Resumo: O cavaleiro andante munido de sua armadura enferrujada e um esquálido cavalo chamado Rocinante em seu mundo de aventuras e fantasias realçou a importância do diálogo. As aparições de Cervantes na obra são outro detalhe que deve ser considerado. O autor alterna a narração entre a sua própria voz e a do narrador Cide Hamete. Embora os personagens principais sejam Dom Quixote, Sancho Pança e Dulcineia, as histórias de outros personagens também são contadas. O que nos remete aos métodos de resolução de conflitos de interesses como a mediação no direito brasileiro.

Palavras-Chave: Mediação. Constituição Federal brasileira de 1988. Judicialização. Justiça. Conflitos de interesses.

 

 

Dom Quixote de La Mancha, ou em espanhol Don Quijote de la Mancha é obra de Miguel de Cervantes e Saavedra. Refere-se a uma sátira às antigas novelas de cavalaria, considerada uma das maiores obras da literatura espanhola e, também, um clássico da literatura universal.

Considera-se que o livro lançado em 1605 e, inaugurou o romance moderno e, atualmente, conta com muitas versões e traduções em diversos idiomas. O título original da obra é "O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha”.

O protagonista era um nobre espanhol de idade avançada, cerca de cinquenta anos, e fora imortalizado até os presentes dias, pois reúne diversas paródias.

Os romances de cavalaria[1] foram desenvolvidos durante a Idade Média sendo composto por cento e vinte e seis capítulos e foram sem duas partes. O autor começou a escrever em 1580 sendo que a primeira parte fora concluída em 1605 e a segunda parte em 1615.  Todo o enredo relata os feitos do ingênuo fidalgo medieval,

Dom Quixote e, bem ao seu lado de seu cavalo Rocinante[2] estava seu fiel amigo e escudeiro Sancho Pança. O cavaleiro vai em sua saga em busca da justiça e de sua bela donzela imaginária, Dulcineia de Toboso, tal qual ocorria nas novelas de cavalaria. Muitas passagens da obra são frutos da invenção de Dom Quixote e romance, apesar disso, tem viés realista.

As histórias e peripécias vividas por Quixote e Sancho nas diferentes regiões espanholas como La Mancha, Aragão e Catalunha. Entre as fantasias e loucuras do protagonista há, uma dura e cruel realidade. E, Quixote travava batalhas contra os moinhos de vento que imaginava serem gigantes (pois, o Dom Quixote viu, nesses moinhos, gigantes que agitavam os braços, desafiando-os para a luta) e, ainda guerreia contra o exército de ovelhas, o que resulta numa surra dos pastores do rebanho.

Por fim, a novela finda quando o protagonista retorna ao mundo real, retorna à sua casa e percebe, finalmente, que não existem heróis no mundo.

Num dos trechos mais famosos, in litteris:

“O destino vai guiando as nossas coisas, melhor do que pudéramos desejar; pois vê lá, amigo Sancho Pança, aqueles trinta ou pouco mais desaforados gigantes, com os quais penso travar batalha e tirar de todos a vida, com cujos despojos começaremos a enriquecer, pois esta é boa guerra, e é grande serviço de Deus varrer tão má semente da face da terra.

— Que gigantes[3]? - disse Sancho Pança.

— Aqueles que ali vês - respondeu seu amo -, de longos braços, que alguns chegam a tê-los de quase duas léguas.

— Veja, vossa mercê, respondeu Sancho que aqueles que ali aparecem não são gigantes, e sim moinhos de vento, e o que neles parecem braços são as asas, que, empurradas pelo vento, fazem rodar a pedra do moinho”.

“Esse meu mestre, por mil sinais, foi visto como um lunático, e eu não fiquei para trás, pois sou mais pateta que ele, já que o sigo e o sirvo, se é verdadeiro o refrão que diz: ‘diga-me com quem anda e te direi quem és’ e o outro de ‘não com quem nasce, mas com quem passa’.”

“A liberdade, Sancho, é um dos mais preciosos dons que os homens receberam dos céus. Com ela não podem igualar-se os tesouros que a terra encerra nem que o mar cobre; pela liberdade, assim como pela honra, se pode e deve aventurar a vida, e, pelo contrário, o cativeiro é o maior mal que pôde vir aos homens.”

“Embora eu saiba que não exista magia no mundo que possa mover e forçar à vontade - como alguns simplesmente acreditam -, é livre a nossa vontade, e não existe erva nem encanto que a force.”

“Entre os pecados maiores que os homens cometem, ainda que alguns digam que é a soberba, eu digo que é a falta de agradecimento.”

Nosso protagonista, a qual nos afeiçoamos, é um pobre homem de meia idade que se dedicava à leitura de romances de cavalaria e, confundia a fantasia e realidade e, assim, resolveu a imitar os heróis e partir em busca de aventuras e justiça. Ao encontrar um albergue simples, o confunde com um castelo rústico e, pensando que o dono fosse um cavaleiro disposto a ordená-lo, resolveu a guardar o lugar durante a noite.

