Servidões

O presente artigo comenta sobre o direito real das servidões e a nova sistemática do novo codex civil.

O fundamento ontológico das servidões vem bem demonstrado por Lafayette e por De Page onde por mais equipado que seja prédio para as necessidades de seu proprietário, nasce há imperiosa utilidade de se constituir direitos de uns prédios que servem aos outros.

Espínola há ainda esclarece que apesar das servidões definir-se como restrições ao direito do proprietário, elas resultam da conveniência do comércio social.

Servidão portanto era encargo que suporta um prédio denominado serviente, em benefício de outro prédio, chamado dominante, conferiam no outro titular o uso e o gozo de direito ou faculdade.

Na boa síntese de Gierke e de Martin Wolff é um direito real de gozo e fruição da coisa alheia limitado e imediato.

As servidões prediais ou as propriamente ditas são distintas da servidões pessoais que são propriamente direitos de crédito.

É importante também ressaltar a distinção entre servidões e restrições legais ao uso e gozo da propriedade estas, nascidas do direito de vizinhança.

E são impropriamente denominadas de “servidões legais” constituídas pelo legislador no propósito de instituir a harmonia entre vizinhos e compor os seus conflitos.

As servidões legais surgem por imperativo da lei, ao passo que as servidões são encargos que um prédio sofre em favor de outro, de forma a melhorar o aproveitamento ou utilização do beneficiado. As servidões enquanto direito real partem de um ato de vontade quase sempre e só eventualmente vão se implantar na lei ou na sentença.

E possuem por objeto coisa e imóvel corpórea , ou seja, prédios. Não há servidão sobre direitos.

Entre elementos caracterizadores das servidões estão:

a) os prédios devem pertencer a proprietários distintos.

b) os prédios devem ser confinantes (ou vizinhos) mas tal característica não é obrigatória em face de certas servidões, como por exemplo, os aquedutos.

Tal proximidade fará com que a servidão seja exercida com efetiva utilidade. Porém, não se exige o conceito de confrontantes.

A servidão grava um dos prédios ( o serviente) e o acompanhará em seu registro imobiliário. O sujeito de direito da servidão enquanto direito real é sempre o homem ( aliás o direito é constituído em função do homem sempre).

Conteúdo da servidão poderá ser uma ação humana, ou num facere e também um non facere (abstenção), e obviamente gera tanto direitos como deveres.

Classicamente se classificava as servidões em rústicas ou urbanas conforme visassem prédios rurais ou urbanos, tal distinção de pouca praticidade caiu em desuso.

Por servidões positivas ou afirmativas são as que consistam num poder ou faculdade que goza o proprietário do prédio dominante.

Será servidão negativa se consistir num abstenção por parte do dono do prédio subordinado ou serviente.

Servidão contínua se exerce inerentemente a uma ação humana, como por exemplo, a de aqueduto – por onde corre águas de um prédio a outro, sem a necessária atuação pessoal.

Será descontínua embora exista em caráter permanente pois seu exercício está condicionado ao fato do homem, por exemplo, retirar águas em prédio alheio e realiza de forma material e intermitente.

Servidão aparente se manifesta de forma crassa através de obras exteriores, visíveis e permanentes como corredores, pontes e, etc...

As servidões não aparentes não se materializam e consistem num mero transitar ou em exercício da servidão por prédio alheio.

Ambas classificações podem combinar-se ou não, daí podem ser descontínuas e não aparentes, bem como descontínuas e, aparentes; contínuas e aparentes e, finalmente contínuas e não aparentes.

Há ainda as servidões coativas que emanam judicialmente, como por exemplo, a prevista no Código de Águas ( aqueduto, trânsito pelas margens do aqueduto, ou do Código de Minas (trânsito para escoamento de minério).

Há situações que situam-se a um mezzo-termo entre a servidão e as restrições ao direito de propriedade, como no caso dos serviços administrativos como o assentamento de esgotos e canalização de água, eletrodutos e dutos para fios telefônicos, implantação de gasoduto e oleoduto.

Para tais situações reservamos a denominação de quase-servidões embora exista o ônus de suportar, inexiste a peculiar característica da sujeição de um prédio a um outro, embora o exercício de uma faculdade venha beneficiar os prédios dos usuários.

Servidão é caracteristicamente indivisível quer ativamente, quer passivamente. A servidão é una e grava cada uma das partes em que se fracione o prédio serviente, salvo se por natureza ou destino só se aplicar a certa parte de um ou outro prédio.

