O Retrato das Famílias Contemporâneas

Vivemos num tempo conturbado pelo consumismo desenfreado, grassa por todos os cantos. Não temos sequer um tempo para olharmos para nosso interior. Nessa correria quotidiana na qual estamos envolvidos, esquecemos até mesmo daqueles momentos especiais que deveríamos passar em família. Por isso, a partir desta reflexão, queremos parar nesse tempo tumultuoso e agitado e, com uma ótica transformadora, enxergar os modeles de famílias que formam a sociedade em que vivemos e o que temos de mais precioso no núcleo familiar. Ao fixarmos a atenção nesses grupos, denominados família, possamos com tamanha caridade observar os caminhos pelos quais estas trilham nossa família. Essas palavras tratam-se apenas de uma reflexão acerca das instituições familiares, que, ao meu ponto de vista e percepção, estão um tanto desvalorizadas. Cada qual, ao ler, sinta-se provocado a perceber a importância de ter um lar, indiferente de sua forma. Sirva de farol a iluminar e ajudar nossas famílias na contemporaneidade.

1. Vive-se num tempo no qual não mais se presa pela instituição familiar. Momento no qual quem a rege é o pensamento do lucro desmedido, a simples ganância ou a preocupação do ter, visando os tempos vindouros. A família é um espaço no qual se procura alimentar um clima de paz e amor; afeto e carinho; amizade e companheirismo; respeito e reconhecimento. É do seio familiar donde tudo deveria provir. O primeiro amor provado pelos recém-nascidos é proveniente do pai e da mãe que, desde cedo, desejaram reunir os frutos de um casamento. O modelo de família testemunhado pelos mais antigos, não tem espaço no meio atual. As mulheres que antes tinham a tarefa de cuidar de seus descendentes, hoje têm de fazer além: trabalhar, deixar seus filhos numa creche, aos cuidados de uma babá ou até mesmo sozinhos, podendo gerar assim na criança, uma ausência amorosa, materna ou paterna, ou então, familiar num todo; pode também causar algumas outras revoltas (violência nas escolas) que foram reflexos de uma infância carecente de presença familiar. Os chefes de família têm grande peso na formação da criança, do adolescente ou do jovem, transmitindo-os carinho, educação e presença edificadora.

2.Precocemente as pessoas estão unindo-se em matrimônio. Porém, não pensam com maturidade e olhos no futuro a importante decisão que tomam; ou, há também aqueles que popularmente “juntam os trapos”. Formar família é vocação, Dom precioso de Deus. Viver junto à pessoa amada é uma realização. Todavia, Paulo na Carta aos Efésios nos afirma: “Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e os dois serão uma só carne” (Ef 5,31). Congregados e nutridos por um forte amor, homem e mulher, unem-se e formam uma só carne. Os primeiros momentos do matrimônio são vividos alegremente. Casaram-se; trajou o mais belo vestido e o mais rebuscado terno; a festa foi um sucesso; os comentários pós-festa foram muitos; para as núpcias não pouparam todo e qualquer valor. Enfim, foi tudo muito bonito, maravilhoso e satisfatório. É muito bom perceber esse bom êxito, essa felicidade dos cônjuges. Ficamos também felizes!

3.São Paulo nos dá as pistas de como se deve viver este amor conjugal no dia a dia: “Sejam submissos uns aos outros no temor a Cristo. Portanto, cada um de vocês ame a sua mulher como a si mesmo, e a mulher respeite o seu marido” (Ef 5,21-33). As mulheres não se convencem com estas palavras do Apóstolo. Afinal, ninguém se agrada em ser submisso; ninguém quer ser o empregado. Mas, para ter um bom relacionamento, a mulher tem de ser submissa ao marido, da mesma forma como também o marido deve ser submisso a sua mulher. O estar submisso na vida matrimonial, não indica nenhum grau de superioridade ou inferioridade, mas, sim, uma submissão caracterizada pelo amor, pela humildade, pelo desejo e doação. É, acima de tudo, estarem sensíveis as necessidades uns dos outros. Quando obedecemos a uma ordem, indiferente de quem a ordena, mesmo que não queiramos, estamos renunciando as nossas próprias vontades e dando sinal de que entendemos o que é viver o amor em família.

