NOS DIAS EM QUE EU FIQUEI COM A ZIKA

Depois de três ou quatro dias consecutivos de febre noturna, sem perda nenhuma do apetite, sem dor de cabeça, numa tarde, ao sair do banho percebi o meu corpo cheio de manchas avermelhadas como se alguém tivesse desenhado o mapa da Austrália em mim. Então, resolvi buscar uma orientação médica.

– O que o senhor tem?

Quando ouvi a pergunta dirigida à minha pessoa, pelo médico, minha vontade era ter dito que se eu soubesse qual era a minha enfermidade eu nem teria ido àquela unidade hospitalar, mas o que saiu foi que eu achava que estava com zika.

– Ah, o senhor acha? Com esses sintomas relatados pelo senhor e a julgar pela sua aparência eu tenho noventa e nove vírgula nove por cento de certeza, mas precisamos fazer um exame para chegarmos ao cem por cento.

O médico falou isso fazendo uns movimentos como quem tirasse uma seringa do bolso e vendo aquilo, eu disse para o doutor se acalmar e deixar essa parte do colhimento do sangue para a enfermeira. Fato é que o movimento do médico não era para pegar seringa nenhuma, mas sim, se levantando para ir abrir a porta do consultório para chamar a enfermeira.

– Cleonice! Cleonice! Cléo...

– Eu já estou aqui, doutor Bernardo!

– Colhe o sangue deste paciente. Vamos fazer uma sorologia. Deve ser zika...

A enfermeira tinha mãos de pena. Senti somente o beliscar inicial da agulha. Não tenho medo de agulhas de seringas, mas prefiro que enfermeiras colham o meu sangue, homens, por mais profissionais e habilidosos que sejam passam uma impressão de agressividade, pelo menos para mim.

Depois de alguns minutos de a enfermeira colher o meu sangue, o resultado dado pelo médico não foi surpreso:

– Senhor, Rocky Taylor, o senhor está realmente zikado. Como analgésico e antitérmico vou recomendar-lhe uma dipirona e, para amenizar a urticária que vai lhe importunar, uma dexclorferinamina, como antialérgico.

Explicava tudo isso, cabisbaixo com a caneta ziguezagueando na folha de cima do receituário. Logo, destacou o papel do bloco, entregou-me na mão já gesticulando para eu ceder o espaço a outro paciente que esperava à espreita do lado de fora do consultório.

Sair do consultório e fui à drogaria para comprar os medicamentos. Aliás, em casa tinha os dois receitados, mas o que teria efeito era somente aquele que o médico receitara. Eu sou um desses seres humanos que confia mais nos efeitos daqueles remédios que o médico acabara de receitar, após a consulta que, naquele receitado em dia anterior, mesmo que não tenha mudado nada.

Fui atendido pelo farmacêutico Calisto. Aquele que ficou em primeiro lugar no concurso de beleza realizado pelas mulheres para saber quem seriam os homens solteiros mais bonitos de Minípolis. Pensa num caboclo feio! Eu também participei do concurso... Quando eu soube que havia saído o resultado definitivo, preguei os olhos no último nome da lista dos vencedores ainda com alguma esperança, mas ouvi a voz de Alfredo, último colocado:

– Rocky Taylor, sua falta de beleza não lhe permitiu nem ser classificado!

Gilson Vasco
Enviado por Gilson Vasco em 28/10/2017
Reeditado em 16/02/2018
Código do texto: T6155135
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