MADRUGADA DE 24/04/2015

É madrugada, antes das 4. 3 e 35 exatamente.

O sono sai como o vapor a subir e desaparece no espaço.

Os pensamentos vêm repentinamente e muitas coisas se pensa:

O que fará minha filha na grande metrópole onde mora longe de nós?

Porque será que ela não quer mais morar conosco? Me pergunto às vezes. Será mesmo só o fato de estar a estudar? Assim espero. Mas, realmente não sei o que se passa em seus pensamentos e o que realmente quer da vida.

Apesar de ser uma menina de 19 anos e autônoma, tenho minhas preocupações paternais que divido com ninguém mais além de mim mesmo.

Enquanto penso nestas coisas a chuva cai mansinho no telhado e faz um chiado melodioso como poesia. O chiado da chuva à noite, principalmente na madrugada, é como uma música de dormir. Música de ninar.

Nesse instante espero que minha filha esteja dormindo, pois é cedo da madrugada, assim como dormem seu irmão e sua mãe sob meu teto.

Meu filho passa o dia na escola. Entra às 7 e sai às 17. Lá é seu mundo durante 10 horas do dia. As outras horas passa em casa e a maioria a dormir. Conversamos pouco. Tão pouco que não sei ao certo quem são os amigos dele. Não sei quem são seus professores, não sei quem são as pessoas que compõem o Núcleo Gestor daquela escola. E como saber quem são seus colegas num emaranhado de gente como aquela?

No final das contas chego a pensar que não conheço nem mesmo o meu próprio filho.

Vem à mente o pensar na disciplina que terminarei de aplicar à turma de Letras de Sabiaguaba. História da Língua Portuguesa e estilística nos dias 25 e 26 de abril.

Outra coisa me preocupa: o desempenho dos meus alunos do ensino médio. Penso que serão deveras prejudicados. Estamos em abril e o governo do estado ainda não pagou o transporte escolar deste ano. Os carros das extensões estão parados em vários lugares e onde ensino o carro leva os alunos dois dias na semana. Eles estão sem receber desde setembro de 2014. Não sei como alguns ainda sobrevivem. Agora me certifiquei que meu município tem 5 pendências com o estado. Algumas sobre ausência de prestações de contas de alguns convênios. Nestes casos a SEDUC não poderá repassar os recursos do Ensino Médio. E meus alunos, pobres alunos; perderão mais aulas até sabe Deus quando.

O rendimento escolar, desses meninos está comprometido.

Outras coisas vêm à mente da gente nessas madrugadas chuvosas sem sono.

Penso nos políticos de nosso país o quanto são corruptos e o quanto gostam de ser. Adoram desviar dinheiro público para seus cofres corruptos lesando nosso povo, nós.

Penso na soberania de Deus e às vezes me pergunto: se Deus é onisciente, pois creio que é, como suporta ver tanto mal sem tomar uma providência? Eu no lugar dele o mundo não mais existia. Já teria feito o que Ele diz em sua eterna palavra que fará. Salvaria deste terrível mundo aqueles que são seus fieis e lhes colocaria num lugar digno deles. Mas, Deus tem seus projetos e não cabe a mim julgar suas atitudes e suas vontades. Apenas sou uma molécula no universo de lixo que há neste mundo.

Agora é 3 e 59. Por causa da gripe que nunca acaba, pois renovou anteontem, me dopei com um remédio para dormir. Dormi a noite de quarta pra quinta, dormi àquela noite, o dia todo de quinta e acordei hoje às 1 e 30. Nunca havia dormido tando. Duas noites e um dia seguidos. A gente tem dessas loucuras na vida e às vezes é necessário ser meio maluco.

Agora ouço a Rádio Poética de Recanto das Letras e ouço o grilo a barulhar nas paredes. Passam de vez em quando uma muriçoca, pernilongo a zumbir e revoam moscas na claridade da luz artificial da incandescente.

