A IDOLATRIA DO MERCADO NO BRASIL

Por Marcio Rabelo

Com a invalidade da teoria ptolomaica o homem moderno chegou ao novo mundo causando grande espanto a toda civilização ocidental. Esse novo mundo foi visto como terra incógnita, haja vista, que a tese cientifica de Galileu foi comprovada, pois até então a Europa se fechava como centro do mundo.

A “descoberta” da terra incógnita não foi tão fácil, levou a humanidade ao maior genocídio de toda História, o choque do venho mundo com o novo mundo deu gênese a uma invasão cultural que significou um terrível etnocídio, resultando na morte e devastação de culturas diversificadas.

Historicamente, o Brasil apareceu como quintal de brigas entre paises europeus. Esse quintal foi palco onde os vencedores iriam contar histórias como conto de fadas. Isso é visível até hoje, pois grande parte de nossa história é contada na versão dos vencedores, sobretudo dos poderosos. O pior é que ainda massificamos as histórias marginais, são vistas como folclóricas.

Recordar a história do Brasil é contar pesados pesadelos de culturas que foram devastadas e submetidas à escravidão e opressão por meio de alguns que se achavam senhores da história.

Hoje, não é diferente essa escravidão, se tornou apenas automatizada. Pois estamos assistindo a um fenômeno novo: o processo de mundialização que se estende pela via do mercado, da política, da estratégia militar, da tecnociência, da comunicação e até da espiritualidade .

Diante de tal fenômeno que nos deixar num peco sem saída, como encontrar alternativas? Será que temos consciência de todo nosso processo histórico e sabemos perfeitamente nosso estado de subdesenvolvimento? Há uma corrente que alastra a nossa chegada ao desenvolvimento que almejamos, é necessário buscar saber onde que se encontra essa matriz. Para tal temática, enfatizaremos a sociologia junto à filosofia como áreas do saber que nos ajudarão a encontrar soluções para essa temática.

A IDOLATRIA DO MERCADO E SEUS MECANISMOS

O prefixo “sub” passou a ser usado em varias esferas sociológicas do saber, precisamente em relação á aqueles paises que ficaram abaixo daquilo que chamamos desenvolvimento. Existiu toda uma conjuntura na raiz sociológica com o intuito de levar esses países ditos subdesenvolvidos á alcançarem o desenvolvimento. É nesta perspectiva que surgiram várias teorias como: do desenvolvimento, da dependência, do dualismo e dos marginalizados. Essas teorias procuravam revitalizar a situação social onde encontravam alguns desses paises. Apesar de essas teorias serem antagônicas, tinha o mesmo principio, querendo demonstrar a carência daquilo que não está desenvolvido.

Sabe-se historicamente que a primeira divisão internacional do trabalho deu-se em virtude de grande quantidade de matéria prima. A Europa como um todo não deixou de ser a grande “sanguessuga” de todo o Brasil, como também todo resto da América. Nesse sentido, o Brasil foi totalmente sucateado com os acordos que beneficiavam apenas as elites européias. O mercantilismo foi chave desse acordo enquanto mecanismo de exploração.

O liberalismo proposto por A. Smith em seu livro a “Riqueza das Nações” servirá de base para a ciência econômica, na qual conduzirá a formação de uma ordem espontânea, dotada de uma lógica produtiva (terra, capital e trabalho) sem intervenção do Estado; mesmo assim se nota ainda a presença de pressupostos éticos. Para Smith a lógica liberal é sustentada pelo egoísmo humano, servindo de base para a sustentação do mercado.

Segundo Manfredo, deste Aristóteles até o século XVIII da era cristã a economia estava atrelada à política e a ética, isto é, enquanto filosofia prática. Já a partir do século XIX surgiu a categoria do “homo oeconomicus”, um ser totalmente voltado ao calculo da maximização da realidade, mudando assim todo esse quadro tradicional, com isso, a ética se desvinculou totalmente do capital.

Neste sentido, o sistema brasileiro não está longe dessa prerrogativa, pois nossa historia enquanto evento sempre copiou o sistema europeu. Um exemplo disso foram os grandes barões de café do Brasil na transição do Reinado para a República no final do século XIX; Gilberto Freire expressa muito bem isso em seu livro “Casa grande e Senzala” no qual se percebe a acumulação do capital, do lucro (ouro), era necessário passar por cima de pressupostos éticos, por cima das culturas negras e indígenas. O etnocentrismo aparece como discurso impregnado na raiz dessa cultura.

Ademais, Assmann nos mostra que o neoliberalismo tem um sistema portador de dominar a vontade humana , pois o mercado conseguiu fazer uma verdadeira “lavagem cerebral” dentro da consciência mais profunda do ser humano. Quando a fé no paradigma do mercado conseguiu avassalar as mentes e os corações, a solução dos problemas sociais ficou entregue, basicamente, ao próprio mecanismo do mercado.

