COMO PREVENIR O CÂNCER GINECOLÓGICO

Sérgio Martins Pandolfo*

“A vida é muito curta para que se a faça pequena”

A Medicina é uma das ciências mais complexas, por valer-se de biovalores e bioindicadores que não são matematicamente constantes; é também uma das mais importantes para a humanidade. Atualmente, graças ao avanço da medicina diagnóstica, da prevenção e tratamento precoce vive-se mais e melhor.

Sob esta denominação – câncer ginecológico - compreendem-se os tumores malignos que incidem sobre os órgãos genitais da mulher e, modernamente, dando-se maior amplitude ao termo, o câncer da mama, mercê da estreita interrelação dessa glândula com o aparelho reprodutor feminino, eis que ela se constitui num símbolo da sensualidade, da sexualidade e da maternidade, a um só tempo responsável pela autoimagem e autoestima. Ademais do papel indissociável na amamentação as mamas são órgãos erógenos e de prazer sexual, além de complemento especificamente inerente à silhueta feminina.

A mortalidade média por câncer nas capitais brasileiras, conforme dados recentes, representou cerca de 17% sobre o total dos óbitos de causas conhecidas. Considerando apenas os grupos etários acima de 40 anos, essa percentagem supera os 20%. Enquanto a incidência de outras doenças diminuiu, a do câncer (CA) aumentou, agravando-se, ainda mais, o problema do seu controle. O principal fator de risco é o envelhecimento.

No que concerne estritamente ao câncer ginecológico os dados fornecidos variam em função da localização: estima-se em 49 casos para cada 100 mil mulheres/ano para o incidente sobre a mama e 18 por 100 mil/mulheres/ano para os que se originam no colo uterino. .O câncer de mama é o segundo tipo mais frequente no mundo e o mais comum entre as mulheres, com incidência de 22% de casos novos por ano; é também o que mais causa mortes na população feminina, oscilando em derredor de 2,5% de todos os óbitos, segundo o Instituto Nacional de Câncer - INCA.

O câncer de colo é o segundo mais frequente a atingir as mulheres, incidindo mais na faixa etária de 45 a 49 anos. De todos eles o câncer do ovário é o de mais difícil diagnostico e o de maior letalidade, sendo sua detecção basicamente adstrita à ultrassonografia (atenção especial deve ser dada para os cistos maiores de 10 cm), já que os chamados marcadores tumorais (CA-125, mormente) são de muito baixa especificidade. No cômputo geral a incidência de câncer ginecológico em áreas urbanas é cerca de seis vezes maior.

Desse modo – e isto é o mais importante! -, o sucesso do tratamento depende basicamente do diagnóstico precoce da doença que, desafortunadamente, nessa fase, poucos sintomas exibe. Para a prevenção ou, pelo menos, o diagnóstico precoce do câncer ginecológico, existem regras hoje perfeitamente estabelecidas e de mui fácil execução, que passaremos a expor, sucintamente, a seguir.

No que respeita ao câncer de mama - o que mais mata mulheres no Brasil -, uma das recomendações mais importantes, preconizada por todos os especialistas no assunto é o autoexame, que consiste em a paciente praticar, ela própria, a intervalos periódicos (de três em três meses, por exemplo), um atento e minucioso exame dos próprios seios. Ninguém conhece melhor as mamas de uma mulher que ela própria! Esse exame é praticado da seguinte maneira: inicialmente uma inspeção cuidadosa das mamas frente ao espelho, procurando atentar para sinais de suspeição, como: 1) aumento de tamanho de um dos seios; 2) depressões ou saliências localizadas; 3) retração ou desvio da mamila (bico do seio); 4) alterações da contextura da pele e/ou da aréola em redor da mamila; 5) alteração de coloração e/ou edema (inchaço). Em seguida, a paciente deitada no leito palpa demorada e minuciosamente cada um dos seios, procurando surpreender principalmente a existência de áreas endurecidas ou de pequenos nódulos (caroços), sinais altamente sugestivos de processo maligno. Qualquer anormalidade por acaso percebida ou suspeitada pela paciente: “caroço”, deformação ou alteração da superfície (saliências, retrações, descamação, ou vermelhidão ao redor do mamilo ou retração deste) das mamas, o achado de nodulações endurecidas (gânglios) na axila, deverá a autoexaminanda imediatamente procurar o ginecologista para esclarecimento e orientação a ser seguida. As formas mais eficazes para detecção precoce do câncer de mama seguem sendo o exame clínico da glândula e a mamografia. O autoexame da mamas deve ser feito já a partir dos 20 anos, preferencialmente uma semana após a menstruação e poderá ser executado durante o banho, deitada ou sentada em frente ao espelho.

