In-Zenonismo
Aqui me encontro...
Parado à beira de mais um dos meus muitos precipícios, que sempre perseguiram incessantemente a minha, agora, ou talvez já desde há muito, destrocada memoria. A todos os outros ou ignorei ou de alguma forma consegui ultrapassar, claro à custa das profundas mas bem visíveis, feridas. Marcas de batalhas vãs, duma barbara e ébria crueldade. Mas agora assumi perante mim mesmo que desisto! Ouviram bem? É verdade, desisti de lutar contra quem não tem a coragem de se dar a conhecer! Podem aparecer, podem me vir ver pela ultima vez com esta feição humaoide, distorcida e inconsequente.
Fantasmas negros, que se ocultam nos recantos obscuros da minha, dogma-mente-ceptica existência. Cobardes! Eles não vão aparecer, lamento. Como sempre preferem se refugiar no interior, que corroem até deixar meramente esta capa, esta crosta, incipiente sem vida, vazia, oca. Exposta à erosão das promiscuas passagens dos corpos, uns moribundos e muitos já em avancada fase de decomposicao. A todos eles, digo que não me deixarei arrastar durante anos e anos de sofrimento auto punitivo, só para lhes dar alimento, nunca! Eles ainda não acreditam, quem sabe se algum dia, eu mesmo acreditarei. No entanto, mantenho e assumo perante todos vós que desisti de lutar!
Esforco-me por recordar se terá sido sempre assim, a minha existencia, ou melhor, pois tendo em conta a situação neste momento, a minha penosa e desgastante subsistencia. Tento acreditar que houve alturas em que fui feliz, essa triste desilusão dos sentidos. Porem, a resposta parece-me perdida na penumbra dos escombros de Eras passadas, fugazmente esquecidas.
Os eternos murmurios da brisa, vinda das longinquas estepes Atlântidas, invadem-me a alma e tolhem-me a razão. Sinto-me paralisado a beira do meu destino já desde há muito tracado. A sua importancia abate-se sobre mim, reduzindo-me a uma mera e mordaz insignificância existêncial. Inocuas, formas disformes que compõem estes restos rarefeitos, de quem outrora quase acreditei ser mas que concretamente nunca verdadeiramente fui. Assemelham-se agora, a meros remendos gastos, dum corpo desgastado pelo lento e eficaz acumular de pesos mortos, anos após anos de espera inutil, numa inerte grandeza inconsequente.
Aqui me desencontro...
António de Almeida