CONTOS REFLEXIVOS DO ANDARILHO MÃO AMIGA

Segue o peregrino, o mundo e seu caminho, sua casa e onde ele estiver o mundo e mais que uma escola, e a própria fonte da sabedoria.

Ele para, olha para o lado, e percebe que um homem lhe observa, o homem lhe cumprimenta, e o andarilho humildemente retribui o cumprimento com um sorriso.

O homem lhe chama e oferece um espetinho e um pouco de feijão tropeiro e mandioca.

O peregrino aceita de bom grado, pois a ultima refeição foi ontem a tarde.

Ali se sentam dois desconhecidos em uma barraca colocada em uma calçada, à comida tem um cheiro agradável.

O homem sorrindo diz ao andarilho.

Aproveite bem o alimento, pois eu também já vaguei por terras estranhas, e fui ajudado por muitos.

O andarilho sente se feliz com a presença do estranho, e ali como dois amigos comem, repetem a comida, a fome não e só de comida, mas também de companhia.

A conversa se estende, o estranho começa a contar como se deram os acontecimentos que o levaram a se tornar um andarilho.

E assim se inicia mais uma historia na vida do ser que vive vagando.

Olha pobre viajante minha historia não e única, ela e como milhares de outras, a diferença esta em como se administra seus problemas.

Pois cada ser busca uma via de acesso para a solução de seus problemas, eu busquei a solução dos meus no trabalho e abnegação.

E ali se registra mais uma historia no livro da vida, pois palavras ao vento se vão, mas quando registramos no papel servem de exemplo.

E assim o homem bem afeiçoado e com ar de gente importante se senta ao lado do andarilho para contar sua historia.

As pessoas que passam ficam a observar um doutor conversando com um mendigo.

E o homem aparentando um aspecto importante externamente se mostra outra pessoa internamente, e assim inicia sua história.

Caro andarilho, eu fiz um curso técnico de contabilidade, parece sem importância hoje, mas na época em que fiz era como se fosse um curso superior.

Consegui um emprego em uma grande empresa, andava bem vestido e cheiroso, todos que comigo conviviam me tratavam com grande consideração.

Apos alguns anos no emprego eu era responsável pela parte financeira da empresa, tinha acesso a todo tipo de informação.

Meu chefe me tratava como um filho, me casei com a secretaria do diretor da empresa, o casamento foi um acontecimento na cidade, saiu ate nos jornais,e nas colunas sociais.

Morava em uma casa confortável, muito bem mobiliada, carro novo na garagem, andava impecavelmente bem vestido.

Ate que um dia ao chegar à empresa me chamaram na sala do diretor, ao entrar vi dois homens com aparência agressiva.

O chefe me pediu para sentar em uma cadeira no canto esquerdo da sala, eu meio que paralisado não tive forças para me mover.

Foi quando senti um tapa na nuca, e um homem gritando.

Senta logo vagabundo, ta esperando convite de quem.

Com o tapa eu já parei quase em frente a cadeira.

Sentei-me, sem saber de nada, foi quando o patrão me perguntou pelo dinheiro desviado, para onde eu estava mandando, em qual pais que tinha conta bancaria.

Não soube responder nem uma das perguntas, foi quando um dos homens se aproximou e disse.

Coloca o grampo e vamos para o DP, o moleque e cadeado, mas tem problema não o chaveiro ta lá.

Jogaram-me em um camburão de uma veraneio, e quase uma hora e meia depois cheguei a delegacia.

Foi ai que eu fui saber do que estava acontecendo, haviam dado um desfalque milionário na empresa, e criaram provas que levavam a mim como o autor do roubo.

Apanhei muito, fiquei desfigurado, e apos varias tentativas acabaram por desistir, eu já estava quase morto.

Ninguém havia ido me procurar, estava sozinho.

Em uma manha do mês de abril de 1974 eu fui jogado em um terreno baldio, quem fez aquilo achou que eu já estava sem vida, pois estava nu e com o corpo gelado pelo frio da madrugada, e pela cela coberta de água.

Só que naquela manhã quando jogado em local ermo, um carroceiro que havia ido cortar capim para seus cavalos me encontrou, me colocou em sua carroça e me levou para sua casa.

Três dias depois recobrei a consciência e voltei a conversar.

O carroceiro se aproximou e me disse.

Olha amigo, vi quando a viatura passou por mim na estrada de chão, e não demorou muito ela voltou pela mesma estrada, eu segui as marcas dos pneus, e quando olhei no mato vi seu corpo jogado.

Me aproximei, e ouvi você gemer bem baixinho, te socorri e trouxe ate minha casa, mas não se preocupe eu também vivo fugindo da policia pois fui acusado de algo que não fiz e hoje sou fugitivo.