Quando, então, um bando de camponeses se aproxima, então Quixote supôs que eram inimigos e, então, os ataca e, termina todo machucado. Após uma falsa sagração, o dono do albergue o manda embora, mas afirmou que ele já era um cavaleiro.

Apesar de muito feliz, Quixote retornou para casa feliz e satisfeito. Convenceu Sancho[4] Pança a se juntar na viagem como escudeiro, com promessas de dinheiro, riquezas e glória.

A sobrinha do protagonista preocupou-se com a saúde mental de Quixote e, requisitou a ajuda do Padre que o diagnostica como louco e completamente insano. Então, decidiram queimar seus livros para solucionar o problema, todavia, Quixote acreditava que tudo era obra de Frestão, seu inimigo feiticeiro.

Assim, partiu em busca de vingança e se deparou com cenários cotidianos que a sua imaginação transformou em adversários.

Assim, luta contra moinhos de vento se instaura, pensando que são gigantes e quando foi empurrado por eles, declara que estavam encantados por Frestão[5].

Passando por dois sacerdotes que carregavam a estátua de uma santa, pensa que está perante dois feiticeiros sequestrando uma princesa e resolve atacá-los. É durante esse episódio que Sancho o batiza de “Cavaleiro da Fraca Figura”.

Em seguida, tentou enfrentar vinte homens que aparecem para roubá-los e ambos acabam sendo espancados. Quando recuperaram, encontraram dois rebanhos que caminhavam em direções contrárias e estavam prestes a se cruzar. Quixote imaginava que eram dois exércitos adversários e decidiu se juntar ao lado mais fraco.

Sancho tentava chamar o amo à razão, mas ele se recusava a escutar e acabava lutando com os pastores e perdendo até os dentes.

Depois, se deparava com um grupo de prisioneiros escoltados por guardas, que estavam sendo levados para campos de trabalho forçado. Vendo que estão acorrentados, questionara os homens acerca de seus crimes e todos pareciam inofensivos (amor, música e feitiçaria, por exemplo).

Decidiu que era preciso salvá-los e atacara os guardas, livrando os homens de suas correntes. Eles, no entanto, o agridem e assaltam. Triste, Quixote escreve uma carta de amor para Dulcineia[6] e manda Sancho entregar. No caminho, o escudeiro se depara com o Padre e o Barbeiro que o forçam a revelar o paradeiro do seu amo. O "Cavaleiro da Fraca Figura" é levado para casa, mas persistia nas suas fantasias de cavalaria.

Logo, Quixote regressava à estrada e, ao ver um grupo de atores ambulantes, pensou estar perante demônios e monstros, atacando-os.  A cena foi interrompida pela chegada de outro homem, o Cavaleiro dos Espelhos, que afirmava que a sua amada é a mais bela e que está a disposto a duelar quem disser o contrário.

Para defender a honra de Dulcineia, enfrentara o adversário e venceu o combate. Descobre que o Cavaleiro dos Espelhos era, na verdade, Sansão Carrasco, um amigo que estava tentando dissuadi-lo da vida de cavalaria.

Mais adiante, Quixote e Sancho conheceram um casal misterioso, o Duque e a Duquesa. Eles revelaram que conhecem seus feitos através de um livro que circulava na região. Resolveram recebê-lo com todas as honras dignas de um cavaleiro, rindo das suas ilusões. Pregaram também uma peça a Sancho Pança, nomeando o escudeiro para o cargo de governador de um povoado.

Exausto por tentar cumprir todas as obrigações do cargo, Sancho não conseguiu descansar nem desfrutar a vida digna, chegando a passar fome por temer o envenenamento. Depois de uma semana, resolveu desistir do poder e voltar a ser escudeiro.

Novamente reunidos, eles abandonaram o castelo dos duques e partiram a caminho de Barcelona. Eis que surge o Cavaleiro da Lua Branca afirmando a beleza e superioridade da sua amada

Por amor a Dulcineia, o protagonista duelava com o Cavaleiro da Lua, concordando em deixar a cavalaria e voltar para casa se perder.

Quixote é vencido diante de uma multidão. O adversário era, mais uma vez, Sansão Carrasco, que montou um plano para salvá-lo de suas fantasias.

Humilhado, regressara a casa, mas acaba ficando doente e deprimido. No seu leito de morte, recuperava a consciência e pediu perdão à sobrinha e a Sancho Pança, que continuou do seu lado até ao suspiro final.

Dom Quixote de La Mancha é uma obra dividida em 126 (cento e vinte e seis) capítulos. A obra foi publicada em duas partes, refletindo diferentes influências: a primeira se aproxima do estilo maneirista e a segunda do barroco.

Inspirado nos romances de cavalaria que já estavam caindo em desuso e no idealismo que atravessava as artes e as letras, Dom Quixote é, ao mesmo tempo, uma sátira e uma homenagem.

Misturando tragédia e comédia e combinando registros populares e eruditos de linguagem, esta é uma obra muito rica. A sua estrutura contribui, em larga medida, para a sua complexidade, criando várias camadas narrativas que dialogam entre si.

Na primeira parte, o narrador aponta que esta é a tradução de um manuscrito árabe, cujo autor é chamado Cid Hamete Benengeli. Contudo, ele não se limita a traduzir, tece comentários e faz correções frequentemente.

