TRILOGIA "O CÍRIO DE NAZARÉ" - 3. CÍRIO FLUVIAL, O ENCANTO DAS ÁGUAS
Sérgio Martins Pandolfo*
Belém do Pará está localizada, na maior porção de sua orla, às margens dos rios Guamá e Pará (do tupi para = água, rio), que ao se encontrarem conformam a baía do Guajará, no estuário do mais longo e caudaloso rio do mundo, o Amazonas, o qual dá formação à maior bacia hidrográfica do planeta. Dezenas de ilhas dispersas ao longo desse formidável hidrocaudal, habitadas por caboclos ribeirinhos, compõem, com a porção continental, a área metropolitana de Belém. Tudo é aqui, assim, aquaticamente superlativo. Por isso que a capital parauara, nacionalmente conhecida como “a cidade das mangueiras”, é também a “rainha das águas”, a “metrópole das águas”, a “atalaia do Norte” e está contida em um estado que é a “terra dos rios”.
Dentro desse contexto mega-hidrográfico é natural, quase uma consequência lógica dessa abundância aquática, que o Círio de Nazaré, a maior e mais opulenta procissão que se realiza em nosso País e no mundo, “algo que empolga, emociona e redime ao mais empedernido e incréu dos mortais”, como já o dissemos algures, cuja massa de romeiros que a acompanha é representada, em mais de 60%, por ribeirinhos que se deslocam, anualmente, de todos os pontos do Estado, terminasse por exigir um desdobramento cumprido ao longo de suas avenidas líquidas, o “Círio das Águas”, como o denominou o jornalista Raymundo Mário Sobral.
Tal romaria fluvial foi idealizada, proposta e organizada pela primeira vez, em 8 de outubro de 1986, pelo jornalista e historiador Carlos Rocque, então Presidente da Companhia Paraense de Turismo - PARATUR, arrimado nos fatos antecitados, mas, também, pela constatação de que a Virgem de Nazaré é a padroeira dos navegantes ribeirinhos e seus mais importantes milagres relatados são alusivos a naufrágios, com a salvação dos devotos. A maioria dos “ex-votos” exibidos nas romarias ou no Museu do Círio é a isso referente. Ademais, por força da Lei nº 4.371, da Assembléia Legislativa do Pará, Nossa Senhora de Nazaré é a padroeira do Estado e Rainha da Amazônia. O deste ano será, portanto, o 23º Círio Fluvial a ser realizado.
A romaria das águas é hoje algo como a avant première do Círio e já está perenizada no calendário das festividades nazarenas. E se agiganta e mais se engalana e enriquece a cada ano! No sábado que antecede ao Círio tradicional, nas águas barrentas de nossa baía do Guajará, o séquito dos barcos enfileirados, embandeirados, multicoloridos, levando em seu interior uma gente alegre, confiante, animada, mas devota, é um encanto para os olhos e um bálsamo para a alma. Barcos de todos os tamanhos, tipos e modos de propulsão (remos, vela, motor) seguem, manobrados por contritos seguidores da devoção à Senhora, até à Vila de Icoaraci, onde oficialmente se inicia a procissão, e de lá, navegando à retaguarda do paquete especial das autoridades, que secunda a corveta da Marinha do Brasil, a qual conduz, gloriosamente, em sua berlinda ricamente ornamentada com flores e trajando manto regiamente confeccionado, a imagem da Virgem que um dia o caboclo Plácido encontrou na margem de um igarapé em Belém, vêm até o cais belenense, onde a Santa é recepcionada com honras de Chefe de Estado pelo povo paraense. De lá será levada até seu nicho no Colégio Gentil Bittencourt, de onde sairá, à noite, conduzida em procissão que é, também, tocante manifestação de fé, a Transladação, até à Catedral metropolitana. No domingo, o Círio.
Há de ser ressaltado que, paralelamente ao aspecto religioso, o Círio fluvial descancelou amplíssimo e futuroso horizonte no panorama turístico de Belém. Em sua grande maioria, os barcos ornamentados que compõem o séquito naval são disponibilizados por empresas públicas ou privadas a seus funcionários, companhias de turismo ou empresários autônomos, que afretam suas embarcações para firmas ou grupos de fiéis formados especificamente para esse fim. As agências de turismo, no afã de aumentar a clientela, oferecem pacotes atrativos que, além da passagem, ofertam café-da-manhã, camiseta alusiva ao evento, missa a bordo, brindes, sorteios, música ao vivo, assistência de guias de turismo e de apoio, afora as iguarias regionais, como o tacacá, o munguzá e a maniçoba. Os paraensíssimos brinquedos de miriti, tradicionalmente confeccionados em Abaetetuba, são também uma constante nas embarcações, para a alegria da gurizada, o que perpetua a tradição. Cresce, assim, a devoção à Senhora de Nazaré e o sentimento de parauarismo, incrementa-se o turismo regional que, em última análise, vem em auxílio dos próprios devotos. Mais um milagre da Virgem?
