Pedagogia Libertadora

Para Paulo Freire, a educação é o processo de criação do conhecimento e da transformação-reinvenção da realidade pela ação-reflexão humana, e existem duas espécies de educação: a dominadora e a libertadora.

A partir de suas primeiras experiências em 1963, conseguiu alfabetizar 300 cortadores de cana, em quarenta e cinco dias. Para ele, a educação, ao libertar a mente dos grilhões dos falsos conceitos e ideias limitadoras, cria novas formas de comunicação, conhecimento, inteligência e convivência.

No seu livro, “Pedagogia da autonomia”, afirma que “Ensinar é uma especificidade humana”, e nos leva a compreender que somos seres condicionados, sim, mas não determinados, e que o futuro pode ser problemático, mas não inexorável. Sua obra é um constante não à educação bancária, que considera o conhecimento como depósitos a serem feitos na cabeça do aluno. É um imperioso não a essa ideologia fatalista, que prega a adaptação do aluno a uma realidade imutável, negando e amesquinhando a própria prática pedagógica.

“O Brasil tem 11 milhões de analfabetos, aponta IBGE- Atualmente 11 milhões de brasileiros não sabem ler nem escrever. A meta do Plano Nacional de Educação é erradicar o analfabetismo até 2024. Mas com a suspensão das aulas presenciais, por causa da pandemia de covid-19, a alfabetização foi prejudicada. O vice-presidente da Comissão de Educação, senador Flávio Arns (Podemos-PR), informou que apenas 33% das escolas têm internet e a maioria dos alunos não possui computador com conexão de qualidade. A reportagem é de Iara Farias Borges, da Rádio Senado. Fonte: Agência Senado” (grifo nosso).

Paulo Reglus Neves Freire, educador e filósofo pernambucano, Patrono da Educação Brasileira, foi um dos pensadores mais conhecidos na história da pedagogia mundial. Através do site “Projeto Memória” e outros que analisam seu trabalho, podemos avaliar o impacto de sua obra no Brasil e no mundo. Seu trabalho foi reconhecido internacionalmente e lhe rendeu, entre outros, o “Prêmio Educação para a Paz” da UNESCO, o “Prêmio Andres Bello” da Organização dos Estados Americanos, como “Educador do Continente” em Washington D.C. Recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica, Universidade de Michigan - Ann Arbor, USA, Universidade de Genebra, Suíça, Universidade de San Simon, Cochabamba, Bolívia, Universidade de Barcelona, Espanha, Universidade de Estocolmo, Suécia, além dos prêmios e títulos recebidos no Brasil.

Sendo um dos teóricos mais citados na área da educação, foram criados Institutos Paulo Freire na África do Sul (Cidade do Cabo), Alemanha (Berlin e München), Argentina (Buenos Aires, IPF-Chacabuco, Rosário, Tandil) Brasil (São Paulo), Canadá (Toronto), Coréia, Chile (Santiago), China (Hong Kong), Colômbia (Bogotá), Egito, Espanha (Valência), Estados Unidos (Los Angeles), Grécia (Tessalónica), Guiné-Bissau (Bissau), Índia (Calcutá e Mumbai), Israel (Mazkeret Batia e Jerusalém), Itália (Bolonha e Milão), Malta, México (Hermosillo), Porto Rico, Portugal (Cidade do Porto), Reino Unido (Manchester), República Dominicana, Suécia.

Trabalhou como professor de Lingua Portuguesa em uma escola de 2º grau (hoje Ensino Médio), dedicando-se ao estudo de Filosofia da linguagem. Foi professor de Filosofia da Educação na Universidade de Recife. Em 1943 formou-se em Direito na mesma Universidade, e em 1947 foi nomeado diretor do Departamento de Educação de Cultura do Serviço Social da Indústria (SESI). Foi então que iniciou seu trabalho com alfabetização de jovens e adultos carentes e de trabalhadores da indústria. Em 1959 passou no processo seletivo para a cátedra de História e Filosofia da Educação da Escola de Belas Artes da Universidade de Recife, e em 1961 assumiu o cargo de diretor do Departamento de Extensões culturais na mesma Universidade, o que lhe abriu as portas para realizar experiências mais amplas na área de alfabetização de adultos.

Seu método tornou-se conhecido em todo o mundo. Utilizava palavras-chave em lugar do método fônico e silábico. Em 1960 teve seu método conhecido como “Pedagogia do Oprimido”, e foi utilizado com sucesso pelo MEC no Programa Nacional de Alfabetização.

Sua família fazia parte da classe média, mas Paulo Freire conheceu a pobreza e a fome na infância durante a depressão de 1929, e essa experiência direcionou o seu olhar para os mais pobres. Sua formação católica ajudou-o a construir seu revolucionário método de alfabetização.

O educador sofreu perseguição do regime militar (1964-1985), e foi preso por 70 dias, exilado por 16 anos, e considerado traidor. Dizem que não existe prisão mais forte do que uma opinião estabelecida. É verdade. Apesar do reconhecimento mundial que recebeu por sua obra, existem ainda, no Brasil, aqueles que criticam o seu trabalho.

É fácil compreender porque a Pedagogia crítica de Paulo Freire encontra resistência. Em “Educação como Prática de Liberdade” (103), ele diz que quanto menos críticos nos tornamos, tanto mais ingenuamente tratamos os problemas e nossas discussões tornam-se superficiais.

Muitos acusam Paulo Freire por ideias que ele realmente não professa e rejeitam esse modelo de democratização cultural, porém o compromisso do grande educador é com o homem, “com a causa da sua humanização, de sua libertação” e afirma a necessidade de o educador assumir o “compromisso com os destinos do país, com seu povo, com o homem concreto, com o ser mais”.

Através da conscientização, o homem deixa de ser um sujeito assujeitado, ajustado, acomodado, e com o desenvolvimento do discernimento e da capacidade crítica percebe que pensam por ele, imputam-lhe uma ideologia que o mantém calado, divorciado da realidade, comandado pela publicidade e por líderes os desumaniza.

É possível que surjam novas formas de transmissão do conhecimento ou novas pedagogias, mas para que sejam inclusivas seria preciso amplos investimentos na formação do professor e disponibilização de recursos para torná-las factíveis, promovendo o acesso das classes populares às novas tecnologias, mas isso é mais do que um sonho, é uma utopia, portanto a Pedagogia da Libertação é, ainda, uma das vias a ser considerada para promover a justiça social. Hoje, a obra de Paulo Freire retorna à discussão, e ele emerge como o maior educador brasileiro de todos os tempos.

Marlene Becker – Membro de Academia Francana de Letras, Psicopedagoga, Mestre em Ciências e Práticas Educativas.