Na parte seguinte, o protagonista e seu escudeiro descobrem a existência de um livro chamado “O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote da Mancha”, onde seus feitos eram narrados. Encontram o Duque e a Duquesa, entre outros indivíduos, que tinham sido leitores de suas aventuras, passando também a ser personagens[7].

O protagonista, de seu verdadeiro nome Alonso Quijano, é um homem cuja mente para ter sido "contaminada" pela leitura de romances de cavalaria. Assim, a leitura é apontada como uma atividade muito poderosa, capaz de mudar o comportamento de um indivíduo e até mesmo de o corromper.

Atraído pelos valores transmitidos nessas narrativas (glória, honra, coragem), Quixote trocava o tédio da vida burguesa pelas aventuras da cavalaria. Tentando imitar seus heróis, precisava lutar para defender a honra de sua amada, correndo todos os riscos para conquistar seu coração. Cria, então, Dulcineia de Toboso.

É através desse amor imaginário que Quixote se mantem motivado e disposto a se reerguer vezes sem conta. Adotando uma postura petrarquista (sentimento amoroso como servidão), justifica suas ações:

(...) o Amor nem atende a respeitos, nem guarda limites de razão nos seus discursos, e tem a mesma condição que a morte, a qual tanto acomete os alcáceres dos reis, como as humildes choças dos pastores; e, quando toma inteira posse de uma alma, a primeira coisa que faz é tirar-lhe o temor e a vergonha".

Dom Quixote nos ensina que a vida é perfeita do jeito que é; e que, com vontade, dignidade, persistência e pessoas certas ao nosso lado como seu amigo Sancho Pança, podemos mudar o mundo por onde todos pertencemos.

O diálogo de Dom Quixote com seu escudeiro Sancho Pança, assim como os diálogos dos outros personagens da história trazem lições sobre a natureza humana. Nestes diálogos nos damos conta da humanidade destes personagens[8].

Miguel de Cervantes foi feliz neste aspecto da sua obra. Dom Quixote e Sancho Pança dialogavam sobre suas aventuras; dialogavam sobre o que deviam fazer e o que não deviam fazer; dialogavam sobre como resolver os dilemas em que se metiam; dialogavam sobre suas conquistas; enfim, dialogavam sobre a vida.

Dom Quixote e Sancho Pança nos mostram como o diálogo é fundamental para um mundo melhor; nos ensinam que é só através do diálogo que podemos resolver os dilemas que diariamente a vida nos impõe.

O texto de Cervantes busca não apenas satiriza as novelas de cavalaria, mas a um conceito de literatura cuja preocupação era muito mais com o rebuscamento da linguagem do que com o sentido. Tal conceito de literatura também se relaciona com a sociedade da época, cujo poder ainda estava centrado no clero e nas mãos de aristocratas, bem como a transição que passava entre o teocentrismo e o humanismo que estava surgindo. E, a ideal central do barro era justamente mostrar esse conflito.

Dom Quixote é personagem que representa a aristocracia falida do século XV e, que parte desse sistema veio para a organização do Brasil Colônia do século XVII, desde as festas religiosas medievais, como as das Onze Mil virgens, ou de Santa Úrsula[9], até as relações de poder e servidão.

Já Sancho Pança é o sobrinho do cavaleiro, o qual representa um popular sonhador que almeja ser notório aristocratas, despossuído de ideal, preocupo apenas com sua sobrevivência e que não pestaneja de aceitar, sem merecimento, uma ilha para governar ou outra benesse para sair da pobreza.

Ad comparandum, os nobres brasileiros da elite colonial do século XVII são comparáveis a Sancho Pança por Gregório de Mattos, que usa a leitura cômica para ridicularizar essa elite e dessacralizar a festa das Onze Mil Virgens. A famosa “boca do inferno” pretende ser a boca da verdade ao criticar a igreja e os governantes e, se utilizou de Quixote com objetivo de galhofa e sátira[10].

A obra nos remete a pensar na mediação e na justiça restaurativa pautada no diálogo e nas resoluções alternativas dos conflitos de interesses bem como o conceito de justiça no direito pátrio.

É sabido que o advogado é indispensável à mediação e, a Constituição brasileira vigente ainda determina que o advogado seja indispensável à justiça.

De maneira que se revela proveitosa a reunião do mediador com os advogados das partes quando se relembra que as leis brasileiras e particularmente o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (EOAB) preconiza expressamente a colaboração dos advogados no procedimento de mediação ou conciliação (art. 26 da Lei 13.140/2015).

Outro fato relevante é quando ocorre de um dos mediandos estar acompanhado de seu advogado e, o outro mediando não. Quando cumpre ao mediador decidir, se poderá ou não dar prosseguimento, mas somente quando houver o equilíbrio entre as partes não se observando a instauração de vantagem entre estes, caso contrário, deverá o mediador suspender a mediação e, aconselhar a parte desassistida e desacompanhada a procurar a Defensoria Pública, ou então, constituir advogado.

