Estilística da Morbidez - continuação

A multidão do pensar

Sem uma resposta específica, vem a maravilhosa plurisignificação. Ou seja, nem todas as coisas que se diz têm um único significado.

O texto, com as idas e vindas, precisou de renovações, inovações e “deturpação” de si mesmo.

Algumas idéias foram absurdas – boas, mas absurdas, como as do inventivo James Joyce, cultuado como um ícone da literatura do século XX, do qual as obras mais famosas já foram consideradas ilegíveis – e as não tão absurdas, como a inovação na pontuação e a presença marcante da língua falada em “Grande sertão: Veredas”.

A idéia de abrir um leque de resultados, motivações, ações entre outros, eu não sei de quem surgiu, mas sei que foi brilhante.

Esse resultado vem principalmente da velocidade e das lacunas do texto. Não dando respostas através de lacunas, você abre uma enorme quantidade de possibilidades do texto. O leitor passará a ser o criador de sua própria estória.

Até mesmo a omissão de descrições – o que ajudará na velocidade – permitirá ao leitor imaginar a cena onde, quando e do jeito que quiser. O que seria uma sala, pode ser uma cozinha, o que pode ser tudo arrumado, pode ser uma grande bagunça.

Essas descrições podem alterar até mesmo o aspecto sócio-econômico do ambiente e dos personagens, tornando-o flutuante entre tudo e todos. Aliás, a literatura em si tem por obrigação ser “onipresente”.

Um exemplo que posso usar é simples, em uma única pergunta: qual é a pessoa mais bonita para você?

Pois bem, se você está lendo até aqui, significa que está bem “conectado” e já imaginou a resposta logo ao ler. A gama de respostas é inimaginável, não é? Cada um que leu (e espero que tenha sido muitos) pensou em uma pessoa deferente, concorda?

Esse é o brilhantismo da plurisignificação; deixar a cargo do leitor desenvolver tudo o que ele puder.

Ave, conto!

Eu não sei se alguém se perguntou no começo desse texto por que eu havia utilizado os filmes Matrix como exemplo de lentidão e inaptidão dentro de seu campo cultural. A resposta é que a agilidade do texto de hoje deve se familiarizar a do cinema. Ninguém mais tem tempo para passar horas sentado lendo sobre como a mesa estava forrada e quais objetos a habitavam. Essa é a razão do conto ter que ser veloz. A imagem deve surgir quase que por imediato durante a leitura.

Porém, ao invés de imitar a linguagem do cinema – tudo mastigado e remoído, restando à platéia assistir, comer, beber e respirar – a literatura deva recolher, omitir, subjugar e desmanchar qualquer imagem pré-fabricada, deixando a imaginação pouco fértil da sociedade atual trabalhar um pouco, resgatando a função do livro e da arte escrita. Assim, o conto torna-se o que ele ouvirá, o que ele sentirá, mas não o que ele “verá”.

Não quero transformar esse monte de pensamentos de um escritor amador em uma cartilha VXZ dos contos de suspense, mas espero que, talvez, ela contribua na criação de um novo ponto de vista sobre a literatura dos nossos tempos.

E lembre-se: se você tem uma boa idéia, mas que não sabe exatamente como desenvolvê-la, faça um conto! Essa é a mais “fácil” e melhor maneira de escrever o que imaginou sem ter que destruí-la com efeitos especiais e salsicha requentada.

m.M.