A indivisibilidade resulta ainda em que a servidão não se adquire e nem se perde por partes ou parcialmente, inerentemente a pluralidade de sujeitos ativos e sujeitos passivos.

A servidão é perpétua embora tal expressão não seja exata, preferimos como Beviláqua defini-la com indefinida, significando que esta constitui por tempo indeterminado e nunca a prazo certo.

É inconcebível a transferência da servidão a outro prédio o que sublinha o seu caráter de inalienabilidade.

A servidão não pode ser hipotecada em separado do prédio a que se aplica. Todavia é transmissível por causa mortis e, ainda por atos intervivos acompanhando o prédio nas suas sucessivas mutações subjetivas.

Tais atos intervivos deve revestir a forma pública. E se por testamento, observar-se-á os requisitos de validade deste.

Pressupõe assim a capacidade das partes não somente a genérica mas a específica para os atos de disposição ou alienação do prédio serviente.

O condômino de prédio indiviso não poderá onerar com servidão sem o prévio consentimento dos demais condôminos, assim como o nu proprietário também necessita de autorização do usufrutuário.

Sendo servidão não aparente somente se adquire por registro do título art. 697 CC ou inscrição imobiliária prevista pela Lei 6.015/73, art. 167, I, alínea 6.

O sentido é acentuar que as servidões não aparentes não se adquirem por usucapião. Dúvidas existem quanto ao usucapião sobre as servidões de trânsito.

A servidão instituída por destinação do pai de família ou do proprietária, no caso de a mesma pessoa ter dois prédios e, criada uma serventia visível de um em favor de outro, venham mais tarde a ser donos diversos por alienação ou herança.

Cria-se uma servidão sem manifestação formal do instituidor, porém oriunda de um ato de vontade unilateral do proprietário.

Insurgindo-se contra tal possibilidade opina Clóvis Beviláqua com base de que a constituição da servidão pressupõe a existência de prédios pertencentes a proprietários diversos.

A tese contrário opinando pela sobrevivência de tal modalidade quer no direito moderno como na doutrina estrangeira (Lafayette, Marty et Raynaud).

César Fiúza define servidão como encargo que suporta o titular de um prédio denominado (serviente), em benefício do titular de outro prédio chamado dominante, conferindo a este o uso e gozo de certo direito sobre o prédio serviente.

É imprópria a afirmação de que servidão corresponde a um direito real de um prédio sobre outro. Posto que impossível, na realidade, travar-se uma relação de direito real entre o titular do prédio dominante e o titular do prédio serviente.

Talvez num afã de explicar que a servidão uma vez criada como direito real, ela se transmite a quem quer que seja o titular do prédio dominante.

É devido ao direito de seqüela que se opera a plena adesão da servidão ao prédio É imprescindível que os prédios sejam confinantes e pertençam a proprietários diferentes. Não se exige que sejam confrontantes.

Seu prazo é sempre indeterminado o que fez alguns doutrinadores adjetivar a servidão como perpétua. Também é indivisível conforme já asseverei anteriormente.

Caso seja a servidão por prazo determinado ou condicional, transformar-se-á em direito de crédito totalmente desprovido de direito de seqüela e, ainda da oponibilidade erga omnes.

Geram as servidões para o titular do prédio dominante, um direito real ao qual corresponde , por outra parte, do titular do prédio serviente, a obrigação propter rem de caráter negativo pois que não poderá de se opor a que o titular da servidão desfrute desembaraçadamente da vantagem sobre seu imóvel.

A servidão para o prédio serviente implica numa restrição a alguns dos direitos dominiais ou elementares do direito de propriedade. O dono do prédio dominante tem direito a usar a servidão dela tirando o proveito que deve proporcionar o bem a que serve.

E daí resulta a faculdade de fazer as obras necessárias à sua conservação e ao seu uso ( art. 699 CC) ainda que tais obras se devam realizar no prédio serviente.

Deve a despesa correr por conta do beneficiado, pois que em princípio a servidão não consiste em fazer alguma coisa ( aliquid facere) mas em abster-se de algo ou suportá-lo ( aliquid non facere vel pati); e, se forem diversos os prédios dominantes, dividem-se pro rata.

Somente ante a convenção explícita é que o dono do prédio serviente tem de suportar esse encargo. Ficará exonerado de fazê-las abandonado o prédio em favor do proprietário do prédio dominante.

