UNIÃO HOMOSSEXUAL E A PREVIDÊNCIA: uma leitura antropológica, jurídica e constitucional.

INTRODUÇÃO

Eis que surge o debate jurídico mais fervoroso da atualidade, União Homossexual, reconhecer ou desconhecer? Nosso Trabalho Acadêmico Interdisciplinar, proposto pela Coordenação Pedagógica do Instituto de Ciências Jurídicas – ICJ, do Curso de Direito da Universidade da Amazônia, pautou-se no tema “Relações interpessoais: respeitar, cuidar, considerar, conviver, Relação Homoafetiva e Previdência Social, segundo a análise do acórdão do RECURSO ESPECIAL Nº 1.026.981 - RJ (2008/0025171-7), do Superior Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Abordando três disciplinas principais, quais sendo: Antropologia, Introdução ao Direito II e Direito Constitucional I.

Intentamos apresentar a temática União Homossexual e Previdência Social de maneira concisa, perpassando pelas três disciplinas, em momentos distintos. No primeiro consta dos aspectos antropológicos, delineando sucintamente sua historicidade, desde os tempos remotos até a atualidade através de pesquisa teórica com apresentação das conceituações pertinentes ao tema homossexualidade. Em seguida a apresentação de aspectos jurídicos enfatizando o tema a luz do Direito Civil. E, finalmente, o tratamento constitucional dispensado a união homossexual. Na pesquisa teórica, estudamos diversos autores quais sendo, Miguel Reale, Paulo Nader, Débora V. Brandão, Rodrigo da Cunha Pereira, Zeno Veloso, Maria Helena Diniz, além do entendimento de estudiosos, como Maria Berenice Dias. No Direito Constitucional: Alexandre de Morais, Arnaldo Lemos Filho, Roger Raupp Rios e na Antropologia, Clifford Geertz, entre outros autores, que foram as bases teóricas para a construção da temática abordada. Também buscamos na pesquisa documentária dos art. 3º e 5º da Constituição Federal, o art. 1.723 do Código Civil, o Projeto de Lei 1.151/95 da Deputada Marta Suplicy, a Súmula 380 STF, a Apelação Civil Nº. 70002355204 do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e em artigos de jornais e internet, além da entrevista com o Jurista Zeno Veloso a complementação para nossa sustentação escrita. Na oportunidade levantamos o questionamento do Direito da Família ser estendido as uniões entre pessoas do mesmo sexo, relatando casos concretos de reconhecimento por jurisprudências e pareceres favoráveis ao assunto, defendidas por juristas e profissionais do Direito brasileiro.

Afirmamos que a natureza jurídica da união homossexual não pode ser tratada comumente como direito obrigacional, em função da assistência mútua e do afeto que indiscutivelmente as envolve, para tanto as questões a ela pertinentes devem sim ser discutidas no âmbito do Direito de Família e conseqüentemente na esfera de competência dos Juízes de Família. Enfatizando que a afetividade, o respeito e vida mútuos, a dignidade da pessoa humana, a igualdade, a honra, a intimidade e o amor, são princípios necessário a serem reconhecidos nas uniões homossexuais. Nosso objetivo é a reflexão, especialmente, dos agentes do Direito, deste novo Direito que se pretende estabelecer, a respeito do que se apresentou no passado relacionado às uniões homossexuais, do que se apresenta no Brasil, do que se conquistou até o momento e do que se espera construir para o futuro. Se uma sociedade cujos princípios são efetivamente praticados e estendidos a todos, ou uma sociedade em que se mascara com falácias uma igualdade permeada de preconceitos e exclusões, onde respeitar, cuidar, considerar e conviver não sejam só e somente verbos, mas que sejam práticas patentes por todos, para que possamos viver plenamente o real significado de igualdade e de dignidade da pessoa humana, com respeito mútuo e solidário tanto aos homossexuais, quanto a todos os brasileiros que por suas limitações, cor, opção de vida ou orientação sexual, estão discriminados e a margem da sociedade e do Direto.

UNIÃO HOMOSSEXUAL E A PREVIDÊNCIA: uma leitura antropológica, jurídica e constitucional.

O constitucionalismo contemporâneo reconhece no princípio do pluralismo, em consonância com o da dignidade da pessoa humana, um dos seus eixos centrais de construção social igualitária. O Estado Moderno trouxe consigo a novidade da valorização do indivíduo, entretanto, o pensamento etnocêntrico, permaneceu. Assim, a modernidade trouxe consigo uma perspectiva antropológica, centrada na idéia de respeito à privacidade do indivíduo e da família, impondo limitações aos poderes soberanos.

Ainda que a nova sociedade estivesse legitimada sobre bases convencionais, afastando-se da idéia transcendental/religiosa do uso coativo da força pelo Estado, esta sociedade dita “moderna” não se desvencilhou dos costumes e tradições, corroborando para a identidade etnocêntrica e consolidação de novos Estados, permitindo que estes identificassem nos valores comuns aquilo que seria correto, bom e digno, discriminando todos os que fugissem do padrão predeterminado. Esta padronização etnocêntrica, nascida desde os primeiros momentos da humanidade, permanece como principal debate nos paradigmas liberal e social do Estado Democrático de Direito.

Neste contexto, a grande novidade do Estado Democrático de Direito é justamente a noção de pluralismo pressupondo o respeito e proteção aqueles com projetos de vida diferentes do padrão social . É a proposta de superação da visão de mundo etnocêntrica, ao reconhecer o direito de vida alternativo. Destarte, o tratamento dado pelas sociedades atuais a questão homossexual é comparável aos trabalhadores do século XIX que reivindicavam direitos sociais, ambos são/eram tratados como caso de polícia, vistos com absoluta intolerância e desprezo social. Posto a sociedade de ter valores culturais dominantes e um sistema de exclusões muitas vezes baseado em preconceitos estigmatizantes, fruto da cultura e de valores históricos .

Vale ressaltar que no Brasil, a questão da discriminação não se limita ao campo moral, mas estende-se ao campo criminal, ao ponto de, a cada dois dias, ser cometido um assassinato de homossexual, além das diversas agressões físicas, psicológicas e moral. Entretanto, nossa abordagem centra-se na questão homossexual e os casos de união homossexual e previdência no Direito brasileiro, onde, em casos excepcionais de união homossexual, a igualdade afasta-se do aspecto meramente formal, assumindo uma concepção material e inovadora, permitindo a concretude da máxima: “Tratar desigualmente os desiguais na medida de sua desigualdade”.