Aqui cabe o analise do estado brasileiro, concretamente subjacente à privatização , no qual sempre se sobressaem os interesses dos entendidos do sistema. Aqui também aparece a famosa filha do capitalismo, isto é, a globalização com todos seus mecanismos de dominação, que sejam ideológico ou cultural.

Destarte, no livro intitulado a “idolatria do mercado” escrito por Assmann junto com Hinkelammert. Eles denunciam o eventual fruto do mercado que consiste na hispóstases, isto é, na sua supra personalização do mercado com atributo de agente autônomo. Uma vez chegados à tamanha fé no mercado, os homens puderam abrir-se a uma confiança ilimitada nele. Tal situação tem como exemplo o Brasil que se tornou escravo do mercado porque o mercado é uma espécie de calculadora, que faz tudo para aquele que a submete. Mas também a tarefa da ciência econômica, abstraindo da questão ética de sua tarefa de justiça ou injustiça.

Ademais, aparece toda uma polêmica em vista da Escola de Chicago em defender a tese básica do egoísmo ético, isto é, a radicalização dos interesses próprios com a exclusão plena dos outros é condição de possibilidade do máximo de eficiência e prosperidade das nações avançadas.

Fazendo um paralelo em relação ao Brasil, tal perspectiva não deixa de ser aplicada em nossa realidade, sabemos muito bem que quem manobra esse egoísmo ético em nosso país são: os banqueiros, os empresários e os latifundiários.

Nesse sentido, o egoísmo leva o mercado a sua melhor performance, conseqüente, muitos acreditam que o mercado é o melhor caminho para a felicidade dos homens. Portanto, para o mercado a prosperidade econômica é fruto da negação da ética, o que importa é o interesse próprio da lei que é suficiente para o desempenho do mercado .

Dado toda esta prerrogativa o capitalismo tende a iluminar a subjetividade e consequentemente o espaço de deliberação ética, o que chega ao máximo na teoria neoliberal. Isso seria o escrúpulo da vida humana isso ocorre porque o capitalismo é uma ideologia individualista do progresso, ele impõe toda uma indiferenciação universal pela redução dos indivíduos a condições de forças produtivas para o progresso. Isto leva a uma alienação quase total da subjetividade.

Já no Brasil há uma carência de ética , pois sempre se produziu apenas no prisma da ciência e da técnica. O pensador argentino Mariano Grondona em seu livro “bajo el império de lãs ideas morales”, aponta a ausência de ética como principal fator das sociedades subdesenvolvidas . A ética ficou esquecida, esse esquecimento ético é sombra de um subdesenvolvimento, sobretudo da miserabilidade da América Latina e principalmente da África. Não queremos produzir apenas um progresso neoliberal, mas produzir formas de éticas nas quais possamos nos libertar de tal situação.

No Brasil as formas de desenvolvimento foram todas feitas como se fossem “abortos” . O pior é que percebemos que temos todos os meios para um verdadeiro desenvolvimento, que possa transparecer em variadas esferas da sociedade, tais como: educação, saúde, cultura, política, economia e etc. Acontece que estamos presos a esta avassaladora corrente neoliberal que faz com que tais mecanismos não se desenvolvam. O que fazer para eliminar tal ideologia do mercado?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A predominância do neoliberalismo nos deixa cada vez mais sob a tutela do prefixo “sub”. É visível que fora do mercado não há salvação, submete-se a ele ou vive-se em uma total alienação. Pergunta-se como sair dessa onda alastrante que nos apavora cada minuto e segundo de nossa vida? Para tal situação apelarei para a ética, que deva ser desenvolvida de forma procedimental dentro do sistema brasileiro buscando justiça social e solidariedade. Essa ética foi desenvolvida pelo teórico e herdeiro da Escola de Frankfurt Jürgen Habermas, na qual ele mostra que há possibilidade de usarmos a racionalidade comunicativa como base para atingirmos uma sociedade onde acontece a inclusão do outro. O exercício dessa ética requer de todas as esferas sociais um grande comprometimento com educação brasileira, alcançando um patamar educacional onde não haja diferença entre os concernidos. Ainda estamos distante desse nível, mas não é impossível, buscamos mecanismos para tal.

Nos anos 90, Habermas durante Conferência no Brasil, lhe perguntaram sobre qual seria a melhor solução para o Brasil enquanto país emergente? Respondendo de forma significativa disse que não dá formulas prontas para as situações, até porque desconhecia a profundidade da realidade brasileira. Mas acreditava que nós como brasileiros que conhecemos nossa realidade, devemos encontrar soluções de formas procedimentais usando a racionalidade comunicativa. Assim, através da ética do discurso seria possível alcançarmos uma verdadeira solidariedade em prol do bem comum.

Marcio dos Santos Rabelo
Enviado por Marcio dos Santos Rabelo em 30/07/2010
Código do texto: T2408879
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