LIBERDADE AO PENSAMENTO II

“A curiosidade mata”. Um amigo professor da rede pública de ensino revoltou-se contra esta frase estampada em letras garrafais na parede da escola onde lecionava. Tratava-se de um slogan para uma campanha contra o uso de entorpecentes. Ele me dizia que seria coerente antes que qualquer campanha viesse a público, haver a verificação se o público alvo saberia ler nas entrelinhas, se a filosofia e o livre pensamento já haviam sido de alguma forma semeados. O contexto apresentado poderia ser satisfatório, dado as ilustrações, mas a incisão provocada pela alta relevância das palavras denota no mínimo uma superestimação dos direcionados. Não é uma crítica, apenas uma constatação de uma realidade de longe observada. Naturalmente que a curiosidade move o mundo, ou do contrário não sairíamos das cavernas nem teríamos acesso ao fogo que hoje acende a droga no cartaz.

A livre forma de pensar é excitante à medida que se consegue encontrar vicinais em teorias e máximas, principalmente quando se trata de aforismos. Grandes filósofos são mal interpretados, justamente por causa de suas frases curtas, não contextualizadas, é como se retirássemos a essência sem nos importar com o aroma e não inalarmos o buquê do bom vinho, nos atendo apenas a encorpada adstringência contida em sua jovialidade.

Para tudo que existe escrito ou pronunciado existem uma ou mais versões. O poder da palavra é relativo ao contexto. Verifique o sedentarismo humano. Só se tornou pejorativo, no final do século passado por motivos óbvios originados pelo avanço da tecnologia e o advento de novas leituras relativas à saúde. Até então sedentarismo era uma palavra ligada diretamente à evolução humana. Para os meninos, estudantes da minha geração, sem ele, não assentaríamos residência. O que hoje é antônimo de saúde, antes se opunha ao nomadismo.

Percebi que nunca deveria responder uma interpelação com a mesma veemência. Se houve uma interrupção, o sentido da observação não foi completado e o interceptor apressou-se em fazê-lo por seus próprios meios interpretativos. O mesmo ocorre quando se adentra um recinto no auge de uma querela. Tomar para si partido é uma temeridade, posto que não se tivesse tempo de fazer a contextualização do absurdo que se ouviu naquele segundo.

A escrita da mesma forma deve ser levada a contento, não apenas porque tornou-se interessante, mas pelo fato de que ao interpretar uma citação deve-se conhecer sua ascendência, seu aprofundamento contextual. O pseudo intelectual faz alusão a grandes mestres da literatura, como se eles fossem celebres autores de frases de pára-choques de caminhões. O pensamento deve ser livre, mas o conjunto obrigatoriamente precisa ser respeitado. Isso me traz noites insones, não sou muito normal eu sei, mas tenho a convicção, o que é um perigo, que a condução das idéias só poderão ser levadas avante surtindo os efeitos desejados, se os vocábulos forem distribuídos uniformemente dentro de um conjunto incontestável, o vernáculo é extenso. Busco a fórmula de expressão sem dualidades. Que seria bom para o entendimento popular, mas a ruína para o escritor. Deve haver um consenso então.

Anderson Du Valle
Enviado por Anderson Du Valle em 25/04/2011
Reeditado em 27/06/2011
Código do texto: T2929829
Classificação de conteúdo: seguro