A ANTROPOLOGIA HOMOSSEXUAL

Adão e Eva, e porque não Adão e Ivo, Ada e Eva? Estamos diante de uma relação existente até aos nossos dias, mas que ainda gera discriminação. Relação que já acontecia antes da vinda de Jesus Cristo a terra. A homossexualidade esteve presente nos primórdios da própria história, citada nos livros da antiguidade grego-romana e na própria Bíblia. Na sociedade grega, tais relações eram tão presentes que chegavam a ser consideradas mais nobres do que os relacionamentos heterossexuais. Inicialmente, cabe referir alguns conceitos relacionados ao tema abordado, antes de adentrarmos na história da antropologia homossexual.

- HOMOSSEXUAL é aquele que se compraz em ter relações sexuais com pessoas de seu próprio sexo, que tem inclinações sexuais por pessoas de seu sexo.

- HOMOSSEXUALIDADE é a prática de atos sexuais entre pessoas do mesmo sexo; tendência para tal prática; característica do homossexual; os pederastas, por exemplo, são homossexuais.

- HOMOSSEXUALISMO é a tendência para relações sexuais com pessoas do mesmo sexo a que se pertence.

Foi o médico húngaro Karoly Benkert quem utilizou pela primeira vez a palavra HOMOSSEXUALISMO, no ano de 1869. Segundo o psicólogo Roberto Graná, o homossexualismo é fruto de um pré-determinismo psíquico primitivo, originado nas relações parentais das crianças, desde a sua concepção até os 3 ou 4 anos de idade, quando o núcleo da identidade sexual na personalidade do individuo, que determinará sua orientação sexual, se constitui. Portanto, se não é possível ao indivíduo a escolha da sexualidade, figura a reprovabilidade quer social, moral, religiosa ou jurídica, um ato discriminatório . Os conceitos revelam apenas relações entre pessoas do mesmo sexo do gênero humano. Entretanto, autores diversos, como o biólogo Bruce Bagemihl, apresentou no ano de 1999, (livro Exuberância Biológica – 3: Homossexualidade Animal e Diversidade Natural), provas mais do que convincentes e irrefutáveis de que existe homossexualidade e vasta diversidade de comportamento sexual também entre os demais animais (BAGEMIHL APUD BRITO, 2002, p. 48).

Segundo relatos na obra de Spencer, (1999, p.74) a prática homossexual já acontecia há mais ou menos 10.000 anos atrás nas tribos, jovens entre 12 e 13 anos eram penetrados por seus tios maternos, em ritual de iniciação. O esperma significava transmissão de força e tornava-os adultos. Entretanto, transmitir determinadas descobertas antropológicas gera certos constrangimentos e medos, visto a dificuldade da imparcialidade na transmissão de assuntos, que ainda são entendidos como imoral ou libertino, visto que a igreja católica, em sua quase totalidade, é contrária a união homossexual. Sem dúvida, na religião é que encontramos o caráter mais polêmico e maior preconceito, em face da religião ter como base os princípios sagrados, segundo os quais a relação sexual tem como natureza, a procriação. Pondera-se no meio religioso, que se Deus quisesse e achasse conveniente a existência de seres de um só sexo, assim o teria feito. O livro de Gêneses, em seu capitulo 2, versículo 27, assim o fala: “Criou Deus, pois o homem a sua imagem e semelhança, a imagem de Deus o criou: homem e mulher os criou’’ •.

A prática homossexual esteve presente na Grécia Antiga, onde identificamos a homossexualidade nos momentos de culto ao belo, atividade feita nos ginásios, onde os gregos podiam apreciar jovens nus exibindo seus corpos. Também nas apresentações teatrais feitas por homens, que se vestiam de mulher ou usavam máscaras femininas (Berenice Dias, 2000, p. 24 e 25), existiam manifestações homossexuais. As relações entre homens mais velhos e os meninos adolescentes, que deu origem ao termo PEDERASTA, significando a relação entre indivíduos masculinos, sendo um adulto e um menor, do grego Erastes (homem mais velho) e Erômenos (adolescente), era uma tendência sexual manifestada entre homens adultos e que se caracteriza pelo desejo a rapazes na puberdade ou na adolescência. Em termos gerais, a palavra é usada também, apesar de forma inadequada, como sinônimo de homossexualidade . Hoje a pederastia é crime previsto no artigo 235 do Código Penal Militar, Decreto Lei n° 1.001, de 21 de outubro de 1969. (Piragibe. p.882 e 883).

Também no Império Romano existia a relação homossexual, mas com diferenças: a relação entre um romano e um escravo era livre, sem restrições, mas entre um romano e um jovem livre era aplicada multa como sanção. O assunto destaca três importantes personagens que viveram essa experiência de virilidade homossexual e heterossexual como é o caso de Júlio César (passivo) com Nicodemos (ativo) e Cleópatra entre tantas outras que Júlio César conquistou, mitigando seu ato ilícito de passivo sendo ativo com mulheres. Na Índia, apesar de ocorrerem algumas objeções, os deuses são bissexuais, hermafroditas, e esta flexibilidade sexual permitiu que os indianos vissem essa prática não só para procriação, mas também como promotora do prazer, atingir o orgasmo viabilizava entender o segredo, a mística de seus deuses. O Kama Sutra (antigo texto indiano) descreve posições de como atingir o orgasmo nas relações sexuais.

China e Japão antes do cristianismo não concebiam a homossexualidade como pecado, sendo prática normal os imperadores terem “favoritos”, e entre os jovens candidatos havia disputa, pois ser um “favorito” era sinal de uma vida de abundância e glamour. As primeiras leis repressoras contra a homossexualidade surgiram com o cristianismo, o culto a Deus mudou a forma de pensar a homossexualidade, proibindo a prática sexual sem fins procriativos e a igualando a selvageria animal, anomalia psicológica. Um acontecimento no século V diminuiu vertiginosamente a prática homossexual promovendo à heterossexual. Justiniano em 533 a. C., punia com castração e morte na fogueira todos que praticavam este ato “não aceito por Deus”, como também reprovava o adultério e o incesto, garantindo a procriação e o casamento. Conforme Willian Naphy, (2004. p. 288), os padres homossexuais perderiam a sua condição clerical e seriam confinados em mosteiros, vitaliciamente, enquanto os leigos seriam excomungados. Entretanto, Spencer (1999, p.74) afirmou que esta repressão serviu muito mais politicamente que religiosamente, como firme propósito de afastar pessoas indesejáveis.