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(*) Médico e Escritor. ABRAMES/SOBRAMES
serpan@amazon.com.br - sergio.serpan@gmail.com - www.sergiopandolfo.com
Sérgio Martins Pandolfo*
Belém do Pará está localizada, na maior porção de sua orla, às margens dos rios Guamá e Pará (do tupi para = água, rio), que ao se encontrarem conformam a baía do Guajará, no estuário do mais longo e caudaloso rio do mundo, o Amazonas, o qual dá formação à maior bacia hidrográfica do planeta. Dezenas de ilhas dispersas ao longo desse formidável hidrocaudal, habitadas por caboclos ribeirinhos, compõem, com a porção continental, a área metropolitana de Belém. Tudo é aqui, assim, aquaticamente superlativo. Por isso que a capital parauara, nacionalmente conhecida como “a cidade das mangueiras”, é também a “rainha das águas”, a “metrópole das águas”, a “atalaia do Norte” e está contida em um estado que é a “terra dos rios”.
Dentro desse contexto mega-hidrográfico é natural, quase uma consequência lógica dessa abundância aquática, que o Círio de Nazaré, a maior e mais opulenta procissão que se realiza em nosso País e no mundo, “algo que empolga, emociona e redime ao mais empedernido e incréu dos mortais”, como já o dissemos algures, cuja massa de romeiros que a acompanha é representada, em mais de 60%, por ribeirinhos que se deslocam, anualmente, de todos os pontos do Estado, terminasse por exigir um desdobramento cumprido ao longo de suas avenidas líquidas, o “Círio das Águas”, como o denominou o jornalista Raymundo Mário Sobral.
Tal romaria fluvial foi idealizada, proposta e organizada pela primeira vez, em 8 de outubro de 1986, pelo jornalista e historiador Carlos Rocque, então Presidente da Companhia Paraense de Turismo - PARATUR, arrimado nos fatos antecitados, mas, também, pela constatação de que a Virgem de Nazaré é a padroeira dos navegantes ribeirinhos e seus mais importantes milagres relatados são alusivos a naufrágios, com a salvação dos devotos. A maioria dos “ex-votos” exibidos nas romarias ou no Museu do Círio é a isso referente. Ademais, por força da Lei nº 4.371, da Assembléia Legislativa do Pará, Nossa Senhora de Nazaré é a padroeira do Estado e Rainha da Amazônia. O deste ano será, portanto, o 23º Círio Fluvial a ser realizado.
A romaria das águas é hoje algo como a avant première do Círio e já está perenizada no calendário das festividades nazarenas. E se agiganta e mais se engalana e enriquece a cada ano! No sábado que antecede ao Círio tradicional, nas águas barrentas de nossa baía do Guajará, o séquito dos barcos enfileirados, embandeirados, multicoloridos, levando em seu interior uma gente alegre, confiante, animada, mas devota, é um encanto para os olhos e um bálsamo para a alma. Barcos de todos os tamanhos, tipos e modos de propulsão (remos, vela, motor) seguem, manobrados por contritos seguidores da devoção à Senhora, até à Vila de Icoaraci, onde oficialmente se inicia a procissão, e de lá, navegando à retaguarda do paquete especial das autoridades, que secunda a corveta da Marinha do Brasil, a qual conduz, gloriosamente, em sua berlinda ricamente ornamentada com flores e trajando manto regiamente confeccionado, a imagem da Virgem que um dia o caboclo Plácido encontrou na margem de um igarapé em Belém, vêm até o cais belenense, onde a Santa é recepcionada com honras de Chefe de Estado pelo povo paraense. De lá será levada até seu nicho no Colégio Gentil Bittencourt, de onde sairá, à noite, conduzida em procissão que é, também, tocante manifestação de fé, a Transladação, até à Catedral metropolitana. No domingo, o Círio.
Há de ser ressaltado que, paralelamente ao aspecto religioso, o Círio fluvial descancelou amplíssimo e futuroso horizonte no panorama turístico de Belém. Em sua grande maioria, os barcos ornamentados que compõem o séquito naval são disponibilizados por empresas públicas ou privadas a seus funcionários, companhias de turismo ou empresários autônomos, que afretam suas embarcações para firmas ou grupos de fiéis formados especificamente para esse fim. As agências de turismo, no afã de aumentar a clientela, oferecem pacotes atrativos que, além da passagem, ofertam café-da-manhã, camiseta alusiva ao evento, missa a bordo, brindes, sorteios, música ao vivo, assistência de guias de turismo e de apoio, afora as iguarias regionais, como o tacacá, o munguzá e a maniçoba. Os paraensíssimos brinquedos de miriti, tradicionalmente confeccionados em Abaetetuba, são também uma constante nas embarcações, para a alegria da gurizada, o que perpetua a tradição. Cresce, assim, a devoção à Senhora de Nazaré e o sentimento de parauarismo, incrementa-se o turismo regional que, em última análise, vem em auxílio dos próprios devotos. Mais um milagre da Virgem?
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(*) Médico e Escritor. ABRAMES/SOBRAMES
serpan@amazon.com.br - sergio.serpan@gmail.com - www.sergiopandolfo.com