Sabemos que o conflito humano é realmente inevitável e, o tempo só veio adicionar maior complexidade a teia estratégica das relações humanas, o que faz com que a controvérsia, a lide e litígios aumentem assombrosamente.

Segundo dados informados pelo Conselho Nacional de Justiça no Brasil, o nível crescente de litígios registrou em 2012 o total de 28.200.000 de novas ações comparado com que antes era registrado ainda em 1988 que era de 350.000.

Ressalte-se que não é exclusividade brasileira, pois diversos países no mundo já registraram também o exorbitante crescimento dos conflitos judiciais.

Analisando criticamente os principais fatores propulsores de tamanha litigiosidade[11], observa-se a insegurança jurídica diante a prolífera legislação brasileira e a dificuldade de se obter sua aplicação de forma bem-sucedida; há, ainda, a privatização de serviços públicos e o progresso bancário e mercantil e de diversos setores da economia pátria.

Aliado também ao aumento real do salário-mínimo e os programas de distribuição de renda que majoraram o poder de compra de milhões de cidadãos, que se tornaram ativos consumidores do mercado brasileiro.

O notório e estrondoso abarrotamento do judiciário pátrio torna tormentosa a busca pelo ideal de justiça que não mais significa dar a cada um, o que é seu, mas atender aos jurisdicionados dentro da propalada duração razoável do processo.

Pois em priscas eras, Rui Barbosa já advertira: “Justiça tardia é justiça nenhuma”.

Diversos esforços empreendidos pelo poder público foram efetivados, desde as sucessivas reformas do CPC de 1973, até mesmo a criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais visando-se com celeridade e eficiência atender a reticente cidadania dos jurisdicionados.

Ainda no contexto evolutivo, entrou em vigor recentemente o neoprocessualista Código de Processo Civil de 2015, em 18 de março de 2016 trazendo diversas inovações para se debelar a cultura adversarial e, buscar a justiça restaurativa e a cultura da paz através da mediação e conciliação (além de também prevista a remodelada Lei de Arbitragem pela Lei 13.129/2015).

É preciso destacar que o advogado, nesse contexto, possui um papel diferenciado podendo ser facilitador para se obter o melhor resultado que possível e, ainda, o mais célere, pois com o diálogo cooperativo é possível encontrar a solução conjunta e consensual, dirimindo os problemas e, concorrendo para o deslinde do procedimento.

Os mecanismos de solução de conflitos podem ser classificados em dois grupos, a saber: os autocompositivos, com características cooperativas e dialógicas e, os heterocompositivos, com características decisórias. Mas, ressaltando que nem sempre os métodos heterocompositivos se valem de poderes decisórios para providenciar a adequada solução dos conflitos de interesses.

Nesse segundo grupo figuram a arbitragem, que possui natureza voluntária e incidente sobre os direitos disponíveis e a jurisdição estatal, de submissão compulsória.

A referida diferenciação nos conduz a uma figura idealizada e didática chamada de Pirâmide da Solução de Conflitos[12] , cuja indicação implica em afirmar que todo conflito só se resolve de forma terminativa por um único mecanismo, apesar de que podem ocorrer outros, durante o processamento do conflito, que tem em sua base a negociação, passando depois pela mediação, conciliação e arbitragem e, no topo está o Poder Judiciário que prima em ser o guardião da solução das controvérsias, além de ser o único que pode coercitivamente dar eficácia às decisões originárias diante dos demais métodos[13].

Ao percorrermos da base até o topo da referida Pirâmide, com o uso da sucessão de mecanismos, majora-se sensivelmente a intervenção de terceiros alheios ao conflito, robustece-se o formalismo, agravando-se a litigiosidade e, o processo então tende a se tornar penosamente mais duradouro e menos eficaz.

A mediação é, pois, instituto caracterizado pela não adversidade, além de se peculiarizar pela voluntariedade, imparcialidade, independência e sigilo.

A intervenção do mediador que é solicitada e aceita pelas partes, demonstra claramente que é um terceiro imparcial, isento e, ainda que as decisões permaneçam sob a responsabilidade dos envolvidos no conflito.

A principal função do mediador[14] é a de facilitar a comunicação entre os litigantes e, detectar as possíveis causas do conflito. Na mediação são usadas as técnicas de comunicação e negociação que devem ser aplicadas até mesmo no Judiciário, buscando-se de forma pacífica as soluções mais adequadas que satisfaçam os interesses dos mediandos, concretizando a justiça e minimizando-se os custos e o tempo gasto com todo o deslinde.

A vontade dos mediandos devem ser atentamente ouvidas e respeitadas, cabendo ao advogado e ao mediador nas devidas proporções e dentro de suas atribuições, trazer esclarecimentos específicos para trazer a lume, os laços fundamentais do relacionamento existente entre os mediandos, a fim de decifrar as reais necessidades e interesses que duelam no litígio.

A mediação proporciona a integral solução do conflito, visando não somente dirimir a lide presente, mas igualmente restabelecer o relacionamento entre os litigantes que prossegue para além da controvérsia, e, assim prevenindo o aparecimento de conflitos futuros. Eis, então a sua função prospectiva.