Há uma visão etnocêntrica e rigorosa quando a igreja espalha e mantém até hoje esta visão preconceituosa e discriminadora quanto à homossexualidade, ainda que na Bíblia não se encontre justificativa plausível de que Deus era contra ou a favor. Contudo, o século XXI vive um momento de relativismo, em que não mais se consegue negar a existência dos relacionamentos homossexuais, vivenciados diariamente através da mídia, onde os parceiros decidem morar juntos e que por força da natureza, não reprodutiva, decidem adotar crianças e assim formar uma nova forma de família.

Tanto a Constituição Federal de 1988 quanto a igreja restringem a condição de família, somente, entre casais heterossexuais. A igreja é contra quando conceitua a relação homossexual de impura e a Constituição brasileira em seu artigo 226 § 3°: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.” Enfatiza também em seu § 5°: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”. Mas em seu § 7° cita princípios constitucionais que merecem maior consideração por afastar a idéia de discriminação. Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

Vale ressaltar, portanto, que o conjunto de valores e costumes que compõe a cultura de um povo, com suas constantes transformações, influenciam diretamente as práticas jurídicas na proporção em que algumas leis se tornam obsoletas, ou nem mesmo existentes, gerando a necessidade da criação e renovação de leis que tirem da marginalidade sujeitos de direitos, pois o Direito só existe enquanto criação do homem, destinatário de todos os experimentos jurídicos, não somente para concretizar uma ordem social, mas especialmente, para propiciar o bem comum e a justiça a todos, independentemente de etnia, cor, orientação sexual, cultura, religião. E, conforme explica Geertz, (2006, p. 324.) o Direito é saber local, por que é fruto da cultura humana, de dado local, dada época e voltado para atender as necessidades da sociedade que o criou. Por isso, os valores de uma sociedade injusta refletirão em um direito injusto, quando não atende os anseios sociais, marginalizando um grupo ou indivíduos desta sociedade.

A realidade nos mostra a necessidade de integração, de respeito ao diferente, pois pertencemos a mesma espécie, somos sujeitos dos mesmos direitos e deveres, ainda que tenhamos características biológicas diferentes, gostos, cor, religião e orientação sexual. Pois somente será rompida a visão etnocêntrica em relação não só a união homossexual, mas aos indígenas, aos idosos, aos deficientes, aos negros, ao pobre, ao ex-detento e todos os indivíduos marginalizados e discriminados, dando visibilidade às questões, tratando o diferente na sua diferença com igualdade.

UNIÕES LIVRES: evolução histórica no Direito brasileiro

A união entre pessoas de sexo diferente quanto do mesmo sexo é um fato social presente e importante, que apesar do aspecto real, por muitos anos foram de certa forma silenciados quanto à legalização no Brasil. Entre pessoas de sexo diferente, o concubinato, assim chamado, foi sendo regulado, tendo o juiz como legislador, aplicando aos concubinos a equidade, humanizando a frieza que a norma lhes impunha (ZENO VELOSO, 1997, p.14).

A Constituição de 1988 atendeu aos anseios da sociedade brasileira quanto à união estável entre homens e mulheres. Entretanto, a mesma não abarcou a união entre companheiros (as) do mesmo sexo, no sentido familiar, permanecendo estes, a margem do amparo legal. Situação que Severino Galdino belo vivenciou ao requerer pensão post motem a Caixa Econômica Federal, negado sob a alegação de “ausência de amparo legal”. Mas o que seria o direito e o justo neste caso? A falta de amparo legal ou a convivência duradoura e pública há mais de dez anos? E porque tratar a união homossexual enquanto Direito Obrigacional e não enquanto Direito de Família? Até quando admitir unicamente o perfil de família tradicional numa sociedade em que a família sofreu transformações diversas em sua estrutura? E como tratar a união homossexual em um Estado Democrático de Direitos que exclui os homossexuais de seus direitos como cidadãos, sobre a alegação de ausência de amparo legal?

Segundo Virgílio de Sá Pereira, a família por ser um fato natural não pode ser restringida por convenções sociais, como o casamento. O acidente convencional não tem força para apagar o fato natural .

Destarte, a dita “ausência de amparo legal” não pode pressupor a exclusão de direitos. As lacunas existentes nas leis, não podem configurar exclusão, nem a discriminação, conflitando com os fundamentos constitucionais, tais como o da isonomia e da dignidade da pessoa humana. A vida social é dinâmica, mudam-se as necessidades de maneira que as normas jurídicas tendem a acompanhar tais transformações. O elaborador das normas jurídicas constrói modelos jurídicos “recortando por ações da realidade, elevando ao plano abstrato, ações que constitui um todo indecomponível, cujas partes se inter-relacionam e se polarizam em torno de um sentido de vida” . Cabendo ao juiz aplicar tais normas entre si, considerando também aos fatos e aos valores.

Há por certo, divergências teóricas sobre o Direito, quando ligado as questões homossexuais. Neste sentido, tais divergências tendem a criar novas interpretações jurídicas para abarcar tais casos concretos, conforme cita Dworkin, (2007, p. 9), quando fala da função do juiz como “criador de novo Direito” a partir de princípios de normas vigentes, toda vez que decide um caso importante. E, segundo o Jurista Zeno Veloso em entrevista concedida , o Judiciário, na ausência do legislador, vem decidindo em favor de companheiros homossexuais.

Em Outubro de 2004 o INSS determinou, no Regulamento da Previdência Social-RPS a inclusão do companheiro ou a companheira homossexual de segurado inscrito no RGPS passando este, a integrar o rol dos dependentes, desde que comprovada a vida em comum e a dependência econômica, concorrendo para fins de pensão por morte e de auxílio-reclusão, com os dependentes preferenciais de que trata o inciso I do art. 16 da Lei n° 8213, de 1991, para óbitos ocorridos a partir de 5 de abril de 1991.

O art. 1.723 do Código Civil/02 traz como concepção de união estável, toda união pautada por uma convivência Pública, Contínua e Duradoura, estabelecida com o objetivo de constituir família, termo que não significa “ter ou pretender filhos” ou mesmo “poder ter filhos”, pois se assim entendido, casais heteroafetivos estéreis não teriam sua união estável reconhecida. Constituir família é, justamente, a manutenção de uma união pública, contínua e duradoura, em comunhão plena de vida, com todas as consequências que esta plenitude acarreta, conforme art. 1.566, incs. I a III e V do Código Civil que estabelece a união estável: “fidelidade recíproca, mútua assistência, vida em comum, respeito e considerações mútuas”. Características apresentadas na união homossexual .

