Crítica Faroeste Caboclo o Filme: Bang Bang Em Balas de Festim

No mais perfeito estilo faroeste, João de Santo Cristo é olho por olho e dente por dente. Era inevitável que o anti-herói da música de Renato Russo fosse parar nas telonas. Afinal, Faroeste Caboclo, com quase dez minutos de duração, não é apenas uma música. Está mais para uma ópera ou roteiro de cinema mesmo. Não era difícil ouvir alguém dizer: “Essa música deveria virar filme!”. Pois aí está. Após quase três décadas do lançamento da música, saciando fãs da Legião Urbana Brasil a fora, em maio de 2013, estreou nos cinemas Faroeste Caboclo, o filme. Mas será que esta produção cumpriu a missão quase impossível diante da tamanha expectativa?

O filme se passa na década de oitenta e começa com a clássica cena final de João versus Jeremias. Depois retoma a narrativa do inicio, com João de Santo Cristo, ainda menino, no sertão da Bahia. Em vários momentos chaves aparecem “flashbacks” contando sua infância até a trágica cena do assassinato de seu pai. Esta opção de narrativa, não linear, foi bastante acertada para contar uma história que 99% dos espectadores já conhecem início, meio e fim. Foi uma maneira inteligente de surpreender o público. Além disso, a trama é narrada em primeira pessoa, o que funciona muito bem quando a história se dá em torno do seu protagonista. Filmes como Forest Gump, se apropriam muito bem deste formato.

A fotografia está simplesmente fantástica! O clima de faroeste é muito bem explorado, com imagens de baixo para cima e o foco nas passadas firmes dos sapatos de couro. O cano longo da Winchester 22, paralelo ao cano das botas, também não ficaram de fora. E se a fotografia ambientou bem este faroeste, a trilha sonora não deixou por menos. Quando se podia esperar a música Faroeste Caboclo tocando o tempo todo, a trilha sonora dá um show de originalidade. Consegue simplesmente mesclar, com maestria, ambientes tão distintos como um faroeste e o rock anos 80 de Brasília. E a música homônima limita-se a tocar somente no início e final do filme. Sem dúvida a trilha sonora é um dos pontos altos desta produção.

No elenco, poucos nomes conhecidos do grande público, mas não por isso menos competentes. Isis Valverde, Antônio Caloni e Marcos Paulo fizeram bem o dever de casa. Mas quem chama mesmo a atenção é Felipe Abib. Ele é quem dá vida ao antagonista Jeremias. É um ator lapidado, sobretudo, nos teatro-escolas do Rio de Janeiro. Jeremias tinha tudo para ficar canastrão e manipulado nas mãos erradas, mas Felipe não desaponta e faz bonito ao encarnar este Jeremias, meio mistura de “cowboy fora da lei” com “playboyzinho” de Brasília. Outro que traz um trabalho primoroso é César Troncoso que vive o traficante Pablo na trama. O sotaque castelhano do ator uruguaio acaba enriquecendo ainda mais a verossimilhança com o personagem, além de uma presença cênica que deixa o público até admirando este vilão.

Contudo, não se pode dizer que Faroeste Caboclo é uma obra prima do cinema nacional. A esta altura me permito dizer que, como fã da obra de Renato Russo, uma obra prima era sim o que eu esperava. Mesmo sabendo que o filme não se propôs em ser uma sequência literal da música, não dá para perdoar o que fizeram com o final. Não é admissível que tenhamos um final de cinema menos impactante que o cantado na música. Quando se esperava o “Grand Finale”, como temos na canção, com o público acompanhando o duelo, com notícia na TV, com a burguesia da cidade recalcada diante de um personagem como Santo Cristo... o que temos é uma reuniãozinha particular entre Santos Cristo, Jeremias e Maria Lúcia. O jogo do século com Maracanã vazio. Bem diferente do catártico final cantado por Renato Russo. Mas, apesar de deixar bastante a desejar na conclusão, o filme cumpre bem a missão de eternizar a saga deste incrível personagem nas telonas. Vale muito o ingresso, mesmo pagando inteira.