Embargos de Terceiro

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Araçatuba (SP).

Distribuição por dependência

Autos do Processo 032.01.2002.013258-5

Ordem nº 2770/2002.

J... F.. P.. F..., brasileiro, casado, comerciante, portadora da Cédula de Identidade nº 000.000 (SSP/TO), inscrito no CPF/MF sob nº 000.000.000-00, residente e domiciliado na cidade de Palmas, capital do Estado de Tocantins, na A.., conjunto , LOTE.., ALAMEDA .., por intermédio de seu advogado e procurador que esta subscreve, vem, com fundamento e na forma prevista nos artigos 1.046 a 1.054, do Código de Processo Civil, opor os presentes

EMBARGOS DE TERCEIRO

em face de V .... L... S...., já qualificada nos autos acima epigrafados - Ação de Execução nº 0000/2002, em trâmite perante esta 1ª Vara Cível da comarca de Araçatuba, promovida pela Embargada em face de C... R... S,,,,, ambos qualificados nos autos do processo em referência, consoante as razões de fato e de direito a seguir aduzidas:

I. DO CABIMENTO

1. Os Embargos de Terceiro ora opostos encontram fundamento nos artigos 1.046 a 1.054, do Código de Processo Civil.

2. O ora Embargante é terceiro que não integra o pólo passivo da Ação de Execução promovida pela Embargada, mas teve seu imóvel penhorado judicialmente para a satisfação de crédito em execução, cuja integral e exclusiva responsabilidade pelo pagamento é do Executado C.... R... S..., conforme prova com a juntada das inclusas peças extraídas dos autos da execução.

3. Dessa forma, tratando-se de ação de execução na qual o Embargante está sendo turbado na propriedade e posse que exerce sobre o imóvel penhorado, são cabíveis os Embargos de Terceiro, conforme indica a mais abalizada doutrina (grifos nossos):

No caso, trata-se de uma ação, procedimento especial de jurisdição contenciosa, que tem por finalidade a proteção da posse ou a propriedade daquele que, não tendo sido parte no feito, tem um bem de que é proprietário ou possuidor, apreendido por ato judicial originário de processo que não foi parte.

No direito pátrio, os embargos de terceiro visam a proteger tanto a propriedade como a posse e podem fundamentar-se quer em direito real quer em direito pessoal, dando lugar apenas a uma cognição sumária sobre a legitimidade ou não da apreensão judicial. grifamos

g) Embargos de terceiro senhor e possuidor, pelo artigo 1.046 e §1º do Código de Processo Civil, é o processo acessório que visa defender os bens daqueles que, não sendo parte numa demanda, sofrem turbação ou esbulho em sua posse, ou direito, por efeito de penhora, depósito, arresto, seqüestro, venda judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, partilha ou outro ato de apreensão judicial.

II. DOS FATOS

4. O Embargante J... F... é comerciante na cidade de Palmas (TO) e adquiriu, em data de 17 de março de 2008, através do Contrato de Cessão e Subrogação de direitos e obrigações sobre imóvel, de C... R..., om imóvel assim constituído: “lote urbano de nº 01, da quadra ARSE-00, CONJUNTO QI, do Loteamento Palmas, pelo valor de R$ 62.000,00 (sessenta e dois mil reais), conforme faz prova com a juntada da cópia do Instrumento.

5. Insta salientar que, pelas peculiaridades dos imóveis na capital do Estado do Tocantins, foi impossível, à época da compra, proceder a qualquer registro de escritura ou mesmo averbação em matrícula, tendo em vista tratar-se de imóvel ainda não regularizado, conforme, aliás, podemos verificar na própria Certidão do Sr. Oficial de Justiça (fls. 537 – dos autos da Execução). Convém salientar ainda que o Embargante, à época da transação, diligenciou e tomou todas as cautelas de praxe, sendo que não havia qualquer processo em andamento na comarca em que reside o vendedor, que é também o local da situação do imóvel.

6. Destarte, o Embargante é, e sempre foi, desde a data de 17 de março de 2008, senhor e legítimo possuidor do imóvel localizado na ARSE-00, CONJUNTO 00, LOTE 0 DO LOTEAMENTO PALMAS, conforme faz prova com a juntada do incluso contrato de cessão.

07. Ocorre que, em 06 de julho de 2010, foi penhorado o imóvel de propriedade do Embargante, conforme certidão de fls. 537.

6. A violência sofrida pelo Embargante é evidente, razão por que não participa, em hipótese alguma, da menciona execução, portanto, os presentes embargos são cabíveis para excluir da penhora o referido bem, considerando-se, também, que o executado possui outros bens competentes para garantir dita execução.

7. A cessão ao embargante se deu em 17 de março de 2008, bem antes da penhora que foi lavrada sobre o imóvel, somente em 6 de julho de 2010, demonstrando ser ele compromissário comprador de boa-fé. Assim, com a edição da Súmula n° 841 do Superior Tribunal de Justiça, abrandando o conteúdo da Súmula n° 621 do Supremo Tribunal Federal, o compromisso de compra e venda, e no presente caso, a cessão de direitos sobre o bem, ainda que desprovido de registro, torna admissível a oposição dos embargos de terceiro. Portanto, legítima e de boa-fé a posse exercida pelo embargante.