É preciso não olvidar que durante o procedimento mediacional não existem apenas os critérios concretos objetivos, mas igualmente as questões e busilis subjetivos. Todo o procedimento da mediação visa reconstruir o diálogo entre as partes envolvidas, também os capacita para que sozinhos possam resolver seus próprios conflitos. Eis, então a sua função pedagógica.

É importante que os advogados e advogadas se qualifiquem e desenvolvam novas habilidades principalmente para atuarem durante a mediação, aperfeiçoando as técnicas de comunicação e negociação e, mesmo, em sua atuação nos chamados MESC’s (Mecanismos Extrajudiciais de Solução de Conflitos) de forma a auxiliar seu cliente, na obtenção de resultados céleres, úteis, eficazes e plenamente reconhecidos pelo Judiciário.

A mediação está em harmonia e sintonia com o preâmbulo da Constituição Federal de Brasileira de 1988 principalmente por se inserir no Estado Democrático de Direito onde se assegura o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade e a segurança e a justiça reconhecida como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida com a solução pacífica das controvérsias.

Também a Resolução 125 do CNJ, de 29 de novembro de 2010 estimula sinceramente que os próprios órgãos judiciais estatais ofereceram mecanismos de soluções de controvérsias, em especial, os chamados meios consensuais[15], tais como a mediação e a conciliação. Aliás, previu a implantação de tais serviços gradativamente no prazo de doze meses.

Há, sem dúvida, a necessidade de mudança de cultura[16] abandonando-se a litigiosidade e a solução via julgamento, para se migrar para a cultura da paz e, em prol dos ideais da justiça restaurativa.

A atuação do advogado perante a política pública de tratamento adequado dos conflitos incluiu a observância de princípios ou negociações dos méritos que se resume em quatro pontos fundamentais tendo em vista o método de negociação de Harvard que são:

•        Separe as pessoas do problema;

•        Concentre-se nos interesses, não nas posições;

•        Crie variedade de possibilidades antes de decidir o que fazer;

•        Critérios (que tem por base um padrão objetivo).

Quando as negociações se transformam em uma disputa, os negociadores frequentemente desenvolvem opiniões negativas sobre o outro. É imperioso que os negociadores pautam suas propostas e condutas pela boa-fé, assim se afastando do ceticismo e gerando uma desvalorização reativa.

Diante de divergências entre os envolvidos, ou mesmo quando surgirem dúvidas quanto à condução do procedimento da mediação, será indicada e recomendável que o mediador reforce a cooperação, sendo chamado para dar a contribuição sobre o debate interno, podendo até solicitar o afastamento temporário do advogado, durante a etapa determinada da mediação.

Sendo concluída a mediação de forma satisfatória, impõe=se a necessária redação do acordo, dotado de cláusulas precisas e objetivas, a fim de se evitar os conflitos futuro, além do que, caso a mediação, não alcance o seu objetivo que é a resolução do conflito e poderá inclusive eliminar os pontos de controvérsia e, favorecer além de facilitar a futura retomada dos entendimentos.

Enfim, os advogados e advogadas brasileiras devem se comprometer em envidar esforços no sentido de se capacitar também para a cultura do não litígio , e para concretização da cultura da paz e voltada para a justiça restaurativa, sempre pautada no consenso e na colaboração a fim de que estejam habilitados para propiciar a solução do conflito não apenas pela via judiciosa, mas, principalmente, pela negociação, mediação ou conciliação ou arbitragem bem como outro método compositivo que se mostre adequado.

O advogado deve, portanto, ser capaz de promover a efetividade da justiça e da pacificação social.

Dom Quixote retrata um espanhol incapaz de enxergar a realidade, que prefere viver em um mundo de sonhos para não ter de encarar a dura verdade. Se alguns consideram o personagem simplesmente louco, outros o entendem como um sofredor que usa a criatividade para tornar seu mundo menos banal.

"Enfrentar o inimigo invencível, tentar quando as forças se esvaem, alcançar a estrela inatingível: Essa é a minha busca". Dom Quixote retrata um espanhol incapaz de enxergar a realidade, que prefere viver em um mundo de sonhos para não ter de encarar a dura verdade. Se alguns consideram o personagem simplesmente louco, outros, o entendem como um sofredor que usa a criatividade para tornar seu mundo menos banal.

Dom Quixote[17] acabou sendo um símbolo do homem sonhador e cheio de ideais, que faz de tudo para alcançar o que deseja e fazer aquilo que acha ser certo e justo.

No final, acaba sendo vencido diante de uma grande multidão. Em meio a isso, descobrimos que o Cavaleiro era o carrasco novamente, que havia feito um plano para salvar Quixote de sua loucura. Humilhado por sua derrota, o protagonista volta para sua casa, mas acaba ficando muito doente e deprimido.

O final da história é muito triste, pois em seu leito de morte, Quixote recupera sua razão e pede desculpas à Dolores e à Sancho Pança por todas as coisas que havia feito em meio aos seus delírios. Após isso, morre, com Sancho ao seu lado.