Então, se tais características estão intrinsecamente ligadas ao conceito do que seria família, por qual motivo tratar das demandas referentes à União Homossexual como direito obrigacional? Aqui não se trata de uma relação jurídica entre sujeitos ligados a prestação de fazer, de dar ou de não fazer, o que se apresenta é um direito de família, ligado ao direito da personalidade (que dizem respeito à pessoa física aos seus múltiplos aspectos físicos e psíquicos, como o de constituição de família) •, em função de assistência mútua e do afeto que indiscutivelmente as envolve. Falamos aqui de amor, de respeito, de vidas em comum. Portanto, as questões a ela pertinentes deverão ser discutidas no âmbito do Direito de Família, como se observa na decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, apelação civil nº. 70002355204 . Devendo as uniões entre companheiros homossexuais, serem vistas e respeitadas enquanto entidade familiar, abrigada pela constituição, ainda que com ausência de regramento infraconstitucional. Portanto, mesmo não prevista na norma, a união entre pessoas do mesmo sexo existe e mercê a proteção devida do Estado.

O texto constitucional em relação ao Direito de Família trouxe, além da família formada pelo matrimônio, duas novas concepções de família, a união estável e a família monoparental, estas também protegidas pelo Estado. No art. 226, inciso III, reconhece a união estável entre homens e mulheres, enquanto entidade familiar. Entretanto, no parágrafo 4º, fica estabelecido, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, a nova família monoparental. Contudo, a expressão “também”, disposta no parágrafo 4º, denota expressão de inclusão, gerando a interpretação de que outras formas de família poderão ser incluídas, já que não impõe idéia de limitação, pois não determina quais são estas famílias especificamente. Considera-se que a base geradora do jurídico encontra-se, primeiramente, nos laços de consangüinidade, nas práticas de convívio familiar de um mesmo grupo social, unido por crenças e tradições (LUHMAN APUD ANTONIO CARLOS WOLKMER, 2002. p. 21).

O projeto de lei 1.151/95(Marta Suplicy), não eleva a união homossexual a uma condição de família em razão da inconstitucionalidade do mesmo, que segundo avaliação, vai de encontro aos dispostos do artigo 226, 3 da Constituição Federal, mas incorporaria aos direitos homossexuais os deveres de solidariedade mútua indispensável à instituição familiar (ÁLVARO SOUZA CRUZ, 2003. p. 20).

Ainda que a família anteceda ao Estado e desempenhe importantes funções para a própria constituição e manutenção da autoridade pública, seu reconhecimento pelo Estado nem sempre corresponde às estruturas familiares encontradas na sociedade. O termo família pode ter várias definições em virtude da diversidade de condições históricas que influenciam tal conceito e dos diferentes discursos que pretendem estabelecer sua definição (Saraceno, 1997, p.11-12). A possibilidade de várias ”configurações” familiares indica que a família não é um grupo natural, mas cultural, ela não se constitui apenas por um homem, mulher e filhos. Ela antes de uma estruturação psíquica, onde cada um de seus membros ocupa um lugar, uma função: lugar do pai, lugar da mãe, lugar dos filhos, sem, entretanto estarem necessariamente ligados biologicamente (Pereira, 1997, p. 24).

Constituir uma família, ainda que seja por união homossexual é um direito inerente à personalidade. Tanto o companheiro ou a companheira homossexual tem o direito de receber o patrimônio adquirido pelo esforço comum e a pensão, pois é reconhecida a existência da união de fato, ainda que permeadas de preconceito pela sociedade. Qualquer união entre pessoas, pela afetividade e sexualidade, em comunhão de vida, prazer e sonhos, faz nascer uma família. Falar exclusivamente em obrigações, onde existe afetividade, é desconhecer a natureza da pessoa humana, é mistificar que só há amor entre um homem e uma mulher. Entretanto, espera-se que com a evolução dos costumes seja possível, que futuramente o conceito de família abranja nas leis as uniões entre companheiros do mesmo sexo.

No acórdão discutido, em face do pedido de pensão pós-morte, vislumbramos que apesar do grande avanço para as questões envolvendo a união entre pessoas do mesmo sexo, o Direito ainda caminha a passos morosos na resolução das demandas. Ainda que existam inúmeras jurisprudências, os recursos são exaustivos e de certa forma configuram desrespeito, especialmente, por parte do recorrido ou do reclamado.

A lei permanece inerte, enquanto a sociedade se transforma trazendo novos fatos sociais que estão para além da lei - Praeter legem. Neste contexto, como pensar em justiça de fato, se a lei se trona restrita, excluindo a necessidade de indivíduos? Como pensar em um Estado Democrático de Direito, pautado na cidadania, na dignidade da pessoa humana, na pluralidade e isonomia, se as normas por si não abarcam o diferente? Como entender a alteridade, quando a sociedade enquanto um todo social, cultural, político, jurídico permanece no etnocentrismo, ao não reconhecer a diferença do outro?

O princípio da igualdade, na dimensão formal, objetiva a superação destas desigualdades entre pessoas, quando aplica a todos a lei, mediante a universalização das normas entre todos os sujeitos de direito. Significa que o direito subjetivo que possibilita a um sujeito de agir e exigir aquilo que as normas de Direito atribuem a alguém como próprio, está atendido quando da utilização da analogia, baseada nos princípios da Constituição, mesmo para as uniões entre pessoas do mesmo sexo, quando se reconhece todos como iguais perante a lei – art. 5º da C.F/88. Abandonando o pressuposto de que somente os heterossexuais são sujeitos de direito, detentores de direito subjetivo. O princípio da igualdade formal exige, portanto, que se reconheça em todos, independente de orientação sexual, a qualidade de sujeito de direitos •. Nesta concepção, a igualdade decorre do respeito à diferença, protegendo a identidade do indivíduo homossexual.

O Direito a pensão por morte previsto no art. 201, I, da CF/88 para os planos de Previdência Social, estabelece: ‘‘o direito a pensão por morte do segurado, seja homem ou mulher, ao cônjuge ou ao companheiro e dependentes”. Ora, entende-se por companheiro aquele que convive em regime de união estável, não especificando se homem com mulher apenas, mas emprega o termo companheiro no sentido amplíssimo. O tratamento reducionista concedido à união homossexual, em face da previdência privada, é mais do que injustificável: É inconstitucional. A Constituição Federal ao consagrar a união estável como entidade familiar, não lhe conferiu uma posição inferior ao casamento, nem as leis infraconstitucionais estabeleceram qualquer hierarquização, ao contrário, explicaram os mesmos direitos. Então, sendo a união homossexual de fato, considerada como entidade familiar (ainda que não normatizada, mas reconhecida por jurisprudências), tendo o caráter de união estável, o retrocesso e a discriminação não se justificam, cabendo ao Judiciário reconhecer a inconstitucionalidade de tal desequiparação.

