Machado de Assis - Simplificar não é a melhor solução.

Pode ser uma notícia antiga, mas ainda assim é preocupante: Patrícia Secco, uma escritora brasileira relata entender o motivo pelo qual os jovens “não gostam de ler as obras de Machado de Assis”. Segundo ela, os jovens não entendem a maioria das palavras, além de impacientarem-se com os períodos muito longos utilizados pelo autor. Não bastasse relatar isso como algo normal e esperado, a escritora, arbitrariamente, decide “ajudar” a juventude a “encontrar” a obra do maior autor brasileiro de todos os tempos. Como? Reescrevendo com linguagem e estrutura simplificada as obras.

Caro leitor, se você acredita que isso é positivo de alguma forma, pode parar por aqui e voltar aos bancos escolares. Uma nação deve valorizar sua cultura. Machado de Assis nasceu em 1839 e viveu até 1908, fundando no ano de 1897 a Academia Brasileira de Letras. Suas obras são clássicos que merecem perdurar através dos séculos.

É extremamente triste pensarmos em adaptar desta forma a literatura brasileira, pois isso significa assinar um atestado de incompetência educacional. Sim, o vocabulário machadiano é complexo, o enredo é complexo e maduro. Mas fica a pergunta: Isso é ruim? Não, não é ruim! Apresentem um dicionário aos adolescentes. Discutam as obras em sala de aula. Há tantas e tantas alternativas pedagógicas disponíveis, basta haver boa vontade dos educadores. Modificar as obras não irá formar melhores leitores, melhores cidadãos, alunos mais esforçados... Ao contrário, irá contribuir ainda mais para a mentalidade arraigada de que para tudo há um “jeitinho”. E o pior: com autorização do Ministério da Cultura para captar R$1,45 milhão para seu projeto, que prevê adaptação de quatro clássicos da língua portuguesa.

Em tempo: Mais do que debater as obras do mestre Machado, é importante falar sobre a vida do autor. Ele nasceu pobre, neto de escravos alforriados, perdeu o pai e a mãe antes dos quatorze anos e não conseguiu freqüentar regularmente a escola. Não tentarei dizer que o preconceito não é uma realidade, mas, em 1839 ser negro ou mulato era estar exposto a uma carga diária bem maior de preconceitos. E o menino Joaquim Maria Machado de Assis esteve exposto a tudo isso, e, ainda assim, sobreviveu, trabalhou, estudou (sozinho, sim, um autodidata) e tornou-se o maior escritor que nosso país produziu até hoje. Sem cotas, sem livros didáticos distribuídos pelo Estado, sem uma educação regular, sem os pais para lhe darem apoio. Apenas um menino, mulato, com vontade de vencer as próprias barreiras. Ele deveria ser um exemplo de superação a ser mostrado aos jovens que hoje possuem tanto acesso ao conhecimento e não valorizam e, certamente, modificar suas excelentes obras para torná-las mais “acessíveis” não é uma forma de honrar este grande escritor, nossa cultura e nosso povo.

Bob Regina
Enviado por Bob Regina em 10/07/2014
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