4.Com o passar do tempo a vida do casal – que agora são uma só carne- vai tomando rumos diferentes. Ambos saem juntos para o trabalho; a mulher segue por um caminho e o marido por outro. O casal trabalha durante todo o dia. Ao retornarem do emprego – após longo período sem se verem - o marido assiste a TV ou vai a procura de atividades lúdicas, enquanto a mulher, também exausta, dedica-se a cuidar dos filhos e do jantar. Consequentemente, nesse relacionamento falta alguma coisa. Falta a cooperação e empatia. Daí, origina-se as divisões e agressões verbais, que podem resultar em vários fins. Aquela concordância de antes, já não mais existe. Para tentar solucionar, há os que seguem o ditado: “Quando a galinha canta, o galo se cala”, ou seja, quando a mulher desabafa o homem consente. Ficar quieto, talvez seja um meio não muito apropriado. Entre o casal deve haver o diálogo, a comunicação. Um bom planejamento pode nutrir a união do casal.

5. O casal uniu-se em matrimônio. Dessa união brota o fruto mais precioso desse amor, um bebê. A família começa a ganhar seus moldes... Novos desafios vão surgindo, e junto, muitas alegrias e surpresas. Chega o nascimento e, a criança logo após vir ao mundo, recebe um nome escolhido pelos próprios pais. Temos o costume de falar que é nosso nome de batismo. Batismo? Sim. O nome que nossos pais, por alegria do nascimento nos deram. É esse, um passo importantíssimo na vida da criança, pois, na pia batismal, ela recebe as marcas iniciais da fé. A criança é batizada em nome da amais perfeita família: em nome do pai que nos criou, e do Filho que nos salvou e do Espírito Santo mãe de amor. A partir desse momento os padrinhos passam a participar da difícil tarefa de ajudar os pais na educação da criança, tanto na fé como na sociedade. O cultivo da fé e responsabilidade da família. É nesse meio que os pais ensinam as crianças as primeiras orações cristãs; os ensinam a rezar o Santo Anjo, a fazer o sinal da Cruz, a juntar as mãozinhas para rezarem ao Papai do Céu e a Mãezinha do Céu. Este é um tempo frutuoso, pois, tudo o que aprendem, vão querer mostrar aos outros. E, não há melodia mais bonita, que ouvir a voz de uma criança a rezar: Santo anjo do Senhor, meu zeloso guardador... Que alegria! Maravilha! Lembramos do tempo em que também nós éramos crianças e, nossos pais nos ensinavam a rezar. A família é o “berço da fé”. “A família é uma Igreja doméstica”, afirmou o Concílio Vaticano II. Os pais devem ser os primeiros catequistas. O lar é um espaço especial de acolhida e evangelização. Os chefes do lar ajudam e, devem ajudar cada vez mais a Santa Igreja no anúncio da Boa Notícia; seus primeiros destinatários são os próprios filhos e filhas. Se não fosse a família evangelizar os seus, talvez a Igreja não conseguiria ter espaço nesse núcleo. Isso é sinal de vivo testemunho. Seria um anti-testemunho se os pais não cuidassem da evangelização e vida de fé dos seus. É nesse espaço que, por primeiro, podemos comunicar a Palavra de Deus, seta a apontar o Cristo do presépio.

6. Observamos ainda que, existem algumas famílias esquecendo-se de que existe um Deus que é Pai e Criador. Não ensinam mais aos filhos as primeiras orações cristãs. Os padrinhos só o são nos momentos de festas (veículos de presentes). Ao invés de levar sua família para a religiosidade, preferem passear. Acabam com a pouca fé da criança. Vai ao shopping, pizzaria e não os incentivam a negar aos convites mundanos, facilmente oferecidos pela sociedade.

7. A liderança é fundamental num grupo de indivíduos. Nos inúmeros paradigmas da sociedade, deparamo-nos com os diversos tipos de líderes: na escola, no hospital, na indústria, na empresa... Na família não é diferente. Conferimos aos pais e as mães essa figura autoritária; essa voz que atenta, lidera e comanda. É função do pai e da mãe reger sua família. São eles quem devem ditar as leis: hora de tomar café, estudar, ajudar nas tarefas do lar, divertir-se... Todo poder na família é confiado a essas ilustres figuras. Esse é o papel do líder familiar. Infelizmente, por momentos, não temos bons exemplos nesse contexto. Os lares modernos, não têm definido seu líder; cada membro brinca de liderar um pouco. Esse modo não é muito eficaz, pois, enquanto a mãe fala que sim, o pai diz não e vice-versa. Não há um diálogo. Não chegam a um consenso. O filho não sabe a quem recorrer. Tudo isso, resultará no instante no qual não mais vão pedir o alvará dos pais, ou então, pedirão e ficarão desnorteados, sem saber a quem obedecer e qual rumo seguir. O pai e a mãe têm de se impor. Não pode divergir um do pensamento ou conduta do outro. Não podem também deixar que os filhos sejam a autoridade máxima do lar. Porém, também não podem deixá-los sem tarefa ou função.