E na casa do carroceiro fiquei por vários dias, pois se aparecesse sei que eles me matariam.

Apos a recuperação fui procurar minha esposa, cheguei de madrugada e fiquei em um lote baldio quase de frente ao portão da minha casa.

E quando o portão se abriu e eu ia sair do mato, percebi que ela não estava só, vi o meu antigo chefe pondo o carro para fora da casa.

O andarilho só ouve esperando o desenrolar da historia para tentar compreender melhor o que aconteceu.

E o homem continua.

Fiquei sem saber o que pensar, voltei para casa do carroceiro e me escondi novamente, e por vários dias voltei ao mesmo local e continuei observando, não quis me ariscar, pois não sabia o que realmente acontecia.

Então em uma tarde de domingo eu estava de cabeça baixa pensando nos acontecimentos e o carroceiro se aproximou.

E com ar de tranquilidade me perguntou o que estava acontecendo, eu calmamente e eu lhe relatei toda a minha história desde o principio.

Ele era um homem muito inteligente e vivido, me fez varias perguntas e ao final ele fez um balanço do que aconteceu e de como aconteceu.

Coçou a barba e começou a falar, e quanto mais ele falava mais eu conseguia entender as coisas, e ao final percebi a grande armação que entrei.

Servi de bode expiatório, me usaram para encobrir um grande desvio de dinheiro.

Enquanto contava minha historia o carroceiro foi me mostrando o que eu não conseguia ver.

Quem me apresentou a minha esposa foi meu chefe e quase pai, ele sempre ia a minha casa, ele e minha esposa estavam sempre juntos, a casa foi presente dele, mas colocou no nome dela.

Depois de tudo esclarecido o carroceiro achou melhor eu sumir.

Foi uma noite pensando, na manhã seguinte eu já tinha resolvido ir embora do pais.

Procurei um antigo amigo de serviço, era o único em que confiava de verdade, bebemos e conversamos, contei tudo a ele.

O amigo me contou outras coisas que ele mesmo sempre percebeu, e ao final eu me culpei, como que a mulher mais bonita da empresa ia ficar com alguém com tão poucas condições financeiras como eu.

O amigo me perguntou como poderia me ajudar, pensamos juntos, e a decisão final foi sair do pais.

Mas eu não tinha dinheiro nem documentos, ele acabou por arrumar uma saída clandestina em um navio que transportava carne.

Sem opção acabei por embarcar no navio.

Foram messes de viajem, ate que tive que descer em um porto, não sabia onde estava, virei um andarilho, naquela época ninguém dava importância a um vagabundo que vivia de pedir esmolas.

Vaguei por um ano e meio, acabei indo parar em Londres, e em uma noite fria eu cai quase que desfalecido em um beco, já havia vários dias que não comia, as roupas que eu ganhava não eram suficientes para me manterem aquecido.

Eu estava vasculhando um contêiner de lixo, quando ouvi alguém se aproximar, tentei esconder, mas não teve jeito, pois eu estava muito fraco.

Foi quando se aproximou um português alto forte e bigodudo, fiquei com medo de apanhar e me encolhi.

O português a me ver ficou estático, viu o medo em meus olhos, estava sujo magro e cheio de feridas nos pés.

O grandalhão começou a chorar a me ver naquela situação, abaixou se e estendeu sua Mão amiga.

Parecia ter uma áurea diferente, um daqueles anjos em processo de regeneração e recomposição evolutiva.

Levou-me aos fundos de sua loja onde servia de deposito, e em um pequeno banheiro eu me lavei, sua esposa me trouxe roupas limpas e uma refeição.

Como a loja estava fechando ele começou a conversar comigo, parecíamos falar a mesma língua, e em poucos minutos contei minha historia a ele.

Diante da minha historia de vida e minha sinceridade ele resolveu me ajudar.

Esse foi o começo de uma nova vida, como ele substituiu os contêineres de lixo por um coletor que recolhia o lixo todas as noites, ele arrumou o lugar onde era o deposito de lixo para eu me abrigar.

Trabalhava dia e noite, ele arrumou uma nova documentação para mim, e aos poucos eu transformei o deposito de lixo em um lugar confortável e digno de se viver.

E por ali os anos foram se passando economizei cada moeda comia pé de frango, pescoço, asa, dorso de frango, tinha meu fogão e minhas panelas.

Já havia me habituado à nova vida, me sentia feliz e útil, e já tinha juntado uma quantia razoável.

E em uma noite quando saia da frente da loja e caminhava pelo beco percebi um ser se esgueirando como um dia eu havia feito.

