KRISHNAMURTI FALANDO PARA OS JOVENS:
Liberte-se da horrorosa teia das gerações mais velhas!
 
Vocês sabem que eu venho falando sobre o medo; e é muito importante que tomemos consciência do medo. Você sabe como ele passa a existir?Por todo o mundo podemos ver que as pessoas são transtornadas pelo medo, têm as ideias, os sentimentos e as atividades torcidos pelo medo. Por isso, temos de examinar o problema do medo e de todos os ângulos possíveis, não só do ponto de vista moral e econômico da sociedade, mas também do ponto de vista de nossos conflitos psicológicos interiores. 
 
Como já disse, o medo pela segurança interior ou exterior desorienta nossa mente e deturpa o pensamento. Espero que vocês tenham refletido um pouco sobre isso, porque quanto maior a clareza com que o considerem e lhe percebem a verdade, tanto mais livres estarão de todo tipo de dependência. As pessoas mais velhas não criaram uma sociedade maravilhosa; os pais, os ministros, os professores, os governantes, os sacerdotes não criaram um mundo bonito. Pelo contrário, criaram um mundo brutal e assustador, em que todos estão sempre lutando contra alguém; em que um grupo está contra outro, uma classe contra outra, uma nação contra outra, uma ideologia ou conjunto de crenças contra outra. O mundo em que vocês estão crescendo é horrível, é infeliz; nele, as pessoas mais idosas procuram sufocá-los com suas ideias, com suas crenças, com sua fealdade; e se vocês se limitarem a seguir o padrão horroroso dos mais idosos, que criaram esta sociedade monstruosa, qual será o sentido de se deixarem educar, qual o sentido até mesmo de viver?
 
Se olharem em torno de vocês, vocês verão que por todo o mundo há espantosa destruição e miséria humana. Vocês podem ler sobre guerras na história, mas não têm a experiência real delas, de como as cidades são completamente destruídas, de como a bomba de hidrogênio, ao ser lançada numa ilha, faz a ilha toda desaparecer. Navios são bombardeados e vão pelos ares. Há uma terrível destruição de vido ao assim chamado progresso, e é num mundo assim que vocês estão crescendo. Vocês podem viver uma época feliz enquanto são jovens, uma fase divertida; mas quando ficarem mais velhos, a não ser que permaneçam bem alertas, observando seus próprios pensamentos e sentimentos, vocês perpetuarão este mundo de batalhas, de ambições desmedidas, mundo em que cada qual compete com o próximo, em que há miséria, fome, superpopulação e doenças. 
 
Por isso, enquanto vocês são jovens, não será acaso importantíssimo que sejam ajudados, pelo tipo certo de professor, a refletir sobre todas essas coisas, em lugar de serem apenas preparados para passar por alguns exames tediosos? A vida é sofrimento, morte, amor, ódio, crueldade, doença, inanição, e vocês precisam começar a considerar todas estas coisas. Aí está por que me parece bom que examinemos juntos esses problemas, para que a inteligência de vocês desperte e vocês passem a ter algum sentimento real sobre todas essas coisas. Então não crescerão apenas para se casar e tornar-se funcionários alienados ou máquinas de procriar, perdendo-se nesse horrível modelo de vida como água e areia?

Uma das causas do medo é a ambição, não é? E porventura não são todos vocês ambiciosos? Qual é a sua ambição? Passar em algum exame? Tornar-se governador? Ou, se forem muito jovens, talvez só desejem ser maquinistas de trem, para guiar trens por cima de pontes. Mas por que motivo vocês são ambiciosos? O que quer dizer isso? Já pensaram nisso? Já observaram como os mais idosos são ambiciosos? Em sua própria família, já não ouviram seu pai ou tio falar sobre obter um maior salário ou ocupar alguma posição proeminente? Em nossa sociedade, todo mundo está fazendo isso, tentando alcançar o topo. Todos querem ser alguém, não é verdade? O funcionário quer tornar-se gerente, o gerente quer ser algo maior, e assim por diante indefinidamente — é a contínua faina do vir-a-ser. Se sou professor, quero tornar-me diretor; se sou diretor, quero tornar-me secretário da educação. Se você é feio, deseja ficar bonito. Ou quer ter mais dinheiro, mais roupas, mais mobília, mais casas, mais propriedades — mais e mais e mais. Não só exteriormente, mas interiormente também, no chamado sentido espiritual, você quer se tornar alguém, embora cubra essa ambição com um dilúvio de palavras. Não perceberam isso? E vocês acham que tudo está perfeitamente certo, não é? Vocês acham que isso tudo é perfeitamente normal, justificável, certo.