Por fim, conforme a própria citação no acórdão do Recurso Especial Nº. 1.026.981 – RJ: “O Direito não regula sentimentos, mas define relações com base neles geradas, não permitindo que a norma, que veda a discriminação de qualquer ordem (Art. 1º, IV), seja revestida de conteúdo discriminatório”. O Judiciário não pode fechar as portas e os olhos para as necessidades dos indivíduos, ignorando fatos sociais, mas deve estar preparado para atender as demandas surgidas na sociedade, ainda que estas ensejem complexidades e polêmicas, pois nenhuma sociedade pode ser declarada justa e civilizada, tão pouco um Estado pode ser declarado Democrático de Direitos em clima de desrespeito aos semelhantes.

UMA VISÃO CONSTITUCIONAL DA UNIÃO HOMOSSEXUAL

Ainda que inexistam leis específicas atribuídas, a união de fato entre indivíduos do mesmo sexo gera conseqüências jurídicas positivas. Hoje, após inúmeras lutas e movimentos sociais, a união entre pessoas do mesmo sexo tem reconhecimento tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência no que diz respeito ao patrimônio, a previdência, também a adoção (a mais recente das conquistas). Essas conseqüências são regidas pelos mesmos princípios gerais de direitos que amparam a sociedade de fato entre homem e mulher. Neste sentido, Weber observou que há direitos subjetivos criados por regulamentos públicos, no qual o indivíduo tem a possibilidade de recorrer a dispositivos constitucionais para garantir seus interesses .

Nos princípios fundamentais que regem a sociedade brasileira, contida nos primeiros artigos da Constituição Federal, estão as normas que protegem a dignidade da pessoa humana; a busca de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da marginalização dos indivíduos e a promoção do bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outra forma de discriminação. O Judiciário, especialmente o Supremo Tribunal de Justiça, assume uma posição avançada e evolutiva para as demandas envolvendo casais homossexuais. Conforme afirma Maria Berenice Dias, ao enfatizar que posturas pessoais ou convicções de ordem moral ou religiosa não devem impedir que se reconheça esta união, quer seja em relação à adoção, a previdência ou a qualquer outro direito, ainda que esta união seja formada por pessoas de sexos distintos ou não.

Busca-se através dessas situações que se apresentam a aplicação da analogia e dos princípios gerais do Direito, revelando sempre os princípios constitucionais da Dignidade da Pessoa Humana, da Igualdade, dos Direitos Humanos, contemplados em nossa Carta Magna, relativos ao art. 1°, III e 3º, IV e art. 4° II, pois a igualdade perante a lei é direito previsto no caput do artigo 5° da Constituição Federal. Esses dispositivos constitucionais são objetivos da República Federativa do Brasil, e não há como aceitar que uma parcela da sociedade seja excluída por sua opção sexual, configurando isto uma afronta aos preceitos fundamentais inscritos na Constituição Federal.

“Só garantindo a igualdade é que uma sociedade pluralista pode se compreender também como sociedade democrática. Consequentemente, só permitindo a inclusão de projetos de vida diversos em sociedade pluralista é que se pode se autocompreender como uma sociedade democrática” (GALUPO APUD ÁLVARO SOUZA CRUZ, 2002. p. 210).

A jurisprudência vem aprimorando e tornando efetivas as conquistas obtidas pelo Direito no espaço constitucional. As decisões judiciais vêm estabelecendo resultados ousados de interpretação, com o apoio em novos paradigmas de famílias, que não se resumem a famílias tradicionais ou monoparentais, mas as novas formas de famílias que correspondem aos anseios de respeito à dignidade de cada pessoa, agente ativo das relações sociais. Como exemplo, podemos falar em Direito de Família, referindo-se ao tratamento que a jurisprudência sempre deu às questões envolvendo o concubinato antes do advento das leis que disciplinam a união estável.

Conforme preceitua o artigo 126 do código de processo civil: “O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade na lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais, não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito”, ou seja, a ausência da lei não impedirá o julgamento da lide e, neste passo, daquelas intentadas por homossexuais, relativas a direito decorrente da união e constituição familiar. Destarte, cabe a jurisprudência a tarefa de preencher as lacunas existentes no texto do Código Civil, mas para que isso aconteça, é necessário, que o juiz não tenha medo de fazer justiça, nem punir com a invisibilidade as situações não contempladas na lei, conforme afirma Maria Berenice Dias: “O juiz precisa se conscientizar de sua função de agente da justiça. É ele quem está rente aos fatos e necessita ter sensibilidade para enfrentar sem medo e sem preconceito as questões que lhe são trazidas. A falta de lei não significa ausência de direito, e a igualdade é o reconhecimento das diferenças” (CONSULEX, ano VIII 2004 p. 10).

O acórdão do STJ/RJ, referente a pensão pós morte solicitada pelo parceiro homossexual, confere tratamento jurisprudencial, condenando condutas preconceituosas, discriminatórias e estigmatizantes, fundamentadas nos princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da liberdade, da autodeterminação, da intimidade, da não-discriminação, da solidariedade e da busca da felicidade, por se tratar de seres humanos, detentores de direitos e obrigações jurídicas. Neste sentido, o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo, enquanto família e tratada no âmbito do Direito de Família tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência, conduz a uma inevitável normatização do tema.

O significado de dignidade do homem é tanto indefinível quanto imensurável. Ser diferente não significa ser desigual, pois se assim fosse, todos seríamos tratados como desigualdade perante a lei e a sociedade. Dignidade é valor ético, cabendo ao Estado promover esta dignidade, não somente na criação de leis, mas na formulação de políticas públicas que possibilitem a vida com dignidade. Neste sentido o Direito necessita ser ambicioso para propiciar aos cidadãos o bem estar tão exaltado na Constituição, pois o Direito que se esquece de exprimir a cultura do povo, que marginaliza que fecha os olhos para a realidade, mascarando-a, é um Direito perverso, praticado em um Estado disfarçado de democrático.

As jurisprudências trazem consigo a lição de que a separação não funciona, de que não há outra saída senão integrar os indivíduos concedendo-lhes direitos iguais. E que expulsando, segregando, dividindo, significa acabar com nossa própria existência, com os ideais modernos de Direitos Humanos, com os princípios da Constituição que é a vontade soberana do povo, pois do povo emana.

