prevaleceram os interesses da Igreja Católica e dos donos de estabelecimentos particulares de ensino sobre os que defendiam o monopólio estatal na oferta de educação aos brasileiros.

Entretanto, em 1964, sob o pretexto de que as propostas seriam “comunizantes e subversivas”, um golpe militar põe fim às iniciativas de melhoria da educação no Brasil.

Constituição de 1967 e Constituição de 1969 – EC n.1, de 17 de outubro de 1969

Nos moldes da Carta de 1937, houve a concentração do poder na esfera Federal e, por conseqüência disso, conferindo-se amplos poderes ao Presidente da República.

A matéria educação, na Constituição de 1967, era disciplinada no artigo 8º, incisos XIV, XVII, alínea “q” e §2º e artigos 68 a 172.

Com fundamento no AI n. 12, de 31.08.1969 – instaurou-se no Brasil um governo de “Juntas Militares”, legitimadas pelo referido ato - o qual permitia que, enquanto o Presidente da República (Costa e Silva) estivesse afastado por motivos de saúde, governassem os Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar. Desse modo, a EC n. 1/69 foi baixada pelos Militares, já que o Congresso Nacional encontrava-se fechado.

Pedagogia em Foco assevera:

Depois do golpe militar de 1964 muito educadores passaram a ser perseguidos em função de posicionamentos ideológicos. Muitos foram calados para sempre, alguns outros se exilaram, outros se recolheram a vida privada e outros, demitidos, trocaram de função.

O Regime Militar espelhou na educação o caráter anti-democrático de sua proposta ideológica de governo: professores foram presos e demitidos; universidades foram invadidas; estudantes foram presos, feridos, nos confronto com a polícia, e alguns foram mortos; os estudantes foram calados e a União Nacional dos Estudantes proibida de funcionar; o Decreto-Lei 477 calou a boca de alunos e professores; o Ministro da Justiça declarou que "estudantes tem que estudar" e "não podem fazer baderna". Esta era a prática do Regime.

Igualmente nesse período, com o intuito de erradicar o analfabetismo, foi criado o Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL; todavia, devido a denúncias de corrupção e por não conseguir o objetivo almejado, foi extinto.

É no período mais cruel da ditadura militar, onde qualquer expressão popular contrária aos interesses do governo era abafada, muitas vezes pela violência física, que é instituída a Lei 5.692, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1971. A característica mais marcante desta Lei era tentar dar a formação educacional um cunho profissionalizante. Dentro do espírito dos "slogans" propostos pelo governo, como "Brasil grande", "ame-o ou deixe-o", "milagre econômico", etc., planejava-se fazer com que a educação contribuísse, de forma decisiva, para o aumento da produção brasileira. A ditadura militar se desfez por si só. Tamanha era a pressão popular, de vários setores da sociedade, que o processo de abertura política tornou-se inevitável. Mesmo assim, os militares deixaram o governo através de uma eleição indireta, mesmo que concorressem somente dois civis (Paulo Maluf e Tancredo Neves). (PEDAGOGIA EM FOCO)

Constituição de 1988

Cumprindo a determinação da emenda constitucional n. 26, de 27 de novembro de 1985, houve convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte, que tinha por finalidade elaborar uma nova Constituição, cujo texto expressasse a atual realidade social. Isto significa, mais explicitamente, o processo de redemocratização e término do regime ditatorial. Assim, em 05 de outubro de 1988 foi promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil.

A Carta Magna de 1988 foi, sem dúvida alguma, a que disciplinou o tema educação de forma mais relevante. Reconhecida como direito fundamental, a matéria está incluída no rol de direitos sociais, no “caput” do artigo 6º e pormenorizada no título VIII – referente à Ordem Social – nos artigos 205 a 214.