Em paralelo ao direito de uso e gozo da servidão pelo dono do prédio dominante , o do prédio serviente tem um dever negativo, ou seja, de nada fazer que o obste.

Será lícito, contudo, remover de um local para outro a servidão, contanto que não diminua as vantagens do prédio favorecido.

O exercício da servidão deve ser civiliter e, conter-se nos limites do que dispõe o título constitutivo respeitando certo fim, salvo nas de trânsito, em que a servidão de maior ônus inclui a de menor (exemplo: quem pode transitar com veículos poderá faze-lo a pé).

Exercer a servidão sob forma civiliter significa evitar quanto possível agravar o encargo do prédio serviente e limitando-se às necessidades do prédio dominante.

Todavia, não é verdadeira a recíproca: a servidão menor exclui a maior. Duas exceções se abrem, a primeira fundada na anuência do prejudicado, pois é bem de ver que se concorda por expresso com o aumento do gravame, terá de suportá-lo.

A segunda exceção decorre de preceito legal previsto no art. 706 CC relativo às necessidades da cultura preexistente: o dono do prédio dominante pode´ra impor ao outro o seu alargamento, mas com a indenização do prejuízo.

Nem caberá esta faculdade, se houver mudança na maneira de exercer a servidão, como no caso de se pretender edificar em terreno até então destinado à cultura ( parágrafo único do art. 706 CC).

Outorgado um direito sobre prédio serviente e duas partes integrantes, não comporta extensão às coisas nele existentes, nem se admite que o dono do prédio serviente seja obrigado às despesas de conservação das instalações.

Pela confusão pode ocorrer a extinção da servidão que sempre pressupõe a pluralidade de prédios pertencentes às pessoas distintas e, ipso facto, desaparece.

Sendo, entretanto, temporária a reunião de dois prédios na titularidade de um só dono, poderá restaurar-se a servidão quando voltarem os prédios a pertencerem a diversos proprietários.

Pela convenção também poderá ocorrer a extinção, cabe ressaltar o resgate do prédio serviente. Também pela renúncia por temos explícitos.

Alguns doutrinadores porém, admitem a renúncia tácita quando o dono do prédio dominante deixa de impedir que o dono do prédio serviente faça nele obra incompatível com o exercício da servidão.

Pelo não uso da servidão mas dependendo do tipo pois difere nas negativas para as afirmativas ou positivas. Nestas últimas, importa a prescrição extintiva equivale a renúncia tácita, e ainda que o não uso seja motivado por força maior.

O prazo decenal conta-se, nas servidões positivas, a partir do momento em que cessa o seu exercício e nas negativas daquele em que o dono do prédio serviente passa a praticar aquilo que devia omitir.

Para as servidões de uso intermitente, o não-uso contar-se-á do dia em que poderia exercer-se e, não se efetivou.

Pela impossibilidade de exercício pela mudança dos lugares,alçando os fundos dominante ou serviente. Pela resolução do domínio também extingue-se a servidão.

Cessa também pelo decurso de tempo, implemento de condição ou por desapropriação, e, neste caso cabe promover o cancelamento no registro imobiliário.

Servidões prediais na lavra de Maria Helena Diniz são direitos reais de gozo sobre imóveis em virtude de lei ou vontade das partes, se impõem sobre o prédio serviente em benefício do dominante.

Não se confunde servidão predial como usufruto, uma vez que:

a) o usufruto implica na cessão do direito de uso e gozo da coisa ao usufrutuário, dos quais o proprietário ficará temporariamente privado, ao passo que as servidões são encargos que não privam o proprietário do uso e do gozo de seu bem;

b) o usufruto recaiu tanto em coisas móveis como também em imóveis e as servidões só cabem a bens imobiliários;

c) usufruto é instituído em proveito de uma pessoa , e a servidão, em benefício de um prédio;

d) o usufruto é temporário, e a servidão perpétua.

A servidão é direito erga omnes que não se presume( art. 697CC) e sua natureza jurídica traduz-se em ser direito real de gozo ou fruição sobre imóvel alheio, de caráter acessório , perpétuo, indivisível e inalienável.

Possui efetivamente caráter acessório uma vez que se liga a um direito principal que é o direito de propriedade que lhe dá origem pois contraria o conceito de servidão(ambulat cum domino)

A servidão estabelece-se por inteiro, gravando um prédio serviente no seu todo, sendo um ônus o nível, que não pode ser partilhado. Não se desdobra, só se extinguindo o em face de alguns quinhões, se por natureza, ou por sua destinação, não puder a eles aproveitar.

