Sérgio Martins Pandolfo
 
         Vai farto e consentido na mídia, em todas as suas vertentes, alguém a se queixar ou verberar contra os serviços médicos, clamando sempre contra a desídia, a incompetência ou, alegação da moda, o “erro médico”, disso denunciando profissionais de ilibada conduta e saber profissional que de repente são atirados à lama fétida, quase sempre visando gorda compensação financeira por tal ou qual “dano”.
        Ora, senhores, a Medicina atingiu hoje níveis de qualidade antes sequer sonhados, podendo-se apontar como indicadores desse estágio de excelência da arte de curar, os transplantes (quase todos os órgãos e tecidos), a cirurgia videoendoscópica, a microcirurgia, as técnicas anestésicas, vacinas para a grande maioria das doenças infecciosas, o controle quase integral de males antes mortais como a Aids e muito mais.  O alcance desse nível de superioridade biomédica, que possibilitou um aumento incrível da expectativa de vida das pessoas no mundo inteiro – só para pôr exemplo, aquando do achamento do Brasil em 1500 essa expectativa era de tão só 35 anos no continente mais avançado e desenvolvido à altura, o europeu – e todo o notável avanço conseguido pela Medicina o foi graças à dedicação, diligência, estudo continuado e sacrifício pessoal dos médicos que, quase sempre anônima e diuturnamente, se dão ao estafante, mas instigante e jubilar labor hipocrático.
        Inobstante, o que se observa no dia a dia é um inexplicável paradoxo: exaltação à Medicina e opróbrio dos médicos, que são vistos, mais das vezes, como mercenários, negligentes, imprudentes, incompetentes, tidos mesmo por alguns como maleficiosos à clientela. O “negócio” do erro médico é um dos mais florescentes e lucrativos dagora, havendo até ONGs e escritórios jurídicos especializados nisso e advogados de “porta de hospital”, que aliciam e estimulam familiares a formular queixas à polícia ou ao Ministério Público e entrar com queixa contra profissionais que hipotética ou fantasiosamente teriam incidido em erro médico, isso a juízos próprios, sem levar em conta as condições e contingências do atendimento, a boa ou má estruturação do hospital, ambulatório ou Posto de Saúde, a agudeza ou cronicidade do mal etc. Logo fazem um bafafá, às vezes com gritos histéricos e minuciação do “erro” cometido, clamando por “justiça”.
        Reclama-se, amiúde, de atrasos de médicos aos postos de serviço (ambulatórios, consultórios), não levando em conta que isso pode dever-se à prolongação do atendimento a outros pacientes (uma cirurgia que se alongou além do previsto), problemas de deslocação no trânsito (abalroamento, pneu furado, engarrafamentos, assaltos, hoje banais), enfermidade em familiar (mãe, filho, esposa/o) ou do próprio profissional (médico também adoece!), um parto normal ou cesáreo que se complicou etc. Se o médico marcou consulta para as 8h e só chegou às 9h, logo se lhe imputa a pecha de relapso ou, se foi “direto ao assunto” visando abreviar o tempo – sem com isso baixar a eficiência – diz-se que “nem olhou pra mim e não fez sequer a anamnese”. Chegou-se mesmo a propor o tabelamento, a unificação dos preços cobrados no consultório a particulares e conveniados.
        Em contraparte, não se reclama isso de outros profissionais, advogados verbi gratia. Destes temos a lamentar, pessoalmente, dois malfeitos recentes de improbidade e desídia profissional. No primeiro caso, após peleja judicial de 20 anos na esfera federal em demanda plúrima para correção de perdas salariais devidas a Planos Econômicos o escritório jurídico adonou-se de ervanário à volta de 600 mil reais dos 32 reclamantes, em 2009, deixando a todos no ora veja. No segundo, a advogada, que exigiu pagamento adiantado para defender-nos em lide funcional, ainda na esfera administrativa, “distraiu-se”, perdeu o prazo recursal e, qual não foi nosso espanto ao recebermos o comunicado de condenação – à revelia, porquanto não contestada – já em nível ministerial. A “causídica” perdeu o prazo e por sua causa perdemos a causa. E a OAB? 
    

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*Médico e escritor. ABRAMES/SOBRAMES
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Sérgio Pandolfo
Enviado por Sérgio Pandolfo em 29/07/2011
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