A união homossexual é um fato social e jurídico, gerador de efeitos jurídicos, por configurar uma sociedade civil, ou mesmo, uma comunhão de vidas e interesses. As jurisprudências vêm buscando incansavelmente a garantia de direitos, quer seja de igualdade entre os sexos, da liberdade, da intimidade, da pluralidade familiar, do desenvolvimento da personalidade e, de maneira central, da dignidade da pessoa humana. Onde esses direitos dispostos na Constituição sejam considerados legais e suficientes para a concessão de efeitos jurídicos favoráveis as parcerias entre pessoas do mesmo sexo, para que estes cidadãos possam conviver familiarmente segundo o modelo que melhor retrate seus anseios individuais.

Garantir aqueles que têm convívio duradouro com seus parceiros, direitos como: união legal, herança, pensão, patrimônio, identidade, e porque não, adoção é ver de fato, a justiça sendo concretizada e a plenitude da democracia e da cidadania estabelecidas, respeitando a identidade de cada indivíduo .

Destarte, assistimos diariamente grupos sociais que conjugam esforços num mesmo trabalho, objetivando o bem estar de todos, demonstrando a solidariedade por semelhança que a sociedade tende a praticar com maior ênfase, buscando a concretização da alteridade entre os indivíduos, que é um dos caracteres da justiça, visto esta existir sempre em função de uma relação social, pois a justiça é algo que se refere ao ser humano (justitia est ad alterum). As leis não podem regular sentimentos humanos, impedindo que pessoas sejam privadas destes sob o argumento da não existência de normas que lhes permita o livre exercício de direitos. O amor, ainda que abstrato, transcende a quaisquer das leis humanas, seja entre uniões heterossexuais ou homossexuais. Reprovar casais homossexuais, discriminar suas relações, tratá-los enquanto diferentes, não condiz com o ideal de sociedade igualitária que buscamos, tão pouco é condizente com o sistema judiciário que, ao longo dos anos, busca concretizar o princípio da igualdade entre os homens.

Também ressaltamos que união homossexual está diretamente ligada ao direito à vida, o mais fundamental de todos os direitos, impondo-se a existência de todos os demais direitos, quando assegurado. Cabendo ao Estado assegurá-los na acepção do direito de continuar vivo, bem como na de se ter vida digna, quanto à subsistência. Subsistência, que segundo o Dicionário Aurélio (2001. p. 650), é o conjunto do que se precisa para sustentar a vida, estabilidade. Sendo a família o principal promotor desta subsistência, que não se define unicamente pela alimentação, moradia, conforto, mas pelo amor, pela afetividade, pelo companheirismo, cumplicidade, respeito, fatores comumente nas relações homossexuais.

O Direito enquanto fruto da sociedade tenta, aos poucos, se desvencilhar da visão etnocêntrica que o acompanhou e, ainda persiste no século XXI, quando já reconhece nas inúmeras decisões a legalização da união entre pessoas do mesmo sexo, concedendo-lhes direitos sucessórios, previdenciários e de maneira inédita, o de adoção. As leis e atos normativos devem ser criados de maneira igualitária, sem diferenciações em razão de classe social, religião, convicções políticas ou filosóficas e de sexo . Pois, se o legislador ao criar leis e o Judiciário ao aplicá-las, de forma não razoável ou arbitrária concede tratamento específico a pessoas diversas, fazendo distinção entre elas, a lei neste caso, estará produzindo a desigualdade.

Entretanto, é necessário, num Estado Democrático de Direitos, fundamentado na cidadania, na dignidade humana, na liberdade, na igualdade, enfrentar fatos como a união homossexual com alteridade, por se tratar de seres humanos iguais, de igual espécie e que apresentam características diferentes, como qualquer ser humano. Pois só haverá justiça de fato, quando efetivamente for reconhecido que a sociedade é formada de uma diversidade, que deverá ser respeitada a partir da individualidade de cada agente social. Para que o Brasil não permaneça no excesso de falta de humanidade, na abundância de inexistência de solidariedade e respeito e no exagero de escassez de direitos a todos os que permanecem marginalizados neste Estado Democrático de Direitos ainda limitados para alguns.

CONCLUSÃO

No trabalho apresentado, vimos que o legislador constituinte elevou à categoria de princípio fundamental da República, à dignidade da pessoa humana, tornando-o um dos pilares estruturais fundamentais da organização do Estado brasileiro, previsto no art. 1º, inciso III da Constituição de 1988. Recaindo sobre o Estado o dever da obrigatoriedade de respeitar, proteger e promover as condições que viabilizem a vida com dignidade em todos os seus aspectos, especialmente, o da constituição da família. Ainda que a dignidade da pessoa humana esteja no epicentro da ordem jurídica brasileira concebendo a valorização da pessoa humana como sendo razão fundamental para a estrutura de organização do Estado e para o Direito, cidadãos como os homossexuais, no que diz respeito à união estável, ainda vivem marginalizados quanto à legislação. Contudo, a Constituição de 1988 trouxe consigo a idéia de Direitos Humanos Fundamentais, baseados em princípios que visam atender a todos os indivíduos enquanto sujeitos de direitos e deveres na sociedade brasileira. Elevando como garantia individual e imprescindível, a dignidade da pessoa humana, a integridade psicofísica, a liberdade, a imagem, a intimidade, a honra, a vida, esta última a mais imprescindível.

Enquanto futuros agentes do Direito percebemos que muitos juízes ainda julgam as demandas relacionadas à união entre pessoas do mesmo sexo, segundo a visão religiosa, impondo muito mais sua concepção de certo ou errado, do que os princípios da Constituição, quando alegam ausência de amparo legal, permitindo que em alguns casos, muitos brasileiros busquem nos Direitos Humanos Internacionais a lei para lhes conceder seus direitos e atender seus anseios, posto que a lei brasileira lhes marginaliza, negando-lhes o direito. Por quanto sabemos as leis não podem convencionar os sentimentos alheios, pois estes são pessoalíssimos. Impor condutas de formas de amar, determinar conceitos de família, do que seria um casal, uma união, é emascular a dignidade do homem, no seu sentido mais profundo. É privá-lo do direito da vida - vida que a Constituição, os Direitos Humanos preservam mais que tudo-, quando lhe é negado o direito de ser o que realmente é, o direito de viver em consonância com seus sentimentos, seus desejos. É tentar tirar do ser humano sua essência, a essência de ser você mesmo, ainda que não conforme o convencionado. Renegar estas relações e discriminá-la ao ponto de cercear direitos, ceifar vidas, é renegar o próprio significado do que é ser humano, que é muito mais que ter um cérebro altamente desenvolvido, com inúmeras capacidades como o raciocínio abstrato, a linguagem, a introspecção e a resolução de problemas. É, sobretudo reconhecer e respeitar o diferente, porque todos somos inegalvelmente diferentes. E o Estado não pode se eximir de fazer prevalecer o direito individual de cada um, de promover as garantias constitucionais, o bem comum e a justiça.