Aproximei-me e vi uma mulher suja fedendo e com cara de faminta,

Quando cheguei frente a ela vi que era muito bonita, ofereci-lhe comida e um banho, ela aceitou.

Depois de limpa e alimentada ela me contou sua historia. Era brasileira também, foi iludida em uma cidade no interior do nordeste, de que teria um emprego de modelo e que iria ganhar muito dinheiro.

Mas quando chegou à Espanha foi tudo diferente, tomaram seu passaporte e todos seus documentos, ela se viu obrigada a fugir na primeira oportunidade.

Foi à noite inteira conversando, contei-lhe toda minha historia, e juntos sofremos e rimos.

Deixei-a ficar no meu abrigo seguro, e na primeira oportunidade contei tudo ao patrão, de inicio ele ficou meio receoso, mas depois de conhece La me aconselhou a dar ajuda aquele ser que vagava.

O andarilho vê claramente a reconexão cósmica mutua, de seres pluriversais se agrupando para evolução conjunta.

O homem continua sua história sem perceber a reflexão dos fatos feitas pelo andarilho.

E por ali fomos levando a vida, e quase sem perceber já vivíamos como marido e mulher, eu passei a conhecer ela de verdade e percebi a guerreira que estava ao meu lado.

E juntos guardávamos quase todo nosso salário, de dia comíamos na loja a noite quando não tinha sobras, tinha os restos de frango que eu guardava dentro de pequenos recipientes de plástico na geladeira.

Ela conseguiu entrar em contato com sua família e regularizou toda sua documentação, eu já era um legitimo português, com documentação que passaria em qualquer sistema alfandegário, pois o português já havia me ajudado nisso.

Ate que um dia resolvemos voltar ao Brasil, tiramos ferias em nosso emprego e viemos visitar a família dela.

A viajem foi tranquila, podíamos ir e vir sem problemas, e assim o fizemos durante anos tirávamos ferias e vínhamos passear no Brasil.

Eu já não tinha mais parentes de verdade, pois fui criado como filho de criação, nunca fui importante de verdade para ninguém, a família dela me tratava como um dos seus, pois na primeira vez que viemos ao Brasil ela contou toda sua historia, e deixou claro que devia sua vida a mim.

Então juntos decidimos usar nossas economias para comprar uma fazenda em uma cidade do interior próximo a cidade onde eu vivia.

A família dela era muito pobre e numerosa, trouxemos aquela gente para nossa fazenda e demos condições para que eles trabalhassem e cuidassem do que tínhamos construído.

Voltamos para Londres e por lá ficamos mais alguns anos, o tempo foi mais que suficiente para adquirirmos uma quantia razoável para viver bem no brasil.

E depois de muitos anos em uma festa entre amigos resolvemos voltar de vez ao brasil.

A noticia causou grande impacto onde vivíamos e trabalhávamos, mas todos por ali eram imigrantes e tinham as mesmas vontades que eu e minha mulher.

No dia da despedida foi só choro, ate que o português se aproximou e contou sua historia, que não era diferente de todos que ali viviam, percebi que minha historia não era única.

E quando arrumávamos nossas malas para partida, ele se aproximou e me entregou uma sacola, quando abri vi que tinha muito dinheiro.

O português me abraçou e me disse. Isso e seu por direito, eu retirava parte do seu salário e do dela e guardava, pois sabia que um dia iriam partir, e assim eu sempre me preocupei com o futuro de vocês.

Despedimos-nos e fomos para o aeroporto.

Chegamos ao Brasil e fomos para nosso novo lar, compramos mais terras e junto com a família da mulher dobramos o patrimônio em menos de cinco anos.

O andarilho em estado de êxtase olha para o homem e pergunta sobre a antiga esposa e o antigo emprego de contador.

O homem coçando o bigode lhe diz.

Depois de tudo estabilizado no Brasil procurei o antigo amigo que um dia me ajudou a fugir no navio.

O andarilho quase não se contendo pergunta.

E ai. E ai.

O homem conta lenta e pausadamente sobre os acontecimentos na sua ausência.

O amigo então me disse.

Com a sua partida eu continuei como se não soubesse de nada, seu antigo chefe arranjou outro e colocou no seu lugar, a historia foi a mesma, sua antiga mulher se aproximou e conquistou o rapaz.

Que se apaixonou por ela, e acabou por cair na mesma armadilha.

Só que com ele foi diferente.

Eu me aproximei e contei tudo que eles haviam feito com você, de inicio ele duvidou e achou que eu estava com inveja.

Mas ficou atento a tudo que acontecia, e quando percebeu que estava sendo enganado me procurou.

Sentamos e conversamos longamente, ao final ele me chamou para irmos ao presidente da empresa e contar tudo.