Lafayette alega que qualquer litígio que tiver por objeto a servidão, não comporta fracionamento a sentença proferida em se indizível objetiva e subjetivamente ou seja, abrange a servidão por inteiro e aproveitou prejudica aos proprietários dos prédios de clientes e dominante, sejam eles quantos forem.

Em decorrência da indivisibilidade a servidão predial não pode ser instituída em favor da parte ideal do prédio dominante, nem pode incidir sobre parte ideal sobre o prédio serviente.

Deve ser mantida a servidão ainda que o proprietário do prédio dominante se torne condômino do serviente ou vice-versa defendida a servidão por um dos consorte do prédio dominante a todos aproveita a ação.

São várias as servidões como a de tirar água, a de condução de gado ao poço vizinho, pastagem , passagem de água, caçar em propriedade alheia, cozer cal, tirar areia, extrair pedra, escoar água de seu telhado, e, ainda as servidões de luz consistentes em não criar obstáculo à entrada de luz no prédio dominante, meter trave na parede do vizinho, abrir janelas para obtenção de luz, apoiar sua edificação nas paredes, muros ou qualquer parte do prédio confinante, mediante condições preestabelecidas, gozar de vista, e de não construir prédio além de certa altura.

Foi o Código Napoleônico de 1804 em seu art. 688 que melhor identificou as servidões contínuas e as descontínuas: as primeiras são aquelas cujo uso é ou pode ser contínuo, sem ter a necessidade de fato atual do homem; tais como a condução.

Já as descontínuas são aquelas que têm necessidade de fato atual do homem para serem exercidas, tais são os direitos de passagem de tirar água, de pastagem, e outros semelhantes.

Foi a Lei 2.437/1955 deu nova redação ao 698 parágrafo único admitindo-se que a servidão advenha de usucapião. Para servidão ser usucapível deve ser suscetível de posse e só as aparentes ( visíveis), só a continuidade e permanência é que caracterizam a posse para usucapir.

A Súmula 415 do STF revela que igualmente as servidões de passagem podem ser objeto de posse, apesar de serem descontínuas, revelam-se externamente como pontes, aterros, viadutos, pavimentação de certos trechos.

No direito brasileiro a proteção jurídica que ampara a servidão é a ação confessória que visa reconhecer a existência então negada ou contestada pelo proprietário ou terceiro sem posse, devendo, provar a servidão pelo título próprio.

Também a ação negatória a que pode recorrer o dono do prédio serviente para provar a inexistência do ônus real. Sem dúvida, os arts. 979, II e 980, II do CPC instituem a possibilidade de constituição de servidão judicial. E a sentença in casu deve ser devidamente homologada no RGI para que a servidão possa como direito real operar todos seus efeitos.

A ação manutenção de posse outorgada ao proprietário do prédio dominante, se tiver sua posse protestada pelo dono do serviente.

Também a ação de nunciação de obra nova ( arts 934, I CPC) para defender servidão tingni immitendi (meter trave na parede do vizinho).

As servidões aparentes e contínuas podem ser objeto de posse; as descontínuas e não aparentes não podem ser objeto de posse. Como posse é visibilidade de domínio, esta só pode se manifestar quando as servidões forem aparentes e contínuas.

A propósito desta razão, o legislador pátrio ex vi o art. 697 CC/1916 determina que as servidões não aparentes só podem ser estabelecidas por meio de transcrição no registro imobiliário.

A constituição de servidão em testamento escapa à regra do art. 1.227 do NCC.O requisito da aparência é fundamental e se funda no fim de proteger a boa fé do adquirente do prédio dominante.

Assim, se as serventias não são aparentes, não se transformam em servidões , por destino do proprietário.O preceito do art. 1.385 § 3o. NCC possibilita ao dominante mediante indenização, exigir ampliação da servidão mesmo contra a vontade do proprietário do prédio serviente, se o reclamarem as necessidades da cultura daquele.

Tal regra foge completamente à sistemática anterior do Código Civil pois se vai permitir um aumento da servidão contra a vontade do dono do prédio serviente para facilitar a exploração do prédio dominante.

Trata-se de expropriação por interesse particular e vis imediatamente atender a um interesse social o que de certa forma, já constitui uma inovação.

Gisele Leite

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 04/03/2007
Código do texto: T401324
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