Que o presente texto acadêmico frutifique o ideal de Direitos Humanos, Igualdade e Dignidade da Pessoa Humana, sua função primordial. E que nossos conhecimentos sejam somados ao objetivo de comprometimento na construção de uma sociedade brasileira e amazônica menos preconceituosa, mais humana, igualitária, com menor índice de violência (não somente a física, mas a psicológica) e discriminação, especialmente aquelas ligadas ao amor e a sexualidade, vivenciada por mulheres, homens, independente de sua orientação sexual. Pois o que torna o homem grandioso é, exatamente, ser diferente, fazer diferente, sendo único, singular em um mundo de cores, sabores, culturas, religiões e pessoas que constituem a vida, que dão existência ao Direito e a tudo o que há de criação humana. Que nos torna não superiores a nenhum um outro ser humano, nem inferiores, tão pouco desiguais ou diferentes, mas humanos. Humanos que se fazem diferentes, quando buscam e constroem uma sociedade com igualdade social e dignidade para todos.

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APÊNDICE

Entrevista com o Jurista Zeno Veloso concedida ao grupo de alunos da turma 2DIV2 do Curso de Direito da Universidade da Amazônia – Unama.

Alunos: Qual sua concepção de Direito de Família e como o Senhor Entende este direito segundo a realidade em que vivemos?

Zeno Veloso: Minha concepção já começa na expressão Direito de Família, estou seguindo uma posição do Instituto brasileiro de Direito das Famílias - IBDFAM do qual sou membro e que está aberto para a política brasileira e que gosta muito de receber estudantes, que podem trabalhar conosco como auxiliares ou membros. Nós estamos usando uma expressão de Direito de Família, para mostrar a pluralidade desse relacionamento sem nenhuma exclusão, limitação ou restrição, aceitando todas as formas em que esse relacionamento se apresenta na sociedade moderna e como evoluiu nos últimos 50 anos, de maneira extraordinária. Antes só tinha uma forma legítima que seria merecedora de apoio e respeito, pode-se dizer de atenção, de cuidado, de proteção, que era a família constituída pelo casamento. Entretanto as alterações foram fantásticas, especialmente em 77, no Brasil, com a lei do divórcio, em 88 com a Constituição houve uma virada de Copérnico, uma alteração extraordinária e hoje nós temos famílias das mais diversas, todas dignas, todas respeitadas, cada qual obedecendo a sua tendência, inclusive a sua orientação sexual, como é o caso das famílias, que assim considero formadas por pessoas do mesmo sexo. Minha posição dentro do Direito de Família é uma posição avançada, democrática, libertária, acho que esses conceitos da constituição devem ser trazidos para o Direito de Família, nós temos hoje que pensar no Direito de Família com a Constituição Federal ou como alguns querem a constitucionalização do Direito de Família ou como eu prefiro, a Civilização da Constituição, seja por um caminho, seja por outro, o especialista em direito de família, hoje, tem que trabalhar com a Constituição Federal.

Alunos: O senhor é contra ou favorável a legalização da união homossexual, com os mesmos direitos de sucessão, previdência, adoção e demais direitos que envolvem hoje os casais heterossexuais?

Zeno Veloso: O legislador está sempre atrasado, no Direito de Família Brasileiro. Esteve atrasado em relação à mulher, esteve atrasado em relação aos filhos, está atrasado com relação a essas novas manifestações no Direito de Família, essas novas formas de família. O Brasil foi o último país, praticamente do mundo, a abolir a escravatura negra, foi um dos últimos a ter o divórcio. Deve ser um dos últimos a ter regulada a união civil entre homossexuais, não estou falando em casamento, casamento já existe, por incrível que pareça, comparando com as sociedades em Portugal que foi votada uma lei pela Assembléia da República prevendo o próprio casamento. O legislador tem sido muito omisso. Em ano eleitoral, agora é que não sai nada desse tipo. O Projeto de anos, seis anos, da Marta Suplicy não andou, não prosperou. Entretanto, quem tem tomado esse espaço de legislador, como já tomou outrora, desde Roma já tomou a figura dos pretores, quem tomou esse espaço foi o Judiciário. Alguns falam em ativismo judicial, mas não é bem isso, é a preguiça do outro lado, é o desinteresse, é a falta de atenção, é a falta de visão histórica e social.

A ausência do Legislativo no Brasil é algo terrível! Ainda estão omissos, mormente num ponto como este que gera muita polêmica e que envolve questões morais e religiosas. A chamada bancada evangélica, com o devido respeito, já disse que não vota esse assunto, que não vai deixar entrar esse assunto, é dito abertamente, então, todo mundo sabe que essa bancada a qual se junta para esse efeito a dos católicos praticantes que seguem a linha do Papa, a mesma ortodoxia Romana, esses também se juntam na questão da proibição do aborto, aborto não, não envolvo junto com os outros problemas, porque eu tenho uma posição bastante fechada com relação a isso, contra isso. Agora esses outros assuntos eu sou normalmente a favor de que se deveria fazer uma legislação para regular essa matéria, nós temos aí uma minoria, mas que é expressiva, talvez 10% dos brasileiros tem essa orientação da qual não podem escapar, não é algo que se escolha, não é algo que se tenta uma opção, uma alternativa, jogada na base do Flamengo, Fluminense, São Paulo, Palmeiras, Remo ou Paissandu, não é bem isso, a pessoa é ou não é, pode estar revelando posteriormente. Ou quer enganar a si próprio engolindo a tendência, mas, é inevitável, inexorável.

Alunos: O senhor enquanto jurista acredita que o legislador irá atender aos anseios da sociedade no sentido da criação de lei específica ou mudança no direito de família que atenda a união homossexual, assim como aconteceu com o concubinato?