O galo canta vez por outra anunciando as proximidades de um novo dia. Os sapos coaxam nos charcos dágua deixados pelas chuvas diárias. Seus barulhos anunciam a expansão de suas proles para perpetuar a espécie.

Outras coisas me preocupam: os doentes nos hospitais sem auxilio médico ou sem remédios em alguns casos. Mesmo com auxílio médico e remédios o fato de estarem hospitalizados é um transtorno. Os presos que por algum motivo estão ali. Alguém cortou o pescoço de outro e levou a cabeça do morto na mão.Por isso está preso. Outro traficou droga, outro bateu na mulher, outro estuprou, outro facilitou o estrupo, outro furtou, assaltou etc, etc, etc,. Agora discute-se a redução da maioridade penal. Uma pena que nossas crianças viram criminosos muito cedo e para inibir é preciso tomar uma atitude dessas. Os pais já não educam os filhos para a vida. Apenas os fazem e pronto. O governo incentiva a parição desenfreada de crianças. Parir hoje é mercado garantido. As mães recebem dinheiro do governo por parir seus filhos. Isso torna-se um ciclo vicioso e muitas famílias são filhos dessa política irresponsável. Além de tudo o governo não educa essas famílias, não lhes põe um basta. Virou voto cabresto para o governo se manter no governo.

Enquanto penso nisso a natureza chora suavemente lá fora e eu ouço o soluço da chuva. É água, mas a mim mais parece lágrimas de desgosto pelos filhos que tem em demasia sem educação moral, em demasia inescrupulosos, desumanos e irracionais. Como se fossem.

Observo meu cinturão pendurado no armador. Instrumento que foi utilizado por meu pai para duas coisas: segurar suas calças e nos disciplinar. Eu o uso nas mesmas circunstâncias.

Também observo a iluminação artificial da fluorescente em contraste com a iluminação da lamparina a querosene em 1980, década de minha infância.

Vejo alguns pobres obesos em contraste com a magreza dos pobres das décadas de 70, 80 e 90 passadas.

Vejo águas fluindo das paredes das casas no interior de minha cidade em várias localidades em contraste com a cabaça dágua na cabeça das mulheres de 1980 e das latas de metal em 1990.

Vejo roupas descartadas em bom estado de uso pelos pobres de hoje em contraste com as calças, bermudas e blusas remendadas nas décadas passadas em decorrência da extrema pobreza.

Vejo ainda que as crianças de hoje não sabem o que é lamparina, pau-de- lenha, pote, farinha de torrado, farinha de gergelim, aguidá, colher-de-pau dentre outras coisas da antiguidade para eles.

Rádio em desuso e com o tempo a TV será coisa da antiguidade.

São 4 e 30 e a melodia chuvosa ainda persiste. Os galos amiudam o canto e as trevas começam a se enrolar para dar lugar à luz que brevemente anunciará um novo dia. Um dia que será normal como os outros, mas que também tem seus males e suas bonanças e que será contabilizado para a eternidade assim como foi o ontem.

A vida é uma dádiva de Deus e ontem ponderava com minha esposa. Somos muito parecidos com Deus. Ele nos deu a capacidade de dar vida. Deus fez o homem de um monte de barro e nos deu a capacidade de de nós mesmo fazer surgir outro ser semelhante. De dentro de nós numa ação mágica milagrosa. E muitos de nós hoje, por questões financeiras nos privamos dessa dádiva. Queremos antes de tudo trabalhar e angariar dinheiro acrescentando nossas posses. Deixamos de trazer uma criança ao mundo para com ela dividir nossas tralhas e com ela viver nossa vida e permitindo que essa criança seja uma benção para nós, uma alegria e felicidade. Mas, hoje é o tempo em que o homem e a mulher priorizam recursos financeiros acima de qualquer valor seja religioso, amoroso, familiar, etc.

Estamos contaminados com as influências modernas e desprezamos os valores divinos. O homem ainda o é esteticamente, mas interiormente o homem virou um monstro indiscernível.

CARLOS JAIME
Enviado por CARLOS JAIME em 24/04/2015
Código do texto: T5218262
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