CRIANÇAS E ALMAS QUE VIVEM EM GAIOLAS...

Por: Maria Dolores Fortes Alves.[1]

Crianças de hoje não tem rua para brincar, não tem quintal. Rua não é lugar legal, é lugar de carro. Quintal também é lugar para guardar o carro. Guardam-se os carros, guardam-se as crianças, guarda-se a infância. Só não se guarda a alma. Esquecem-na, abandonam-se. Crianças tornam-se passarinhos em gaiolas com seus vôos e cantos tristes... e as vezes esquecem até mesmo o canto.

Ou os adultos querem ensinar ao passarinho um canto que não é seu e este perde sua singularidade, sua generosidade e alegria.

E, o passarinho que esquece seu canto e seu vôo, esquece-se, esmorece diante do primeiro obstáculo. Porque não tem sonho. Os passarinhos deixam de sonhar quando deixam de cantar... deixam de brincar, deixam de dançar, deixam de amar...

Vi e vejo em sala de aula, muitos passarinhos -pequeninos ou crescidos- que esqueceram seu canto. Imitam outros cantos, outros heróis, outras poses plastificadas. Esquecem o canto melodia da alma e do corpo. Perdem a singularidade, esquecem de ser si mesmo na busca de uma perfeição imperfeita porque a verdadeira perfeição só pode vir da ligação singular, da conexão consigo, da verdade verdadeira que é a autoria e si mesmo, a autoria de pensamento, a autoria de vida. Autoria de vida que é a maiêutica de si mesmo paridora dos cantos da alma!

Autoria é descobrir-se como único e ser si mesmo, singular, vivo, criativo, dotado de coerência interna, de uma escuta sensível de si mesmo em ligação com o Todo. As águias sabem disto. Mas também sabem as galinhas, os pintinhos, os patos, os gansos, os cisnes. Toda a Natureza sabe de sua coerência, toda Natureza é coerente. As arvores dançam com o vento, os peixes nadam com a maré, as águias- oh, as águias! - tão grande sincronia e coerência têm consigo e com a natureza que pairam no ar.... Até mesmo quando é tempo de renovarem-se, elas confiam na coerência da Natureza e enfrentam a dor da renovação. (diz a lenda...).

Mas, o bicho homem em sua agonia por mais, mais e mais, perdeu a sincronia, não dança mais com o vento, não nada mais com as águas, não canta mais com os pássaros...perdeu o encantamento e a si mesmo. Fragmentou-se, distanciou-se de Gáia. Esqueceu-se como filho de Gaia Saiu da floresta excluiu e fez-se excluído. Esqueceu seu canto... Aceitam verdades pré-concebidas, conceitos pré-estabelecidos e esquecem seus valores de integração, cooperação, amorosidade e coerência interna e com o Todo.

Cantemos canção que religa-nos a teia da vida.Que nos sincroniza com nossa canção interior, nos re-equilibra. Põe-nos na freqüência da amorosidade. Cantemos canção que soa na alma e vibra no coração.

[1] Este texto é parte integrante do livro “ O voo da águia: uma autobiografia.” Da Dra Maria Dolores Frtes Alves, publicado pela Editora WAK.