1931-(I) TROVAS DOS PATRONOS (Cadeira 36 )DA ACADEMIA MINEIRA DE TROVAS–(Parte 20-I)-Entrevistada: Sílvia Araújo Motta

1931-(I) TROVAS DOS PATRONOS (Cadeira 36 )DA ACADEMIA MINEIRA DE TROVAS–(Parte 20-I)-Entrevistada: Sílvia Araújo Motta

CADEIRA*36-PATRONO NA

ACADEMIA MINEIRA DE TROVAS/BH/MG/BRASIL:

36-LUIZ OTÁVIO

A Trova tomou-me inteiro,

tão amada e repetida,

que agora traça o roteiro

das horas da minha vida!...

Quer ser feliz? Então siga

a minha vida bizarra

que tem muito de formiga

e ainda mais de cigarra...

Festejo tanto e bendigo

vitórias que os outros têm,

que a vitória de um amigo

parece minha também!

Dizes que és pobre e eu, coitado,

inveja tenho de ti:

--tens tua mãe ao teu lado

e a minha, eu nem conheci!...

Telefono... sempre em ânsia...

e ao ouvir a tua voz,

sinto que a longa distância

fica menor entre nós...

Tirem-me tudo que tenho,

neguem-me todo o valor!

--Numa glória só me empenho:

a de humilde trovador...

Nessas angústias que oprimem,

que trazem o medo e o pranto,

há gritos que nada exprimem,

silêncios que dizem tanto!

Eu...você...as confidências...

O amor que, intenso, cresceu...

O resto são reticências

que a própria vida escreveu...

Ele cai...não retrocede!...

continua até sozinho...

que a fibra também se mede

pelas quedas no caminho!

Na vida tanta promessa,

tanto anseio de subir!

--E a ventura mal começa,

vem a hora de partir...

Sou como aquela palmeira,

sozinha, no alto do monte:

--Uma eterna prisioneira

olhando, triste, o horizonte...

Duas vidas todos temos,

muitas vezes sem saber:

a vida que nós vivemos

e a que sonhamos viver.

Beijos de mãe...filha...esposa,

tantos beijos ganha a gente!

--Como pode a mesma cois

ter sabor tão diferente!...

O mar nos deu a receita

de um viver sábio, fecundo:

sendo salgado, ele aceita

as águas doces do mundo!

Desconfio que a saudade

não gosta de ti, meu bem:

quando tu vens, ela vai...

quando tu vais, ela vem!

Não sei qual pior ferida,

qual o maior padecer:

se viver sem sonho a vida

ou se sonhar, sem viver.

Sou como a cana do engenho...

Quem dera que assim não fosse!

Quanto mais dores eu tenho,

o meu cantar sai mais doce!

Quero falar...retrocedo...

pois tenho um pavor medonho

de que ao contar meu segredo

você destrua o meu sonho!

Às vezes o mar bravio

dá-nos lição engenhosa:

afunda um grande navio,

deixa boiar uma rosa!

Meus sentimentos diversos

prendo em poemas pequenos.

Quem na vida deixa versos,

parece que morre menos.

Fiz o bem na vida, a esmo,

sem sequer olhar a quem...

E, esquecendo de mim mesmo,

fiz a mim o melhor bem!

Ó santa e doce morena,

ó mãe que eu não conheci,

esta tristeza... esta pena...

eu julgo que vem daí!...

De todo lado jogado,

desde os tempos de menino,

eu acho até engraçado

meu destino sem destino...

Plantei roseiras, outrora,

sem almejar o dono...

E sou bem feliz, agora,

colhendo rosas no outono.

Que estranha fatalidade,

grande amor de minha vida,

mesmo em forma de saudade,

és presença proibida!...

Um suplício que me aterra

e me torna quase incréu:

ter de perder-te na terra

para assim ganhar o Céu...

No Céu, em vida mais bela,

na terra, seja onde for,

se eu estiver longe dela,

é tudp Inferno, Senhor!...

Em dois versos se resume

a nossa esplêndida história:

- amor que é sonho e perfume!

- amor que é cruz e que é glória!

Este amor que não buscamos,

amor -- castigo e troféu,

se tem espinhos nos ramos,

tem flores que vêm do Céu!...

Contradição singular

que angustia o meu viver:

a ventura de te achar

e o medo de te perder.

Não pàras quase ao meu lado...

e em cada tua partida,

eu sinto que sou roubado

num pouco da minha vida...

Minha alma tanto se eleva,

carrego tão bem a cruz,

que este abandono que é treva,

tem desperdícios de luz!

Rusgas tolas, falta o senso,

não falo, não telefono...

E esse nosso orgulho imenso

é causa deste abandono.

Abandonada, esquecida,

sem amor, sem ter ninguém,

vai rolando, até que a vida

não a queira mais também...

A minha esposa... o meu Lar...

Os meus livros... meu filhinho...

-- Tu jamais hás de encontrar

ventura igual noutro ninho!

Mocinha, que reza tanto,

-- devota de Santo Antônio --

traz sempre um olho no santo

e o outro no matrimônio...

Mulher que não faz questão

de o corpo muito ocultar,

geralmente tem razão:

nada mais pode mostrar...

Tem amor e tolerância!

Não julgues assim a esmo!

Pois, na mesma circunstância,

talvez fizesses o mesmo.

Toma cuidado, poeta,

com teu sentir mais profundo.

-- A trova é muito indiscreta!

Conta tudo a todo mundo...

Amor -- sentimento forte!

Palavra odiada e querida...

Se é causa de tanta morte,

é a própria razão da Vida!...

Saveiros, que vêm de volta,

que eu vejo do alto do monte,

são pipas que a Tarde solta

com a linha do Horizonte...

Amarga insatisfação

que só desejo nos dá

de ter o que não se tem,

de estar onde não se está...

"Pequena" -- dizem zangados,

muitas vezes com desdém.

-- Nunca saberão -- coitados! --

que grandeza a trova tem!

Natal... ternura... poesia...

Vem o amor... e foge o mal...

-- Quem dera que todo dia

fosse dia de Natal!...

Tu gostas do que não gosto...

- E eu sofro por ser assim! --

-Vou ver se de mim desgosto,

para gostares de mim...

Não te causem sobressalto

maledicências terrenas!

- Contemplando o mundo do alto

as coisas ficam pequenas...

Eu... você... nossos dois filhos...

- Gosto tanto de quadrinhas

que do Lar fiz uma Trova,

sendo nós as quatro linhas...

Trovador, grande que seja,

tem esta mágoa a esconder:

a trova que mais deseja,

jamais consegue escrever...

Dos atos meus de bravura,

o que teve mais valor,

foi perder minha ventura

na renúncia de um amor.

Nas noites de lua cheia

como é bom a gente amar...

-As ondas beijando a areia...

E eu, na areia, a te beijar...

---***---

Silvia Araujo Motta
Enviado por Silvia Araujo Motta em 09/09/2008
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