O braço armado do Estado, e os braços desarmados do Estado.

O número de jovens infratores detidos pela polícia não cessa de crescer no Brasil. O tom da divulgação midiática é invariavelmente crítico às prisões, e as opiniões são comumente acompanhadas de comentários como “a política de encarceramento não está dando resultados, precisamos rever”.

A premissa implícita no raciocínio é o de que a apreensão dos jovens está, de algum modo, relacionada com o aumento nas taxas de infrações, não sendo explicado como uma redução das prisões poderia afetar estas mesmas taxas. Esta argumentação pode ser encontrada recheando boa parte das notícias sobre criminalidade infanto juvenil. Ela é, parcialmente, resultado da irresistível tentação de encontrar alguma culpa atribuível à força policial, o famigerado braço armado do Estado.

Não se pode negar que o encarceramento afeta o comportamento futuro dos jovens infratores, uma vez que os presídios brasileiros são verdadeiras escolas do crime, bem como o são os Centros de Reabilitação de menores infratores, a exemplo Fundação Casa. Mas note bem, se o aumento do número de infrações traz consigo concomitante elevação no número de prisões, então a crítica deveria estar centrada não no aumento do número de prisões, mas no próprio aumento no número de jovens infratores. Na realidade não estamos diante de uma “política de encarceramento”, mas de uma política de fabricação de criminalidade em escala industrial.

A verberação geral contra uma suposta “política de encarceramento” só pode pulular por aí ignorando-se por completo as causas profundas da criminalidade infanto juvenil. Tal como o cidadão que, limpando o leite derramado, reclama por não obter resultado satisfatório na limpeza do fogão, mas não desliga o fogo que aquece a leiteira, o foco exacerbado nas prisões ignora a falência da educação pública, a miséria que assola as periferias do país, a degradação cultural nacional, a qual aflige tanto as classes dominantes quanto as classes trabalhadoras, a incompetência do Estado em gerar oportunidades de formação e trabalho e, como citado, o próprio sistema prisional.

Ou seja, o braço armado do Estado, em termos de periculosidade, é insignificante, perto do poder destrutivo de seus braços desarmados. Mas é, por outro lado, um excelente bode expiatório, facilmente assimilável pela, comumente incauta, opinião geral.