Agora, o que tem feito a ambição no mundo? Pouquíssimos de nós têm sequer pensado nisso. Ao ver um homem lutando para ganhar, para adquirir, para passar à frente de alguém, já se perguntaram o que está no coração dele? Se vocês olharem para o próprio coração, quando vocês mesmos são ambiciosos, quando estão lutando para se tornarem alguém, em sentido espiritual ou terreno, vocês encontrarão ali o verme do medo. O homem ambicioso é o mais medroso dos homens, porque tem medo de ser o que é. Ele diz: "Se continuar sendo o que sou, não serei nada; portanto devo ser alguém, devo tornar-me magistrado, juiz, ministro." Se examinarem atentamente esse processo, se penetrarem a cortina das palavras e das ideias, se ultrapassarem as paredes do status e do sucesso, descobrirão que o que existe é medo; porque o homem ambicioso tem medo de ser o que é. Ele acha que aquilo que ele é, em si mesmo, é insignificante, pobre, feio; sente-se só, totalmente vazio, por isso diz: "Preciso realizar alguma coisa". Então, ou vai em busca do que chama Deus, que é apenas uma outra forma de ambição, ou procurar tornar-se alguém no mundo. Desse modo, sua solidão, sua sensação de vazio interior — que o amedronta verdadeiramente — é coberta. Ele foge disso, e a ambição torna-se o meio pelo qual pode escapar.

Então, o que está acontecendo no mundo? Todos estão lutando contra alguém. Um homem se sente inferior a outro e luta para alcançar o topo. Não há amor, não há consideração, não há pensamento profundo. Nossa sociedade é uma constante batalha de homens contra homens. Essa luta é fruto da ambição de vir a ser alguém, e as pessoas mais velhas o encorajam a ser ambiciosos. Eles querem que você se torne alguém, que se casem com um homem rico ou uma mulher rica, ou tenham amigos influentes. Sendo medrosos, feios em seus corações, eles procuram fazê-los semelhantes a eles; e vocês, de seu lado, querem ser iguais a eles, porque vêem o encanto disso tudo. Quando o governador aparece, todos se curvam para recebê-lo, dão-lhe grinaldas, fazem discursos. Ele gosta disso, e vocês também. Você se sentem honrados se lhe conhecem o tio ou o criado, e se deleitam ao sol da ambição dele, de suas realizações. Desse modo vocês são facilmente presos na teia horrorosa das gerações mais velhas, no padrão desta sociedade monstruosa. Só se estiverem muito alertas, mantendo-se constantemente vigilantes, só se não tiverem medo e não aceitarem tudo irrefletidamente, mas questionarem sempre as coisas — só, então, vocês escaparão de ser presos irão além e criarão um mundo diferente.

Eis porque é importante que vocês encontrem sua verdadeira vocação. Sabem o que quer dizer "vocação"? Algo que gostam de fazer, que lhes seja natural. Afinal de contas, é esta a função da educação — ajudá-los a se desenvolverem independentemente, de modo a ficarem livres da ambição e a poderem encontrar sua verdadeira vocação. O homem ambicioso nunca encontrou sua verdadeira vocação; se a tivesse encontrado não seria ambicioso.

Portanto, é responsabilidade dos professores e do diretor ajudá-los a ser inteligentes, livres do medo, para que possam encontrar a sua verdadeira vocação, o seu próprio modo de vida, o modo por que queiram realmente viver e ganhar a vida. Isto implica uma revolução no pensamento; porque, em nossa atual sociedade, acredita-se que o homem que sabe falar, o homem que sabe escrever, o que sabe governar, o que possui um grande carro está numa posição maravilhosa; e o homem que trabalha sem descanso no jardim, que cozinha, que ergue uma casa, esse é desprezado.

Você tem consciência de seus próprios sentimentos quando vê um pedreiro, quando vê um consertador de ruas, ou um motorista de táxi, ou alguém puxando uma carroça? Já observou como lhe tem um desprezo absoluto? Para você ele mal chega a existir. Você o desconsidera; mas quando alguém tem algum título, ou é um banqueiro, comerciante, guru, ou ministro, você imediatamente o respeita. Mas se você encontrar sua verdadeira vocação, ajudará a romper completamente este sistema podre; porque então, seja você jardineiro, pintor ou maquinista, estará fazendo algo que gosta de fazer com todo o seu ser; e isso não é ambição. Fazer algo maravilhosamente bem, fazê-lo completamente, verdadeiramente, de acordo com o que você pensa e sente profundamente — isso não é ambição e aí não há medo.

Ajudá-los a descobrir sua verdadeira vocação é muito difícil, porquanto significa que o professor tem de prestar muita atenção a cada aluno para descobrir do que o mesmo é capaz. Ele precisa ajudá-lo a não ter medo, mas a contestar, a questionar, a investigar. Você pode ser um escritor em potencial, ou poeta, ou pintor. Seja o que for, se você realmente gosta de fazê-lo, não será ambicioso; porque no amor não há ambição.

Por isso, não será importante, enquanto vocês são jovens, que os outros os ajudem a despertar sua própria inteligência e desse modo a encontrar a verdadeira vocação? Então vocês amarão o que fizerem, por toda a vida, o que quer dizer que não haverá ambição, nem competição, nem luta contra outros por causa de posições, por causa de prestígio; e então talvez sejam capaz de criar um novo mundo. Nesse mundo novo,todas as coisas horríveis das gerações mais velhas cessarão de existir — suas guerras, seus malfeitos, seus deuses desunidores, seus rituais que não significam absolutamente nada, seus governos soberanos, sua violência. Eis porque a responsabilidade dos professores, e dos estudantes, é muito grande.

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Jiddu Krishnamurti
Enviado por Tânia de Oliveira em 08/02/2015
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