LEITURA COMO CASTIGO

José Neres

É, infelizmente, uma constante em algumas escolas, quando um aluno, ou mesmo uma turma inteira, não se comporta de acordo com os ditames da instituição, que professores, coordenadores e até mesmo membros do corpo diretivo imponham uma penalidade a quem não esteja encaixado nas normas pré-estabelecidas.

As sanções são as mais variadas e vão desde advertências verbais até a expulsão sumária, passando por outras medidas corriqueiras, como exclusão do aluno da sala de aula, suspensão por determinado período ou até, por mais absurdo que pareça, castigos físicos. Contudo uma das punições mais corriqueiras e aparentemente sem grandes proporções é a que mais chama a atenção, por sua discutível aplicabilidade como método educativo: obrigar o educando a ler um livro ou a escrever uma redação como forma de castigo.

Ora, um dos papéis dos educadores, em todos os níveis de ensino e fomentar nos alunos a ideia de que ler é uma espécie de passaporte para a independência intelectual. Quando alguém é alfabetizado e consegue sair do simples decifrar de palavras para alcançar a dimensão do entendimento global dos textos e da realidade circundante, adquire uma poderosa ferramenta capaz de fazer da pessoa um cidadão mais cônscio de seus direitos e deveres. A produção escrita, por sua vez se transforma em um excelente mecanismo de divulgação das próprias ideias, seja para um grupo restrito, como na produção de cartas e pequenos documentos, seja para um público mais amplo, como ocorre nos escritos de cunho científico ou artístico ou ainda na divulgação de textos via internet.

Mas, impondo a leitura e a escrita com forma de castigo, qual a mensagem subliminar que a instituição escolar passa para seus educando? Agindo dessa forma, qual o incentivo que a escola deixa para o estudante que passa a ver nas palavras escritas um grande inimigo e não um aliado que irá acompanhá-lo ao longo de toda uma vida? Quantos alunos se sentirão inteiramente à vontade com um livro nas mãos enquanto as imagens de castigos antigos e recentes ainda fazem parte de suas mais traumáticas lembranças?

A escola, bem como a família e a sociedade em geral, têm a obrigação de fazer o possível e até o impossível para transformar meros frequentadores de aulas em leitores proficientes e capazes. Não pode ser negado ao educando o direito de caminhar com as próprias pernas e de seguir pelas tortuosas estradas da vida guiado pelo mapa das palavras escritas, com caminhos iluminados pelo farol do conhecimento adquirido após anos de estudos sistemáticos e pavimentados ao prazer das leituras escolhidas pelo próprio indivíduo, quando a passagem pelas salas de aula tiver se tornado uma doce lembrança dos bons tempos de aprendizado.

A leitura e a escrita devem virar fonte de aprendizagem e de prazer. Cada página deve ser devorada com a ânsia de saber o que virá a seguir. Casa palavra escrita deve trazer a essência de quem muito transpirou para transformar ideia, conhecimento e emoções em palavras que traduzam o que o autor sente ou sentiu. Claro que o papel da escola não é o de transformar todos em grandes escritores, mas nada impede que ela ofereça a todos os instrumentos necessários para o aluno pelo menos sonhar com isso.

No entanto, enquanto perdurar a concepção arcaica de que é possível castigar um aluno pondo a sua frente um livro para ser lido ou uma folha de papel em branco da qual sairá um texto, a educação com finalidade qualitativa e não apenas quantitativa estará sempre prejudicada e todos nós sairemos dessa árdua batalha pelo sucesso educacional como grandes perdedores.

José Neres
Enviado por José Neres em 21/01/2011
Código do texto: T2744159
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