Consoante o artigo 205, há três propósitos básicos da educação: “o pleno desenvolvimento da pessoa; seu preparo para exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Entretanto, segundo Silva (2009, p. 312):

A consecução prática desses objetivos só se realizará num sistema educacional democrático, em que a organização da educação formal (via escola) concretize o direito de ensino, informado por alguns princípios com eles coerentes, que, realmente, foram acolhidos pela Constituição, tais são: universalidade (ensino para todos), igualdade, liberdade, pluralismo, gratuidade do ensino público, valorização dos respectivos profissionais, gestão democrática da escola e padrão de qualidade, princípios esses que foram acolhidos no art. 206 da Constituição [...] (grifo nosso)

Do Direito à educação

Ainda:

O art. 205 contém uma declaração fundamental que, combinada com o art. 6º, eleva a educação ao nível dos direitos fundamentais do homem. Aí se firma que a educação é direito de todos, com o que esse direito é informado pelo princípio da universalidade. Realça-lhe o valor jurídico, por um lado, a cláusula – a educação é dever do Estado e da família -, constante do mesmo artigo, que completa a situação jurídica subjetiva, ao explicitar o titular do dever, da obrigação, contraposto àquele direito. Vale dizer: todos têm o direito à educação e o Estado tem o dever de prestá-la, assim como a família. (SILVA, 2009, p. 312). (grifo do autor)

Quando a norma do art. 205 da CRFB determina que “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família [...]”, significa, que o Estado deve fornecer educação para todos indistintamente e “ que todas as normas da Constituição, sobre educação e ensino, hão que ser interpretadas em função daquela declaração e no sentido de sua plena e efetiva realização”. (SILVA, 2009, p. 313); ampliando, com base nos princípios elencados no art. 206, as possibilidades para que todos possam exercer de forma igualitária esse direito.

A Constituição de 1988, conforme já assinalado, ao colocar a educação no rol de direitos essenciais, que competem ao Poder Público sua efetiva prestação a todos de forma equivalente, demonstra sua preferência pelo ensino público, que pela iniciativa privada.

Brilhante é a lembrança de José Afonso da Silva ao citar os ensinamentos de Teixeira:

Obrigatória, gratuita e universal, a educação só poderia ser ministrada pelo Estado. Impossível deixá-la confiada a particulares, pois estes somente podiam oferecê-la aos que tivessem posses (ou a ‘protegidos’) e daí operar antes para perpetuar as desigualdades sociais, que para removê-las. A escola pública, comum a todos, não seria, assim, o instrumento de benevolência de uma classe dominante, tomada de generosidade ou de medo, mas um direito do povo, sobretudo das classes trabalhadoras, para que, na ordem capitalista, o trabalho (não se trata, com efeito, de nenhuma doutrina socialista, mas do melhor capitalismo) não se conservasse servil, submetido e degradado, mas, igual ao capital na consciência de suas reivindicações e dos seus direitos. (SILVA, 2009, p. 839).

O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios (art. 206 da CRFB):

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;

VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;

VII - garantia de padrão de qualidade.

VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.

Ainda, o art. 214 traz a lume os propósitos constitucionais da educação no Brasil:

[...]

I - erradicação do analfabetismo;

II - universalização do atendimento escolar;

III - melhoria da qualidade do ensino;

IV - formação para o trabalho;

V - promoção humanística, científica e tecnológica do País.

Acerca do ensino universitário, eis a dicção do art. 217 (CF/88):

As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

§ 1º É facultado às universidades admitir professores, técnicos e cientistas estrangeiros, na forma da lei.

§ 2º O disposto neste artigo aplica-se às instituições de pesquisa científica e tecnológica.

A Lei Maior asseverou, em seu artigo 206, inciso II, que o ensino será ministrado com base na liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber. Consequentemente, seria absolutamente necessária “uma manifestação normativa expressa em favor da autonomia das Universidades.” (SILVA, 2009, p. 840). Na verdade, “a autonomia universitária é instrumento a serviço do bom desempenho da atividade educacional”. (RAPOSO, 2002).

Desse modo, faz-se mister ressaltar a teoria de Teixeira, citada por Silva, a respeito da autonomia das Universidades:

As universidades não serão o que devem ser se não cultivarem a consciência da independência do saber e se não souberem que a supremacia do saber, graças a essa independência, é levar a um novo saber. E para isto precisam de viver em uma atmosfera de autonomia e estímulos vigorosos de experimentação, ensaio e renovação. Não é por simples acidente que as universidades se constituem em comunidades de mestres e discípulos, casando a experiência de uns com o ardor e a mocidade de outros. Elas não são, com efeito, apenas instituições de ensino e de pesquisas, mas sociedades devotadas ao livre, desinteressado e deliberativo cultivo da inteligência e do espírito e fundadas na esperança do progresso humano pelo progresso da razão. (SILVA, 2009, p. 840).

