A guerra dos farrapos foi realmente uma “Revolução”?

Está se aproximando o 20 de Setembro, data do orgulho gaúcho e de exaltar o amor a nossa terra, então dedico este artigo um tanto quanto polêmico aqueles que são “gaúchos” somente na Semana Farroupilha, que nem sabem direito o que tão fazendo ou vestindo e muito menos sabem o significado da cor do lenço que trazem em seu pescoço e também aqueles cujo tradicionalismo exarcebado tiveram seu intelecto cauterizado pela alienação positivista que nossa história propõe, esta que é transmitida de geração em geração que nos leva a idolatrar um panteão de latifundiários. Como sou um gaúcho que ama esta terra sou a favor de um revisionismo histórico nesta fábula e a desmascarar a farsa que nos é imposta!

Começando que não há por que considerar como Revolução a Guerra Farroupilha de 1835. Não foi uma revolta popular, levando em conta os interesses em jogo; todavia, na condição de classe subordinada, o povo lutou. E se considerarmos os projetos da República e Federalismo, houve componentes progressistas no ideário político gaúcho, repletos de dispositivos maçons (um exemplo, a “fuga” de Bento Gonçalves do Forte do Mar na Bahia) e nestes, estão impregnados os interesses da elite.

Pode-se começar justificando o fato de estar errado o termo Revolução para o levante farrapo. Há um senso comum que diz ser Revolução uma troca dos que estão no poder, por meios drásticos. Trata-se de um entendimento equivocado das coisas. Revolução implica troca de classes no poder, uma alteração radical na estrutura institucional. O termo é usado gratuitamente na História do Brasil, tais como 1835, 1893, 1923, 1930 e 1964. Tal manipulação tem servido para valorizar os interesses da elite dominante, os quais não tinham projetos radicais de alteração das classes no poder.

A historiografia positivista oculta a instabilidade e miséria da peonada, submetida a uma dominação disfarçada de convívio paternal e fraternal. Convém lembrar que o povo jamais lutou por uma causa verdadeiramente sua embora as elites continuem festejando o 20 de setembro como se tivesse sido uma revolução popular, a verdade histórica está demonstrando que aquele evento nada teve de jacobino. Complementando que nossa independência tão celebrada no dia 7 de setembro, por exemplo, não foi uma revolução, mas sim a substituição da expropriação e opressão de Lisboa pela hegemonia do sudeste, enfim, um prolongamento interno do antigo colonialismo.

Citando o movimento maragato de 1923, foi ideologicamente herdeiro do pensamento liberal-conservador de 1835, ancorado socialmente na elite dos estancieiros que, a despeito do apoio de outras classes, não tinha nenhum projeto para elas. Esta herança se manifestou na oposição ao centralismo borgista em nome de um sentimento liberal que buscou legitimar evocando o discurso sobre liberdade dos rebeldes farrapos. Quer dizer, os borgistas podiam recolher, no baú da ideologia farroupilha, o republicanismo, amortecido com a derrota de 1845 e revivido por Júlio de Castilhos em 1882. E os maragatos, no mesmo baú, foram recolher o entusiasmo liberal que animara a luta contra a tirania do Governo central. Enfim, os eventos de 1835 forneceram subsídios para diferentes ramificações do ideário político gaúcho posterior.

Acrescento um fato curioso e cômico ao mesmo tempo ocorrido no ano de 1838, que ao tomar Rio Pardo, os farrapos prenderam a banda imperial e o maestro Joaquim José de Medanha e o coagiram literalmente a compor o hino farroupilha, hoje Hino do Rio Grande do Sul.

O gaúcho daquela época não era um homem “livre” e altivo como apregoam os tradicionalistas, mas sim sempre esteve submetido aos caprichos e vontades do estancieiro, sempre foi um solitário miserável, apenas acompanhado pelo álcool, do jogo e da cordeona, compondo um setor social rarefeito, pouco unido, muito débil diante da elite dominante e sem consciência de classe para entender e lutar por seus interesses, o verdadeiro gaúcho se caracterizou por ter uma vida errante, dura e difícil, o que inclusive o habilitou a enfrentar as durezas da longa e árdua revolta farroupilha, ou seja, seu cotidiano nada possuiu de lúdico e idílico como muita gente pensa.

Concluo argumentando que não se justifica fazer todo um povo compartilhar de um ufanismo que só tem sentido em nível de interesses restritos. As camadas populares sempre perderam no campo de luta, desde os tempos de Cabral... Porque utilizar o nome do povo para encobrir interesses apenas de um grupo significa uma nova derrota popular, na medida em que, desse modo, impede-se que um episódio histórico sirva para a formação de uma consciência crítica. Como nossa historiografia é tipicamente positivista, então ela busca seus heróis do passado nas oligarquias é claro, e na Guerra Farroupilha existe um panteão de nomes a serem cultuados e idolatrados pelo povo gaúcho.

Adriano Couto
Enviado por Adriano Couto em 30/11/2010
Código do texto: T2645815
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