Bobo da Corte e Chefe de Seção!

Bobo da Corte

Ah!

Se todos soubessem o quanto sou hipócrita:

Que minhas frases são feitas,

Meu sorriso forçado,

Minha risada cronometrada,

Pensamentos indecorosos,

Dignidade aparente,

Projetos os mais torpes,

Saber puro verniz,

Polidez mera sutileza,

Apetite cheio de gozo e arrotos...

Minha melhor imitação, por certo, é esta:

Por favor não me façam festa,

Não me ergam estátuas,

Não me queiram poderoso,

Não me imputem liderança,

Não me exijam atos heróicos,

Não me peçam tomada de posição,

Não, não e não!

Hoje, sem guizos, risos e máscaras,

Quero somente ficar em silêncio,

Sem minha rica e suntuosa,

Cínica e opulenta necessidade e condição

De bobo da corte! (pág. 31)

Chefe de Seção

Finalmente chefe de seção!

Tanto pedi, tanto rezei,

Tanto me benzi, cabeça baixei,

Tantos pisei, cartão de ponto marquei...

Ah, pequeno poder, ordens dar,

Problemas resolver, dar a palavra final,

Belo anel no dedo da mão ostentar,

Ouvir: é para o senhor, doutor!

Andar pelos corredores, chefe de seção!

Mas nada de parar por aí!

A escala é para subir,

Ponta de inveja aqui,

Inimigo declarado ali,

Removê-los como pó para baixo do tapete!

Receber os importantes com largo sorriso,

Procurar o nome na coluna social,

Viver como manda a razão!

Brisa, não venhas, quero ar condicionado!

Vento, não te atrevas, os papéis estão em ordem!

Vendaval, te contenhas, por favor, não! (pág. 35)

Do livro No Lado Obscuro da Lua -1998-

Pablo Ribeiro.