A principio relutei muito, mas acabei indo falar com o chefe, que não deu a mínima credibilidade ao que dissemos.

Mas passou a observar mais de perto os passos do funcionário de confiança, não demorou muito para que ele descobrisse a verdade dos fatos.

O patrão me chamou novamente e me pediu sigilo, pois os desvios estavam sendo investigados, e ele queria saber para onde o dinheiro estava indo, e quem estava envolvido.

Depois de quatro meses a mídia divulgava toda fraude de caráter internacional que acontecia a muito tempo na empresa.

Todos os envolvidos foram presos, inclusive seus torturadores, alem dos crimes que eles foram responsabilizados também incluíram sua morte e a ocultação do seu cadáver, que diga se de passagem nunca foi encontrado.

Sua antiga família de criação foi indenizada, e mudou se de cidade, temendo represálias.

O bode expiatório assumiu o lugar de seu antigo chefe, eu me tornei responsável pela segurança da empresa em todo pais, e a vida voltou à normalidade.

Eu tentei te encontrar, mas foi em vão.

Depois de tudo nunca mais ouvi falar da sua ex mulher nem do seu antigo chefe, sei que perderam tudo e ainda foram presos.

A conversa termina com a promessa do segredo da visita, e a amizade ainda mais forte.

Eu agora sabia que o destino cobrou seu preço, e que não valia a pena remexer no passado, agora eu seria uma nova pessoa, com uma nova vida.

Sai mais leve.

O andarilho reflete.

Apenas reflete.

O preço que os juízes do pluriverso cobram vão além de uma existência, e quem teima em continuar errando fica vagando por mundos inferiores ate que todas as dividas sejam pagas.

O homem olha para o andarilho e fala sorrindo.

Calma amigo a historia ainda não acabou.

O andarilho sorrindo agora fala.

Ainda tem mais.

O homem continua.

Depois que sai da casa do antigo amigo fui atrás do carroceiro a quem devo minha vida.

Andei por quase uma hora, a estrada de chão estava do mesmo jeito, o progresso ainda não havia chegado por ali.

Parei o carro próximo ao colchete, abri e desci em direção a casa, de longe eu o vi.

E ele ao me ver me reconheceu de longe, já veio sorrindo em minha direção, nos abraçamos e descemos ate sua casa.

Tudo ainda estava do mesmo jeito.

O barraco era de tabua, um batedor de roupa, que era uma tabua grossa de madeira, onde a água de sabão escorria tinha uma moita de taioba.

Ao lado do batedor um antigo vaso sanitário que servia para plantar cebolinha, e uma banheira velha que um dia serviu para banhar uma criança agora era usada para plantar salsa e um pé de pimenta cumari.

Tudo muito simples, o cavalo descansava em um cercado de arame farpado, e ao lado a carroça toda remendada com tabuas velhas.

Sentamos, eu sua mulher e seus filhos, que eram todos crianças pequenas, eu fiz um breve relato de todo o acontecido, ate chegar na ida a sua casa.

Ele tirou o chapéu de palha da cabeça, olhou em minha direção e me disse.

Que historia heim, da para escrever um livro, pena que tenha que ficar no anonimato.

Sorrimos e brincamos quase que a tarde inteira, e ao sair dei lhe uma ajuda razoável, e daquele dia em diante meu salvador vive com dignidade.

Faço o que esta ao meu alcance para ajudá-lo, agora quero limpar o nome dele para que possa seguir sua vida em paz.

E essa e minha historia caro amigo.

O andarilho se despede e sai andando, e refletindo sobre a gratidão e sua forma de pagamento, feliz quem recebe ajuda, mas quem ajuda tem seu pagamento no momento certo.

O nosso dinheiro e moeda de troca apenas nesse plano, mas em outros mundos de nada vale, as nossas economias devem ser feitas para serem usadas no momento da transição.

E assim o viajante segue, e a energia criadora vai lhe guiar ate um outro lugar, sem se importar com o tempo, o que vale na verdade são as experiências vividas e como elas podem ser reaproveitadas em outras vidas, existentes ou vindouras.

O importante e de como tudo isso vai servir para moldar uma nova alma no caminho do bem, da fraternidade e da soberania das existências.

Paulo César de Castro Gomes.

Graduado em Direito pela Universidade Salgado de Oliveira Goiânia, pós-graduado em docência universitária pela Universidade Salgado de Oliveira Goiânia, pós graduando em Criminologia e Segurança Publica pela Universidade Federal de Goiás. (email. paulo44g@hotmail.com)

Este livro se encontra pronto aguardando editora para publicação.

paulocastro
Enviado por paulocastro em 30/03/2016
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