 

 

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[1] As novelas de cavalaria são narrativas derivadas de poemas épicas e das canções de gesta, isto é, surgem da poesia medieval e, por serem longas, e foram sendo escritas em prosa. Além de Inglaterra e França, estas tiveram forte presença e foram popularizadas em Portugal, Espanha e Itália. Era gênero literário escrito em prosa, típico da Idade Média. E, foi na Espanha, Inglaterra, França, Itália e Portugal que as novelas de cavalaria tiveram grande êxito, tornando-se populares. Eram histórias fantásticas que contavam as proezas e façanhas de um herói e a busca pelo seu amor. De caráter místico e simbólico, relatam aventuras penetradas de espiritualidade cristã e subordinam-se a um ideal místico, que sublima o amor profundo. Eles surgem no final do séc. XV, sendo o último exemplar original (Boecia Policisne) publicado em 1602. Deixaram de estar na moda a partir de 1550, e Miguel de Cervantes, no séc. XVII, decide satirizá-los ao escrever um dos maiores clássicos da literatura ocidental, Dom Quixote. Hoje, a imagem que temos da Idade Média é bastante mais influenciada pelo romance de cavalaria do que por qualquer outro género literário medieval. Quando pensamos em época medieval vem-nos logo à cabeça a imagem dos cavaleiros, das donzelas em perigo, dos dragões e monstros e tudo isso se encontra nos romances de cavalaria. Originalmente, os romances de cavalaria foram escritos em francês antigo, anglo-normando, occitano, franco-provençal e depois em português, castelhano, inglês, italiano (Poesia siciliana) e alemão. Durante o início do séc. XIII, as novelas de cavalaria foram cada vez mais escritas em prosa. Nos romances posteriores a esse século, particularmente os de origem francesa, há uma marcada tendência para enfatizar os temas do amor cortês, tais como os de fidelidade na adversidade.

[2]  Vem de Rocim, que significa Pileca, cavalo fraco e pequeno. Sofreu muito durante as aventuras de Dom Quixote de La Mancha. Era um cavalo branco, desengonçado, magricelo, que o acompanhava em suas aventuras.

[3] O episódio dos moinhos de vento se concretizou como sendo a própria metáfora da loucura. Pois o pobre cavaleiro investe sua lança contra as imensas pás rodantes do moinho, tendo como testemunha o atônito e fiel escudeiro Sancho Pança que tentava em vão, dissuadi-lo. Numa toada humorística, partiu-se a lança em pedaços e jogou longe o pobre cavaleiro, pasto afora, amassando-lhe a armadura enferrujada. Enfrentando as ilusões pelo amor de Dulcineia e lutando a boa guerra contra as injustiças do mundo. O moinho substituía muitas mãos trabalhadoras.

[4] O Sancho era roliço e baixo, é o que imaginamos ao longo das várias cenas, e é o que confirmamos com o ilustrador clássico do Quixote, Gustave Doré (1832-1883), pintor, desenhista e ilustrador francês que também complementa nossa imaginação com passagens da Divina Comédia (Dante) e do Paraíso Perdido (Milton). Há no Quixote e no Sancho uma identificação com mitos visuais. Um crítico, Ian Ward, afirmou que "se nós fosse dado ver um cajado e uma bola andando emparelhados por uma estrada, imediatamente os reconheceríamos como Dom Quixote e Sancho Pança".

[5] De acordo com Ferreira (2004) Frestão ou Frisão, têm dois significados, de ser procedente da Frísia, antiga província da Holanda; frísio; e o de ser natural ou habitante da frísia. A terceira hipótese refere-se à língua dos antigos frisões. Ou ainda, significando cavalo forte, corpulento, da raça originária da frísia.

 

[6] Dulcineia é o ideal do amor impossível. Ela é idealizada a partir do amor da juventude de Dom Quixote: Aldonza Lorenzo, uma camponesa. Mas, diferente desta, Dulcineia faz parte da nobreza, além de ser bela e honrada.

[7] As duas partes desta obra apresentam atmosferas distintas. A primeira, em estilo mais maneirista, transmite uma intensa sensação de liberdade, enquanto a outra, tendendo para o barroco, passa ao leitor um sentimento asfixiante, um ar sufocante, como se suas páginas pudessem encerrar dentro de si todos que por elas se aventurassem. Aqui os protagonistas parecem caminhar da esfera da imaginação para os limites irremediáveis da realidade. Também os personagens se contrapõem, simbolizando universos diferentes, embora pareçam caminhar pela mesma estrada. Sancho tem os pés mais próximos do real, enquanto Dom Quixote transita pela esfera do imaginário. Esta novela realista e satírica só pode concluir com o retorno do fidalgo ao mundo da razão e do bom senso, pois não há mais espaço para heróis nos tempos modernos.

[8] Cervantes colocou na cena da mentira sobre o destino dos livros um tema recorrente na história da cultura, pertinente a uma relatividade (ou não) da verdade. O assunto também é bíblico. Em João (18:36, 37), o acusado (Jesus) respondeu ao juiz (Pilatos) que viera ao mundo dar o testemunho da verdade, e que todo aquele que era da verdade ouvia a sua voz, ao que Pilatos contestou: que é a verdade? Quase 2.000 anos depois um filósofo alemão (Kant) afirmava que a verdade é direito apenas de quem direito à verdade. Pode-se ocultar a verdade em favor de uma causa justa?