Zeno Veloso: Acho que o legislador devia entender isso, porém, diante dá inércia dele, tem tomado espaço, como aconteceu com as mulheres desse país e, como aconteceu com as uniões estáveis que eram chamadas de “concubinato”, como o que aconteceu com os filhos, com um pedido de socorro na falta, na ausência do legislador é o Judiciário. Nós temos direitos hoje, muito mais direitos na “união homoafetiva”, como diz a minha queridíssima Maria Berenice Dias, do que em Portugal, embora lá tenha uma lei que regula a união de fato, como chamam lá e, já tem uma outra... eu não tenho absoluta certeza se já foi sancionada, promulgada, mas o Tribunal Constitucional de Portugal já deu sinal verde para esta promulgação. É o que seria a nossa sanção, considerando que a lei é Constitucional e, é válida, portanto se for sancionada. Entretanto, no Brasil onde não há lei, nem tão cedo creio que haverá, a nossa jurisprudência é mais avançada do que a legislação portuguesa. Só não temos hoje, praticamente, o casamento, o resto já temos.

Alunos: O senhor acredita que a sociedade está preparada para entender as diferenças e respeitar esta nova forma de família, a união homossexual?

Zeno Veloso: É uma questão mais social, sociológica, acredito. Esse negócio de “sociedade tá preparada”... Se colocarem a sociedade para votarem em pena de morte, tá votada imediatamente a pena de morte... Se colocar a sociedade para fechar o congresso nacional, o congresso nacional tá fechado amanhã... Se colocar a sociedade para votar em quem vai para a copa, no mínimo iria o Neymar e Ganso, de maneira que eu tenho minhas dúvidas enquanto a essas... Foi a mesma sociedade que mandou crucificar Jesus Cristo. Colocar para votar, fica meio complicado... Eu tenho minhas dúvidas quanto esse consenso. Uma sociedade tão dividida como a nossa, sobre tudo, dividida culturalmente. Uma sociedade analfabeta, de atrasados, de gente que... Basta você vê quem é que essa sociedade elege como seus representantes. Ah, o congresso é terrível! O congresso não é terrível, o congresso é exatamente o retrato da sociedade brasileira... A Assembléia Legislativa do Pará é um retrato da sociedade brasileira, os Deputados Federais que são votados aqui, não quero citar nomes, são retratos da sociedade paraense, isso não tem muito jeito... Agora, não tem havido nenhum movimento popular ao que eu fui informado, na frente dos Tribunais Superiores, nem dos Tribunais Estaduais, contra os avanços das jurisprudências com relação à questão das uniões homoafetivas. Há um ranço, sem dúvida, há um preconceito , quem dera que não houvesse, creio que grande número de pessoas na sociedade brasileira não querem nem ouvir falar nisso, porque não sabem direito o que é e, confundem às vezes uma união homossexual com um comportamento um tanto quanto, escandaloso com um travesti, ou coisa parecida... Não estou denegrindo aqui o travesti, mas, esse comportamento as vezes choca.

De um modo geral, as jurisprudências tem dado resultados, tem apresentado soluções e, tem sido cumprida e acabou a conversa, previdência social, seguros de saúde. Uma coisa que eu não vi acontecer foi usar o nome do companheiro. Isso nas uniões heterossexuais ainda não teve avanço significativo, eu também sou um pouco “analfabeto”, mas aquele pior que eu, é o que não aceita a extensão do problema, ele me devolveu dizendo que o assessor dizia que era até inconstitucional... Quando na verdade, já temos até uma regra nesse sentido no Brasil, a lei do divórcio, apenas essa lei perdeu o sentido na norma que estava vinculada ao tempo, acho que seria viável termos uma lei dizendo que o companheiro poderá mais ela do que ele. Pela nossa reflexão acrescentar aos seus o sobrenome do companheiro, talvez com um mero requerimento ao juiz que já use aquele nome, como algumas mulheres já fazem na prática, quando já usam o nome. Então sintetizando, eu acho que a sociedade brasileira está preparada, tanto assim que estão havendo as decisões, os avanços acontecem na vista de todos.

A imprensa inteira mencionou um mês a autorização para que a adoção de duas crianças fosse feita lá de Bagé do Rio Grande do Sul, não vi nenhuma revolta, claro que uma ou outra pessoa fala ao contrário, inclusive um amigo meu disse: “Ah, mas que coisa horrível isso! Você fica falando esse assunto, “você parece que tá virando”... assim que eles falam pra mim. É quem sabe! Eu digo... eu não dou muita bola, mais olham com certo ranço, com certo preconceito, algo que está estabelecido há séculos, há milênios e não vai mudar de repente, como já houve com relação à mulher solteira, a mulher que tinha filho sem estar casada ou o filho que não fosse de matrimônio.

Nós estamos vencendo etapas na sociedade, hoje praticamente só sobra aqui ranço e preconceito. Quando digo só sobra isso, na maioria falando, tem um amigo meu, ex- deputado que disse, se eu voltar para Brasília como deputado, meu primeiro projeto será de emenda constitucional, extinguindo o divórcio no Brasil, podem crer, alias ele não pede segredo e, é muito ligado a igreja, seu primeiro projeto a ser apresentado no mesmo dia de posse. Imaginem um país sem divórcio depois da luta que tivemos para estabelecer o divórcio? Porque ele acha indissolúvel, porque assim falou Deus, nosso senhor Jesus Cristo, “o que Deus uniu, o homem não deve separar”. Tem sua base nisso, é questão de formação. Eu não tiro os direitos dele. Uma vez aqui eu falei sobre a questão da adoção e um bispo me contestou, aí a briga começou, a briga com um debate, mas quando que eu ia debater com um bispo! Deixei-o falando e fiquei na minha, até porque eu concordo com tudo que ele disse , mas ele não disse tudo quando eu falei como jurista... Como católico acho que ele está certo, se é que vocês me compreendem, eu sou católico, não vou contestar o bispo porque acho que ele está certo. Mas ele não estava contestando o senhor, ele tava contestando o jurista com argumentos católicos, os argumentos podem ser aceitos.

Notas:

CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. O Direito a Diferença: as ações afirmativas como mecanismo de inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e pessoas portadoras de deficiência. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. Cap. V. p. 93-105.

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Ver apêndice.

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Este texto é fruto do trabalho interdisciplinar dos alunos do curso de Direito da Universidade da Amazônia - Belém/Pa.

Ana Luiza Farias Costa

Anne Veloso Monteiro

Antonio Ramon F. Rodrigues

Denize Maria H. Menezes

Evandro Augusto A. da Rocha

Anne Monteiro
Enviado por Anne Monteiro em 13/05/2011
Reeditado em 19/07/2012
Código do texto: T2968350
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