O artigo 208 determina que o dever do Estado para com a educação será efetivado mediante a garantia de:

I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria;

II - progressiva universalização do ensino médio gratuito;

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade;

V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;

VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didáticoescolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

§ 1º - O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.

§ 2º - O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.

§ 3º - Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.

A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino, conforme art. 211 da CRFB:

§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;

§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.

§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio.

Compreende-se, também, segundo a EC nº. 59, de 11/11/2009, na organização de seus sistemas de ensino, os Entes Federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório.

Igualmente, nos termos da EC nº. 53, de 19/12/2006: “A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular.”

Conforme observou Moraes (2010, p. 840-841):

A EC nº.53/ 2006, também, determinou que a distribuição dos recursos e de responsabilidades entre o Distrito Federal, os Estados e os Municípios é assegurada mediante a criação, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, de natureza contábil; que serão constituídos por 20% dos recursos previstos no art. 155, incisos I, II e III, no art. 157, caput, e incisos II, III e IV, e no art. 159, caput, e incisos, I, ‘a’ e ‘b’ e II, todos da Constituição Federal.

A distribuição dos recursos entre cada Estado e seus Municípios será realizada na forma da lei e proporcionalmente ao número de alunos das diversas etapas e modalidades da educação básica presencial, matriculados nas respectivas redes, observando-se os âmbitos de atuação prioritária estabelecidos constitucionalmente, ou seja, prioridade dos Municípios no ensino fundamental e na educação infantil e dos Estados no ensino fundamental e médio (ADCT, art. 60).

A Constituição reza, nos termos do artigo 212, que a União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito (18%), e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento (25%), no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino. Eliminando-se a parcela da arrecadação de impostos transferida pela União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, ou pelos Estados aos respectivos Municípios.

Consoante a Emenda Constitucional nº 59/2009:

A distribuição dos recursos públicos assegurará prioridade ao atendimento das necessidades do ensino obrigatório, no que se refere a universalização, garantia de padrão de qualidade e equidade, nos termos do plano nacional de educação.

Destarte, conforme assevera Moraes (2010, p. 841):

Conforme já visto, a aplicação dos recursos constitucionalmente previstos na área da educação, a partir da Emenda Constitucional nº 14, de 12-9-1996, com entrada em vigor, no primeiro ano subseqüente, tornou-se princípio sensível da Constituição Federal (CF, art. 34, VII, e), cuja inobservância pelo Estado-membro ou Distrito Federal possibilitará a intervenção federal.

Conclusão

O objetivo deste estudo foi explicitar, levando em consideração o contexto social, político e econômico do país em cada período, como as Constituições anteriores tratavam a matéria educação e como o texto atual aborda o mesmo tema.

Pode-se notar, claramente, que o aludido direito tem evoluído e sido tratado de forma muito mais abrangente pela atual Constituição. O texto constitucional de 1988 proporcionou progressos significativos na matéria, impondo princípios norteadores das atividades dos entes federados e buscando o desenvolvimento de todo sistema educacional do país. E mais, estabeleceu um percentual, obrigatório, a ser aplicado em educação pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, cuja inobservância possibilita, até, a intervenção federal.

O Brasil está no caminho certo, é claro que dificuldades ainda existem; todavia, o modo com que a atual Constituição aborda a temática educacional é inédito na história do país - tratando a matéria de forma ampla, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Educação a serviço da inclusão social - contando com a colaboração e incentivo de toda a sociedade, ainda que seja um dever do Estado e da família.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 23 abr. 2010.

Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm>. Acesso em: 09 abr. 2010.

História da Educação no Brasil: Período do Estado Novo (1937-1945). Pedagogia em Foco. Disponível em: <http://www.pedagogiaemfoco. pro.br/heb08.htm>. Acesso em: 24 abr. 2010.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009.

Magna Carta. Brasil Escola. Disponível em: <http://www.brasilescola.com/historiag/magna-carta.htm>. Acesso em: 26 fev. 2010.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

RAPOSO, Gustavo de Resende. A educação na Constituição Federal de 1988. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 641, 10 abr. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6574>. Acesso em: 21 abr. 2010.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito constitucional positivo. 33. ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2009.

TEIXEIRA, Maria Cristina. O Direito à educação nas Constituições brasileiras. Disponível em: <http: //www.metodista.br/revistas/revistas. hp/RFD/article/view/464>. Acesso em: 21 abr. 2010.