José Saramago

Li quase toda a obra de José Saramago, e, irei sentir a falta de ler no futuro as suas histórias que sempre me encantaram desde os tempos de “Levantado do Chão” naquele longínquo 1980, cujo tema central é a luta do povo e da miséria rural face às forças opressoras (latifundiários, forças da ordem e a igreja),“Memorial do Convento” (1982), crítica à opressão exercida pela Nobreza e Clero sobre o povo, e a história de amor entre Baltazar e Blimunda, “Jangada de Pedra” (1986), a separação geográfica da Península Ibérica da Europa, “Evangelho Segundo Cristo” (1991), livro que o fez mudar-se para a Ilha de Lanzarote no Arquipélago das Canárias após o Governo Português de então vetar este romance a uma lista de romances portugueses candidatos a um prémio literário europeu por “atentar contra a moral cristã”, conta a história humanizada de Jesus Cristo e da sua relação com Maria Madalena, “ Ensaio sobre a Cegueira” (1995), onde todas as personagens ficam cegas exceptuando uma mulher, será preciso os homens ficarem cegos para enxergarem a sua própria essência? Passado para tela excelentemente por Fernando Meirelles, “As Intermitências da Morte” (2005) que começa assim “ No dia seguinte ninguém morreu” onde reflete sobre a vida, morte, amor, existência em estilo imensamente sarcástico e irónico, “ Viagem do Elefante” (2008), a ironia e o sarcasmo durante uma viagem de um elefante oferecido pelo rei português D. João III ao seu primo o Arquiduque Maximiliano da Áustria, “Caim” (2009) o seu último livro, e nova polémica com a Igreja Católica, Saramago esclarece da seguinte maneira “ Deus, o demónio, o bem, o mal, tudo isso está na nossa cabeça, não no céu ou no inferno, que também inventámos. Não nos damos conta de que, tendo inventado Deus, imediatamente nos tornamos seus escravos”, no livro aponta Deus como “autor intelectual do crime, ao desprezar o sacrifício que Caim lhe havia oferecido”.

Outros livros ficaram por mencionar nesta breve abordagem à sua vasta obra.

José de Sousa, Saramago por embriaguez do funcionário do Registo Civil, nasceu em 16 de Novembro de 1922, Prémio Camões em 1995, Prémio Nobel da Literatura, o único da Língua Portuguesa, em 1998, autodidacta, “ …começar a ler foi para mim como entrar num bosque pela primeira vez e encontrar-me, de repente, com todas as árvores, todas as flores, todos os pássaros”, nascido de uma família pobre camponesa da zona centro de Portugal, o Ribatejo, militante do Partido Comunista Português desde 1969, critico “ O que falta em Portugal é exactamente isso – sentido crítico. Já nem somos capazes de balir Méééé´. Nem sequer isso. Achamos que a crítica, autocrítica, contracrítica, é coisa deles. Dos políticos, dos jornalistas”, ateu “ O que leva à criação de Deus é o medo de morrer…. pensar que depois de morrer os anjinhos me recebem a tocar harpa….e porque não me recebem a tocar trombone?” , um grande amor na sua vida a sua esposa Pilar “..em 22 anos que nos conhecemos não tive um só momento em que dissesse ‘ Podia não ser assim ’ Não, não podia ser assim, tinha de ser assim.”, sem dúvida que a literatura mundial perdeu um escritor fabuloso, original, único, bem mais que todas as palavras com que possamos exaltar a sua obra.

Luiz Schwarcz, Editor da Companhia das Letras escrevia assim no blog da Companhia: “ Agora só quero me despedir mais uma vez de José. Com as melhores lembranças, o amor, e minha saudade. Maldita palavra, tão portuguesa, que agora ficará associada ao meu amigo. Mas saudade não tem remédio, não é José?”.

Sim, saudade, muita saudade.

(in Gazeta de Noticias do Cairiri)