[9] A lenda de Santa Úrsula e das Onze Mil Virgens foi revivida, principalmente no início da Idade Moderna. A devoção só crescia chegando a formar no século XVI por Angela Merici a Ordem das Ursulinas, dedicada à educação de meninas. José Ramos Tinhorão afirma que no local onde se acreditava que foram martirizadas, foram encontradas ossadas de mulheres jovens que “a boa fé cristã do povo transformava logo em relíquia das onze mil virgens”. No ano de 1575, chegaram no Brasil, na cidade de Salvador, duas cabeças das Onze Mil Virgens.  Foi uma grande festa devido serem as primeiras relíquias existentes na colônia. Em 1577, uma cabeça chegou a São Vicente, e há relatos que a Capitania se colocou em festa. Cristóvão Gouvea, padre Visitador da Companhia de Jesus, visitou o Brasil em 1582, e trouxe consigo outra cabeça das Onze Mil Virgens, entregue em Salvador e recebida com uma grande festa pública, com direito a diversas manifestações, entre elas, a apresentação de uma encenação teatral promovida pelos alunos do colégio jesuíta.

[10] Mesmo após 417 anos de publicação, Dom Quixote segue no posto de um dos melhores romances da história. A obra seguiu influenciando as gerações seguintes como, por exemplo, a de Flaubert. Afinal, Madame Bovary, assim como Dom Quixote, foi influenciada pelos livros que ela lia. Assim, ela optou por viver no mundo dos sonhos. Ademais, esse clássico segue como tema de muitos trabalhos acadêmicos, que se debruçam em diversas análises sobre a história.

[11] A explosão da litigiosidade é resultado da distância entre lei e realidade. Mais uma vez o Conselho Nacional de Justiça publicou o tradicional relatório Justiça em Números, revelando dados relativos ao movimento do Poder Judiciário brasileiro. De todos os indicadores publicados, certamente um dos mais impressionantes é a marca de cerca de 102 milhões de processos que circularam no ano de 2015 (incluindo os feitos extintos e aqueles não extintos). Antes de mais nada, ressaltar que Judiciário sobrecarregado não consiste em peculiaridade brasileira. Trata-se de problema que tem sua origem na Europa Ocidental do pós Segunda Guerra Mundial, período em que se consolidou o chamado Estado de Bem-estar Social, caracterizado pela legalização de uma série de direitos coletivos que, caminhando para além das fundamentais liberdades públicas  oriundas das revoluções burguesas do século XVIII, prometem saúde, educação, condições dignas de trabalho, dentre outros valores. Essa situação levou ao advento de um enorme abismo entre duas realidades: de um lado, a realidade das normas jurídicas contendo ambiciosos compromissos fundados no princípio maior da dignidade da pessoa humana; de outro lado, a realidade da vida da população, especialmente os estratos mais pobres, que não presenciavam a concretização das promessas das normas.

[12] Uma figura metafórica denominada “Pirâmide da Solução de Conflitos”, que ordena os métodos mais utilizados a partir do grau de intervenção de terceiros,  iniciando-se na negociação e terminando no topo com o Poder Judiciário, que sempre será o guardião da solução das controvérsias. Entre as alternativas ilustradas na pirâmide, tem-se, iniciando pela base, a negociação, que é um processo de troca de informações entre as partes,  com a finalidade de se alcançar um acordo, cujas fases envolvem um processo de preparação por ambas, passando pelo desenvolvimento para formulação de  propostas e terminando com um acordo, interrupção temporária ou término da negociação.

[13] Abaixo temos os links para cartilhas e manuais sobre o tema produzidas pelos mais diversos órgãos, como OAB e CNJ: Cartilha de arbitragem: A arbitragem ao alcance de todos – OAB/RJ (link de acesso: https://www.oabrj.org.br/arquivos/files/-Comissao/cartilha_arbitragem.pdf) ; Cartilha: O que é mediação? – OAB/RJ (link de acesso: https://www.oabrj.org.br/arquivos/files/-Comissao/cartilha_mediacao.pdf); Cartilha Conciliação e mediação: perguntas e respostas – CNJ (link de acesso: http://www.tjrj.jus.br/documents/10136/1607514/cartilha-completa-rj-web.pdf) ; Manual de mediação judicial – CNJ (link de acesso: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2015/06/f247f5ce60df2774c59d6e2dddbfec54.pdf).

[14] A mediação consiste, em linhas gerais, em um processo de negociação assistida, caracterizada pela não-adversariedade, voluntariedade, imparcialidade, independência e sigilo, que envolve a participação solicitada e aceita de um terceiro, mas cujas decisões permanecem sob a responsabilidade dos envolvidos no conflito, uma vez que o mediador tem o objetivo de facilitar a comunicação entre as partes em litígio e ajudá-las a alcançar uma solução com benefícios e satisfação mútuos.

