A Vontade, em Schopenhauer.

"A ESTÉTICA COMO LIBERTAÇÃO DA VONTADE

6.1 A libertação da vontade

Todo desejo nasce de uma necessidade, de uma privação, de um sofrimento. Satisfazendo-o acalma-se; mas embora se satisfaça um, quantos permanecem insaciados! De mais, o desejo dura muito tempo, as exigências são infinitas, o gozo é curto e avaramente medido. E mesmo esse prazer uma vez obtido é apenas aparente: sucede-lhe outro, o primeiro é uma ilusão dissipada, o segundo uma ilusão que dura ainda. (SCHOPENHAUER, 1960. p. 107)

Enquanto somos dominados pelo desejo através da vontade, não conseguimos nada além da dor e da angústia, não partimos para uma vida, ou momentos, de felicidade, mas com o pessimismo da filosofia de Schopenhauer, o homem encontra o seu ser perturbado. Entretanto, esta situação pode converter-se em momentos de liberdade e pureza, a medida em que o homem se abstrai do seu ser de vontade e caminha para o mais profundo do seu ser.

Para Schopenhauer, há a possibilidade de uma libertação, ou superação, da vontade, que se apresenta ao homem e ao mundo como raiz metafísica do mundo. Esta superação pode até ser total, se tratando da ascese, porém, sendo nossa pesquisa voltada para a estética, veremos como esta superação se dá, provisoriamente, a partir da contemplação artística. Desta forma, dada a contemplação artística, é através da arte, que o homem eleva a mente à contemplação da verdade, porém sem influência da vontade. É um elevar-se ontológico, que está acima da competição das vontades, volta-se para o mais profundo de seu ser e há o esquecimento do eu individual e de seu interesse material. Conclui-se que através da arte, o homem se liberta da escravidão que ele possui pela vontade.

Quando movidos por uma circunstância estranha, ou uma harmonia interior, somos levados por um momento ao mais íntimo de nosso ser que:

Nos livra o espírito da opressão da vontade, nos desvia a atenção de tudo que a solicita, e as coisas nos aparecem desligadas de todos os prestígios da esperança, de todo o interesse próprio, como objetos de contemplação desinteressada, e não de cobiça; é então que esse repouso, procurado baldadamente nos apresenta e nos dá o sentimento da paz em toda a sua plenitude.(SCHOPENHAUER, 1960. p. 107)

6.2 O papel da arte no processo de libertação da vontade

Já compreendendo o mundo como vontade, buscaremos agora um entendimento da idéia para Schopenhauer. A idéia é a primeira e imediata objetivação da vontade, no sentido de “essência universal e genérica” (ABBAGNANO, 1970. p.195). Ela não está presa ao espaço-tempo, e também é exterior ao conhecimento científico e conhecimento comum, desta forma, a idéia não é objeto do conhecimento, mas da arte, que é conhecimento livre e desinteressado, é obra do gênio. “Quem contempla as idéias não é já o individuo natural, sujeito às exigências da vontade, mas o puro sujeito do conhecer, o “puro olho do mundo”. O gênio é a atitude de contemplação das idéias no seu grau mais elevado”(ABBAGNANO. 1970, p.196).

Assim, a contemplação estética conduz o homem a uma complexa e infinita satisfação total dos seus mais profundos desejos. A satisfação total dos desejos, por sua vez, só é alcançada pela estética, observando novamente a categoria do “puro olho do mundo”. O homem busca no mais alto grau de sua interioridade a satisfação e libertação da alma, traduzindo na emancipação do ser.

A arte expressa e objetiva a essência das coisas. E, precisamente por isso, ajuda-nos a nos afastarmos da vontade. O gênio capta as idéias eternas e a contemplação artística mergulha nelas, anulando aquela vontade que, tendo optado pela vida e pelo tempo, é somente pecado e dor. (REALE, 2003. p. 232).

A música como a mais sublime, profunda e universal forma de arte, não corresponde às idéias, mas é imediata revelação da vontade como as próprias idéias. Por isso ela atinge graus elevadíssimos na dimensão da linguagem por ela atingida.

Uma vez que, suprimida a vontade e se tornando então o sujeito puro, o contemplador estará partindo para o conhecimento não mais a coisa individualizada, mas sim a idéia. Neste processo, o sujeito é entendido como aquele que supera a vontade, a dor, ou temporalidade e sim ligado somente ao objeto de contemplação artística, independentemente da obra que estiver como objeto. A partir de então percebemos as artes como libertadoras, pois cessam a dor e o sofrimento que o homem passa em sua vida, tendo em vista o pessimismo de Schopenhauer, assim, ela age no mais intimo do ser, se abstrai da vontade e parte para a idéia. É uma contemplação desinteressada, fora das exigências da vontade.

Porém, a arte não é um cessar definitivo das dores e angústias humanas, esta libertação total ocorre independente da arte, mas sim um cessar por breves instantes, parcial. Não é um caminho para deixar a vida, mas para, por instantes, mergulhar no mais profundo do próprio ser.

6.3 A Arte

É difícil pontuar exatamente como Schopenhauer interpretava em seu pensamento cada arte que lhe era conhecida, pois muito pouco se tem escrito a este respeito. Entretanto, vamos comentar os pontos principais de cada expressão artística comentada por ele, ou pelo menos as que nos couberam conhecer a partir de sua obra “Dores do mundo”, que pode ser consultada na bibliografia que se segue no final deste trabalho.

6.3.1 Escultura

A escultura tem por maior intuito mostrar uma perfeita simetria entre as partes da figura esculpida. Assim, ela age imitando a natureza, a partir de seu modo primordial, transformando-a em beleza esculpida, dando um sentido novo. Assim, fica claro a busca pela perfeição da cópia, sem excessos ou poucos recursos, tudo deve ser harmônico. Tudo é mais objetivo e tem diretamente uma “fonte” de onde se copia.

No caso do contemplador, a escultura transmite uma imagem do belo apenas quando esta está pronta, diferentemente do artista que a esculpe, que, por ter uma visão do que está copiando, e já com algo pronto em sua imaginação, pode ter uma idéia de como será a obra. Entretanto, ambos podem gozar da beleza, que é a apresentação da vontade geral – objetiva – por meio do tempo apresentação da vontade pronta na escultura, e “presa” a um espaço, onde também é representação da vontade.

6.3.2 A Poesia

A poesia também é muito importante. Na poesia lírica, é revelado ao homem todos os sentimentos, independente do tempo em que é representado. Não existe exatamente um tempo para limitar as emoções sentidas pelo artista ou pelo contemplador, ou seja, independente do tempo em que as obras poéticas serão observadas, terão a mesma emoção e poderão ser vividas as mesmas circunstâncias da obra quando produzida. É arte viva que contém toda a fidelidade da emoção do homem".

Desconhecido.
Enviado por Archidy de Noronha em 09/06/2016
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