SOBRE O ATO DE BRINCAR E AMAR...

por Maria Dolores Fortes Alves.[1]

Brincar é ferramenta de criança. Brincar alimenta, reaviva a cor do sonho. Quando a criança, brinca exercita o adulto que um dia será. O brincar, o brinquedo é alimento da alma, alimento do sonho, da esperança. Criança que não brinca e como passarinho na gaiola. Perde o canto, perde o vôo, perde o sonho. Quando brinca, voa, sonha, constrói e reconstrói mundos. Criança que brinca cria novas melodias e colore o mundo com sua alegria.

Hoje colocam crianças em gaiolas e lhes enfeitam de jóias, de jogos e brinquedos que brincam sozinhos. Robotizam-lhe a alma, congelam os pensamentos.

Sim, congelam os pensamentos. A natureza, o brincar livre oferece fluidez, instiga a criança a pensar, a escolher, não é pré-determinado. Na Natureza tudo é tão novo e tão vivo quanto a natureza da criança. Instiga o pensar, o refletir, o sentipensar, o criar. No brincar livre a criança encontra sua sintonia e entra na sinfonia da vida.

Crianças que não puderam brincar, foram como passarinhos engaiolados. Foram obrigadas a seguir este ou aquele modelo em nome das boas maneiras, dos bons modos, do não suje a roupa, não faça isto, aquilo; ou foram seduzidas e guiadas pela fantasia que não era sua, era da TV, do jogo eletrônico, disto ou daquilo, tornam-se muitas vezes adultos frios, também congelados, mal amados.

Acho muito triste os pais trabalham dia e noite para comprarem grandes televisões, lindos sofás, enfeitarem as gaiolas com lindos e caros brinquedos eletrônicos e congelam as crianças para que não estraguem o lindo sofá, a linda cortina, o lindo brinquedo. Ou o brinquedo TV que congela o pensamento da criança...

Crianças não precisam do melhor brinquedo, do meu melhor apartamento ou casa, da melhor e mais enfeitada gaiola. Crianças precisam de sonho, de espaço para criação, de modelos humanos amorosos que lhes transmitam valores de paz, amor, não-violência, cooperação, coragem para não esmorecerem diante dos obstáculos. Modelos, exemplos, referenciais que lhes mostrem o valor de sonhar e acreditar que após a tempestade virá a calmaria, que no final do arco-íris ou atrás da montanha pode haver um barril e tesouros- tesouros da alma. Ou mesmo, se não houver, que aprendam a apreciar s flores e a relva do caminho, o sabor de um carinho, a força da gratidão, a luz do coração.

Valores se ensinam vivendo valores e somente pessoas com coerência interna podem transmitir verdadeiros valores porque são igualmente verdadeiras.

Objetos têm preço, seres humanos têm valor e somente damos aquilo que temos.

Dê um minuto de colo, de carinho, de um sim amoroso, de um não igualmente amoroso (porque quem ama põe limites, ensina o caminho reto, transmite o amoroso discernimento), isto não tem preço, tem valor, tem cor, tem sabor, tem amor... Pai, mãe, tio, tia, educadora, quanto valor tem teu amor, tem teu ser? Dinheiro compra enfeites para gaiolas, mas enfeites e alegria para alma, humanos vivos, com valor e com amor nenhum dinheiro poderá pagar, nenhum jogo, televisão, etc., poderá ensinar.

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[1] Este texto é parte integrante do livro “ O voo da águia: uma autobiografia.” De Maria Dolores Frtes Alves, publicado pela Editora WAK.