Solução de conflitos nos Juizados Especiais

DIREITO & JUSTIÇA

Solução de conflitos nos Juizados Especiais

A tarefa do conciliador será, sempre, adubar as sementes da solidariedade, da justiça e da paz

A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988, prevê na norma do artigo 98, inciso I, a criação, pelos estados e pela União, de Juizados Especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis no valor de até 40 salários mínimos e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante procedimentos oral e sumaríssimo.

Sete anos depois da promulgação da Constituição Federal, sobreveio a Lei Federal nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, dispondo sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais nos Estados. O objetivo é a conciliação, na área cível, ou a transação penal, na criminal, a fim de se buscar, sempre, o acordo ou o consenso das partes. Portanto, o ato de conciliar pretende a harmonização dos litigantes ou pessoas, mediante acordo homologado pelo juiz.

Nesse sentido, se permitiu a participação de uma terceira pessoa, cuja função intitula-se de Conciliador – bacharel em direito ou não – na solução de conflitos. Exerce fundamental papel, pois seu desempenho conciliatório resulta, muitas vezes, na composição amigável da demanda.

Lembro, a propósito da expressão “conciliador”, o que afirma o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa: “Propenso a conciliar ânimos, opiniões; conciliante, conciliativo; homem conciliador, é ele que resolve os dissídios em família”.

Além de não haver necessidade de conhecimentos técnicos em direito, a função exige tendência conciliatória e elevado interesse pelo fascinante instituto da conciliação. Este auxiliar, no caso da Justiça, precisa entender a relevância de sua função.

Na prática, embora pareça tarefa simples, não o é, pois o conciliador é o primeiro juiz da causa. O conciliador que se empenha, na atividade, terá o encargo de conter o animus das partes, às vezes alterados. Conduzirá o ato processual, explicará o procedimento, provocará o diálogo, a fim de se obter a solução do conflito.

Nos Juizados Especiais, exercer a conciliação requer imparcialidade. A compreensão também é importante, e para obtê-la é necessário ouvir as partes. Sobretudo manter-se concentrado, de modo a tornar-se exemplo para que os envolvidos no conflito saibam como ouvir uns aos outros. Permitir às partes exporem os fatos, mediante justificativa do seu comportamento. Esta oportunidade franqueará um acordo que, outrora impossível, torna-se viável.

Importante listarmos as vantagens da conciliação: possibilita soluções criativas; deixa nas mãos das partes a decisão; não admite a ruptura entre os litigantes; permite uma relação de proximidade entre as partes e a Justiça; favorece a economia e celeridade processual; viabliza a reconciliação entre inimigos minimizando a tensão social; ameniza o inconformismo da parte vencida e, principalmente, que o litígio permaneça em estado latente; é excelente alternativa da pacificação social; evita a sentença, considerada solução imposta e, fundamentalmente, impede a sobrecarga nos tribunais.

O recrutamento de conciliadores, para os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, está previsto na norma do artigo 7º, da Lei n 9.099/95. Devem ser escolhidos, preferencialmente, entre bacharéis em direito, portanto, nada impede que estagiários de direito aprovados com critérios previamente estabelecidos exerçam esta função. Em diversas audiências também atuam graduandos nos cursos de psicologia e serviço social. Há, para tanto, entre o Tribunal de Justiça do Estado de Minas e algumas Universidades, convênios com a finalidade de cooperação técnico-didática na área de estágio supervisionado.

Aliás, essa experiência beneficia ambas as partes: o estagiário exercita a prática de teorias aprendidas por muitos semestres na faculdade e tem ainda a oportunidade de conviver e aprender diretamente com juízes, escrivães, funcionários das secretarias de juízo e advogados, além das partes que atuam na disputa; para o Juizado Especial, é a oportunidade de colher novas idéias, fôlego, dedicação e disposição para o auxílio na prestação jurisdicional de qualidade e com mais eficiência.

O Conselho Nacional de Justiça, em recente enunciado administrativo, também aprimora a atuação do bacharel em direito na função de conciliador, ao considerar atividade jurídica o exercício como juiz leigo ou conciliador no Sistema dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, desde que não inferior a 16 horas mensais.

Portanto, sem empenho do conciliador, dificilmente o resultado obtido será um acordo. As principais qualidades, naturalmente, são: ter boa comunicação; saber ouvir; perceber a comunicação não-verbal; ser empático; aceitar as diferenças; possuir equilíbrio emocional e preparar-se para a audiência. Mas o empenho e as qualidades do conciliador não podem significar forçar as partes contra sua vontade, em situações, às vezes, constrangedoras.

A tarefa do conciliador será, sempre, adubar as sementes da solidariedade, da justiça e da paz. E, para isso, é fundamental haver sintonia com a missão e com os valores defendidos pelo Juizado Especial de Minas e de outros estados do país.

Não é à toa que o Conselho Nacional de Justiça, sob a liderança da ministra Ellen Gracie Northfleet, presidente do Supremo Tribunal Federal, defende a conciliação como uma das prioridades para a Justiça brasileira. Em movimento nacional, lançado dia 8 de dezembro do ano passado, o CNJ divulgou a campanha “Conciliar é legal”, slogan que vai permear diversas ações com foco na solução de conflitos já distribuídos ou não nos Juizados Especiais e nas varas Cíveis e de Família da 1ª Instância, além daqueles sob a responsabilidade dos informais Juizados de Conciliação.

Minas Gerais novamente serve de exemplo para o país. Como bem disse o desembargador Orlando Carvalho, presidente do Tribunal de Justiça do Estado: “Minas está construindo sua própria história de promoção da cultura da paz, por meio da conciliação. Conciliar é legal e faz bem. Nossos Juizados Especiais são exemplos disso”.

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Adriano da Silva Ribeiro - Assessor judiciário do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e membro associado do Instituto de Hermenêutica Jurídica

Fonte: Jornal Estado de Minas – Caderno Direito & Justiça -08/01/2007

Adriano Ribeiro
Enviado por Adriano Ribeiro em 12/01/2007
Código do texto: T344953