IOF sobre capital Estrangeiro

Artigo do

Dr. Antonio Corrêa de Lacerda

Chief Economist

O aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) de 2,0% para 4,0%, para as aplicações de capitais estrangeiros no mercado de renda fixa foi anunciado pelo Ministério da Fazenda. Dobrar o imposto introduzido há um ano, embora uma medida necessária, é insuficiente, isoladamente, para impedir a valorização do Real.

A iniciativa não deixa de representar uma quebra de paradigma, pois especialmente no Brasil, qualquer medida de restrição ao capital estrangeiro sempre foi vista como tabú.

Desestimular os ingressos de capitais especulativos via tributação, diferenciando-os dos investimentos diretos estrangeiros (em empresas) e os investimentos em portfólio (bolsa de valores) é uma medida que já foi praticada, quando necessária, por vários países e até mesmo recomendada por instituições multilaterais, como o outrora conservador Fundo Monetário Internacional (FMI).

A questão principal é que o Brasil continua praticando uma das mais altas taxas reais do mundo. Nesse sentido, do ponto de vista da harmonia das políticas macroeconômicas trata-se de uma incoerência. Ao mesmo tempo em que o Ministério da Fazenda adota mecanismos de desestimulo às aplicações de cunho estritamente especulativo, a taxa de juros definida pelo Banco Central do Brasil (BCB) representa, inversamente, um convite a essas aplicações.

Trata-se das operações de arbitragem, ou carry trade, no jargão internacional. Devido ao diferencial da taxa de juros praticada no mercado brasileiro relativamente ao internacional e a certa passividade da política cambial, as operações permitem ganhos nas duas pontas. Do diferencial de juros e ainda na reconversão da moeda.

O IOF sozinho não consegue desmontar esse mecanismo, embora possa, na margem, desestimulá-lo. Há ainda um efeito psicológico importante, ao denotar que o governo considera o problema, o que poderá determinar outras ações para impedir a valorização do real.

É mais um capítulo da guerra cambial internacional, como se referiu o Ministro Guido Mantega, há alguns dias. O fato é que vários países estão tomando medidas para evitar a valorização excessiva das suas moedas. A maioria tomou a precaução de logo após a crise iniciada nos EUA reduzirem as suas taxas de juros. Isso visava não apenas estimular o consumo e a produção para amenizar a recessão, mas também defender suas moedas ao torná-la menos atrativa para as aplicações internacionais.

Os norte-americanos têm adotado a estratégia de permitir a desvalorização do dólar como fator de aumento da sua competitividade nas exportações visando a correção do seu elevado déficit em conta-corrente do Balanço de Pagamentos.

A China atrelou a sua moeda ao dólar, como forma de manter o nível da sua moeda, que estima-se esteja desvalorizada em cerca de 40% e evitar perder sua vantagem competitiva. A estratégia chinesa de desvalorização competitiva da sua moeda não é nova, mas ganha ainda mais dimensão no quadro internacional que se seguiu à crise. Suportada por um nível de reservas cambiais superiores a US$ 2,5 trilhões, os chineses tem resistido aos apelos dos norte-americanos e de outros países para valorizar o yuan.

O Japão tem se destacado como um dos países que mais explicitamente tem adotado medidas para evitar a valorização do iene, o que lhe seria bastante problemático.

A origem do problema decorre da diferença de status das economias emissoras de moedas conversíveis e das de moeda não conversíveis. A prevalência do dólar como moeda internacional de referencia e de reserva também dá aos EUA um privilégio.

Não se trata de algo novo. Desde o início dos anos 1970 com a derrocada do sistema definido em Bretton Woods logo após o término da Segunda Guerra mundial, o mundo vive uma desordem monetária e cambial que se agravou com a crise recente. O desbalanceamento cambial internacional será um dos temas mais relevantes para discussão nas reuniões do G-20, o grupo dos países de maior PIB, do qual o Brasil faz parte.

Enquanto isso, a economia brasileira, às portas de um novo governo, não vai escapar de enfrentar o problema, sob a pena de colocar em risco o seu futuro, pelos efeitos deletérios da valorização do Real sobre a estrutura produtiva e o balanço de pagamentos.

MARCO ANTONIO PEREIRA
Enviado por MARCO ANTONIO PEREIRA em 05/10/2010
Reeditado em 06/10/2010
Código do texto: T2539467
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