A Polícia e a Noticia
Polícia e notícia: apenas a sonoridade tão parecida destas duas palavras já é suficiente para notarmos as ligações perigosas que elas podem estabelecer. Nossas polícias, em todos os seus níveis, e a PM, em particular, têm investido fortemente em suas equipes de relações públicas, no capital humano que trabalha com comunicação.
A PM, diuturnamente, mantém contato com a mídia, realiza comunicação com a comunidade, recebe comunicação do Governo, além da publicidade institucional, que tem nas viaturas, solípedes, barcos e aeronaves a presença institucional sendo divulgada. Nesse sentido, por exemplo, o ganho na imagem pela padronização do grafismo em todas as viaturas é incalculável.
A PM também tem focado sua atenção no público interno, uma vez que circulam muitos boatos na área de segurança. Por boatos, entenda-se informação relevante divulgada de forma imprecisa ou com dados insuficientes.
A programação e as pautas, nos dias que correm, ainda privilegiam a polícia, a tragédia, o inusitado.
De forma geral, as grandes instituições e empresas não cometem mais o erro básico de, em momentos de crise, cortarem exatamente a área que poderá/deverá reverter ao menos a sensação momentânea do episódio vivenciado.
Temos seguido a “regra de ouro” para as situações de crise extremada, ou seja, aquelas que têm o evento morte como parte do resultado. Nestes momentos, a atitude fundamental não é esconder ou minimizar os fatos, mas acolher e saber lidar/ouvir os familiares das vítimas. São momentos em que a transparência e a forma proativa do setor envolvido são primordiais.
Há pelo menos duas décadas, deixamos de nos preocupar com as relações de causa e efeito, e passamos a incrementar a aproximação viabilizada pelo simbólico da filosofia do policiamento comunitário.
Os diversos tipos de desamparo, as múltiplas dependências, a violência, são algumas das experiências com as quais se confrontam homens e mulheres em seu desenvolvimento individual e na vida social. Mas, o que não se pode esquecer é que, para muitos, para além de capas de noticiários, são marcas em suas vidas.
O crescente discurso uniforme e as muitas repetições de pauta, além das trivialidades, geram a abolição das diferenças entre público e privado, o ser e o parecer, o consumidor e o cidadão, o fato real e o publicado na rede.
É preciso, como escreve José Saramago nas “Intermitências da morte”, quando fala das posições ambíguas, perder o costume de “encanar a perna da rã”, ou “dar uma no cravo e outra na ferradura”, acreditando que este seja o papel da imprensa.
No caso da polícia, informação de qualidade faz muito bem para a saúde, para a área educacional e, sobretudo, para os mais necessitados de serviços públicos.
A via midiática necessita lentamente deixar de ser uma fonte de finos prazeres para refazer-se um precioso e insubstituível artefato de combate, visando ampliar liberdades.
Sabe-se que a esperança para os que precisam ser noticiados é poder encontrar na escuta e no olhar sensível do profissional de imprensa a ressonância necessária para criar outros e novos caminhos para suas demandas, parte delas recorrentes.
Enfim, as notícias jornalísticas precisam voltar ao seu ponto de equilíbrio, uma vez que têm pendido para um lado sombrio, o lado mais pesado, ou seja, o das paixões do momento.
Doutor em Educação, professor universitário e capitão da sala de imprensa da PMESP