O exame de mamografia digital (MD) constituiu-se em grande avanço tecnológico para a detecção precoce do câncer de mama, doença que, segundo a OMS tem vindo a aumentar desde a década de 1960, respondendo por 22% dos casos novos de câncer registrados em todo o mundo. O exame é rápido, indolor, e de alta definição (detecta tumores de até 0,5 mm) e deve ser realizado a partir dos 35 anos de idade se houver fatores de risco (como histórico de CA de mama nos ascendentes e colaterais familiares) e a partir dos 40 anos no geral, repetindo-se a cada dois anos até os 69 anos.

Algumas vezes a MD precisa ser complementada com a ultrassonografia (USG) para a elucidação de determinadas imagens. Trata-se de método inócuo (não usa radiações ionizantes), indolor, rápido e também de alta resolução; Eventualmente pode ser necessário um exame de ressonância nuclear magnética. Após a menopausa os exames periódicos devem ser rigorosamente efetuados e, se necessário, amiudados. . O tabagismo, o consumo exagerado de álcool, de drogas ilícitas, o excesso de peso corporal e o estresse devem ser evitados, pois constituem importante fator de doenças das mamas que podem levar ao câncer. Alimentação saudável e nutritivamente balanceada e a prática de atividades físicas, a amamentação são formas de preveni-lo. Os anticoncepcionais não constituem fator de risco para o CA de mama. Quanto à reposição hormonal, se feita dentro de parâmetros adequados, não há nenhuma evidência cientificamente comprobatória de aumento da incidência de neoplasia da mama.

Em relação ao câncer dos órgãos genitais, entre os quais avulta o que se origina no colo do útero como mais freqüente e traiçoeiro, a paciente contará com o auxílio do especialista para a sua prevenção, isto é, para impedir que o mesmo se instale. Isto pode ser facilmente conseguido, bastando que as mulheres em atividade sexual e após os 25 anos de idade – embora possa ocorrer em qualquer idade, o câncer acomete mais frequentemente as mulheres após os 25 anos de idade – façam pelo menos uma vez por ano um exame especializado com o ginecologista, durante o qual procurar-se-á detectar com o auxílio de um instrumento ótico denominado colposcópio, capaz de aumentar várias vezes as estruturas por ele examinadas, a presença de lesões consideradas pré-cancerosas, facilmente tratáveis, evitando-se sua evolução para o câncer. Na mesma ocasião, com material recolhido do colo do útero e das paredes vaginais prepara-se uma lâmina, que é corada e levada ao microscópio para o estudo das células, exame esse conhecido popularmente como “preventivo” ou teste de Papanicolaou. Atenção também deve ser dada à parte mais externa e visível da genitália feminina, a vulva, à busca de alterações e/ou lesões aí assestadas.

Por este meio, consegue-se surpreender processos malignos na sua fase mais precoce, quando os meios de tratamento chegam a oferecer até 100% de curas. É, como ficou visto, um método absolutamente indolor, cômodo e barato, que dá à mulher que o utiliza garantia de proteção contra uma das formas de câncer de maior freqüência e poder de destruição. Nos Estados Unidos da América e nos países mais desenvolvidos existem esquemas de prevenção ao câncer ginecológico tão bem montados, que a maioria das mulheres, conscientes de sua eficácia, procuram sistemática e periodicamente os Serviços de Prevenção, onde são cadastradas, recebendo uma carteira na qual são anotados os resultados dos exames realizados regularmente.

Ao longo da primeira década deste século surgiram vacinas para várias doenças, até então inexistentes, dentre as quais a que imuniza contra o papilomavírus humano - HPV (vírus causador do câncer do colo do útero, tipo que mais vitima mulheres brasileiras depois do de localização mamária). A vacina quadrivalente, que imuniza contra os quatro tipos virais mais perigosos para a indução de câncer (6 e 11 para os implicados na formação de verrugas genitais, ditos condilomas, e 16 e 18, mais frequentemente envolvidos na gênese do CA de colo) está indicada para aplicação entre os 9 e os 26 anos de idade, garantindo segura imunidade.

Os métodos de tratamento de que dispomos hoje em dia, representados basicamente pela cirurgia, pela quimioterapia e pela radioterapia (tratamento por irradiações com raios-X, radium e bomba de cobalto), proporcionam resultados altamente eficazes quando a doença é diagnosticada no início e maus resultados quando o tumor já é avançado.

Cumpre alertar a população para a superioridade da Medicina Preventiva em relação à Curativa e em particular no que concerne ao câncer ginecológico, tudo fazendo para que o mesmo seja evitado ou pelo menos descoberto precocemente, quando é curável, e não somente nos estágios finais, ocasião em que quase mais nada pode ser feito para combatê-lo.

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(*) Médico e escritor. SOBRAMES/ABRAMES. Especialista em Ginecologia e Obstetrícia. Do Serviço de Tocoginecologia do Hospital de Clínicas “Gaspar Vianna”, Belém. E-mail: serpan@amazon.com.br - sergio.serpan@gmail.com - Site: www.sergiopandolfo.com

Sérgio Pandolfo
Enviado por Sérgio Pandolfo em 04/11/2010
Reeditado em 04/11/2010
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