Serra: o homem que distorce o canto do galo

Minas é uma terra de muitos galos. E isso pode ser decisivo para o resultado das eleições presidenciais. No debate de ontem, da Rede TV!, José Serra se vangloriou de ter ao seu lado na campanha o ex-presidente Itamar Franco, “um homem íntegro”, garantiu. Minas é a terra onde “se come quieto”. José Serra, porém, ainda não aprendeu esta arte.

Tivesse ficado calado teria tido mais sucesso do que com a montoeira de lorotas que conseguiu dizer em tão curto espaço de tempo. Começou batendo no peito para dizer que foi o autor do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), na Constituinte de 88. É emblemático que Serra tenha a cara-de-pau de dizer isso, quando o DIAP (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) acaba de soltar nota reprovando a participação dele como deputado constituinte. Uma atuação que, na presidência, destruiria os avanços dos movimentos sociais e os direitos trabalhistas arduamente alcançados pelo povo brasileiro.

Mas apropriação indébita, falsidade ideológica e charlatanismo são coisas das quais ele entende. Justiça seja feita. Basta dizer que está sendo processado, dentre outras coisas, por se registrar no TSE como possuidor de um diploma que ninguém viu: economia. O que se viu foi ele errar conta de porcentagem na frente de criancinhas. Muito gosta de se dizer o “pai disso, pai daquilo”. Seqüestrou para si o filho legítimo de Jamil Haddad: o medicamento genérico. E agora vem a público seqüestrar o filho de Jorge Uequed: o FAT. É um sentimento paternal digno de comoção.

No entanto, fosse mais esperto, como os mineirinhos a quem tanto admira, escolheria melhor o que seqüestrar. A história dos cursos do FAT é recheada de desvios de verba. Há quem garanta que nunca capacitaram ninguém e, só no DF, enriqueceram muitas pessoas – que hoje estão todas em sua campanha.

Serra gosta também de seqüestrar filhos para os outros. É um homem solidário. Insiste que o Plano Real é de FHC e, nesta hora, o coitado do Itamar fica impedido de cantar de galo. Enquanto isso, FHC jogou no colo de Serra um filho que ele rejeita: as privatizações. Solidariedade tem limite, não é? E não se pode aceitar tudo o que os outros nos oferecem...

Estranho... Porque se os tucanos dizem que as privatizações foram tão boas pro Brasil, por que toda essa rejeição? Por que desvia do assunto como as minhocas fogem dos galos? No debate de ontem, sem se explicar sobre o uso vergonhoso que faz de tantas questões, Serra lamentou que a privatização esteja sendo “usada eleitoreiramente” contra ele e garantiu que, se ele for presidente, “estatal vai ser estatal”. O problema é que Estado para ele é sinônimo de colônia. Chegou ao cúmulo de dizer que números apontam que o avanço de sua candidatura no 2º turno elevou as ações da Petrobras. Levou merecida vaia da platéia. Mas não desistiu e lembrou: “Eu fui daqueles que liderou a defesa da Petrobras quando ela ainda era adolescente”. Lindo! Faltou explicar porque não continuou a defendê-la na fase adulta. Suponho que adultos saibam se cuidar, mas o sentimento paternal dos tucanos é tão grande que quiseram até lhe mudar o nome para Petrobrax, na ânsia de melhor agradar aos neocolonizadores.

Em determinado momento do debate, ainda sobre o tema privatização, que foi o grande mote, Serra disse que Dilma “ouviu o galo cantar e não sabe onde”. Melhor não saber onde está o galo do que distorcer seu canto.

Ana Helena Tavares é jornalista por paixão, escritora e poeta eternamente aprendiz.

Ana Helena Tavares
Enviado por Ana Helena Tavares em 18/10/2010
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