Impeachment no Paraguai

O Partido Colorado dominou a política no Paraguai durante 61 anos (1947-2008), até perder as eleições presidenciais de abril de 2008 para o candidato da Aliança Patriótica para a Mudança.

Fernando Lugo, um ex-bispo católico que representava uma coalizão de vários partidos e movimentos sociais, foi eleito com 42,3% dos votos. O fato de não haver segundo turno levanta a questão do candidato poder ser eleito por maioria relativa de votos e não por maioria absoluta de votos, o que daria mais legitimidade ao vencedor.

Fernando Lugo (Aliança Patriótica para a Mudança) formou chapa com Federico Franco (Partido Liberal Radical Autêntico). O partido do presidente elegeu apenas 2 deputados e nenhum senador, enquanto o partido do vice-presidente elegeu 26 deputados e 14 senadores. Portanto, o governo teve dificuldade em formar maioria absoluta para governar tendo em vista que há 80 deputados e 45 senadores.

O presidente Fernando Lugo passou por momentos delicados ao longo do mandato:

1) reconheceu filhos frutos de relacionamentos enquanto era membro da Igreja;

2) tratou-se de um câncer linfático;

3) no último dia 15 de junho, houve conflito agrário entre camponeses e a polícia na fazenda Curuguaty que resultou na morte de 17 pessoas.

O último fato desencadeou uma rápida sequência de acontecimentos: no dia 20 de junho, o Partido Liberal Radical Autêntico abandonou a base do governo; no dia 21 de junho, a Câmara abriu processo de impeachment por 76 votos contra um, com três abstenções; no dia 22 de junho, o Senado aprovou o impeachment por 39 votos contra quatro, com duas abstenções.

Em 25 de junho, a Corte Suprema recusou as alegações de Fernando Lugo sobre a inconstitucionalidade do processo de impeachment. As eleições presidenciais estão marcadas para abril de 2013 e não serão antecipadas. O processo seguiu as regras constitucionais e o ordenamento jurídico vigente.

Ao longo do século 20, o presidencialismo latino-americano sempre apresentou um problema de funcionamento institucional, devido à impossibilidade de antecipar eleições presidenciais, quando há uma aguda crise política e o presidente não tem mais maioria parlamentar para governar o país.

No quadro de uma recessão econômica mais profunda, com conflito agrário, insatisfação social e num ambiente de polarização política, há a falta de consenso sobre as medidas a serem adotadas e de maioria parlamentar estável para o presidente terminar o mandato.

Nesse tipo de situação, ao contrariar os interesses das elites oligárquicas, um presidente não consegue implantar medidas para melhorar a vida dos mais pobres e termina derrubado do poder. A novidade no caso paraguaio foi o uso do impeachment para remover o presidente que ficou politicamente isolado. Este pretexto pode tornar o impeachment uma arma política para promover mudanças de governo.

Se no parlamentarismo o primeiro-ministro pode cair por moção de desconfiança da maioria absoluta, o presidencialismo latino-americano está abrindo o precedente de que o presidente pode cair por impeachment, por maioria qualificada de dois terços, se a oposição conseguir aglutinar essa força para promover uma mudança de governo.

Torna-se necessário repensar as instituições democráticas do presidencialismo latino-americano antes que tal fato volte a ocorrer em outro país.