Para que se configure a fraude à execução, não existindo penhora sobre o bem, é necessária a prova do concilium fraudis, ou qualquer outro elemento indicativo de que pudesse o adquirente do imóvel ter ciência de que o bem estava a garantir o pagamento da dívida existente

DA AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS DA FRAUDE À EXECUÇÃO:

7. A caracterização da fraude à execução decorre da lei processual civil, consoante artigo 593 do CPC:

“Art. 539. Considera-se em fraude de execução a alienação ou oneração de bens:

(...)

II – quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência;

(..)”

8. Ora, no caso em tela, tais pressupostos não se verificam. Basta a constatação de que a presente execução foi iniciada em 2009 e que a venda ocorreu em 2008, quando sequer havia sido iniciada contra o devedor, a presente execução.

9. Sobre essa questão, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 375: “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.

Não há nos autos provas de que o adquirente do imóvel tinha ciência do ajuizamento da ação de execução, pois sequer havia se iniciado a fase de execução do processo, existia apenas e tão somente uma expectativa de direito por parte da Autora, ora Embargada, não recaindo nenhuma constrição sobre o bem, não há como reconhecer que a alienação se deu em fraude à execução. Para que se configure a fraude à execução, não existindo penhora sobre o bem, é necessária a prova do concilium fraudis, ou qualquer outro elemento indicativo de que pudesse o adquirente do imóvel ter ciência de que o bem estava a garantir o pagamento da dívida existente

10. Já é pacífico em nossos Tribunais que, para caracterizar fraude à execução é requisito essencial que o devedor, pessoa física, esteja figurando no pólo passivo da demanda, na fase da execução. Nesse entendimento, o julgado abaixo:

VOTO Nº: 24834

APEL.Nº: 0010091-81.2000.8.26.0348

COMARCA: MAUÁ

APTE. : UNIBANCO UNIÃO DE BANCOS BRASILEIROS S/A

APDO. : RUBENS MISUTIO KONDO (E SUA MULHER)

EMBARGOS DE TERCEIRO Penhora de imóvel em execução Aquisição do bem, antes da citação -Reconhecimento de legalidade na transação Fraude à execução Inocorrência Atuação de má-fé dos adquirentes não demonstrada Súmula 375, do STJ.

Ainda neste sentido:

REsp 739388 . PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA DE BEM ALIENADO A TERCEIRO DE BOA-FÉ. AUSÊNCIA DE TRANSCRIÇÃO DO TÍTULO NO REGISTRO DE IMÓVEIS. 1. Alienação de bem imóvel pendente execução fiscal. A novel exigência do registro da penhora, muito embora não produza efeitos infirmadores da regra prior in tempore prior in jure, exsurgiu com o escopo de conferir à mesma efeitos erga omnes para o fim de caracterizar a fraude à execução. 2. Deveras, à luz do art. 530 do Código Civil sobressai claro que a lei reclama o registro dos títulos translativos da propriedade imóvel por ato inter vivos, onerosos ou gratuitos, posto que os negócios jurídicos em nosso ordenamento jurídico, não são hábeis a transferir o domínio do bem. Assim, titular do direito é aquele em cujo nome está transcrita a propriedade imobiliária. 3. Todavia, a jurisprudência do STJ, sobrepujando a questão de fundo sobre a questão da forma, como técnica de realização da justiça, vem conferindo interpretação finalística à Lei de Registros Publicos . Assim é que foi editada a Súmula 84 , com a seguinte redação:"É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro". 4."O CTN nem o CPC , em face da execução, não estabelecem a indisponibilidade de bem alforriado de constrição judicial. A pré-existência de dívida inscrita ou de execução, por si, não constitui ônus 'erga omnes', efeito decorrente da publicidade do registro público. Para a demonstração do 'consilium' 'fraudis' não basta o ajuizamento da ação. A demonstração de má-fé, pressupõe ato de efetiva citação ou de constrição judicial ou de atos repersecutórios vinculados a imóvel, para que as modificações na ordem patrimonial configurem a fraude. Validade da alienação a terceiro que adquiriu o bem sem conhecimento de constrição já que nenhum ônus foi dado à publicidade. Os precedentes desta Corte não consideram fraude de execução a alienação ocorrida antes da citação do executado alienante. (EREsp nº 31321/SP , Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 16/11/1999) 5. Aquele que não adquire do penhorado não fica sujeito à fraude in re ipsa, senão pelo conhecimento erga omnes produzido pelo registro da penhora. Sobre o tema, sustentamos: "Hodiernamente, a lei exige o registro da penhora, quando imóvel o bem transcrito. A novel exigência visa à proteção do terceiro de boa-fé, e não é ato essencial à formalização da constrição judicial; por isso o registro não cria prioridade na fase de pagamento. Entretanto, a moderna exigência do registro altera a tradicional concepção d a fraude de execução; razão pela qual, somente a alienação posterior ao registro é que caracteriza a figura em exame. Trata-se de uma execução criada pela própria lei, sem que se possa argumentar que a execução em si seja uma demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência e, por isso, a hipótese estaria enquadrada no inciso II do art. 593 do CPC . A referida exegese esbarraria na inequívoca ratio legis que exsurgiu com o nítido objetivo de proteger terceiros adquirentes. Assim, não se pode mais afirmar que quem compra do penhorado o faz em fraude de execução. 'É preciso verificar se a aquisição precedeu ou sucedeu o registro da penhora '. Neste passo, a reforma consagrou, no nosso sistema, aquilo que de há muito se preconiza nos nossos matizes europeus." (Curso de Direito Processual Civil, Luiz Fux, 2ª Ed., pp. 1298/1299), 6. Precedentes: Resp 638664/PR , deste Relator, publicado no DJ: 02.05.2005; REsp 791104/PR , Relator Ministro JOSÉ DELGADO, pu blicado no DJ 06.02.2006; REsp 665451/ CE Relator Ministro CASTRO MEIRA DJ 07.11.2005, Resp 468.718 , Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 15/04/2003; AGA 448332 / RS , Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJ de 21/10/2002; Resp 171.259/SP , Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ 11/03/2002. 7. In casu, além de não ter sido registrada, a penhora efetivou-se em 05/11/99, ou seja, após a alienação do imóvel pelos executados, realizada em 20/04/99, devidamente registrada no Cartório de Imóveis (fls. 09) data em que não havia qualquer ônus sobre a matrícula do imóvel. Deveras, a citação de um dos executados, ocorreu em 25/03/99, sem contudo, ter ocorrido a convocação do outro executado. 8. Recurso especial provido."