8. Quem hoje não traz em seu coração aquele exemplo de família testemunhado por seus antepassados? Velhos e bons tempos...! Onde o pai trabalhava na roça para garantir o sustento da família; a mãe ficava em casa cuidando dos filhos, lavando, passando, preparando as refeições, enfim, cuidando da casa; tudo para o melhor conforto dos seus. Quando chegada a hora da refeição, era o filho quem levava o alimento para o pai que, a tempos já estava trabalhando, fatigado. Temos saudades de tempos como esse... No modelo de família antiga, era o pai quem regia o lar. Planejavam ter grandes números de filhos, para ajudar nos serviços do campo. E, que por sinal, eram muito bem educados, apesar de não possuírem grandes condições. Os filhos (as) desse tempo só faziam o que lhes recomendassem os pais; até mesmo na escolha da profissão ou esposa, sofriam influências dos pais. Os filhos homens, muitas vezes trabalhavam no comércio da família ou na roça. As filhas moças ficavam em casa, aprendendo a cozinhar, bordar, preparando o enxoval e todas as boas maneiras para ser uma boa esposa. Os que, dessa forma foram educados, hoje, ficam horrorizados ao depararem-se com esse modelo atual de vivência familiar (se é que podemos chamar dessa forma). São pais e mães que não mais honram o exemplo que receberam. Filhos que não aceitam a opinião dos pais. Chefes de família que, ao confrontar-se com a triste realidade na qual vivem logo se entregam ao desespero doloroso da desunião.

9. Alguns responsáveis pelas crianças, dizem que lavar umas palmadas de vez em quando ajuda bastante na educação. Sem dúvidas, há aqueles pais de costumes antigos que foram educados na base do tão famoso chicote. Muitos deles dizem que educam seus filhos da mesma maneira com que foram educados pelos seus pais. Se pararmos para analisar, percebemos que esta maneira adotada surtiu um bom efeito. Há também aqueles pais mais jovens, cordiais, compreensivos que, apesar de terem sido ensinados de nosso radical, dizem que jamais aplicam esse tipo de educação para seus filhos. Preferem repreendê-los através de um simples diálogo, que se propaga em uma boa educação. Com esse modelo, certamente diminui-se os casos de agressão infantil nos lares. Educar não é apenas repreender com o chicote a estripulia. Mas nunca ninguém morreu por ter levado umas leves palmadas. O Eclesiástico nos exorta: “... Vara e disciplina é sabedoria em qualquer tempo” (Eclo 22,6). Para mostrar aos filhos os valores familiares, é preciso muita calma. Não se educa de uma ora para a outra. Educação é um processo contínuo, que pode durar a vida toda. Não existe um livro ou forma padrão de educação. Existem os adjetivos que conhecemos e chamamos de educação. Existem apenas valores que podem ser preservados e aplicados aos que devem ser construídos, conforme as circunstâncias. Há uma enorme diferença entre os métodos educacionais do passado em comparação ao atual. Por mais que os responsáveis queiram educar conforme os valores recebidos, a acolhida será diferente. O modo como se comunica tal educação é diferente. E, para transmitir uma boa educação aos seus, os pais, antes, devem reavaliar seus conceitos de educação. Pois, os bons exemplos brotam da vivência do casal. O alicerce da vida dos filhos está fundamentado na rocha conjugal dos pais que, com amor querem formar e colher seus frutos pela presença-caráter dos filhos. Toda a boa formação dos filhos, recebida desde cedo, irá resultar no seu futuro, na construção de sua identidade.

10. Ser família, é compreender o amor de Deus revelado aos que conosco formam essa união. Só compreende isso a família que caminha por Cristo, com Cristo e em Cristo, procurando a cada dia serem pessoas comprometidas com a causa do Reino: social, humana e na forma de vida de Cristo. Nós queremos que nossa família seja fonte de luz para os que nela vivem. Aspiramos para os nossos filhos uma boa educação, que o forme para enfrentar todas as facetas sociais. Sonhamos viver num mundo tranquilo, envolto pelo amor e paz. Não mais queremos ver casais brigando, divorciando-se, desanimando ante aos desafios. Sonhamos ver as famílias alegres, vivendo seus compromissos familiares frente a toda e qualquer problemática. Família é o presente mais precioso que Deus nos concedeu. Não importa se não a possuímos por completo. O que importa, é que a cada dia partilhamos dos sorrisos, tristeza, desafios e medos, observando acima de tudo, o amor. Enfrentamos com coragem os desafios e, guardamos no coração a viva esperança, pois a nossa família é perfeita na sua valentia na contemporaneidade.

Frei Zilmar Augusto OFM
Enviado por Frei Zilmar Augusto OFM em 12/10/2011
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