[15] Os meios alternativos de resolução de conflitos, além de se dividirem entre autocomposição e heterocomposição, conforme elucidado no tópico anterior, se dividem em: A conciliação tem por escopo a resolução objetiva da lide pelo conciliador, ou seja, este pode atuar de forma a propor às partes soluções para que se haja a celebração do acordo por elas em consenso. Isto só é possível porque, na maioria das vezes, as partes são pessoas que não possuem vínculo social anterior, possivelmente vindo a se conhecer apenas em função do fato social que gerou a lide entre elas (ex: um acidente automobilístico que será julgado no Juizado Especial Adjunto Criminal – JEACrim).

Segundo a doutrinadora Trícia Navarro Xavier Cabral, “na conciliação o conflito é tratado de modo mais superficial e busca-se, primordialmente, a autocomposição, com o encerramento da disputa” (CABRAL, 2017). Deste modo, a conciliação preza por um caráter mais objetivo, tendo em foco sempre a resolução do litígio, sem necessariamente prezar pelo restabelecimento de algum vínculo afetivo anterior entre elas. A mediação, diferentemente da conciliação, tem a necessidade de que se avalie o contexto, o que ensejou tal problemática ou disputa. Na mediação existe afinidade anterior que culmina em espécie de fato gerador para a causa, e tenta-se garantir que haja o mínimo de comunicação e respeito entre as partes para sua validação. Assim diz a autora Trícia Navarro Xavier Cabral: “além de objetivar a resolução da controvérsia, tenta restaurar as relações sociais entre os envolvidos” (CABRAL, 2017).

Já na mediação, a situação se difere exatamente pela presença de um vínculo afetivo entre as partes, e por isso o mediador atua de forma a tentar restabelecer uma comunicação e comunhão de vontades acerca do caso, para assim chegarem juntos à resolução do litígio, por exemplo, audiências de mediação sobre guarda de menores ou prestação alimentícia entre os progenitores nas Varas de Direito de Família (GONÇALVES, 2016, p. 398-400). Arbitragem: Conforme ensina a doutrina processual do Desembargador do TJ-RJ, Alexandre Freitas Câmara, a respeito da mesma: É conhecido que conflitos que envolvem partes capazes e direitos patrimoniais disponíveis podem ser solucionados através da arbitragem, nos termos da Lei no 9.307/1996. A arbitragem, porém, só poderá ser empregada como mecanismo de resolução do conflito se assim convencionarem as partes (através de alguma das modalidades de convenção de arbitragem: cláusula compromissória ou compromisso arbitral). Convencionada a arbitragem como meio adequado para a resolução do litígio, exclui-se a atuação do Judiciário, que não poderá apreciar o mérito da causa, uma vez que a competência para tal apreciação terá sido transferida, por convenção das partes, para o árbitro ou tribunal arbitral (CÂMARA, 2018, p. 421).

[16] Tem-se no Brasil uma categoria conhecida como grandes litigantes. Já no ano de 2011, por exemplo, foi constatado que 38% dos processos envolviam o setor público federal; 8% o estadual; 5% o municipal. Significando, 51% dos processos apresentavam como parte os entes federativos brasileiros, suas autarquias e empresas públicas; o Estado brasileiro, em suma.  Existem outros dados reveladores do mesmo ano: 38% das ações envolviam bancos e 6% telefonia. Outros litigantes, como, por exemplo, inquilino contra locador, vizinho contra vizinho, empresas privadas que discutem cláusulas contratuais, dentre outras, somavam, ao todo, apenas 5% de todos os processos. A explosão da litigiosidade brasileira está relacionada à distância existente entre a realidade das normas e a realidade da vida. Não por outro motivo, aquele que detém o papel primordial de efetivar direitos (o Estado) e as duas categorias de empresas que representam o capitalismo globalizado (bancos e telefonias) deste início de século XXI são os que abarrotam o Judiciário de processos. Eis os grandes violadores dos direitos conquistados com a Constituição de 1988. Ressalve-se que isso não significa que as grandes litigantes são derrotadas em todos os processos e nem tampouco que nada fazem para não violarem direito alheio. Isso também não significa que inexistem abusos ou instrumentalização da atividade jurisdicional para violação de direitos gerados por outros estratos populacionais. O fato, contudo, é que o congestionamento do Judiciário gerado por apenas três espécies de litigantes revela alguma patologia nas estruturas políticas e econômicas brasileira, que deságua, inexoravelmente, em um absurdo volume de trabalho para todos os agentes do sistema de justiça.

[17] Dom Quixote instaura, portanto, uma nova modernidade, não cartesiana, inserida na experiência concreta da vida, protegendo-a contra “o esquecimento do ser”, como nos mostrou o crítico e romancista Milan Kundera (1988, p. 72-3), no capítulo “A Herança Depreciada de Cervantes” do seu livro A Arte do Romance. Ao absorver e transformar a tradição literária, Cervantes fez a revisão dos conceitos aristotélicos de imitação, história e verdade. Além disso, rompeu com a ideia metafísica de um centro unificador de tudo e desconstruiu a suposta unidade orgânica da obra de arte. A partir dessa revolução cervantina, o romance transforma-se no sério jogo de questionamento da arte e da existência.

 

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 24/01/2023
Código do texto: T7702757
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