11. Há que se levar em conta, como princípio basilar do direito, a segurança jurídica: as leis não retroagem em prejuízo da coisa julgada, do direito adquirido e do ato jurídico perfeito, considerando-se também a boa fé do adquirente, que tem a segurança da transação respaldada em lei.

12. Enfatiza-se, mais uma vez, que sequer havia sido iniciada a execução contra o vendedor do imóvel, quando o embargante adquiriu o imóvel, conforme já demonstrado. Não há pois, que se falar em fraude a execução.

13. Deste modo, nos termos do artigo 1.046, do Código de Processo Civil, resta evidente que o Embargante não é parte no processo e mesmo assim está sofrendo esbulho indevido na posse de seu bem.

14. Há que se destacar que, na remota hipótese de prevalecer a penhora que recaiu sobre o imóvel em tela, o que se admite apenas por amor ao argumento e oportunidade de defesa, estar-se-á renegando o princípio da dignidade da pessoa humana, que encontra previsão no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal.

15. Mas não é só. O esbulho que ora se perpetra em face do bem de propriedade e posse do Embargante nada mais é do que uma violação ao Direito de Propriedade, conforme destaca ALEXANDRE DE MORAES :

Toda pessoa, física ou jurídica, tem direito à propriedade, podendo o ordenamento jurídico estabelecer suas modalidades de aquisição, perda, uso e limites. O direito de propriedade, constitucionalmente consagrado, garante que dela ninguém poderá ser privado arbitrariamente, pois somente a necessidade ou utilidade pública ou interesse social permitirão a desapropriação.

16. Diante de todas essas premissas e, principalmente, mercê da súmula 375 do Superior Tribunal de Justiça, deve ser determinada a desconstituição da penhora realizada no imóvel acima descrito, de propriedade e posse do Embargante, bem como suspensas eventuais hastas públicas designadas para sua alienação.

IV. CONCLUSÃO

17. Diante de tudo o que foi acima exposto, é lícito concluir que não pode ser mantida a determinação de penhora do imóvel do Embargante, executado na ação em comento, tampouco o bem em cotejo pode ser levado à praça para alienação, uma vez que: (i) originária de execução judicial na qual o Embargante não figura como devedor, não têm responsabilidade patrimonial e não participara do processo que a constituiu.

V. DO PEDIDO

18. Em face do exposto, requer o Embargante:

a) o recebimento dos presentes Embargos de Terceiro, SUSPENDENDO-SE o andamento do curso do processo principal com relação ao bem penhorado e descrito retro, especialmente suspendendo eventuais hastas públicas designadas para a alienação do imóvel objeto destes embargos, com fundamento no artigo 1.052, do Código de Processo Civil; e

b) que os presentes Embargos de Terceiro sejam, ao final, julgados PROCEDENTES, determinando-se, por conseqüência, a desconstituição da penhora que recai sobre o imóvel constrito, com a condenação da Embargada nos ônus da sucumbência.

19. Para tanto, requer a Embargante a citação da Embargada no endereço constante do preâmbulo da presente, para apresentar, caso assim queira, contestação no prazo estabelecido no artigo 1.053, do Código de Processo Civil.

20. Requer, ainda, a produção de todo o gênero de provas em direito permitidas, especialmente a oitiva de testemunhas e a juntada de novos documentos.

21. Dá-se à causa o valor de R$ 10.000,00, correspondente ao valor venal do imóvel.

Termos em que,

Pedem deferimento.

Araçatuba, 12 de abril de 2011.

Advogado